Os Estranhos Casos de Evernood & Blindwar

11 – Sexto Caso: Gavetas, olhos, puxadores e lábios – Parte 2

Os Estranhos Casos de Elizabeth Evernood e Margareth Blindwar

Sexto Caso: Gavetas, olhos, puxadores e lábios – Parte 2

Texto: Carolina Bivard

Revisão: Naty Souza e Nefer

Ilustração: Táttah Nacimento


Parte 2 –

Evernood, apesar de acompanhar a necrópsia de perto, limitou-se a observar. Aprendera com a antiga médica da universidade e amiga, a não interromper enquanto estivesse nos primeiros estágios da autópsia. A senhorita Lister agradecia a atitude, e após um tempo, voltou-se para a detetive particular.

— Vou mostrar algo a você. Espere-me aqui. 

A legista saiu e retornou com uma pasta na mão.

— Veja isto.

Mostrou uma autópsia feita para a crimes gerais há quinze dias.

— O que você consegue observar?

— Que a morte de Edward Sander talvez não seja um crime pessoal. Este assassino já matou antes.

— Exato. Este laudo que tenho nas mãos é de um verdureiro que comercializava seus produtos, há anos, no mercado central da cidade. Foi encontrado morto dentro da tenda. Parece que ele não voltou para casa no dia anterior e a esposa fez queixa na polícia. Os policiais visitaram a tenda dele no mercado para averiguar. O encontraram debaixo da bancada de verduras.

— O homem estava sem orelhas e nariz.

Elizabeth falou a esmo, lendo com atenção a autópsia.

— Quando vi o jovem Sander na estufa sem sobrancelhas e lábios, algo me despertou para esse caso. – Lister comentou. – É muita loucura, mas… Não sei. Talvez não tenha ligação nenhuma.

— Talvez, Violet. No entanto, não podemos descartar nada. Margareth está na mansão conversando com os empregados e familiares. Depois falaremos com os amigos que estavam presentes na tal festa, todavia, diante do que me mostrou, devemos investigar se esse verdureiro e o jovem Sander tinham alguma ligação.

— Acha que pode ser a atuação de alguma máfia ou crime organizado?

— Pode ser. Essas organizações criminosas sempre têm uma forma peculiar de eliminar seus desafetos.

— Quando você diz peculiar, quer dizer que eles têm um jeito específico de matar para deixarem uma marca, não é?

Elizabeth desviou o olhar, que estava fixo na pasta do outro assassinato, e encarou a médica com um sorriso de lado. Realmente, a senhorita Lister era bonita, inteligente e observadora. Características que, em outra época, fariam Evernood se interessar pela mulher. 

— Você é bem curiosa. Está pensando em integrar a força policial?

— Não posso negar minha curiosidade. Se o fizesse, seria uma péssima pesquisadora para a universidade, no entanto, estou longe de pensar em uma posição na polícia. São limitados… Oh! Desculpe-me, não você, a senhorita Blindwar e a Crimes Graves

Evernood gargalhou. Ela não havia se ofendido. Pelo contrário, tinha a mesma opinião, assim como a sua Meg.

— Não se envergonhe de expressar esse pensamento, Violet. Entendo o que quer dizer e concordo, assim como a detetive Blindwar. – Sorriu, encabulando a médica. – Respondendo a sua pergunta, sim. Organizações criminosas normalmente apelam para um “modus operandi”, para mostrar aos seus adversários de outras facções, ou mesmo à polícia, quem executou o crime. Também é uma forma de amedrontarem quem os trai. A questão toda é que jamais vi uma marca como essa.

— Você conhece muitas?

— A maioria que atua nesta cidade. Se quiser saber um pouco mais, veja os arquivos de sua ex-chefe, a doutora Catley Hollaway. Ela e eu fizemos um arquivo para este tipo de assassinato, quando percebíamos os padrões.

— Eu nunca vi um arquivo assim. Não está aqui. Li tudo que Catley deixou.

— Talvez esteja com o marido dela. Era um trabalho nosso, pois a polícia não se interessou por nossas… digamos investigações. Achavam bobagem. 

— Típico deles. – Lister balançou a cabeça em negativa. – Sou amiga do Tom, marido dela. Vou ver com ele.

