Ponto de Vista

Ponto de Vista – Parte 1

PONTO DE VISTA

Parte 1

   O espaço profundo, infindável e infinito.

        Ultimamente dei para divagar quando só, uma certa ansiedade; não sei do que ou por que. Parece que algo está para acontecer, e meu íntimo está em alerta ou algo assim. E o interessante é que não parece que tenha algo a ver com a missão que, por si, é inusitada.

        O ser humano não mudou em sua essência. O ano é de 3057 d.c; sou a historiadora desta nave, tenente da frota, e embora não seja apreciadora da violência, ao longo dos fatos acontecidos com a Terra, é minha especialidade, vi muita. Admiro a coragem dos pioneiros velejadores e mesmo dos conquistadores antigos que desafiavam as forças da natureza em locais desconhecidos e lutavam frente a frente, sem muitos subterfúgios.

        Com a civilização político-financeira avançada, no início devagar, mais tarde vertiginosamente com o apoio estratégico militar, graças à tecnologia, os mais fortes foram arraigando o hábito de se envolver com assuntos de outros povos e “orientá-los”, obviamente sob jugo. Nesta época, já encontramos diversos povos diferentes em aparência, crenças, tecnologia, linguagem. Os mais pacatos e tecnologicamente atrasados, foram “orientados” a fazerem parte da Federação Interplanetária, a fim de serem defendidos em casos de invasões por raças desconhecidas, em troca de matéria prima ou alguns minérios ricos em energia. Os mais fortes, obviamente, são os governantes de tal Federação.

        A nave da qual faço parte da tripulação (Saturno), tem pessoas dos mais variados países da Terra, embora as fronteiras não sejam mais como antigamente. Meu nome Cristina Petrus e estudo, com afinco e paixão, a história nossa e dos planetas aliados. Nossa missão atual é fazer parte (a militar-a-força) de uma delegação em um planeta um tanto quanto seco, chamado Esfig, que faz parte de um quadrilátero distante 8.659,5 mil anos-luz da Terra, mas com minerais energéticos em quantidade impressionantes, minerais estes, usados desde a iluminação das cidades, até os propulsores de velocidade das naves, em vários sistemas planetários. Portanto, esta área é vital à Federação. No entanto, nos últimos dois anos, vem sendo saqueado por naves desconhecidas, que já destruíram algumas naves aliadas e uma estação de fronteira espacial, onde havia cerca de 3.500 seres, sem deixar vestígios do que ali existiu. E devido a importância do quadrante e a supremacia combativa do inimigo, precisamos de ajuda.

        Na borda limítrofe do quadrante, há o Império Qualtz, cuja tecnologia é avançada demais para os nossos padrões. Seu povo, segundo as poucas informações obtidas, não é muito sociável a estranhos, são de fidelidade à Família Imperial. O poder do Imperador do Planeta Central que conquistou cerca de 36 planetas do sistema, se estende por todos eles. Parece que são treinados desde crianças nas artes da guerra, mas também desenvolvem as artes e o espírito, sendo que sua força física é 4 vezes maior que do um ser humano. Um único cientista humano, Dr. Samuel Ortega foi aceito dentro de sua área e passou 5 anos por lá, embora não tenha feito muitos amigos, conhece um pouco da realidade daquele povo, e fará parte da delegação como consultor e, com certeza, ele será meu primeiro contato quando da nossa chegada; embora não tenhamos certeza que a delegação deles venha, uma vez que foi enviado o convite em várias faixas das fronteiras do Império, pedindo ajuda e solicitando contato para daqui a três dias…

**

        Chegamos sem qualquer novidade. A delegação da frota já está completa e ainda falta um dia para a data do encontro. Cientistas, políticos, diplomatas, militares, todos à espera.

        Foram montados para a ocasião, uma espécie de prédio arredondado, como uma arena, com vários níveis e salas de segurança máxima para conversações.

        No bar do hotel, procuro Dr. Samuel, e encontro um homem miúdo, magro e aparentemente de extrema perspicácia, vivaz, com um cérebro que não condiz com o tamanho do corpo.

