MARCELA
Uau! Nem preciso falar que a noite que passei ao lado de Joana foi maravilhosa, né? Sentir ela junto a mim, beijando e acariciando meu corpo, só me fez ter mais certeza do que sentia por ela. Tive muita vontade de me entregar a ela completamente, mas não sabia como e mesmo querendo isso, minha mente ainda tinha essa possibilidade como algo nojento.
Mas, era só sentir seus beijos que a ideia retornava avassaladora e até me arrisquei com algumas mãos bobas, achava tocá-la tão estranho e ao mesmo tempo gostoso.
E, tudo isso, só me fez pensar mais e mais em quando e como isso aconteceu. Quando, durante aquela conversa, ela me pediu para pensar bem em meus sentimentos, fiquei a observando. Naquele momento, obtive minha resposta. Ela se infiltrou em meu coração no momento em que fui pedir desculpas a Ana e, esta, me obrigou a também pedir desculpas a ela.
Na ocasião, a observei por um longo tempo. Não sabia o que me chamava a atenção nela, mas, naquele momento, não conseguia desviar meus olhos dos dela. Foi ali que me perdi naqueles olhos negros.
Não era inocente ao ponto de imaginar que estar com Joana seria um mar de rosas. Pelo contrário, sabia e percebia, pelo modo como seu olhar tornava-se opaco e sem vida em alguns momentos, que apesar dela me querer, ainda duvidava dos meus sentimentos. Mesmo tendo certeza deles, às vezes me pegava duvidando também.
Minha primeira atitude como sua namorada foi exigir que ela cancelasse o encontro com a loira azeda da Priscila e a proibi, terminantemente, de voltar a vê-la.
— Seu desejo é uma ordem! — disse ela rindo, enquanto pegava o celular sob o meu olhar atento e o de Edu que tinha um sorrisinho sarcástico nos lábios grossos.
Joana saiu da cozinha para ter mais privacidade ao celular e encontrei o olhar de Edu me analisando como se fosse um objeto raro.
— Que foi? — perguntei.
— Nada — deu de ombros. — Estava apenas refletindo sobre como a vida é engraçada e em como estamos em constante mudança, principalmente, em nossa forma de enxergar a vida, o mundo, as pessoas, o amor…
João Paulo, que bebericava um pouco de café, deixou um sorriso escapar, enquanto balançava a cabeça afirmativamente.
— Edu namorou metade dessa cidade antes de aceitar que estava apaixonado por mim — contou e Edu riu como se achasse o que fez engraçado.
— Tolo, não? — meu, agora cunhado de verdade, questionou.
— O quê? — perguntei sem entender ao que se referia.
— Tentar negar para si mesmo sua própria essência — ele explicou prendendo a mão do namorado entre as suas, então compreendi o que quis me dizer na noite anterior quando afirmou que os sentimentos, o desejo, já estavam em mim e que eu apenas havia me negado a enxerga-los.
— Pronto! — Joana regressou com um sorriso. — Compromisso cancelado.
Logo eu que nunca me imaginei ao lado de uma mulher, estava completamente apaixonada por uma e me sentia a pessoa mais feliz do planeta e aproveita cada segundo que podia ao seu lado. Assim, a semana passou voando. Durante o dia, trabalhávamos juntas e éramos apenas boas colegas de trabalho nada de mais. Respeitávamos ao máximo o Edu, por isso, fazíamos de tudo para aprisionar nossos impulsos de estarmos juntas.
Joana até passou a ignorar as brincadeirinhas de sedução da Paula. Tratava ela polidamente e mais nada. Admito que fiquei com ciúmes, mas me sentia feliz em ver que nem olhava para ela direito.
Quando a noite chegava, as coisas eram diferentes. Só queríamos saber de estarmos juntas, grudadas. Por isso, sempre sobravam beijos, abraços e carícias. E descobri o prazer de dormir com ela todas as noites.
O sábado chegou. Fui despertada pelos beijos de Joana em minha nuca. Oh, maldade! Me virei e tomei a sua boca na minha.
— Bom dia, linda — ela falou com os lábios ainda grudados aos meus.
— Bom dia — sorri e me afastei.
Foi então, que notei que já estava vestida.
— Que horas são?
— Quase onze.
— Tão tarde assim?
Ela confirmou com um sorriso e leve inclinar de cabeça.
— Por que não me acordou antes?
— Ah, você estava aí, dormindo tão serena que tive pena de te acordar — sorriu. — Levante-se e vamos tomar o café ou, se preferir, pode esperar o almoço.
— Estou com uma fome danada, mas vou esperar o almoço.
— Tá certo. Vá se vestir que daqui a pouco a Ana chega aí.
Aninha havia passado a semana enrolada com as aulas finais do colégio, aulões e provas no cursinho pré-vestibular que estava fazendo, então só havíamos nos falado por telefone rapidamente e todo o assunto se resumiu à como estava indo no trabalho, a convivência com Joana e o que ela andava fazendo. Não havíamos tocado no assunto do nosso namoro com ela, então a convidamos para almoçar a fim de formalizar nossa relação diante da pessoa que, mesmo não tendo a intenção, havia sido responsável por nossa união.