— Faça. Se ele não souber a respeito desse arquivo, me fale, pois tenho uma cópia.

— Então acha ser possível um crime cometido por alguma organização dessas?

— Nada pode ser descartado inicialmente numa investigação. Talvez o jovem Sander tenha se metido com dívidas de jogo, ou de drogas. Como a Meg falou, ele era do tipo “bon vivant”! Esse talvez seja o elo com o verdureiro. O homem poderia não ser da alta roda, mas tinha uma boa vida. Pelo que vejo neste arquivo, ganhava bem na tenda do mercado e morava num bom bairro.

— Cedric, boa tarde!

— Boa tarde, senhorita Blindwar. Quer um chá?

— Não é necessário. Sabe por que estou aqui, não sabe?

— Sim. Porém, um chá sempre é bom para qualquer momento.

Margareth sorriu para o mordomo. Ele era filho do antigo mordomo da família Sander e herdou a posição do pai. Conhecia-o desde muito jovem.

— Está bem. Aceitarei, Cedric, porém, peça que sirvam para nós dois. Nossa conversa não será fácil e nem breve. 

— Sim, senhorita.

Desta vez, Cedric tocou a sineta para que alguém os atendesse. Ele permaneceu de pé, esperando que alguém da copa viesse. Demandou o chá para uma empregada, que saiu logo da sala.

— Sente-se, Cedric.

O mordomo não fez objeção. Estava acostumado com as excentricidades de seu jovem patrão falecido, que sempre pedia que ele se sentasse, para conversarem.

— Bem, Cedric, quero que me conte cada detalhe de ontem. Não importa fatos intrigantes ou situações comuns em um dia de festa. Quero que relate tudo que ocorreu desde cedo.

— Tudo como?

— Se meu primo ficou em casa…, se saiu…, quem fez as entregas para a festa…, se haviam empregados incomumente nervosos àquele dia…, se houveram visitas inesperadas… Enfim. Quero saber de tudo.

— Vejamos…

O mordomo fez uma expressão como se puxasse pela mente.

— … Ontem o dia se iniciou como o normal de um dia de festas. Logo de manhã, o verdureiro do mercado central que nos fornece, chegou. O que houve de incomum foi que a mulher do verdureiro é que veio entregar, pois o filho estava na banca do mercado. Parece que o marido morreu há quinze dias e era o filho que estava substituindo-o na banca. 

— Continue, Cedric.

— Bom, ela entregou as verduras e legumes e a despachei. Estava na hora do café da manhã e tinha que verificar se a cozinha estava servindo corretamente. O jovem Edward acordou cedo para o desjejum. Seria incomum, se não fosse o dia de uma festa planejada por ele.

Margareth sorriu, pensando no quanto seu primo amava aquelas festividades e se empolgava com elas. Nada comentou, para que o mordomo continuasse a narrativa.

— Logo depois atendi a mercearia e o açougueiro, que entregaram as pastas para os canapés, as bebidas, os embutidos e as carnes para o jantar. O que ocorreu de estranho neste momento, foi que o jovem O’Connor chegou e Edward e ele, foram conversar na estufa. Me pareceu que o rapaz não foi embora muito feliz. Depois, Ed… – O mordomo limpou a garganta constrangido. – … o senhor Edward veio até mim. Ele costumava me procurar quando estava contrariado. Disse que havia brigado com o amigo, por conta da senhorita Taylor.

— Está falando de Clarence Taylor?

— Sim, senhorita Blindwar.

— E por que houve a briga?

— Não sei. Disse somente que o jovem Finn estava louco. Desta vez, ele foi reticente em contar para mim o que ocorria, porém isto não é tudo. Dois outros amigos do senhor Edward estiveram aqui mais tarde e houve outra discussão.

— Meus tios não viram nada disto?

— O senhor e a senhora Sander saíram logo após o desjejum. Foram fazer as visitas costumeiras de sábado no orfanato de meninas da cidade, e depois, no de meninos. Eles ajudam aquelas crianças desafortunadas.

— Certo, continue Cedric. Me diga quem foram os amigos que estiveram aqui após o jovem O’Connor ir embora.

— Os moços Robson e Jefferson Hall. Eles são amigos de Edward desde a infância.

— Eu os conheço, Cedric.

