Ato 3: Um Compromisso com o Amor
Alessandra abriu os olhos preguiçosamente.
A luz solar insinuava-se pelas cortinas indo de encontro a parede oposta à janela. Demorou-se a admira-la e o calor que trazia, sentindo-se grata por vê-la e senti-la. Mexeu-se e sentiu a pressão em sua cintura, feita pelo braço longo e delicado de uma morena possessiva de lindos olhos amendoados que ainda dormia. Sorriu maravilhada, o mesmo sorriso que visitava seus lábios todas as manhãs junto com o gosto dos beijos dela. O calor do corpo aconchegado ao seu a fez permanecer imóvel por mais algum tempo, desfrutando todo o bem que lhe trazia.
Com cuidado para não a despertar, saiu da cama. O chão frio em contato com seus pés descalços lhe trouxe um arrepio que sentiu percorrer seu corpo com satisfação exagerada. Ao longo dos últimos anos, descobriu estranhos prazeres em pequenas coisas até mesmo aquelas que a maioria das pessoas considerava insignificantes ou incômodas. A razão disso, era que tudo aquilo a lembrava de que estava viva.
Demorou-se um tempo a fitar os lençóis amarrotados e a bela que repousava entre eles, um sorriso a distorcer sua face em uma máscara de felicidade.
Com passos gingados e cantarolando baixinho, percorreu o jardim acariciando as rosas que sua mãe tanto amava até encontrar aquela cuja perfeição e beleza serviriam a um propósito ainda mais belo.
Preparou o café da manhã como fazia todos os dias. Levar o desjejum para sua mulher na cama era um de seus maiores prazeres e o fazia sempre que podia. Naquele dia não seria diferente, mas havia algo a mais na bandeja, a rosa vermelha que colhera minutos antes ocultava entre suas pétalas um anel, um símbolo de um laço que ultrapassava o físico.
Ajoelhou-se ao pé da cama e ficou a admirar aquela que era dona de seu coração, responsável pela sua felicidade e por estar ali vivendo aquele momento. Olhava com carinho para a mulher amada em seu sono tranqüilo, um pequeno sorriso se formando na boca carnuda, os cabelos negros e cacheados cobrindo parcialmente o vale formado pelos lindos seios sobre os quais adorava repousar sua cabeça e ouvir os batimentos acelerados de seu coração como uma canção dos deuses logo após fazerem amor.
Amava aquela mulher de tantas formas e todas elas eram puras e plenas.
Com um sorrisinho maroto, recordou de como foi fazer amor com ela pela primeira vez. Tinha tanto medo de que não fosse perfeito, ambas tinham sonhado tanto com aquele momento e esperado tanto por ele, mas cada toque, cada beijo, cada gemido e sussurro só fizeram comprovar, em sua perfeição, o que havia muito seus corações já sabiam; haviam sido feitas uma para a outra.
Esticou o braço e com a ponta do dedo tocou os lábios de sua amada, acompanhou os traços de sua boca lentamente para, em seguida, capturá-la com a sua e, quase imediatamente, foi correspondida.
Monique entreabriu os lábios e, antes mesmo de abrir os olhos e despertar para a consciência completamente, estava correspondendo o beijo com voracidade. Seu corpo reagia ao de Alessandra ao menor contato que fosse, um simples roçar de mãos trazia à tona toda a paixão e desejo que sentiam.
O beijo tornou-se mais e mais exigente, as carícias tornaram-se cada vez mais íntimas. Em poucos instantes, as poucas peças de roupas que vestiam foram arrancadas e jogadas ao chão. Monique afastou-se para, como sempre fazia, poder admirar a beleza do corpo amado, seus traços, suas curvas, serras e vales. Aspirou o perfume único e viciante que vinha dela, prendeu seu olhar ao par de safiras que brilhavam de desejo e mergulhou mais uma vez na boca sensual que se abria receptiva ao seu beijo.
Os corpos fundiram-se com o calor do desejo, da ânsia de se pertencerem, de estarem mais uma vez completos, encaixados. Os sussurros e gemidos dominaram o quarto, seu refúgio, seu ninho de amor. Ecoaram por todos os outros cômodos da casa que compartilhavam desde que, em uma tarde quente, Monique adentrou ao quarto de Alessandra logo após receber desta uma declaração de amor nas páginas de um velho livro de poesias. Após o primeiro beijo que trocaram, não havia mais dúvidas de que seu destino era estarem juntas e, sendo assim, Monique nunca mais se foi, nem permitiu que a mulher que amava desistisse de viver quando o mal que um dia lhe abatera ameaçou retornar.