De uma coisa o Edu tinha razão, a Joana cozinhava que era uma beleza! Ana e eu estávamos tão cheias que mal podíamos falar e cheguei à conclusão de que teria de começar a correr com Edu e JP se ainda quisesse caber no manequim trinta e oito.
Nossa amiga estava muito séria àquele dia. Seu sorriso, que sempre era fácil, quase não apareceu durante o almoço e isso sempre foi sinal de que algo a incomodava.
Joana também havia percebido seu afastamento e atacou:
— O que foi, Ana? O que está te incomodando?
Ela se empertigou na cadeira.
— Nada, Jô. Não tem nada me incomodando, não — mentiu.
Me intrometi na conversa.
— Ana, assim como nós somos livros abertos para você, você também é para nós. Agora, deixa de besteira e fala logo!
Ela baixou os olhos, estava visivelmente incomodada pela nossa insistência. — Talvez mais tarde. O assunto é meio indigesto — informou.
— Se é para passar mal, que seja de uma vez — pontuei.
Aninha deixou um suspiro escapar e pousou o olhar esmeralda em Joana.
— Encontrei uma velha conhecida nossa hoje, Jô.
Uma sobrancelha arqueada, indicou a curiosidade de Joana.
— E quem seria?
Ana pigarreou, claramente tentando decidir se prosseguia ou não com a conversa.
— Natália.
Me perguntei quem seria Natália e o motivo de Joana ter ficado tão sombria de repente.
— E daí? — Joana perguntou e notei um leve tremor em sua voz.
Enquanto conversavam, tentei imaginar quem seria essa talzinha capaz de deixar a Aninha e a Joana com aquelas caras de enterro. Como num passe de mágica, a imagem de uma ruiva estonteante, de cabelos longos e encaracolados, sorriso um pouco abusado e olhos safira surgiu em minha mente. Não me lembrava o nome dela, mas só podia ser dela que falavam.
Claro que a Joana não era a única lésbica na cidade, mas, com certeza, na época em que se assumiu ela se tornou a mais famosa.
O caso todo aconteceu porque, pelo que me lembrava dos comentários, a Joana estava tendo um caso com a filha do gerente do banco. Até aí, nada a ver para essa algazarra toda, mas o problema é que a garota era noiva e faltavam apenas três dias para se casar quando essa bomba estourou. Algumas pessoas se indignaram porque um noivado tão lindo, afinal eles namoravam desde a adolescência, havia acabado. Taxaram a Joana de destruidora de casamentos, sedutora de mulheres casadas, sei lá.
O que aconteceu depois disso, não me recordava. O fato era que a garota sumiu. Se elas tiveram realmente um caso, nunca soube com certeza, até aquele momento. Só de ver a expressão magoada que ela fez ao ouvir o nome daquelazinha, pude perceber que ela gostou muito da Natália e o bichinho do ciúme voltou a me corroer por dentro.
— Ela disse que está arrependida do que fez e que voltou para ficar. Quer te ver. Disse que precisam conversar seriamente — Ana informou.
O olhar de Joana era sombrio como nunca tinha visto antes e me perguntei se ela ainda amaria Natália.
— Natália e eu não temos mais nada para conversar. Se você voltar a vê-la, lhe dê este recado.
E foi só. A conversa parou por aí.
Ainda levou um tempo para Joana voltar a ter uma expressão serena na face. Mas, nada mais foi dito em relação a Natália e seu regresso. No entanto, seu nome permaneceu em meus pensamentos, junto com a certeza de que perguntaria a Ana mais tarde o que realmente havia acontecido entre Joana e ela.
Depois do almoço, limpamos a cozinha para Joana descansar e fomos assistir um filme juntas. Aninha fingia prestar atenção ao filme, mas sabíamos que ela estava nos observando. Nos olhava de rabo de olho e, mesmo tentando disfarçar, fazia aquela carinha de cachorro pidão. Ainda não tínhamos contado a ela sobre nós.
Ela estava sentada em outro sofá, portanto, Joana e eu ocupávamos o outro. Sentamos lado a lado, eretas. Mas, depois relaxamos e eu me deitei em seu colo, enquanto ela acariciava meus cabelos, distraída.
— Peraí! O que está acontecendo aqui?
— Desculpe, Ana, ao que se refere? — perguntei.
Aquele olhar de quem diz “Não se façam de desentendidas” surgiu em seu rosto.
— Ana, que cara é essa? Você está com dor de barriga? — Joana conteve o riso.
— Podem parar! Sei o que estão tentando fazer!
— É mesmo? E o que é?
— Estão tentando me confundir. Aff! Não sei como aguento ser amiga de vocês, são tão parecidas que chega a doer. Falem logo o que está havendo.
Ela tinha razão, Joana e eu éramos mesmo muito parecidas em algumas coisas. Talvez por isso, tivesse me negado tanto a me aproximar dela. Joana curvou-se e sapecou um selinho em meus lábios.
