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Olhares e gestos impossíveis de esquecer
Jenny ainda não sabia, mas naqueles míseros segundos em que seus olhos pousaram nos olhos de Sophie e o tempo parou, o amor lhes aconteceu.
Sophie tentou sair daquele transe, chamando mentalmente pelos deuses ou qualquer força superior. Jenny ainda se sentia atordoada, sem aparente explicação para aquela nova sensação sem nome.
– Você está bem? __ perguntou Sophie, tentando livrar-se daquele quase transe hipnótico, que fez um arrepio percorrer pelo seu corpo e explodir na nuca.
– Nossa, desculpa moça. Eu que devo perguntar se você está bem?! __ Jenny respondeu perguntando, ainda se sentia embaraçada em toda aquela situação.
Sorrisos foram trocados e houve silencio por alguns instantes. Sophie notou que os olhos de Jenny estavam marejados, compreendeu que ela havia chorado e achou educado perguntar.
É um fato, quando se está contendo um choro, e alguém nos aparece com a voz gentil, cheia de cuidados e pergunta se estamos a chorar, é certo que vamos nos verter em lagrimas. E como já havia dito, a coisa mais fácil do mundo, era a Jenny chorar.
As lagrimas que ela vinha tentado conter, acabaram rompendo as barreiras e ela se desabou em choro.
Obviamente, Sophie assustou-se com aquela reação, afinal, Jenny passou a chorar como se a moça tivesse lhe dito algo terrível. Sophie tentou perguntar o que estava acontecendo, e ouviu um “nada”, em meio a soluços e mais choro, o que fez com que ela começasse a entrar em desespero.
– Impossível, vamos sentar aqui. Você precisa de ajuda? Deseja que eu ligue para alguém, chame a polícia? __ Sophie indagava preocupada, enquanto ajudava Jenny a sentar no banco.
– Não… obrigada, está tudo bem.
Jenny insistia que nada havia acontecido e que estava bem, o que Sophie por sua vez sabia que não estava, ninguém chorava a ponto de soluçar, por nada. A moça de olhos azuis pedia desculpas e estava envergonhada por chorar na frente de uma desconhecida, já Sophie não entendia aquilo, mas seu coração apertava e sentia-se agoniada com toda aquela situação. Não sabia como agir e respondeu algo bobo, que arrancou um riso de Jenny, que chorou e sorriu novamente. Sophie concluiu que aquela moça não estava mesmo bem e que só sairia dali quando ela estivesse razoavelmente melhor. Não teria como ser diferente, apesar da pose de “pronta para a briga”, Sophie tinha um bom coração, que ficava ainda mais mole diante daquelas lagrimas.
Entre um assunto e outro, que foram naturalmente surgindo, notaram que ainda não haviam se apresentado. Jenny fez as honras, mas em seguida, retificou-se, explicando que o nome era Jênnifer, mas que o detestava e preferia o Jenny. Sophie sorriu e também se apresentou, e logo que o fez, Jenny pensou que nenhum outro nome se encaixaria tão bem: “Sophie… um nome tão bonito quanto a dona”.
E então começaram as observações silenciosas, entre uma frase e outra; Jenny logo notou o sotaque e as expressões diferentes, sorriu quando se deu conta de que a moça conversava gesticulando e olhando nos olhos, e que ao falar, além da voz grave e suave, havia segurança nas palavras.
A primeira coisa que Sophie notou foi o quanto Jenny parecia perdida. Depois, mesmo que sem querer, se pegou enxergando os detalhes: as leves sardas perto dos olhos, a forma como a face ia corando quando Jenny sentia-se envergonhada, o desenho da boca, os sorrisos que faziam os olhos ficarem apertadinhos…
Conversaram bastante, falaram sobre teses, lugares, riram… a impressão que se tinha, não era de duas desconhecidas, mas de pessoas que já foram muito intimas, que completavam uma a frase da outra. Falaram das coisas mais singelas, como alguns balões coloridos que estavam amarrados em uma arvore ao lado delas, mas também abordaram assuntos sobre teatro, música, economia local e mundial. Concordavam com muitas coisas e discordavam de poucas outras.
Sophie analisava em silencio aquela sensação que sentia, a de já conhecer aquela mulher, e enquanto se perdia nesse pensamento, Jenny lhe indagou se ambas já haviam se encontrado alguma vez.
– Creio que está é a primeira vez que nos encontramos, Jenny.
– Hum…
– Mas, eu teria adorado ter te conhecido antes.
– Isso é engraçado!
– O que, Jenny?
– Estou com essa impressão desde a hora que quase te derrubei, sinto que já te conheço. Que estranho!
– Acredite, se já tivesse me deparado contigo, eu jamais esqueceria!
E ali estava mais uma troca de olhares… que Jenny tratou de cortar, insistindo que ainda tinha a tal sensação.
– Talvez, sua alma reconheceu a minha, de alguma vida passada! __ por alguns instantes, nem mesmo Sophie acreditava no que acabara de dizer, se chamou mentalmente de louca: “almas que se reconhecem, de vidas passadas? Vai começar a acreditar em amor à primeira vista também? ”
– Você está falando sério? __ havia confusão na voz de Jenny, como quem ainda não tinha decido se aquela afirmação assustava ou encantava.
– Não Jenny, estava apenas brincando. __ mas a resposta verdadeira era: “Sim, estou. Apesar de nunca ter acreditado nisso, até ter me esbarrado em você”.
Sophie sentiu necessidade de ir embora, estar na presença daquela mulher começava a afeta-la, e ela não sabia ao certo como lidar com aquilo. De forma gentil, tratou de começar a despedida… quase desistiu quando Jenny suspirou e fez cara de quem não gostou da notícia.
– Ah, Sophie! A conversa está tão agradável, juro que nem notei que havia anoitecido. Tem mesmo que ir?
– Infelizmente, preciso ir. Mas Jenny, gostei de conversar contigo e desejo sorte para que consigas resolver os problemas que fizeram você chorar.
– Aí que vergonha…
– Você mudou de cor, que fofa!
Mas, o que Sophie achou mesmo fofo, foi ver Jenny gaguejar ao falar que gostaria de vê-la mais vezes. Seu sorriso foi largo e feliz, e fazia muito tempo que não sorria daquele jeito. Tratou de abrir a bolsa, pegou caneta e um pedaço de papel, escreveu o que achou necessário e o que sentiu vontade, entregou para Jenny. Despediu-se outra vez, sim, era daquelas despedidas que ninguém quer mesmo ir embora, mas precisa.
Sophie já estava atrasada para o seu compromisso, foi embora sem coragem de olhar para trás, pois tinha certeza que se olhasse, acabaria voltando, e se voltasse, iria beijar a Jenny ali mesmo, ainda que corresse o risco de levar um tapa e ser chamada de louca.
Jenny, alheia ao pensamento de Sophie, permaneceu bem ali, sentada naquele banco, vendo a jovem desaparecer em a meio a neblina que começava a se formar no parque.