        Apresento-me, e esclareço que farei parte das conversações como historiadora e que vou estar, sempre que possível, próximo a ele que começa a falar sobre o Império Qualtz. Tornou-se um apaixonado pelo povo e dirigentes. Segundo ele, o Império foi formado há milênios passados pela força e capacidade bélica do Planeta Central, que dá o nome ao Império; os planetas são bem diferentes entre si. Enquanto o Central era belicoso, o 1º a ser conquistado por ele, desenvolvia a tecnologia em paz, para o bem estar comum, o 5º a ser anexado, era dedicado às artes, e daí em diante, cada um com sua característica, fez de tal Império, altamente único e auto suficiente, pois os povos acabaram-se por miscigenar quase que por decreto, já que o Imperador não queria desavenças entre seus dominados, pois acarretaria desgastes em seu governo. Então há 2.500 anos atrás, assumiu o trono, o rei Jonus, que se casou com Tet do planeta das artes, e resolveram dar direitos e deveres iguais a cada cidadão do Império, e graças a isto, agora é quase que um só povo, todos aprendem tudo, e trabalham nas funções que mais lhe agradem. O que ninguém quer fazer, a tecnologia faz. Os grupos que trabalham e adquirem experiências juntas, costumam se comunicar telepaticamente. Quanto ao emocional, disse apenas:

 -Espero que ninguém aqui se envolva com descendentes direto do planeta central… – E não quis dizer mais nada a este respeito.

        No dia e hora marcados, foi recebida no centro de comunicações, a mensagem de que ali estavam e se podiam descer no planeta. Pânico geral, porque cinco naves estavam em órbita e não haviam sido detectadas de nenhuma forma, até que se deixaram notar. Dr. Samuel acalmou-os, lembrando-os que eles o haviam chamado e que já fazia 2.500 anos que o Império perdera o interesse em crescer, fechando-se numa concha, concentrada apenas no bem estar de seu povo. Após entendimentos de praxe, fomos para a sala de espera, aonde chegariam as naves transportes, pois devido ao elevado número de pessoas, não usariam o teletransporte.

        Guarda de honra perfilada, oficiais dispostos de um lado, diplomatas à frente, aguardando o desembarque. Primeiro desceram o que parecia ser a segurança, homens e mulheres altos, com roupas iguais, aparentemente inteiriças, inclusive as cabeças, a diferença estava na cor dos capacetes, dos 20, quatro tinham cores diferentes. Em seguida, pessoas vestidas com túnicas coloridas, simples, sem que nenhumas delas sejam jovens, com características físicas parecidas com as nossas, pareciam sorrir.

       Ao lado do Dr. Samuel, este me esclareceu fazerem parte do Conselho dos Anciões, cuja vontade tinham grande ascendência junto ao Imperador e as pequenas diferenças entre eles, mostrava de que planetas descendiam. Eram responsáveis em representar a vontade do povo. Quanto aos primeiros, sim, eram da astronave de combate, que chegara junto com as outras quatro, mas seus oficiais (os de capacetes de cores diferentes) também tinham o poder de decisão e, embora há muito tempo não expandissem mais o Império, eram treinados desde os quatro anos de idade, e aos dez já começavam a ser aperfeiçoar naquilo em que se achavam melhores, fosse lá o que fosse, fosse lá em quantas coisas quisesse se aprimorar.

      Vários alienígenas já haviam tentado invadir seu território, inclusive o nosso atual inimigo, sendo de imediato rechaçados, mas não perseguidos fora das fronteiras, o que deixou bem claro que não era boa ideia tê-los como oponentes. Agora, quando tinham que passar, ou visitar qualquer local, solicitavam humildemente permissão, e seguiam as regras. O de capacete vermelho era o comandante, o de verde, o meu equivalente, o amarelo, o oficial de ciências; o de azul, a oficial das armas, isto é, a encarregada de táticas e combates, e como era a única oficial com espada fazendo parte de seu equipamento, com certeza era do planeta central, bem como os outros seis soldados que a portavam. Permaneceram estáticos enquanto se seguia o protocolo de quase quarenta minutos, até todos adentrarem a recepção, para distribuição dos alojamentos. Então se deslocaram em silêncio; e, de repente, a do capacete azul, olhou em minha direção; não; olhou para mim, por um segundo pareceu-me olhar direto nos olhos. Eu senti e me assustei não sei porque. Naquele instante, voltou-me àquela sensação de dias atrás…

        Na manhã seguinte, começou a conversação, para convencê-los a prestar auxílio técnico, aconselhamento, ou mesmo envolvimento direto no conflito. Estranho dizer-se conversação, pois a delegação da Federação falava e os Qualtzianos ouviam, ponderavam e raramente perguntavam algo. Usávamos tradutores universais para agilizar o entendimento, e embora quando falavam, utilizassem um idioma estranho à maioria de nós, não pareciam fazer uso de aparelhos para poder nos entender. Comentei isso com o Dr. Samuel, e este me disse que o tempo que passara junto com eles, não aprendera tanto sobre o Império, quanto o Império aprendera sobre nós. Todos ali entendiam e falavam o idioma da Federação, pelo menos os idiomas oficiais.