— O que foi isso?
Joana deixou um sorrisinho debochado vir aos lábios, dizendo:
— Acho que ela ainda não entendeu.
— Então, precisamos ser mais claras, não acha? — sorri.
— Concordo! — um sorriso safado espalhou-se por seus lábios antes deles tocarem os meus. Nossa, como era bom beijar aquela mulher. Podia morrer assim que morreria feliz.
Ana nos olhava boquiaberta quando nos separamos. Sorrimos em cumplicidade para ela, seu olhar endureceu e sua postura tornou-se fria, então nos deus as costas e caminhou lentamente para a varanda.
— Acha que deveríamos ter ido com mais calma? — questionei e
Joana me sorriu. Nossa, que sorriso lindo!
— Que nada! Ela só ficou surpresa. Já, já ela se recupera. Ela sabia que eu gostava de você, mas nunca imaginou que você pudesse me corresponder — deu de ombros.
Suas palavras me acalmaram, mas percebi a dúvida em seu olhar. Sabia que ela ainda não acreditava completamente em meus sentimentos e não podia culpa-la por isso.
Ana estava recostada à parede observando a rua. Me juntei a ela e aguardei, em silêncio, que me falasse o que estava pensando.
— O que pensa que está fazendo, Marcela? — perguntou após alguns minutos, sua voz era quase um sussurro.
Engoli em seco sob o peso do seu olhar.
— Amando, acho que estou amando — respondi com sinceridade.
Ela deixou um risinho cínico escapar.
— Sério?! Me desculpe, mas não consigo acreditar.
— Mas é verdade.
— É muito pouco tempo — observou. — Há exatamente uma semana, você fazia carinha de nojo só de pensar em estar diante da Joana e agora isso… Desculpe, acredito no amor e em todas as formas em que ele possa se manifestar, mas, em se tratando de você e do que cresci te ouvindo falar e vendo fazer, é realmente muito difícil acreditar que tenha esquecido, de uma hora para outra, todo o teu preconceito. E, se isso realmente aconteceu, não entendo como não pirou com toda a confusão mental que isso traria.
Desde que nos conhecíamos, Ana jamais me falou daquela forma ou duvidou de minhas palavras. Ouvi-la e ver que não acreditava em mim, era duro, mas era algo que eu mesma havia provocado com minhas atitudes.
— Ela também não acredita — revelei.
E notei como a cor dos seus olhos escureceu. Seu rosto era uma máscara indecifrável, em nada se parecia com a menina de riso fácil a quem sempre gostei de chamar de irmã e que, até alguns dias antes, pensei conhecer todos os segredos como a palma da minha mão.
— Joana também não acredita — repeti com voz fraca. — Sei que ela gosta de mim e, agora entendo a razão de você não querer que viesse para cá. Não queria que ela se magoasse, não é mesmo?
— Não. Joana já tem problemas demais para ter seu coração despedaçado mais uma vez — respondeu seca.
E suas palavras me deram ainda mais certeza de que Joana havia amado muito a tal Natália. Baixei os olhos para os meus pés descalços em contato com o chão frio como as palavras da minha melhor amiga.
— Vejo nos olhos dela que duvida de mim, mesmo querendo estar comigo. Concordo que é muito pouco tempo para se apaixonar por alguém do jeito que estou por ela. Não pirei, como você disse, porque desde que me conheço por gente, jamais fugi do que senti por nada ou ninguém, fosse ódio, raiva, afeto ou amor. Você sabe muito bem disso.
Ela concordou com um inclinar de cabeça, não olhava para mim e sim para a rua abaixo de nós. Como era um sábado à tarde, todo o comércio já havia fechado e não havia ninguém à vista que estivesse disposto a enfrentar o sol forte daquela tarde qualquer que fosse o motivo.
— Já fiz muita besteira, Aninha. Em algumas, você foi minha cumplice, lembra? Me meti em muita confusão com muita gente por aí, principalmente, com meus pais. Como você disse alguns dias atrás, não calculei bem as consequências do que estava fazendo. Acima de tudo, não calculei que poderia me perder de amores por alguém que sempre desprezei e que usei para uma vingança.
Ela voltou a direcionar as esmeraldas em seus olhos para mim.
— Eu tenho medo do que sinto por ela, — confessei — e esse medo é arrasador. Tenho medo de ser mais uma na extensa lista de ficantes dela. Aliás, o celular dela não parou de tocar a semana inteira e sempre que percebo que está falando com alguma garota, o ciúme me consome. É quase monstruoso! Só volto a me sentir bem quando percebo que ela dispensou a garota da vez — fiz uma careta, enciumada e sua expressão séria se suavizou.
— Isso é sério? Está mesmo apaixonada por ela?
— Até o último fio de cabelo. Não sei explicar o como, mas o que sinto é fato. Nunca me senti assim por ninguém, nem sei bem como agir.
Ela deixou uma sonora gargalhada escapar e Joana enfiou sua cabeça morena na porta, os fios longos e pesados balançando ao vento que soprava forte naquele momento.
