– Du…da
Ouvi uma vozinha de criança que estava aprendendo a falar, virei e vi o Gui segurando a mão da Clara e tentando vir em minha direção, dei meu sorriso mais largo, mais satisfeito. Ajoelhei-me para tentar ficar na sua altura, abri meus braços e ele tentava andar até a mim, a distância ela bem curtinha. Ele inteligente como era, olhou para a Clara, sorriu, ela sorriu de volta, soltou sua mão e eu estiquei a minha.
– Só vou aceitar o abraço se você vir até a mim – continuava sorrindo.
O Gui foi andando lentamente, primeiro segurando-se ao sofá. Era perceptível a sua força de vontade de ir ao meu encontro. Quando faltavam uns três passos, ele resolveu correr e ameaçou cair, mas o segurei antes disso abraçando-o e beijando-lhe a face, ele apertava ainda mais o abraço quanto mais tempo ficávamos daquela forma:
– Estava com saudade desse abraço gostoso.
O Gui afastou-se um pouco de mim, fez um carinho em meu cabelo e sorriu lindamente com seus dentes pequenininhos, suas covinhas, seus olhos castanhos que fechavam sempre que sorria. Era lindo, muito lindo. Beijei sua testa, carreguei e fui falar com a Sophia que estava ao lado da Clara esperando seu abraço também com o sorriso lindo:
– Não vou ganhar seu abraço?
Abaixei para que ela pudesse me abraçar tão apertado e tão saudoso quanto o Gui, lágrimas desceram dos meus olhos, pois só naquele momento que minha ficha caiu, coloquei os dois sentados no sofá:
– Sei que os dois sentiram minha falta, mas tenho uma proposta a lhes fazer – sorri, os olhinhos dos dois brilhavam, pois sabiam que minhas propostas eram pra lá de tentadoras – hoje vou sair com a mãe de vocês, mas prometo que amanhã nós quatro vamos a farra com direito a pipoca, chocolate, sorvete, batata frita e mais o que vocês quiserem mesmo que ela – apontei para a Clara – não deixe. O que acham?
– Êbaaaaa – foi a resposta entusiasmada que me deram.
Escutei a Sophia gritar a pular de alegria, foi correndo me abraçar a beijar ajudando o Gui a levantar-se do sofá para poder fazer o mesmo:
– Mas, primeiro quero saber se vocês cuidaram da mãe de vocês direitinho como combinamos.
– Claro que cuidamos, né Duda? Ou você acha que eu ia deixar nossa mãe tristinha porque você ficou longe tanto tempo por causa do seu trabalho?
Sorri e procurei a Clara com os olhos, ela sorria lindamente e balançou os ombros como se dissesse que ela não tinha nada a ver com aquilo:
– Bons meninos, agora vamos para o banho porque daqui a pouco a avó de vocês está chegando para passar a noite aqui. Quero que cuidem dela também, estamos combinados?
– Vamos cuidar dela direitinho, né Gui?
Ele balançou a cabeça em sentido afirmativo sorrindo largo e abertamente. A campainha tocou, a Sophia foi abrir a porta e escutamos um sonoro:
– Vóóóóó!
Minutos depois vi minha mãe entrar na nossa sala, nos falamos e ela foi levar os meninos para tomar banho:
– Será que agora posso falar com a minha mulher?
Sorri e fui em direção a minha esposa:
– Você sabe que se eu não falar com eles primeiro, ficam emburrados a noite inteira, né?
– Culpa sua que fica mimando esses meninos em demasia – sorriu.
Beijei a Clara apaixonadamente e ficamos nos curtindo por alguns minutos. Trocando beijos, carinhos, sentindo nossas peles, nossos cheiros até que percebemos que os meninos barulhentos ficaram em silêncio, fomos ver o que tinha acontecido e simplesmente já estavam dormindo: o Gui abraçava a Sophia. Eles se acostumaram a dormir juntos, mesmo tendo camas separadas.
Minha mãe estava terminando de cobri-los com o lençol, entrei, beijei os dois e juntos soltaram um pequeno suspiro, sorri e saí do quarto deixando somente a luz do abajur acesa, mas ainda fiquei na soleira da porta do quarto observando-os. A Clara me abraçou por trás e apoiou o queixo em meu ombro:
– Estavam ansiosos por sua chegada – beijou meu ombro – e eu também estava louca de saudades já.
Sorri e virei em direção a minha esposa, beijei suavemente seus lábios:
– Desde quando o Gui começou a falar?
– Desde hoje pela manhã quando acordou e lembrou que você chegaria agora a noite, qualquer barulho que vinha da rua era um “Du…da?”. Você precisava ver a carinha de decepção que ele fazia sempre que percebia que não era você.
– E como anda o tratamento dele?
