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Segredo revelado
(Palavras de Sophie) … foi o melhor final de semana da minha vida! Havia muitos anos que não me sentia tão feliz como fui naqueles dias. Jenny, eu e James… e por algumas horas, eu devaneei, imaginei um futuro bom ao lado dela. Foi um pensamento feliz e ao mesmo tempo dolorido. Não poderia dizer que tínhamos um relacionamento, mas de certa forma, namorávamos. Tomamos café da manhã juntas, como se fossemos um casal, não esses casais recentes, mas um casal antigo, onde uma conhece o gosto da outra, onde cada olhar e expressão são decifrados com facilidade, e outra vez, aquela felicidade me feriu, precisava contar-lhe a verdade, não poderia esperar nem mais um dia.
O tormento de Sophie ficara tão explicito, que Jenny indagou o que estava acontecendo. Pois não conseguia entender, como depois de tanta cumplicidade e felicidade, os olhos da jovem eram tristes.
– Eu preciso te contar algo, Jenny!
– Hum…
– Eu não sei se as coisas vão continuar do mesmo jeito, com certeza não vão. E era justamente por isso que eu temia tanto me deixar levar por todos esses sentimentos que você me despertou… ah, se você soubesse o quanto me entristece essa sensação de que posso te perder, dói e você não faz ideia.
Sophie estava certa de que aquele momento seria o fim de tudo que mal havia começado, mas Jenny pediu que ela não contasse nada, justificando que não queria ver destruído o que estava sentindo, pediu para que a jovem deixasse para contar, fosse o que fosse, em outro momento.
Talvez, Sophie deveria ter sido taxativa e fazer-se ser ouvida, mas, bem sabemos o quanto o medo pode ser um mal conselheiro, de fato, quem poderia julgar Sophie naquele momento? Sentiu-se fraca e covarde, mas atendeu o pedido de Jenny e acabou concordando em não falar nada, pelo menos não naquele dia, e só o tempo saberia dizer quando ela tomaria outra dose coragem para se revelar novamente.
– Tudo bem…
– Então, me dá um sorriso e um beijo?
—
Precisamos falar sobre esse pedido de Jenny, sabe, ela sempre teve esse problema de não ouvir o que as pessoas têm a lhe dizer, por medo de que as palavras proferidas acabassem com a sua felicidade, mesmo que a felicidade referida fosse momentânea.
Egoísmo? Talvez.
Mas, já diz o velho chavão que: mentira tem perna curta.
Depois do final de semana encantado, elas encontram-se algumas vezes durante a semana, trocaram beijos, assistiram filmes, ouviram música, passearam e riram de coisas bobas. De repente, aconteceu a viagem que Helena havia programado. Sophie até tentou, mas não conseguiu contatar Jenny a tempo de avisar que ficaria ausente por alguns dias.
Aquele desaparecimento sem aviso prévio preocupou Jenny, que automaticamente lembrou que a jovem queria lhe contar algo, e muitos pensamentos surgiram. Afinal, ela não sabia muita coisa sobre Sophie, talvez a moça estivesse em perigo, talvez fosse casada, poderia também ter sofrido alguém acidente.
É sempre assim, nesses momentos nunca conseguimos ter bons pensamentos. Então, Jenny foi até o apartamento de Sophie, estando lá, acabou sendo recepcionada pela Flávia e o James, que correu em sua direção.
– Ele realmente gosta de ti!
– Sim, gosta. Eu também estava com saudades dele.
– Tipo assim, eu acho incrível essa sua relação com a Sophie. Eu não sei como você aceita, como consegue, eu mesma, não conseguiria.
– Como assim?
– Tem que amar muito ou pouco, acho que o segredo deve ser o desapego, para não se importar com o trabalho que a namorada tem. É … eu realmente não conseguiria, mas acho super bacana da sua parte, e dá para ver que a Sophie está mesmo gostando de você, vai que ela largue esse trabalho. Tudo pode acontecer.