— Ah, perdoe-me. Por um momento, me esqueci de que era a senhorita a me interrogar.

O mordomo sorriu constrangido. Custava a compreender por que uma moça jovem, rica e bonita, como Margareth Blindwar, abrira mão de uma vida confortável para trabalhar. E ainda mais, naquele tipo de atividade.

— Relaxe, Cedric. – Margareth sorriu para o mordomo. – Por que Rob e Jeff discutiram com Ed?

— Também não sei, senhorita. Edward não me falou, mas escutei parte da conversa. Seu primo falava para os dois amigos que eles estavam tão loucos quanto Finn. Estavam próximos à janela da copa, porém, caminharam em direção ao pomar. Não os escutei mais. O resto do dia correu tranquilamente, sem outras intercorrências. Arrumamos tudo para a festa e até as empregadas estavam de bom humor. 

— E o jardineiro? Foi ele quem encontrou o corpo do Ed, não foi? 

— Ah, sim. O senhor Jones está petrificado. Ele amava Edward, pois dizia que o tratava sempre respeitosamente. Dizia que a casa se alegrava com a presença dele. Ainda não consegui acalmá-lo. Antes de vir falar com a senhorita, dei-lhe um brandy para que conseguisse dormir. No entanto, nesta hora, ele estava aparando os arbustos do pequeno labirinto à frente da propriedade. Qualquer um o enxergava da sacada da varanda, pois o labirinto da casa tem no máximo um metro de altura. A senhora Sander nunca permitiu que os arbustos crescessem mais que isso. Dizia que, se não desse para ver a forma do labirinto, para que o teria como adorno?

Margareth conversou mais um pouco com Cedric e depois procurou os outros empregados para a entrevista, vendo que os relatos coincidiam. Encontrou-se com a namorada em um empório próximo à mansão Sanders.

— Meu dia está terrível, Beth. Não sei se conseguirei levar adiante a investigação.

Elizabeth observava as grandes olheiras da namorada. Apostava que ela havia chorado e muito, na última hora e, como boa jogadora que era, sabia que ganharia a própria aposta. Estendeu a mão e cobriu a da namorada que estava sobre a mesa. 

— Você consegue. Sei que está sofrendo pelo Edward, mas pense! Dashwood nem lhe acompanhou nas entrevistas. Se Ed tiver justiça, terá que ser por suas mãos.

— Não condene Dashwood. Eu o convenci a voltar para o departamento, para verificar arquivos antigos com características próximas ao assassinato de Ed. Embora saiba que é o praxe, a verdade é que queria me livrar dele.

Margareth sorriu sem graça, diante da atitude que tomou com o colega de trabalho. Evernood abriu um sorriso maior. 

— Então, não vou fazê-la esperar pelo que descobri e, acho que acabou dando uma dica para seu parceiro, sem querer…

Evernood contou-lhe sobre a autópsia. Edward Sander sofreu várias estocadas de um objeto contundente, porém extremamente fino. A médica legista ainda não conseguira identificar a arma, pois não pareciam cortes de faca, adaga ou mesmo punhal. Apesar de ter sido estocado várias vezes, o que o matou foi o ferimento do coração. Pareceu à médica que este foi um dos primeiros, pois se assim não fosse, o rapaz teria como revidar, lutar com o agressor.

— Não entendo, Beth. Se ele recebeu uma estocada no coração, deve ter morrido rápido. Como retiraram as sobrancelhas e lábios com ele ainda vivo?

— Aí é que está, Meg. Por isso penso que foi um assassinato premeditado. Esta lâmina, ou o que quer que tenham utilizado, era tão fina, que o coração não jorrou o sangue. Foi mais como uma hemorragia. O sangue se esvaindo aos poucos. Ele perdeu as forças, assim que foi estocado, porém não o matou prontamente.

— Não houve inconsistência entre os relatos dos empregados. Pode até ser que o assassino esteja entre eles, contudo teria que ser alguém bem inteligente para observar tudo que ocorreu durante o dia e relatar da mesma forma que o restante da criadagem.

— Tem mais coisa que tenho que lhe contar, Meg.

Elizabeth contou sobre o assassinato do verdureiro e a forma como foi. Não escondeu nenhum detalhe. Margareth ficou intrigada, pois o mordomo havia lhe falado sobre a morte do verdureiro. Único fato que não foi relatado por outro empregado.