        À noite, estando de folga, resolvi tomar um drinque e jantar no restaurante para observar o movimento. Enquanto aguardava o prato escolhido, entraram, ao que me parece, com a mesma intenção, cinco Qualtzianos, incluindo a do capacete azul, que parou, fixou-me e daí todos os outros olharam para mim, aquiesceram e foram para uma mesa e ali continuou a me olhar e sem que fizesse qualquer movimento, seu capacete sumiu, como se evaporasse, não sei de que forma, e o cabelo negro caiu até a altura dos ombros, e duas estrelas verdes continuavam fixas em mim. Não conseguia me mover; parecia hipnotizada. De repente, virou-se e seguiu-se para sua mesa. Eu não sabia o que tinha acontecido, não sabia o que sentia, não sabia se ainda tinha fome. Parecia que meus órgãos internos tinham se embolados todos na boca do estômago. O garçom trouxe o jantar, esperei os órgãos voltarem a seus devidos lugares, terminei a bebida e comi sem vontade, com uma leve sensação de frio.

        Dormi muito mal, sem saber por que, e quando o Dr. Samuel veio tomar café, eu já estava à sua espera. Contei-lhe o ocorrido enquanto comíamos e pedi-lhe uma explicação. Pareceu-me desconfortável, e então disse que se viessem conversar direta e pessoalmente comigo, ele falaria e, até lá, eu não deveria me preocupar, pois tudo poderia ser nada.

        Não sei por que, mas fui almoçar no restaurante, sentei-me à mesma mesa e esperei. Esperei o quê?! Sei lá! Estava escolhendo o que comer, distraidamente, olhando sempre para a porta de entrada, quando senti às minhas costas, algo, uma força, uma energia não sei bem. Parecia ter me atingido à nuca, descido pela coluna, paralisando-me as pernas, parecia ter subido para a cabeça e deixado meu cérebro em suspensão. Eu sabia o que, ou melhor, quem causara isto. Senti aproximar-se e então ouvi sua voz suave, baixa, rouca. “Interrompo?”. Só consegui menear a cabeça para não. “Janta comigo?” Ouvi como se estivesse longe um “Ta!” e afastou-se…

        O Dr. Samuel olhava-me sério, os grandes olhos castanhos pareciam ausentes, então começou a falar, quase que para ele mesmo. “- Por todo o Império, há povos provenientes de culturas diversificadas. Todos foram respeitados na nova história. Há casas com um casal e filhos, há casas polígamas da mesma crença, de crenças diferentes, lares só com mulheres, ou só com homens, eles não se importam quanto às invenções morais, ou coisas assim, contanto que sejam felizes, não haja violência, não haja vícios e ninguém saia prejudicado. No entanto, o povo do planeta Central (achava que era por religião, mas depois tive a certeza que é biológico mesmo) acredita em pares perfeitos, almas gêmeas, ou como queiram chamar. Esperam para encontrar tal pessoa, a maioria deles. Alguns se casam por amizade, companheirismo, se não a encontram, mas, caso isto aconteça, irá se unir a esta pessoa com o apoio de todos, e até sua cumplicidade. Quando acontece, o organismo reage quase de imediato, e a química acontece segundo eles. Se você for destinada à ela, terá certeza quando beija-la, pois nessa troca de fluidos virá em resposta, não só física. E se o resto acontecer, não terá mais volta. Terá que se decidir antes disso, e não será jamais obrigada a aceitar até esse ponto. Não se deixe levar, pois, pelo que você sentiu, a lenda pode ser verdadeira”.

– Então, por lá, tudo é maravilhoso, é a utopia…

– Não! O Império foi primeiro forjado a sangue e destruição. Até hoje aparecem os que não estão contentes em serem governados por alguém de fora. Ainda aparecem algumas insurreições. Há os que pretendem ser aliados do planeta Central, mas não ser conduzidos por ele, e quando se rebelam com um pouco mais de agressividade, não repetem o ato. A segurança do Imperador é composta por Qualtzianos legítimos, ou descendentes diretos, treinados para defendê-lo assim que começam a andar. Não fazem prisioneiros e raramente alguém consegue fugir para voltar outro dia. A unidade do Império tornou-se quase sagrada.

– Mas o senhor disse que não perseguiam os invasores!

