Por muitos anos não quis ter filhos. Não foi falta de insistência da esposa que, além de querer ter a criança, ainda queria gerar…
A ideia me parecia absurda por vários motivos, na ocasião:
1) eu tinha 26 anos, estava começando a vida profissional e trabalhava ensandecidamente. Não tinha tempo nem pra mim, que diria pra criança. Não tinha como trabalhar menos, porque ela não tinha trabalho na ocasião. E aí, eu teria que trabalhar mais, pois seriam três, ao invés de dois para sustentar. Eu, praticamente não veria o/a filho/a, e isso me deixava num estado de nervos, pois meus pais trabalhavam demais; eu os via, sem vê-los.
2) Ela queria engravidar: voltamos a questão da grana, numa situação de inseminação artificial. A outra opção era realmente transar com o suposto pai escolhido. E esta opção me agoniava ainda mais, pelo fato de pensar nela transando com alguém que não fosse eu. E pra completar minha piração, pensava nesse tal pai querendo dar opinião na nossa vida, nos avós paternos e no meu papel. Juridicamente, naquele contexto, nenhum… Não tínhamos nem uma união estável (não era permitido naquela altura), e eu seria a tia? Isso sempre me atormentou.
3) Não poder ser parte ativa da concepção, não ter uma criança com nossos traços, sempre me desanimou do processo.
Fiz a única coisa possível na ocasião: a deixei livre para poder ter o filho com quem quer que fosse. Ela não foi. Criamos um acordo tácito de continuar na mesma toada.
Os anos passaram e, desta vez, fui eu que me vi pensando em filhos. Agora, com a vida um pouco mais estabelecida, a opção da adoção me pareceu interessante. Aí, ela foi contra. Chegamos a uma conversa definitiva sobre o assunto. Não os teríamos.
Um velho colega de escola da minha esposa, que era professor do ensino fundamental, costumava dizer que o necessário para criar os filhos era amor e limite, e que todo o resto se ajeitava. Eu achava aquilo um absurdo, no entanto depois de uma prima louca, em todos os sentidos, ter tido uma filha, penso que eles se criam. Que a família ajuda daqui, se dá um jeito de lá, e tudo se acerta.Vejo que o meu medo sempre falou mais alto. E depois de muita terapia e auto-análise, descobri que o medo maior era ser uma mãe como a minha fora.
Ainda daria tempo? Creio que sim. Mas, já não tenho mais paciência. Quando viajo, quero dormir, descansar, pois boa parte das vezes é a trabalho. Não consigo. Parece que as crianças estão sempre ao meu lado, pulando, gritando, literalmente fritando. E pro meu desespero, as mães têm aquela voz pastosa de quem não quer fazer nada, e fala por falar…
Crianças mal-educadas, com pais que parecem ter menos paciência que eu, colocando a bendita “Galinha pintadinha” pra rolar no celular! Será que esses pais sempre existiram e eu que não os enxergava antes? Crianças cuidando de crianças, sim, sempre existiram.
Nesse momento, penso que, apesar de achar que conseguiríamos criar um ser humano maravilhoso, também penso que o que mais aconteceria seria: eu pagar minha língua! E quando penso nisso, o sentimento maternal se esvai, volto ao meu egoísmo tosco e quero dormir!
FIM!
Meninas, sei que muitas por aí têm o desejo de serem mães ou já o são. Quero que saibam que as respeito profundamente, assim como quero que pensem da mesma forma, com respeito, sobre todas aquelas que se encontram na minha posição. O conto não tem a intenção de satirizar este desejo ou o esforço de ter e criar filhos. Muito pelo contrário! Creio que existam outras como eu, e espero que elas não se sintam sozinhas, como me senti dentro de toda minha insegurança no decorrer dos anos. >
Enfim, mudando de pato pra ganso, vou continuar com a ladainha do apoio à campanha de arrecadação. Clica lá e contribui com qualquer quantia, ok? O que importa não é o valor, e sim a atitude. Obrigada!