— Cedric tem mais contato com os entregadores. É ele quem recebe as encomendas. – Elizabete pontuou.

— Sei disso, Beth. Mas como costumamos dizer, ninguém pode ser descartado até que surjam novos indícios inocentando os suspeitos. Não creio que Cedric tenha a ver com as mortes, porém, ele é nossa única ponte, no momento, entre Ed e o assassinato do verdureiro.

— Não podemos descartar a possibilidade do crime organizado também. Sei que não gosta de pensar que seu primo pudesse estar em contato com essa gente, todavia não estava tão próxima dele nos últimos tempos.

— Não estou descartando, Beth. Meu primo gostava de apostar, eu sei. Entretanto, gostava de ambientes requintados, como corridas de cavalos e de cachorros galgos.

— Não sei se sabe, mas a máfia russa domina as pistas de cavalos. Já as corridas de cães galgos são dominadas pelos irlandeses. Você não falou que ele discutiu mais cedo com o jovem O’Connor? A família O’Connor investe em cães de corrida.

— E o verdureiro nisso tudo?

— Temos que investigar, Meg. O verdureiro não era um homem sem posses. Na verdade, a tenda dele distribui para muitas casas nobres da cidade e muitos restaurantes. Era o comerciante mais expressivo do mercado central e tinha uma pequena fortuna. Poderia frequentar locais da alta classe.

Edwin chegou e assim que Elizabeth o avistou, fez um sinal para que ele se juntasse a elas. Margareth ao vê-lo, sorriu pela primeira vez desde que tudo havia começado. Percebeu que se alegrara com a presença do estranho mordomo de Elizabeth. Acostumara-se a ter o rapaz por perto, sabendo que ele sempre atuou com extremo valor, em todas as investigações que fizeram desde que conhecera Evernood.

— Sente-se, Edwin. 

Elizabeth pediu e o mordomo não retrucou. Era a primeira vez que Margareth o via aceitar tal convite, numa postura mais relaxada e íntima.

— Boa noite, Edwin.

— Boa noite, senhoritas.

Ele respondeu, porém não perdeu tempo em muitas mesuras, começando seu relato.

— Recebi seu recado, senhorita Evernood. Ainda não deu tempo de investigar as atividades do verdureiro, todavia creio que, até amanhã à tarde, conseguirei dar-lhes informações precisas.

— Diga-nos o que conseguiu até agora, Edwin.

— Consegui mapear a maior parte das marcas de assassinatos de organizações criminosas na cidade. Falta pouco agora. 

— Então nos diga o que já conseguiu. – Margareth pediu aflita.

— Os italianos preferem a tortura antes da execução. Há duas facções italianas na cidade: A “Famiglia Unita” e a “Silenzio e onore”. Uma cuida da distribuição de armas ilegais e a outra da bebida. 

— Não temos proibição de armas e nem bebidas aqui.

Margareth pontuou, estranhando aquele tipo de atividade.

— Não temos, senhorita Blindwar, no entanto, as armas compradas legalmente têm número de registro e podem ser rastreadas, além das ilegais serem mais baratas. Muita gente compra arma ilegal para não se encrencar, caso faça alguma bobagem. E não falo só do pessoal das periferias. Esses compram armas ilegais, porque conseguem pagar por elas. A “Famiglia Unita”  traz estas armas para cá.

— E quanto às bebidas? – Margareth perguntou.

— O whisky de melhor qualidade está aumentando de preço. O Escocês, a população já nem consegue mais comprar. E o gin, idem. Era a bebida mais barata para o povo que trabalha nas fábricas. As duas bebidas são feitas em destilarias clandestinas pela  facção italiana “Silenzio e Onore”.

— Qual é a marca deles, Edwin?

Evernood perguntou e o mordomo sabia a que ela se referia.

— A “Famiglia Unita” tortura cortando os dedos de seus desafetos com o cortador de charutos e depois os executa com um tiro na nuca. Já o “Silenzio e Onore”, quebra as pernas antes de executar com um tiro na fronte. 

— Quais as outras organizações, Edwin?