– Os invasores de que tenham a certeza de que não irão voltar, não perseguem, se houver alguma dúvida disso, serão completamente eliminados, mas, para os considerados “traidores”, os que fazem parte de seu território, nunca existe perdão.

Fiquei pasma. Como uma civilização tão avançada, tão consciente, pode ser tão bárbara, tão radical.

– Esses que aqui estão seguem a mesma linha? – Indaguei.

– Com certeza. Por exemplo. Se algum Qualtziano for ferido por um agressor qualquer, eles saberão quem foi, e eliminarão sumariamente, seja quem for esse agressor.

– Sem medir as consequências que podem advir de tal ato…?

– Para eles, o ato terá sido a agressão. A eliminação terá sido a consequência do ato, sem discussão.

– Meu Deus…!

– Em contrapartida, provavelmente, todos os que aqui estão, já devem saber sobre a probabilidade de você se tornar uma deles.

– Como?!

– Pelo mesmo meio que saberiam da agressão. Sentimentos fortes são “sentidos” pelos outros que estão próximos.

– Mas, e os Anciões? Não podem modificar tudo isto? Quer dizer, fora este lance emocional?

– Não, todos são subalternos do Imperador. Os únicos que poderiam tirar o poder deste e distribuí-lo, de volta, aos planetas satélites, é o povo central, principalmente os Guardiões de lá, mas não são preparados para tal. O bisneto de Jonus I, ao assumir o trono, mostrou-se devasso, preguiçoso, em suma, “um ditador incompetente”. Para sanar isto e não haver rebelião, os militares foram então, a partir daí, “programados”, a defender o Imperador sem envolver-se em questões que não a segurança. Tudo isto que estou te explicando, é porque parece que você pode vir a ser um deles, mas, para mais ninguém posso contar toda a verdade sem ser punido. Seu filho foi colocado no poder antes de sua morte e, a partir daí reassumiram o controle pleno.

– Ora, o senhor não mora mais lá, e eles não têm contato com outros povos, como saberiam…?

– Tenho um pequeno implante, desde que fui aceito no Império. Não se assuste, você não é considerada inimiga por eles, logo, não saberão que te contei. Tenente! Preste atenção. Se você for predestinada, a capitã Cibe pode tirá-la de lá. Isto é permitido, pois não podem forçar o rompimento, nem mesmo o Imperador. Isto é mais antigo e poderoso que ele. Agora o comandante, depois de terminadas as conversações, ouvirá os conselheiros presentes e, se decidir pelo combate aos Korzes, o Imperador acatará, pois, o coronel Flion é filho de um membro da corte e uma política importante do planeta Vindi, portanto descendente direto do planeta Central. A única pessoa que pode desafiar sua autoridade você conhece.

– Acha que, dependendo da minha atitude com ela, poderá influenciar…?

– Não sei. Eu não a conheço pessoalmente. Descubra. Ah!… Não tente conversar sobre política ou liberdade em todas as formas para seu povo, logo de cara.

A noite chegou, depois de uma eternidade. Vesti-me com simplicidade, mas tentando demonstrar elegância, segurança e certo “desinteresse” na expressão quando, ao sair do quarto, encontrei um soldado Qualtziano a minha espera, perfilado.

– Boa noite, senhora!

– Boa noite! Posso ajuda-lo?

– Não, obrigado, estou aqui para conduzi-la ao jantar com a capitã Cibe.

– Ah! Não será no restaurante?

– Não, senhora, a menos é claro, que a senhora exija.

– Tudo bem, tudo bem. Podemos ir então, e fique à vontade, soldado.

Conduziu-me até um carro estacionado na entrada do hotel e, em dez minutos, chegamos a um local calmo, parecido com… se não me engano, antigamente chamado de cantina na Terra. Havia música suave, plantas floridas, bem tratadas e, de imediato achei o lugar aconchegante. O soldado fez uma saudação e afastou-se em direção ao carro.

A minha convicção de simplicidade nos trajes caiu por terra ao vê-la. Estava ao lado de um aquário, admirando os peixes. Pela primeira vez, a via com roupa comum, como a dos Anciões, mas havia tanta graça, tanta harmonia nela. Virou-se quase de imediato, quando a olhei, sorriu, e chamou-me com um aceno de mão. Já havia uma mesa reservada junto a qual sentamos. Pela proximidade, senti seu cheiro. Não era perfume. Era cheiro mesmo. Marcante. Comecei a acreditar na lenda Qualtziana da alma gêmea, e de repente, queria que fosse eu a ela predestinada, embora nunca antes tivesse pensado em algum relacionamento com alguém do mesmo sexo.