— E aí, que foi que eu perdi? — perguntou com um sorrisinho maroto.
Ana a puxou para um abraço e fez o mesmo comigo, me deixando entre feliz e desconcertada. Seu riso, era gostoso e ela me sapecou um selinho e outro em Joana.
— Isso quer dizer que está tudo bem? — perguntei.
— É, vocês têm a minha benção — falou sério e depois deixou uma fileira de dentes a mostra com uma risada alta e cristalina. — Gente, isso é hilário! Nunca imaginei que isso pudesse acontecer entre vocês. A Marcela nunca foi, digamos, uma pessoa que me parecesse curtir uma bela mulher — gargalhou mais uma vez, sem nos libertar de seu abraço.
— Eu não te disse? Foi só o susto — Joana riu e piscou para mim exatamente como o Edu fazia para ela.
Ana se afastou.
— Está certo! Vocês estão namorando e eu estou muito feliz porque, finalmente, as minhas melhores amigas estão se entendendo. Bem, não era bem assim que eu esperava que vocês se entendessem, mas está valendo.
Colocou as mãos na cintura e ergueu o indicador em um gesto teatral.
— Ah, vou logo avisando: Vocês estão namorando, que maravilha! Mas, quando brigarem, não venham chorar no meu ombro! Não vou aguentar bancar a babá e conselheira amorosa de duas mulheres feitas. Poupem-me!
***
Joana estava deitada na rede. Os olhos fechados. Um sorrisinho no canto da boca. O sol tocando sua pele e me encantando com o brilho que refletia. Era fim de tarde e eu a admirava de longe, deitada na cama com Aninha.
— Nunca imaginei que veria você olhar para alguém assim — Ana falou surpreendendo-me.
— Assim como?
— Com essa cara de boba apaixonada. Seus olhos brilham de um jeito diferente quando olha para ela.
— Sério?
— Sim, muito. Ainda não estou conseguindo acreditar que vocês estão juntas e nem que você esqueceu todo aquele seu preconceito de uma hora para outra.
— Às vezes, nem eu acredito. O que você disse é verdade. Estou apaixonada por ela. Não vou dizer que foi fácil acordar para essa nova realidade e esquecer meus conceitos, mas você sabe que, se há algo em que acredito, é que cada sentimento e momento devem ser vividos ao extremo. Joana é o meu momento agora, se isso vai durar eu não sei. Só sei que quero estar ao lado dela até quando este sentimento fizer meu coração bater forte.
Ela me abraçou.
— Quando me opus a você ficar aqui, temia que Joana se apaixonasse ainda mais por você e, no fim, acabasse sofrendo novamente. Ela não merece sofrer mais, Marcela. Não suportaria ver minha amiga se desmanchando em lágrimas no meu ombro por isso de novo. Te conheço e sei que está sendo sincera ao dizer que está apaixonada por ela e, embora, ainda tenha minhas dúvidas quanto a essa relação, torço muito para que sejam felizes. Não a magoe, se vir que estar com ela não é o que deseja para si, termine antes que seja tarde demais para voltar atrás.
— Aninha, se depender de mim, Joana vai ser muito feliz. Sei que ainda é cedo, mas sinto que meus sentimentos por ela crescem mais a cada dia. Você tem razão, nunca olhei assim para ninguém, mas também, nunca senti com alguém o que sinto quando estou nos braços dela.
Ela sorriu e deitou-se na cama olhando para o teto.
— Aninha.
— Hum.
Deitei ao seu lado.
— Me fala sobre a Joana e essa tal de Natália.
— Por que você quer saber disso?
Ela virou-se para me olhar.
— Por favor, me conta o que aconteceu entre elas.
Ela suspirou.
— A história não é minha para contar.
— Por favor. Preciso saber.
— Por quê?
Voltei a pousar o olhar em Joana que balançava a rede com o pé na parede.
— Preciso saber se há alguma chance de perde-la para essa Natália.
Ela sentou na cama com olhar sério e também passou a observar Joana.
— Não posso dizer o que passa no coração da Jô, Marcela. Mas, acho que Natália não voltará a ter lugar nele outra vez — afirmou.
— O que aconteceu?
— O que você quer saber? — voltou a me fitar.
— Tudo.
— Tudo é muita coisa, mas posso te fazer um resumo da história.
Assenti com um meio sorriso.
— Nessa época, Joana e eu não éramos tão amigas. Na verdade, éramos apenas boas colegas, pois jogávamos juntas no time de vôlei do colégio. Nos tratávamos com cordialidade e era só.
Fez uma pausa para coçar o nariz com uma pequena careta.
— Só fiquei sabendo da história toda um tempo depois quando nossa amizade se solidificou. A Joana e a Natália se conheceram por acaso, ficaram amigas e daí surgiu uma paixão entre elas, então começaram a namorar. O problema era que a Natália era noiva. Por acaso, após uma partida de vôlei pelo campeonato interescolar, as flagrei juntas. A partir daí me tornei amiga delas e, muitas vezes, fui a garota de recados das duas. Elas eram loucas uma pela outra.