– Acho que ela trabalha demais, mas quando a conheci, ela já tinha esse trabalho. E, não temos uma relação onde eu possa sair fazendo exigências.
– Mesmo assim, né bem. Você parece tão certinha, dessas que até vai na missa aos domingos pela manhã, quem diria, olhando assim para você, que seria capaz de aceitar se relacionar com uma garota de programa.
– Garota de programa? Você disse, garota… de … programa?
– Sim, bem. O trabalho da Sophie, sendo que nesses momentos ela se torna Scarlet. Eu gosto desse nome e você? Deve ser interessante estar com ela na “versão” Scarlet.
– É … bom, Flávia, eu preciso ir. Saí no meu horário de almoço, e está quase terminando o meu tempo. Não vou dizer para você cuidar direitinho do James, pois tenho certeza que você faz isso. É … preciso mesmo ir.
Aquela novidade golpeou Jenny, abrindo um buraco no chão e a sugando, nem deu tempo segurar-se em algo para evitar a queda livre.
(Jenny) … uma garota de programa! Meu Deus, a Sophie é uma garota de programa. A Sophie … ela é tão inteligente, bonita, cheia de teses e maturidade. Por quê? Por que ela não me contou? Ah, então era isso, era o que queria me contar, era o motivo das relutâncias. Meu Deus, é isso mesmo, garota de programa! Eu beijei uma garota de programa!
A cabeça de Jenny dava voltas, chegou a comparar Sophie com o Carlos, depois fez comparações bem piores, e deu-lhe nomes que eu não teria coragem de repetir aqui. Na lógica de Jenny, nada poderia justificar a forma qual a jovem ganhara a vida.
(Sophie) … todas as coisas que pareciam estar certas, que pareciam simples, começaram a dar errado e ficarem complicadas, sem contar que eu ligava para a Jenny o celular tocava até cair na caixa postal. Enfim, primeiro eu devo dizer que ferrei com o negócio que Helena estava tentando fechar. Sim, eu até cheguei a seduzir a tal mulher, como foi o combinado, mas acabei lhe contando a verdade e ela conseguiu chegar no escritório do esposo antes dele assinar o contrato.
Estava preparada para enfrentar a fúria de Helena, mas isso não aconteceu, nem mesmo um “ai” ela me disse, até a volta para casa foi em total silencio, ainda no aeroporto enquanto ela tomava um táxi, esperei que me dissesse algo, ou até mesmo pedisse restituição do dinheiro que me foi pago, mas não, ela simplesmente foi embora. Pareceu uma forma perfeita de me livrar dela, mas eu não tinha planejado aquilo, como também sabia que Helena era explosiva demais para ficar calada em uma situação como aquela. Seu silencio me deixou com medo e alerta… acontece que medo era algo que eu sempre tive, só era boa mesmo em disfarça-lo. Mas, nenhum disfarce, truque de sedução ou manipulação, me preparou para notícia que recebi ao chegar em casa.
Sophie ainda brincava com o James e olhava para o celular já pensando em ligar novamente para Jenny, precisava saber o que estava acontecendo, mas antes tinha que arranjar uma excelente explicação para aquela viagem sem avisos.
– A Jênnifer esteve aqui. __ falou uma Flávia, sentindo-se triunfante.
– Hã?
– Dããã, ela veio aqui. Óbvio que procurar por você, mas não se preocupe, recebi sua namoradinha direitinho.
– Flá… detesto quando você faz esses deboches. O que vocês falaram?
– Deixa eu ver … antes dela perguntar por você, eu me adiantei e contei que você faz programas.
– Você fez o que? VOCÊ É LOUCA?