– Suponho que já tenha conversado com o velho e bom doutor!

– Certamente!

– Ele disse algo a respeito do amor?

– Sim… Explicou-me algo sobre alma gêmea, química, coisas assim…

– É mais que isso, é uma integração total, é complementação total. Está pronta pra se enfrentar?

– Como faríamos?

Estendeu as mãos, palmas para cima, sobre a mesa enquanto sorria. Devagar, não sei se com medo, ou tentando controlar a ansiedade, coloquei as minhas mãos sobre as delas. Houve a sensação, ao mesmo tempo, de um leve choque elétrico e um calor diferente se espalhando pelo corpo.

Fechou as mãos sobre as minhas e cerrou os olhos. Olhava para ela e, de repente, estávamos num turbilhão. Coisas diversas numa velocidade impressionante. Nossa! Estava conhecendo, sabendo tudo dela, e tive a impressão que o inverso era verdadeiro. Estava sem medo, solta e confiante. Então, ela separou as mãos. Ficamos apenas nos olhando e esperando a respiração normalizar.

– O que foi isto? Você interrompeu? Por quê?

– Isto foi a confirmação de que nos pertencemos. Sim, interrompi porque temos tempo. Seria informação demais de uma só vez no corpo.

– No corpo, ou na cabeça?

– A informação é completa. Caso continuemos, se você não recuar, vai entender. Saberemos tudo uma da outra.

– Sem segredos?! Percebi que quase gritei. Agora estava um pouco assustada.

– Sem nenhum segredo.

O garçom, que observava de longe, havia esperado ao que parece, começarmos a falar, para então se aproximar. Fizemos os pedidos e só voltamos a conversar depois do jantar servido. Minha cabeça estava cheia de perguntas, dúvidas, de ansiedade…

– Toda vez que eu tocar você, isto vai acontecer?

– Só nas primeiras vezes, depois você terá a informação completa, daí só sentirá as emoções que eu estiver sentindo. Isto é, se você quiser saber ou sentir. Caso contrário, quanto antes pararmos melhor.

– Pra quem?

– Pra ambas.

– Se eu quiser parar?

– Deixo-a em paz.

– Vai procurar outra pessoa?

A capitã sorriu:

– Não há outra pessoa para mim além de você.

– Se eu quiser continuar?

– Haverá um ponto sem retorno.

– Saberei qual é? Ou, como disse o doutor, é a relação sexual?

– Não, não é o sexo, mas, você com certeza saberá.

– Antes desse ponto, posso desistir quando quiser?

– Você pode.

Olhando aqueles olhos mansos em mim, sentindo seu cheiro, vendo sua beleza, e “Meu Deus”, aquele sorriso, eu tinha a certeza, que queria sentir sua pele, queria beijar aquela boca, queria seu amor, queria mais, queria tudo.

– Não, pense bem, vá devagar. Quando realmente tiver certeza, eu estarei esperando.

– Até quando? E… pare de ler meus pensamentos!

– Até sempre… E não leio seus pensamentos, só sinto você.

– Se eu te beijasse agora?

– Você não está pronta.

– Só podemos nos olhar, ou posso ir embora?

– Não conheço visão melhor.

– E?

– A hora que quiser posso chamar a pessoa que te trouxe para leva-la, ou se deixar, levo você, caminhando pela noite…

– Escolho a última opção.

A noite estava linda, céu limpo, estrelas cintilando, duas luas brilhando, e ela ao meu lado. Meus pensamentos voavam. Meu coração batia acelerado. Meu corpo suava e… doía. Sentia que se a abraçasse, se a beijasse, a dor sumiria. Sabia que era recíproco, mas tinha que ouvir.

– O que você está pensando?

Parou. Depois se colocou à minha frente, olhando-me nos olhos e… juro, naquele momento queria qualquer coisa, menos ficar parada fitando-a, mas, foi o que eu fiz. Apenas ouvia seus olhos. Tive vontade de chorar e lágrimas rolaram quentes.

– Por favor! – Ouvi-me dizendo.

– Hoje, não. Faria-te mal. Posso te ver amanhã?

– Pode continuar me vendo. É só ficar comigo.

Olhou-me e sorriu. Nunca antes, tinha visto alguém conseguir demonstrar tanta ternura e carinho em gestos tão simples.

– Até amanhã. Procure dormir.

Não respondi, e ela se foi. Então notei que estava na frente do hotel, e diversas pessoas andavam por ali.

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