— E o que aconteceu para isso mudar? — perguntei, engolindo o meu ciúme.
— Joana se cansou de se esconder da família e contou sobre sua condição.
Voltou a deitar ao meu lado.
— Como você deve saber, foi um escândalo entre a família dela. Ricardo, seu irmão, a agrediu e Edu acabou tomando partido nessa briga. Até hoje, os dois não se falam direito. Enfim, Joana e Natália andavam sempre juntas e, assim que a notícia se espalhou, um boato começou a surgir de que eram amantes. Você sabe que nesta cidade, as más línguas trabalham mais rápido e melhor que as boas.
Concordei com um gemidinho.
— Foi um escândalo quando esse boato chegou aos ouvidos da família de Natália. O noivo terminou o noivado apenas três dias antes do casamento. Ela dizia que amava a Joana, mas não assumiu esse amor e tinha a pretensão de se casar mesmo. Negou de todas as formas esse relacionamento, chegando ao ponto de ignorar a Joana em todos os locais públicos e até quando estavam às sós. Simplesmente, foi embora. Não ligou, não escreveu, não mandou recado.
— Como ela pôde fazer isso? — perguntei indignada.
— Não se pode prever o que as pessoas farão diante de certas situações, Marcela. Você é a maior prova disso.
— Nem tanto — neguei.
— Certo, deixe-me colocar isso de outra forma. Você é como uma tempestade em um copo d’água, desesperada por um pouquinho mais de vento para poder se tornar um furacão.
Joguei o travesseiro nela.
— Depois eu que sou exagerada — me queixei.
— Amiga, você é exagerada e o que eu disse é apenas uma fração da realidade.
— Nossa, se é assim que a minha melhor amiga me vê, não quero nem imaginar como os desafetos me enxergam.
— Provavelmente, como uma louca desvairada que gosta de atacar lésbicas inocentes em locais públicos — sorriu cínica.
Atirei outro travesseiro nela que deixou seu riso preencher o quarto e me prendeu na cama fazendo cócegas em minhas costelas. Na rede, Joana levantou a cabeça a fim de ver o que estávamos fazendo, mas logo perdeu o interesse e voltou a repousar de olhos fechados.
— O que Joana fez quando Natália foi embora? — perguntei tentando recuperar o fôlego que as cócegas de Ana haviam me roubado.
— A resposta é muito simples e previsível. Ela chorou, chorou e chorou. Amava ela e seu coração se partiu quando a abandonou. Por isso, se tornou essa pegadora. Joana tem uma lista extensa de ex-ficantes. Vou logo te avisando que você vai ter problema com metade delas — riu maliciosa.
Não gostei desse comentário, mas o que realmente não gostei foi saber que ela havia gostado muito dessa tal Natália. Meu coração estava apertado, tinha medo que ela me largasse e voltasse para ela.
Caminhei até a rede e deitei-me ao seu lado. Grudei meus lábios em seu pescoço, enquanto minhas mãos acariciavam seus cabelos. Ela abriu os olhos e sorriu.
— Poderia ficar aqui para sempre, contigo.
Me abraçou forte, repousei minha cabeça em seu peito e adormeci ouvindo as batidas ritmadas do seu coração.
***
— Cunhadinha linda, convence essa chata da tua namorada a sair com a gente, vai! — Edu pediu fazendo bico.
Era noite de sexta-feira, outra semana de trabalho intenso e muito amor ao lado de Joana havia se passado. Estávamos tão bem que até estranhamos um pouco aquela calmaria.
Meus pais haviam tomado chá de sumiço e me sentia muito satisfeita com isso. Claro que sentia falta deles, afinal, eram minha família, mas depois de tantos absurdos da minha parte e deles também, não sentia mais a força do laço de sangue e isso era estranho e, também, libertador.
Joana estava espalhada no sofá com uma Coca-Cola na mão e olhar entediado.
— Estou cansada, Chatolino — queixou-se ela para o irmão. — Quero dormir até domingo.
— Nem por cima do meu cadáver! Vai se arrumar, vai!
— Não tem nada para se fazer por aqui em noite de sexta-feira — ela pontuou.
Claro que eu concordava, mas queria sair um pouco e ver outras pessoas.
— Vamos, Jô! — sentei em seu colo e ela sorriu.
— Anjo, acredite em mim quando digo que você não vai querer estar perto desses dois quando se embebedarem — falou com um sorriso cínico.
Edu arqueou uma sobrancelha de modo muito indignado.
— O que está querendo insinuar com isso? — ele perguntou.
— Não estou insinuando, estou afirmando. Parecem dois gatos no cio.
JP se empertigou na cadeira em que estava.
— Sempre fomos muito discretos — informou.
Gostava dele, era o oposto de Edu. Sempre sério, mas disposto a ofertar um sorriso sincero a qualquer instante. Quando Edu estava ao seu lado, era outro homem e sempre tinha um sorriso sereno nos lábios e um gesto de carinho.
— Na rua, sim, mas estas paredes não são grossas o suficiente — Joana atacou novamente e vi JP ficar vermelho, enquanto Edu deixava uma gargalhada alta escapar para disfarçar sua vergonha.