– Ele está saindo-se muito bem, tem gente que nem percebe a síndrome. Ele está cada vez mais inteligente, cada vez mais esperto e parecido com você.
Acho que devo algumas explicações a vocês, não é verdade? Depois que perdemos o João, eu e a Clara resolvemos nos curtir mais um pouco, solidificar ainda mais nosso casamento e isso durou quase um ano quando decidimos novamente ter um bebê, nove meses se passaram e nasceu a Sophia: uma menininha linda, morena, olhar intimidador – não sei até hoje como ela conseguiu isso desde quando nasceu – muitas características da mãe, mas adorava carros, motos – não podia ver uma moto que ficava toda agitada – ficava super concentrada quando eu falava das minhas viagens, das minhas palestras, era uma menina super bem humorada e sapeca.
Deixava tanto a Clara quanto a babá doidinhas e se divertia quando percebia que tirava qualquer uma das duas do sério e corria para que eu a protegesse quando ela percebia que não tinha mais jeito. Quando nossa menina estava prestes a completar dois anos, conhecemos uma senhora em Salvador mesmo, ela criava o neto, pois sua filha havia falecido da hora do nascimento dele e ela não tinha condições para criá-lo e nem de custear seus medicamentos e tratamento da síndrome. Isso mesmo, ele tem a síndrome de Down e assim que me viu, abriu os braçinhos querendo que eu o abraçasse, carregasse e brincasse com ele. Foi amor a primeira vista, pouco tempo depois demos entrada na papelada para a adoção do Gui e logo em seguida a dona Fátima faleceu. Senti que estava só nos esperando.
O Gui já estava conosco havia um ano e super feliz. O tratamento dele o ajudava a se desenvolver num ritmo um pouco parecido das crianças que julgamos ser normais, mas nosso filho era tão inteligente quanto a Sophia e isso era muito engraçado porque um gostava de proteger e ajudar o outro. A nossa filha ama o Gui e o defende de qualquer pessoa que tente fazer qualquer coisa contra ele, uma vez questionamos isso a ela:
– Ninguém além de mim pode magoar o meu irmão.
Foi uma resposta rápida e com um enorme sorriso sapeca que ela tinha nos lábios:
– Isso ela puxou a você – foi o que a Clara me disse no ouvido quando escutamos a resposta da nossa Sophia.
Sempre fizemos questão de deixar bem claro para os dois que eram irmãos e que era para um sempre cuidar do outro e que não podiam brigar em hipótese alguma. Se tivessem discordando de qualquer coisa, era só falar comigo ou com a Clara para resolvermos os quatro juntos.
O Gui ainda começava a falar, mas tinha atitudes de que entendia tudo o que explicávamos a ele. Sempre sorria abertamente e balançava a cabeça como se estivesse concordando e não repetia mais o erro ou fazia aquilo que pedíamos. Tínhamos realmente dois filhos de ouro: a Sophia com quase quatro anos e o Gui com dois anos recém completados. Estava começando a dar os primeiros passos também, mas quando o fazia era com uma enorme segurança e isso crescia ainda mais quando era eu que o esperava do outro lado com os braços abertos para poder abraçá-lo e naquela noite que cheguei de viagem não foi diferente.
Eu já estava fora de casa há mais de quinze dias, estava louca de saudades dos meus filhos e da minha esposa, principalmente porque quando eu viajei, ela tinha acabado de retornar de uma viagem também de quase dez dias, nem conseguimos matar a saudade. Nosso contado naquele mês resumiu-se em ligações, msn e sms, coisas que estavam me deixando irritada.
Eu estava no quarto, sentada na beira da cama, esperando a minha esposa terminar de se arrumar para podermos sair:
– Amor, o que você acha de passarmos alguns dias em Portugal? Matamos a saudade do pessoal que deixamos lá e é bom que nós tiramos férias já que não conseguimos esse ano ainda, nos curtimos um pouco e aos nossos filhos também.
Ela parou de pentear o cabelo, me olhou através do espelho e sorriu lindamente:
– Achei que você nunca iria propor isso.
Levantei e a abracei por trás, beijei seu pescoço arrancando-lhe vários arrepios:
– Vamos?
– Agora, porque se a gente demorar mais um pouco, juro que não saímos daqui. Você com toda essa provocação em meu pescoço… – suspirou.
– Quando a gente voltar tem muito mais, mais de trinta dias de saudade.
– Sabe uma das coisas que mais gosto do nosso casamento?
– O que? – passei o nariz em sua nuca.
– Tantos anos juntas, casadas, nos vemos quase todos os dias, só não são todos por causa dos nossos trabalhos, temos dois cansativos e lindos filhos, mas nossa amizade, nossa cumplicidade, nosso companheirismo e nosso tesão não mudaram em nada.