– Pode parar de dar show, alguém precisava contar. Ela ficou tão chocada, mas até que disfarçou bem, e quer saber, se ela não continuar contigo, é porque não gosta mesmo de você. E talvez, só assim você consiga reparar em mim, perceber que eu fico aqui igual a uma idiota esperando por você e você me inventa de se apaixonar por essa mulher. Que porra Sophie, quando vai entender que eu sou a única que te conhece de verdade, entende e aceita você de qualquer jeito? Por que não consegue enxergar que eu te amo? O que falta em mim?
– Flávia, você é louca… caramba, eu não acredito que você fez isso comigo. Preciso ir na casa da Jenny.
– É sério isso? Você ouviu alguma coisa do que te falei? Eu acabei de dizer que te amo e você quer ir atrás dela, como se eu não fosse nada, será que não mereço nem um pouco de consideração da tua parte? Quer saber, vai mesmo, pode ir… eu duvido que ela vai querer te receber ou que queira falar contigo. Vai lá, é bom que você toma na cara de uma vez e quando voltar, eu sou quem vai estar aqui, te esperando…
Talvez, Flávia tivesse razão e Jenny não fazia questão de vê-la, mesmo que estivesse vestida de princesa-heroína cantando: A imperatriz e a Princesa, da Isabella Taviani. Mas, em algo Flávia estava errada, Sophie nunca foi cega quanto aos sentimentos que a amiga nutria por ela, porém, nunca teve a intenção de oferecer mais que amizade. Sendo que naquele momento, Sophie ainda tinha sérias restrições a manter Flávia no seu ciclo de amigos, acabou pedindo para que a amiga fosse embora, deixando claro que jamais aconteceria algo entre elas, ainda aproveitou para afirmar que a menina não a conhecia tão bem como julgara, pois, se conhecesse, não teria feito o que fez. Claro que as palavras de Sophie não saíram com tanta delicadeza, não estava com as emoções no lugar, e muito menos tinha paciência para ser delicada naquele momento.
Os sentimentos de Sophie estavam voltados para Jenny, precisava saber o que aquela mulher estava pensando a seu respeito, depois de saber da verdade, e da pior forma possível. Mas, não teve coragem de ir até a casa dela, mandou uma mensagem.
“Sei que esteve no meu apartamento, sei que conversou com a Flávia. Era isso que precisava lhe contar, sinto muito por você ter ciência de tudo dessa forma. Mas, agora você já sabe, e eu preciso saber se você ainda deseja estar na minha vida ou não…
Sophie. ”
Assim que ouviu o sinal de notificação, Jenny pegou o celular e leu a mensagem.
Do outro lado, Sophie aguardava ansiosa por uma resposta, a única que chegou fora da operadora do celular informando que a mensagem havia sido entregue.
Sophie não sabia, mas o desejo de Jenny, era de mandar-lhe a puta que pariu. E, não mostrava muito interesse em ouvir qualquer que fosse sua versão da história, se é que havia alguma explicação para aquilo.
Jenny não respondeu as mensagens…
Não retornou as ligações, até mudou a rotina, os horários.
Pareceu adivinhar que Sophie iria ao seu encontro, mas quando isso aconteceu, a jovem não conseguiu encontrá-la. Sim, Jenny estava fugindo de Sophie, pois não sabia o que dizer, muito menos o que sentiria quando a olhasse.
Não a como condenar Jenny, se pararmos para analisar a forma como fora educada, seria capaz de respeitar as escolhas de Sophie, mas não conseguiria aceitar. Sim, existia um preconceito gigantesco da parte dela, a ponto de não saber se ainda queria ao menos a amizade de Sophie, mas, sinceramente, será que realmente não agiríamos como a Jenny? Talvez, até de forma pior. O fato era: aquela informação ainda não cabia em sua cabeça, a Sophie, uma garota de programa.
E Sophie entendeu o recado, Jenny não queria vê-la. Aquilo lhe doeu profundamente, ter a consciência de que a mulher que passou a habitar em seu coração e por algumas semanas a fez acreditar em dias amenos, futuro bom e vida nova, não a queria mais por perto.
Então era aquilo, havia simplesmente acabado?
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