Sentiu o corpo amado estremecer entre seus braços e as unhas de Alessandra deixando o rastro de sua passagem em suas costas, a respiração ofegante dela atingia seu pescoço e ombro numa carícia sensual antes que o seu próprio corpo atingisse o êxtase e se aninhasse ao dela em um descanso embalado pelo ritmo de suas respirações entrecortadas.
Cada vez que faziam amor, era um momento único e sublime.
Alessandra brincava com os cachos do cabelo da amada, hábito que ela tinha sempre que faziam amor ou quando se recolhiam para dormir. E Monique amava isso, amava cada gesto dela, olhar e sorriso, amava até vê-la zangada e o mesmo se passava com Alessandra.
Nos três anos que estavam juntas, não houve um só dia em que a felicidade de se pertencerem as abandonasse, até mesmo quando brigavam a raiva não durava mais que alguns minutos e as discussões terminavam com um abraço apertado em que ambas se permitiam dizer “Eu te amo” e os problemas se resolviam como em um passe de mágica logo após sentarem com calma para conversar.
Alessandra reconheceu em Monique a mulher que amaria para o resto de seus dias no instante em que a viu e tirou de seu olhar, de seu sorriso e da saudade da presença dela, forças para lutar por sua vida quando a morte lhe parecia ser seu único destino. Muitos foram os problemas, os medos, os sofrimentos que enfrentou, mas passou por eles como se nada fossem, pois tinha a mulher que amava ao seu lado e, por esse motivo, queria demonstrar seu amor da melhor forma que conhecia.
Monique ergueu a cabeça e ajeitou-se em uma posição mais confortável para fitá-la quando ela a chamou. Seus rostos estavam muito próximos e Alessandra, por um instante, perdeu-se no brilho das íris castanhas, quase se esquecendo do que tinha ensaiado para falar.
Monique a aguardava pacientemente com um sorriso quase tímido, o rosto afogueado pelo amor recente.
Alessandra esticou o braço para pegar a rosa sobre a bandeja e entregou-lhe. Monique aceitou a flor com um sorriso largo e levou-a até bem próximo do rosto, aspirando seu perfume. A amante tomou sua mão carinhosa e beijou-a suavemente. Com a mão livre, acariciou as pétalas da flor, enquanto a olhava profundamente.
— Você é meu tudo — disse por fim, a timidez lhe assaltando de repente.
Monique lhe sapecou um beijo na testa e Alessandra caiu em silêncio, o coração pulsando mais rápido, mas logo as palavras regressaram aos seus lábios.
— Nenhum beijo, olhar, sussurro, toque, gesto ou momento a teu lado para mim é suficiente. Quero sempre mais de ti. Quero sempre mais contigo. E sei que sente o mesmo. Sei que você sabe que fomos feitas uma para outra e que ninguém no mundo é capaz de arrancar de nossos corações o amor que sentimos.
A morena sorriu, adorava ouvi-la falar daquele jeito tão apaixonado. Amava beber de suas palavras, assim como bebia de seus lábios.
— Hoje, exatamente hoje, faz quatro anos que sentei em uma mesa de um quiosque a beira do lago e vi a mulher mais linda e encantadora. O sorriso dela me cativou, seu olhar me guiou para a vida e os seus beijos me levaram ao paraíso — passou a mão sobre as pétalas da rosa de modo que o anel escondido entre elas ficasse visível. — Você é a mulher da minha vida. Sei que sempre achou isso desnecessário, pois já moramos juntas, mas quero que seja oficial.
Os olhos de Monique se abriram um pouco mais, iluminados pelo brilho da aliança tocada pela luminosidade que dominava o quarto.
— Sim, isso é um pedido de casamento — concluiu ansiosa. — Casa comigo?
Elas não precisavam de alianças, nem uma cerimônia para efetivar seu amor, era o que Monique pensava. Mesmo assim, um sorriso desenhou-se lentamente na face morena, enquanto sussurrava um “sim” emocionado.
Mais tarde, quando amigos lhes perguntaram onde se realizaria a cerimônia, a resposta veio em uníssono sem que ambas tivessem conversado a respeito antes, queriam que o casamento se realizasse onde tudo começou: no lago.
FIM