— Tem mais algumas, senhorita Blindwar. Para resumir, temos os gregos que são da “Néa Athiná”, que atuam na distribuição de drogas ilícitas. Costumam castrar, antes de cortar a garganta. Os russos têm duas organizações: Uma é a “khladnokroviye”; seu poder está nas apostas das corridas de cavalo. A marca deles é a morte através do ecamento. A outra organização russa é a “moshchnost’” e atuam nas apostas de jogos mais populares, como cartas, competições de dardos… 

— Dardos? Meu primo fez essa brincadeira ontem na festa. 

— Não acredito que ele tivesse nada a ver com a “moshchnost’”, senhorita Blindwar. A marca dessa organização é através da decapitação com um machado. Eles não torturam e tem orgulho dessa forma de morte.

— Imagino por quê… – Evernood comentou. – Não precisa de tortura se a pessoa souber que irá morrer sem a cabeça.

— Existem outras organizações? E a irlandesa?

Blindwar estava estarrecida. Nos anos que atuou na polícia como assistente de Stain, nunca havia deparado com assassinatos dessas organizações.

— Tem outras menores. Rede de prostituição, contrabando de tecidos franceses… Os irlandeses estão nas corridas de cães, entretanto não investiguei ainda. Poderei falar melhor sobre elas, amanhã. Esta noite vou circular pela cidade.

As detetives-namoradas se entreolharam. 

— Está certo, Edwin. Amanhã, eu irei de manhã até o mercado central conversar com a viúva do verdureiro, enquanto Meg vai para o departamento. Certamente, Dashwood e Reynold levantaram mais alguma coisa, pois Greendwish está sendo pressionado pelo prefeito.

— Quero conversar com a família do verdureiro também, Beth.

— Combinamos de nos dividir, lembra? Sei que está aflita, porém, se quisermos descobrir logo o que aconteceu, temos que cobrir a maior área que pudermos. Em que outras ocasiões você não pôde contar com a força policial inteiramente? Estavam sempre divididos. Pode apostar que o prefeito colocou o comissário geral Lewis contra a parede, também, e ele deve ter ordenado ao Harry para colaborar com a Crimes Graves. Temos que saber em que frente estão atuando.

— Está certa, Beth. – Margareth respondeu desolada. – Dispensei Dashwood porque queria chorar o quanto pudesse, sem que me vissem. Contudo, se quiser resolver o assassinato de meu primo, terei que contar com todos. Não estou nos meus melhores dias para pensar.

— Não se preocupe. Estaremos aqui para apoiar você. 

Evernood fez um sinal com a cabeça para o mordomo, fazendo-o compreender que deveria se empenhar muito naquele caso. Recebeu um aceno igual. 

— Vá para o departamento de manhã. Nos reuniremos no almoço e poderemos integrar todas as informações. Assim, quando falarmos à tarde com os amigos de Ed, teremos no que nos apoiar.

Margareth mal conseguiu dormir. Seus pais e seus tios contavam com ela para resolver o assassinato do primo, além de a pressionarem para que o corpo dele fosse logo liberado para o enterro. Não soube o que falar para eles, pois tinha conhecimento de que a liberação do corpo demoraria. 

A universidade conseguira instalar uma câmara frigorífica para a conservação dos corpos, enquanto a investigação estivesse em andamento. O prefeito era um dos maiores benfeitores da universidade, visto que o filho mais velho fazia Direito e a filha Medicina. Ele mesmo fez a doação do valor para o maquinário de refrigeração.

A detetive de polícia gostava da forma de pensar do prefeito. Era um homem alinhado com tendências progressistas, embora Margareth soubesse que ele tinha interesses pessoais, pois o filho teve uma única escolha na hora de fazer a universidade. Ele queria que o filho seguisse seus passos na política. Contudo, deu a oportunidade à filha de estudar em um ensino superior e como ela não tinha qualquer vínculo com a vida política do pai, pôde fazer o que queria. 

— Bom dia, rapazes!

Ela cumprimentou, e via que os olhares de consternação de todos estavam voltados para ela. Eles a cumprimentaram, um tanto constrangidos. A aparência dela não era das melhores àquele dia. Não colocou nem um batom para sair de casa. Não tinha ânimo. As olheiras também deviam estar profundas. Resolveu apaziguar o clima de piedade dos colegas de trabalho.