– Você acredita em vidas passadas?
– Alma gêmea?
– Não, não acredito que isso exista. Não existem almas gêmeas no sentido que normalmente se dá a esse termo. Não há um homem criado especialmente para uma mulher, uma mulher para um homem, homem para homem ou mulher para mulher. Essa idéia, usada para justificar paixões transitórias, é puramente humana e nada tem a ver com as informações dadas pelos espíritos superiores que revelaram a Doutrina Espírita. O objetivo de todos os espíritos é atingir a perfeição e nesse estado todos se reconhecerão como verdadeiros irmãos. Mas, acredito sim em vidas passadas e você sabe disso, acredito que a gente tenha se encontrado em outra, aliás, outras vidas e a gente vem vivendo nosso amor todos esses séculos. Acredito em promessas feitas de forma sincera e cumpridas até os dias de hoje.
– Que tipo de promessa você está se referindo?
A Clara nunca soube da história de Aurélia. A fiz ficar de frente para mim, segurei sua cintura com ambas as mãos, beijei seus lábios de forma suave, olhei em seus olhos profundamente:
– Acredito que nós já nos encontramos há várias vidas passadas, nos apaixonamos de uma forma que nada e nem ninguém conseguiu nos separar e isso se tornou amor, prometemos de coração aberto que sempre estaremos juntas.
A Clara passou os braços ao redor do meu pescoço, sorriu de uma forma mais linda ainda, uma forma que eu nunca havia visto antes, eu me apaixonei novamente pela minha esposa:
– Eu te amo, Eduarda! Eu te amo mais do que ontem… – a interrompi.
– E menos do que amanhã – ri – amor, isso é plágio.
– Ai amor, só disse a verdade.
Não tem problema, continuo te amando mesmo você plagiando as autoras alheias – levei um leve tapa em meu ombro – ai amor, vou te denunciar na delegacia das mulheres, viu?
Percebi que a Clara ia responder alguma coisa, mas não deixei roubando-lhe um beijo:
– Amor, temos que ir, as meninas estão nos esperando – disse dando leves beijos nos lábios da Clara.
– O que você está aprontando hein, dona Eduarda? E o que as meninas têm haver com essa nossa saída?
– Surpresa, vamos.
A puxei para sairmos do quarto, passamos por minha mãe, beijei seu rosto:
– Mãe, nós não temos hora para voltar, qualquer coisa você liga para o meu celular ou o da Clara, tá?
– Divirtam-se, faz tempo que não fazem isso – sorriu cúmplice para a Clara.
– Perdi alguma coisa?
A minha esposa segurou minha mão depois de despedir-se de minha mãe também e me puxou até a garagem da nossa casa:
– Se eu não tenho uma mãe, tenho que tornar a minha sogra uma, né?
Sorri, abri a porta do carro para que a Clara entrasse e se acomodasse do banco, fechei, dei a volta e entrei também:
– Isso quer dizer então que você anda trocando confidências com a minha mãe?
Ela riu gostosamente enquanto eu ligava o carro:
– Não fique com ciúmes dela, amor. Eu estava falando da saudade que estava de você, dos seus beijos, dos seus toques, do seu carinho, de fazer amor contigo, das nossas conversas até altas horas depois de nos amarmos, de dormir abraçada a você, da forma que você lida com nossos filhos. Estava um pouco chorosa nesse dia.
– E o que ela disse?
– Não disse nada, colocou minha cabeça em seu colo e ficou me fazendo cafuné até que eu consegui dormir, aliás, disse uma coisa: que era para eu ter um pouco mais de paciência e que você estaria voltando amanhã, no caso hoje.
Parei em um sinal vermelho, apoiei meu cotovelo na porta do carro e a cabeça em minha mão. Olhei para a Clara, fiquei admirando sua beleza e percebi que enfim eu estava feliz:
– O que foi, amor?
– Enfim eu tenho a família que eu sempre sonhei.
O sinal abriu e segui em frente, a Clara pousou a mão esquerda em minha perna, apertou levemente, olhei para ela de relance, vi que estava sorrindo:
– Até que enfim vocês chegaram.
Era a Dani já reclamando pela demora. Eu, ela e a Bruna havíamos combinado de fazer uma surpresa para nossa respectivas esposas, pois aquela era uma data muito especial para nós seis. Alugamos uma escuna para ficarmos mais a vontade, encomendamos o jantar, as bebidas, serviço de garçom e levamos um equipamento som que a Dani tem em casa, preparamos tudo para que as três mulheres gostassem.
– Ainda não começou a beber, né Dani?
– Ahh, vocês estavam demorando, resolvi beber só um pouquinho – chegou perto do meu ouvido – tô nervosa, porra!
– Xi i, é a idade deixando você insegura – ri as gargalhadas.