— Bandidinha! — disse. — Com quem será que está aprendendo essas gracinhas?
— Com o mestre — ela piscou.
— Está aprendendo direitirinho — ele admitiu. — Agora, deixa de frescura e vai se trocar. Vamos beber e conversar um pouco de besteira…
— Não acha que conversa besteira suficiente sóbrio? — Joana retrucou me afastando de seu colo. Estava provocando o irmão mais que o normal e notei um sorriso se formando em seus lábios.
— Eita, está naqueles dias, é?
Passaram a meia hora seguinte se provocando e me perguntei de onde conseguiam tirar tanto assunto para mexerem um com o outro. Mas, acabamos saindo juntos. Marcamos de encontrar a Aninha no local e ela já nos aguardava quando chegamos.
Fomos para o quiosque na praça.
A bebida era boa, a companhia era maravilhosa e eu nem me importava com os olhares das pessoas para nós. Tudo que me importava era a presença de Joana ao meu lado e o calor da sua mão entrelaçada na minha o tempo todo.
Ana avistou um amigo e me arrastou com ela para uma conversa rápida que já estava durando vinte minutos. Estava me sentindo como uma vela, pois os dois se paqueravam descaradamente e fiz menção de me afastar de fininho, mas ela me incluiu na conversa e continuei com eles.
De onde estávamos podíamos ver Edu, Joana e JP. Eu fiquei lá, balançando a cabeça em afirmação quando me perguntavam algo, mas, na verdade, meus olhos e atenção estavam fixos em Joana. Estava admirando-a. Ela estava particularmente linda àquela noite. Praticamente, todos os homens que estavam ali a devoravam com os olhos. De início, quando observei isso, fiquei furiosa, mas logo notei que besteira estava fazendo. Não precisava me preocupar com eles, afinal, Joana não gostava da fruta. Foi então, que eu a vi. Linda, deslumbrante em toda sua beleza, com a cabeleira ruiva balançando ao vento, enquanto cruzava a rua.
Natália mantinha os olhos fixos em Joana, enquanto se aproximava. Comecei a andar em direção à mesa, mas parei. Apesar do medo que sentia, resolvi esperar para ver qual seria a reação dela ao ver a ruiva.
Natália se aproximou. Joana ainda não a tinha notado, pois estava distraída em uma conversa animada com Edu e JP. Natália tocou em seu ombro e quando Joana virou-se, conversaram por alguns instantes. Então, a ruiva sentou-se em seu colo, passou os braços em seu pescoço e a beijou.
JOANA
Quando Ana falou que Natália havia regressado, pensei que meu coração ia acelerar a mil, minhas mãos iriam suar e uma vontade descontrolada de chorar iria se apossar de mim como sempre acontecia quando ouvia o nome dela. Mas, nada aconteceu. Não senti nada. Não senti tristeza, nem rancor, nada!
Como era possível?
Marcela.
Essa era a explicação. Marcela havia preenchido todo o vazio que ela havia deixado em meu peito. Marcela havia removido toda a tristeza e dor que ela tinha me causado.
Ainda me ressentia pelo modo como ela foi embora, mas não a amava mais. Em meu coração só havia espaço para Marcela. Meu olhar, minha respiração, as batidas de meu coração, tudo era dela. Estava vivendo um sonho lindo ao lado dela e sabia que um dia chegaria ao fim, mas iria aproveitar cada segundo de carinho que ela estivesse disposta a me dar.
Estava completamente louca por ela e acordava no meio da noite, apenas para vê-la dormir entre meus braços. Sempre acabava me perguntando quanto tempo levaria até que ela percebesse que tudo não passava de uma ilusão para si e me deixaria. Meus olhos sempre estavam inchados pela manhã, mas a razão não era o sono e, sim, as lágrimas que derramava durante a noite ao pensar em perde-la.
— Ei, maninha! Você quer um babador?
— Deixa de ser palhaço, Edu!
— Mas não estou fazendo palhaçada alguma. Estou apenas perguntando se você não quer um babadorzinho. Do jeito que você está aí babando pela Marcela, daqui a pouco, estaremos nos afogando em baba.
— Argh, que nojento! Para de me encher o saco! Não me canso de olhar para ela um só instante.
— Está vendo, não te disse JP? O cupido acertou a flecha da idiotice na minha irmãzinha — riu.
— Deixa sua irmã em paz, seu chato! Não está vendo que ela está feliz como há muito não víamos?
Eles começaram uma discussão sobre o meu estado avançado de paixão. Então, senti um toque suave em meu ombro e me voltei para ver quem me tocava. Levei um susto. Natália estava bem a minha frente toda sorridente.
— Oi, amor — disse ela com voz suave e meu estômago se revirou.
Não vou negar, fiquei abalada com seu toque e sua presença. Não um abalo da antiga paixão que nos uniu, mas o abalo por estar diante de que alguém com quem dividi momentos de carinhos sublimes e que, no fim, me fez sofrer como jamais imaginei ser possível.