— O que aconteceu ontem por aqui? Colhi os depoimentos dos empregados e a senhorita Evernood acompanhou a autópsia. Vou fazer as transcrições e o relatório, agora de manhã, para que todos possam consultar o que conseguimos. – Voltou-se para Dashwood. – Conseguiu alguma coisa?

— Hã?! Ah, sim. 

Após um momento de desorientação, o velho detetive se prontificou para dar as informações.

— Tem algo interessante que eu e os rapazes levantamos. Não é o primeiro assassinato na cidade com as mesmas características. Há mais cinco como este.

— Cinco?! – Margareth se etou. – A senhorita Lister falou somente de um, que ocorreu há quinze dias, entretanto não disse que havia outros.

— Isto porque a universidade não fazia todas as autópsias da polícia, antigamente. O laboratório da universidade fazia somente o que a polícia demandava. Agora temos um acordo formal e todas as vítimas são levadas para lá.

Reynold se adiantou para mostrar o resumo dos outros casos, na pasta que estava em sua mão. Ele estava analisando todos, quando Margareth chegou.

— Veja.

Mostrou para ela, que pegou a pasta de arquivo na mão e abriu sobre a mesa, pois viu que todos que estavam na sala se aproximaram. Sentiu-se mais calma por ver que seus colegas de trabalho estavam empenhados em solucionar aquele crime.

— Como não soubemos disso antes?

— Estava na Crimes Gerais em “casos arquivados”. Dessa vez, nem podemos culpá-los. A Crimes Graves nem existia e fazíamos parte da força policial. Passou despercebido por todos nós.

Dashwood comunicou. Levava a sério a sua moral enquanto policial e ele se autocondenava pela falha.

— E eu entendo por que não levantou suspeitas para algo mais sério. Vejam as datas.

Margareth apontou para as datas dos cinco documentos espalhados sobre a mesa.

— Os assassinatos foram executados em épocas muito distintas. 

O policial Spencer balbuciou, revelando o que todos haviam reparado.

— Que organização criminosa mata tão pouco? – Reynold questionou. – O que quero dizer é que, quando o departamento era um só, trabalhei em muitos casos de assassinatos dessas organizações. Pegamos muitos assassinos, mas nunca desmantelamos as organizações. Sempre havia corpos deixados nas docas, beira do rio, periferias… As marcas das organizações estavam sempre presentes e as vítimas nunca foram poucas.

— Acha que há uma nova organização atuando por aqui, Reynold? Que prefere a discrição e quando mata alguém, é por não ter mais alternativa?

— Eu não sei… Conhecia todas as marcas das organizações que atuavam e cortar orelhas, lábios e sobrancelhas não era uma delas.

— Vejam esse. Retiraram o nariz da vítima. 

O policial Smith apontou para um dos arquivos.

— Todas têm uma coisa em comum. – Margareth pontuou. – Vejam as fotos e a autópsia. Foram mortos com perfurações de um objeto muito fino. Não podem nem ser classificados como estocadas de um punhal, de tão delgados que são as penetrações.

— Isso é muito esquisito. Estamos estudando estes relatórios, Blindwar, entretanto não estamos conseguindo ver nada que ligue qualquer desses assassinatos. Essas pessoas não tinham nada entre si.

— Nada que nos chame atenção, Dashwood. – Reynold pontuou. – Lembre-se que, antes da Crimes Graves surgir, todo o departamento cuidava de tudo; desde assaltos, desaparecimentos, mortes e até brigas de bar. Não investigávamos com tanto apuro.

— Reynold está certo. – O policial Smith confirmou. – Nós, policiais de ronda, mesmo quando nos deparávamos com um incidente pequeno como brigas em bares, tínhamos que chamar os detetives.

— Sei disso. Éramos chamados até quando vocês já haviam contido a pendenga. Um desperdício de recursos e forças. Participei de diversas diligências inúteis dessas, tendo que deixar uma investigação importante de lado. – Margareth se lembrou. – Estamos em outra condição e teremos de revisar esses casos.

Ela determinou, olhando com apuro os relatórios das mortes anteriores. Dashwood pediu que ela contasse o que havia levantado nas entrevistas e, também, o que Evernood tinha obtido na autópsia. Blindwar os colocou a par de tudo.