Como já dizia o poeta Vinicius de Moraes…
“Filhos… Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-los?”
Sempre quis ter e vivia sonhando com isso. Ficava enternecida com a beleza da gravidez e tudo mais… O tempo passou, não rolou e vida que segue! Não sou daquelas que fica na fissura da frustração. Não era pra ser. Ficaram os sobrinhos e afilhados, todos com endereço de devolução…😆😆😆
Ótima reflexão, Naty!
O endereço de devolução é o melhor, né Nefer?
Você sabe que esses dias me lembrei desse trecho e não conseguia lembrar de quem era… Acabei de descobrir!
Obrigada pelo comentário.
Abraços
Olá! Tudo bem?
Assunto espinhoso. Na verdade, hoje a mulher não quer ter mais filhos, e isso em qualquer nível social ou intelectual. Na maioria dos países do mundo a taxa de natalidade já é assustadoramente negativa. Estamos caminhando para um mundo senil e enrugado, sem bundinhas lisas e sorrisos de faces rosadas.
É assustador. Concordo: é muito egoísmo, mas assim caminha a humanidade. Fazer o quê…
É isso!
Post Scriptum:
Mãe
Renovadora e reveladora do mundo
A humanidade se renova no teu ventre.
Cria teus filhos,
não os entregues à creche.
Creche é fria, impessoal.
Nunca será um lar
para teu filho.
Ele, pequenino, precisa de ti.
Não o desligues da tua força maternal.
Que pretendes, mulher?
Independência, igualdade de condições…
Empregos fora do lar?
És superior àqueles
que procuras imitar.
Tens o dom divino
de ser mãe
Em ti está presente a humanidade.
Mulher, não te deixes castrar.
Serás um animal somente de prazer
e às vezes nem mais isso.
Frígida, bloqueada, teu orgulho te faz calar.
Tumultuada, fingindo ser o que não és.
Roendo o teu osso negro da amargura.
Cora Coralina [Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas. Mulher simples, doceira de profissão, tendo vivido longe dos grandes centros urbanos, alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos do cotidiano do interior brasileiro, em particular dos becos e ruas históricas de Goiás.]
https://pt.wikipedia.org/wiki/Cora_Coralina
Obrigada pelo seu comentário! E pela linda poesia da Cora Coralina. A admiro muito tanto quanto poetisa e como doceira, que trás aí uma tradição nos seus preparos.
Creio que os ciclos vão se repetindo ao longo dos tempos. Agora, por exemplo, tenho visto muitos “filhos do Covid-19”, como apelidamos por aqui. Muitas mulheres grávidas por estarem mais tempo em casa com seus parceiros.
Uma coisa é certa: a população mundial não tende a diminuir.
Bom domingo.
Super me identifiquei, com o medo de ser mãe e não ser suficiente, com o “egoísmo” de preferir dormir. Bem no fundo eu quero ser o centro do meu universo, e a nossa cultura de ser mãe transforma os filhos no centro do universo e as mães, em sua maioria, deixam de viver muitas coisas em função dos filhos. Confesso que não tenho essa vocação.
No final das contas o principal motivo de não ter pensado em ter filhos foi ver 90% das amigas ao meu redor ter filhos e perder a sua identidade para se tornar mãe, o trabalho que dá ser responsável por outro ser humano, e por querer ter o meu direito de ir e vir a hora que quiser, sem ter a preocupação com um ser humano que depende de mim, principalmente pq sei que seria a mãe que tem o filho como centro do universo. haha Meio egoísta, provavelmente, mas tô felizinha com minhas sobrinhas!
Masssss super apoio quem quer ter filhos, perpetuar a espécie, ser mãezona, julgo, mas jamais seria contra a escolha de qualquer pessoa. hahaha
Bjão
Super obrigada pelo mega comentário!
É, sigamos sendo tias! Adoro uma parte dos meus sobrinhos.
Bom fds.
Abraços.