— Oi — respondi seca.
— Podemos conversar?
— Já estamos.
Ela me dirigiu um olhar vacilante.
— Em particular — insistiu.
Endureci minha postura.
— O que tiver para falar, pode dizer aqui mesmo.
Com o canto do olho, percebi que Eduardo havia perdido o sorriso de instantes antes e ameaçava sair da mesa. Seu olhar para Natália, era puro ódio. Com um inclinar de cabeça, informei a ele que estava tudo bem.
— Não precisa ser tão rude… — Natália voltou a se manifestar, ignorando o olhar assassino que meu irmão mais velho lhe enviava.
— Esperava que me jogasse aos seus pés me derretendo como sorvete ao sol? — perguntei cínica e vi surpresa em seu olhar.
Era compreensível, já que mesmo quando me abandonou, jamais fui rude e grosseira com ela. Mas, eu havia crescido muito no último ano e não estava disposta a permitir que voltasse a bagunçar minha vida.
— Não esperava que se jogasse aos meus pés, nunca quis isso. Só queria ter uma conversa séria contigo e, quem sabe, te reconquistar.
Deixei um suspiro irritado escapar, enquanto informava:
— Sem chance! Você teve a sua oportunidade, agora a fila andou.
Ela sorriu incrédula com minhas palavras e sentou em meu colo.
— Não acredito nisso. Você me amava e amor não se esquece de uma hora para outra! — passou os braços em meu pescoço e trouxe seus lábios até os meus.
O que senti? Nada! Nadinha!
Foi como se estivesse beijando uma parede. Ela tentava forçar meus lábios a se abrirem para intensificar o beijo, enquanto eu tentava empurra-la, mas ela não se deixava afastar, então fiz a única coisa que poderia fazer. Levantei e ela foi atirada ao chão pelo meu movimento brusco.
— O que você pensa que está fazendo, garota? — perguntei.
Ela, ainda tentando se recuperar do susto e da queda, permanecia no chão me olhando com um sorriso safado nos lábios. Um ano antes, eu teria matado por aquele sorriso, no entanto, naquele momento, ele nada significava para mim.
— Amor, eu voltei para você. Não precisava me tratar assim — estendeu a mão para que a ajudasse a levantar.
Não me movi sequer um centímetro e outra mão, já tão conhecida minha, a pegou. Com um movimento brusco, Marcela ajudou Natália a se erguer deixando-a de pé à nossa frente. Ainda tentando se equilibrar no alto de seu salto, Natália ensaiou um “obrigado”, mas antes que terminasse de pronunciá-lo, recebeu uma bofetada no rosto que a atirou ao chão novamente.
É, eu disse bofetada mesmo!
Fiquei de queixo caído. Marcela a acertou em cheio na boca. Era a segunda vez em menos de quinze dias que a via bater em alguém. Ela passou a mão em minha cintura de maneira possessiva e disse para Natália, que ainda estava meio grogue no chão:
— Isso é para você aprender a nunca mais beijar a namorada dos outros.
Não pude deixar de sorrir. Eu mesma, enquanto sofria por Natália, desejei muitas vezes poder bater nela. Mas, o que mais me encantava naquele momento, era a cena de ciúmes que Marcela estava fazendo. Nunca a vi tão séria.
— Você não pode estar namorando essa louca! — berrou Natália.
— E por que não?
— Olha só o que ela me fez! E você vai ficar aí parada sem dizer nada, Joana?
— E o que você quer que eu diga? Você mereceu. Não tinha nenhuma razão para me beijar daquele jeito.
— Não tinha razão?! Ora essa, sou sua namorada!
— Correção: Você era, “ERA” minha namorada há muito tempo atrás. Aliás, é melhor corrigir isso, né? Segundo você falava para as pessoas “Nós nunca fomos namoradas, nunca tivemos nada além de amizade!”. Se toca!
Sem qualquer aviso, Marcela pegou em minha mão e saiu me arrastando dali. Andava com uma determinação incrível. Não olhava para mim e não falava nada. Apenas apertava firme minha mão, enquanto andávamos. Apertava meus dedos com tanta força que senti alguns ossos estalarem.
Então, cansei-me de ser arrastada por ela.
— Marcela… — tentei faze-la parar, mas ela sequer me olhou. — Marcela, para! — gritei.
Ela voltou-se, os olhos em fúria.
— Que é?
— O que aconteceu não foi culpa minha…
— Para, Joana! — soltou minha mão. — Não precisa se explicar. Eu vi tudo. Não estou com raiva de você ou qualquer coisa do tipo. Vi quando aquela assanhada se aproximou e te beijou, também vi você atira-la ao chão.
Seu olhar, antes sério e determinado, se suavizou.
— Jô, eu não poderia deixar barato, né? Afinal, foi a minha namorada que ela beijou! E que fique claro para você e todas as suas ex-namoradas, que sei que não são poucas, que farei o mesmo com todas as que tentarem roubar você de mim!
Gente! Que fofo, né?