— Vá se encontrar com Evernood e ver que informações ela levantou com a família do verdureiro. Nos dividiremos. Eu e Smith vamos falar com parte dos familiares das vítimas antigas e, Reynold e Spencer com a outra parte. 


Nota: Pessoal, vou responder aos comentários hoje sucintamente, pois estou tentando adiantar um capítulo novo de “Caminhos em Dias de Luz” para soltar amanhã ou depois, ok? Espero que estejam todos bem. Na minha cidade o prefeito baixou diversos decretos, inclusive está fazendo cordões de isolamento nas praias, para que as pessoas não utilizem. Já temos diversos casos aqui e acredito ser correto o que ele está fazendo, para contenção. Tem um caso de morte pelo vírus, ainda não confirmado. Então é isso. Façamos a nossa parte! 



Notas:



O que achou deste história?

8 Respostas para 11 – Sexto Caso: Gavetas, olhos, puxadores e lábios – Parte 2

  1. Agatha Christie que se cuide! Menina, que bafão, quantas organizações criminosas!
    Agora tô pasma!

    • Oi, Ione!
      Cara, nem de longe chego aos pés de Agatha Christie. A musa da trama policial assassinaria você, com a comparação. kkkkk
      Tá pasma com o que? Me diz, me diz!
      Valeu Ione! Fiquei maior envaidecida.
      Um beijo grande, menina!

  2. Carollllll!! Cheguei a tempo!
    Nossa, que capítulo massa!Nem vi passar,sacanagem! Kkkkk
    Vou falar q n gostei da observação de da detetive sobre essa médica…rs.

    Esse caso vai ser complicadíssimo!! Muitas organizações, mas capaz a resposta está nas mãos antigas ou será de grande ajuda…
    Muito curiosa pra saber o que o primo de Meg estava fazendo e pq discordava dos outros.. será q a mulher essa q estava na festa foi a razão ou foi algum jogo? N bate mt a briga dos amigos com as organizações, talvez n esteja relacionado…enfim!

    Sabe q sou MT fã dessa dupla,assim q esperarei com ânsia!!!
    Eu li sobre o caso na sua cidade!!Achei q já tivessem confirmado…
    Povinho sem noção..indo à praia?!!!

    Beijos de luz e muito cuidado!!! Vcs tão tendo q trabalhar??? Se protejam bem!! Chega em casa e joga a roupa pro lava-roupa com cloro, toma banho e evite tocar muitas coisas…os vírus sobrevivem até 3 dias em algumas coisas… Só tô reforçando o cuidado!! 🙂
    Vibrando com carinho pra vcs!!!

    • Oi, Lailicha!
      Cara, que “observação da “detetive sobre essa médica…rs””? Essa não saquei.
      Esse caso vai ser complicado sim. Só digo que tá me dando trabalho. rsrs
      Não vou falar muito porque vc é F****. rsrs Toca em assuntos que se eu começar a responder, vou te dar indícios para descobrir antes do final. kkkkkkk
      Estamos nos cuidando sim. E vamos vencer “esse apocalipse Zumbi” kkkkk.
      Vocês duas fiquem na paz!
      Um beijão, menina!

  3. Carol,
    Adorei ver Margareth se aceita pelos colegas como uma igual, se esse comportamento vai durar não sei, mas gostei.

    Uau, tá ficando mto bom, o próximo cap. mtas revelações.

    Não nos faça esperar mto tempo, lembra q estamos em quarentena e teus romances me são um alento.

    Bjs

    • Oi, Nádia!
      Pois é. Agora os detetives estão vendo na medida da competência dela. Naturalizando, eu acho. rs
      Como falam umas amigas minhas das bandas do nordeste, ouxi… que lindo! Está contando com minhas postagens para amenizar a quarentena? Então, amanhã terá mais. Não desse, mas da outra história, pode ser?
      Valeu, Nádia e muito obrigada pelo carinho de sempre, por aqui. Vocês são um alento para mim também, nesses dias de tanta insegurança.
      Um beijão pra ti.

    • Oi, Carla!
      Obrigadão pelas palavras carinhosas e incentivadoras! Hoje tem mais e acredito que deixará mais dúvidas que respostas. rsrs Vamos lá!
      Um beijo grande pra você!

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