Achei que não poderia me apaixonar ainda mais por aquela mulher, mas estava enganada. A cada novo dia, Marcela me surpreendia mais. Já estava começando a acreditar que contos de fadas existiam.
Enlacei sua cintura e a trouxe para mais perto de mim e me perdi em seus lábios. Afastei-me lentamente, meu olhar preso ao dela. Naquele momento, palavras não eram necessárias. Via em seu olhar o que estava em seu coração e tive certeza de que, se ela ainda não me amava, amaria. Pois, eu faria de um tudo para conquistar o seu amor.
Passos e risos nos arrancaram daquele momento mágico. Ana e os rapazes vinham em nossa direção aos trancos e barrancos, gargalhando. Edu, que já estava para lá de bêbado, pendurou-se no pescoço de Marcela dando-lhe um beijo no rosto.
— Cunhadinha, eu te amo! Você é demais! Finalmente, alguém deu uma lição naquela cretina da Natália! — ela riu e ele voltou a encher sua bochecha de beijos.
— Ei! Vamos parar por aí! Chega dessa beijação toda na minha namorada, Edu! — aproximei-me deles, separando-os. — Tira a mão, vai! Chega pra lá!
Todos começaram a rir da minha cara emburrada e Marcela me abraçou e beijou com carinho. Caminhávamos de braços dados. Edu ia, praticamente, carregado pelo namorado e Ana ia ao nosso lado ainda rindo e comentando:
— Celinha, nunca imaginei que você fosse tão ciumenta!
— Ciumenta, não, apenas cuidadosa!
Ri desse “Cuidadosa” e Ana continuou:
— Nossa, Jô, o que você fez com a minha amiga? Quem é essa mulher aí do seu lado? — riu.
— Ana, amor, não fiz nada com a sua amiga, foi ela que fez comigo. Mas, às vezes, também me pergunto onde ela foi parar! — recebi um beliscão da minha amada e sorri.
Antes de deixarmos Aninha no portão de sua casa, sua face adquiriu uma seriedade que não lhe era comum.
— Amigas, devo avisar vocês que depois que saíram do quiosque, entre um insulto e outro que proferia, Natália disse que não importava com quem Joana estivesse, pois iria roubá-la de volta. E, pelo modo como disse isso, não vai deixar barato a bofetada que levou, nem a vergonha que passou. Então, preparem-se porque aí vem chumbo grosso!
— Obrigada, Aninha. Mas, acho que depois disso ela não fará mais nada, não.
— Está enganada, Marcela. Natália pode ter sido fraca ao não assumir a sua relação com a Joana, mas ela nunca foi de desistir de nada. Ela é vingativa e persistente. Se disse que vai fazer isso, com certeza irá tentar.
Mais tarde, quando já estávamos deitadas em nossa cama, repousava minha cabeça sobre a barriga de Marcela, enquanto ela me fazia cafuné. Era maravilhoso poder dormir ao lado dela! Não saberia mais viver sem isso. Não suportaria mais acordar todas as manhãs e não encontrar o seu sorriso me desejando bom dia.
— Jô?!
— Hum.
— Me responde com sinceridade. O que você sentiu quando Natália te beijou?
Não estava nenhum pouco surpresa com aquela pergunta. De fato, já a esperava e fui sincera ao responder:
— Nada.
— Como assim nada?
— Nada, oras. Nada é nada.
— Mas, vocês foram namoradas e, pelo que entendi, você a amava muito. Como é possível que você não tenha sentido nada?
Ergui minha cabeça para encará-la. Queria que ela visse a verdade em meu olhar, enquanto lhe respondia:
— Houve uma época em minha vida em que pensei que jamais conseguiria ouvir o nome dela sem sentir um nó na garganta, um aperto no peito e uma vontade imensa de chorar. No entanto, isso não aconteceu quando Ana falou que a tinha encontrado, nem quando ela surgiu a minha frente e me beijou. Eu teria sentido mais coisas se tivesse beijado um bloco de gelo. Marcela, um dia pensei que a amava, mas hoje, vejo que os sentimentos que tinha por ela em nada se comparam com o que sinto por você.
Não aguentava mais tentar ocultar o que sentia por ela. Então, que soubesse a verdade, a amava e estava disposta a lutar para conquistar o seu amor.
— Sei que gosta de mim, o que aconteceu hoje é prova mais que suficiente disso, mas estou falando de amor. Amor de verdade. Daqueles que é capaz de consumir sua alma de desejo, de carinho, alegria por estar ao lado de quem se ama. Quero que saiba que te amo e que pretendo lutar por seu amor. Quero te conquistar, nem que seja um pouquinho.
Seus lábios tornaram-se uma fina linha horizontal, os olhos perderam um o brilho por um instante e temi ter ido longe demais ao confessar o que sentia. Então, sua fisionomia mudou outra vez e ela tocou minha face carinhosamente e me roubou o ar com um beijo longo e apaixonado. Me abraçou forte e sussurrou em meu ouvido:
— Faça amor comigo — pediu e meu coração apostou uma corrida insana com ele mesmo dentro do meu peito.