– Podemos saber o que tanto vocês conversam ao pé do ouvido? – a Cris pronunciou-se.
– Hei Cris, calma, sou amiga, aliás, irmã da sua mulher. Estou muito satisfeita com a minha, tá?
Nós seis caímos na gargalhada. Subi e ajudei a Clara a fazer o mesmo, a noite prometia ser muito agradável. Eu realmente estava muito feliz, estava entre minhas melhores amigas juntamente com a mulher que amo, minha mãe estava em casa cuidando dos meus filhos lindos. Profissionalmente eu também estava muito bem, muito feliz, satisfeita com minhas escolhas. A ONG estava com muita credibilidade e tomando proporções internacionais, recebendo prêmios por conta dos projetos sócio-culturais.
Resolvemos jantar logo, já que todas já havíamos começado a beber. Algum tempo depois, todas nós já estávamos alteradas pelo álcool:
– Vamos? – a Bruna pronunciou-se olhando para mim e para a Dani.
Levantamos juntas:
– Irmãzinha, por favor – Dani me chamou.
Decidimos as três tocarmos a música que mais marcou em cada um dos três relacionamentos. Primeiro veio a Bruna cantando “Diga que me ama” da Vânia Abreu, eu a Dani sempre no violão:
“Diga que me ama/ Seja minha guia/ Nossa travessia/ Nunca chega ao fim/ Guarde seu veneno/ Baixe suas armas/ Dê o seu sorriso só pra mim/ Vem fazer a festa/ No pátio lá de casa/ Diga que eu não presto/ Mas diga mesmo assim/ Me jogue na parede/ Me leve na garupa/ Que eu não tenho culpa de ser assim/ Diga que me ama/ Seja minha guia/ Nossa travessia/ Nunca chega ao fim/ Guarde seu veneno/ Baixe suas armas/ Dê o seu sorriso só pra mim/ Abra suas asas/ Deixe que eu te atenda/ A sua vontade/ É uma ordem para mim/ Vou fazer a cama/ Vou te dar amores/ Sem pisar nas flores do seu jardim”.
As nossas esposas eram só sorrisos. Logo depois a Dani tocou comigo e cantou sozinha “Do outro lado” da Aline Muniz:
“Eu quis fazer, amor/ uma canção de amor/ pra ouvir você cantar/ cheia de rimas/ mas, só me veio que o povo corre atrás de dinheiro/ e um prato cheio faz um sorriso pra um dia inteiro/ e quando eu ando depressa/ pra poder te encontrar/ tem muita mão que me atrasa/ pra saber o que eu posso dar/ pra todo fim tem um meio/ tem muito jeito de amar/ tem dor que foge do peito/ pra ir morar n’outro lugar/ e quando você me abraça/ esqueço da vida dura/ que a gente não teve que passar/ do outro lado da rua”.
A Cris se desmanchava em lágrimas, olhei fixamente para minha Clara:
“Olhe nos meus olhos/ E diga o que você/ Vê quando eles vêem/ Que você me vê/ Olho nos seus olhos/ E o que eu posso ler/ Que eles ficam melhores/ Quando eles me lêem/ Eu leio as suas cartas/ Eu vejo a letra/ Meu Deus que homem forte/ Que me contempla/ Sou sua, mas não posso ser/ Sou seu, mas ninguém pode saber/ Amor, eu te proíbo/ De não me querer/ Olho nos seus olhos/ E sinto que você/ Faz eles brilharem/ Como astro rei/ Olhe nos meus olhos/ E o que você vai ver/ Seu rosto iluminado/ A lua de um além/ Eu leio as suas asas/ Borboletas/ Meu Deus que linda imagem/ Me atormenta/ Sou seu, mas eu não posso ser/ Sou sua, mas ninguém pode saber/ Amor eu te proíbo/ De não me querer”.
A Clara não chorou, mas era perceptível a sua emoção, sorria de uma forma linda, mais linda do que eu estava acostumada. Cada dia que passava eu achava que seu sorriso ficava ainda mais bonito e eu me apaixonava ainda mais por ele. Não consegui e nem queria resistir aquele olhar, aquele mar negro que eu sempre me perdia e beijei minha Clara demorada e apaixonadamente. Quando terminamos, passei meu braço esquerdo por trás da sua cadeira e ela apoiou a cabeça em meu ombro. A conversa fluía normalmente:
– Duda, minha cunhada favorita – sorriu – sua vez, mais uma vez.
Ia levantar, mas resolvi falar o que queria sentada mesmo, só me afastei um pouco para ficar de frente para todas. Até havia tentado ensaiar alguma coisa, mas preferi discursar – imposição das outras duas – o que vinha em mente naquele momento:
– Rafa, quem diria que naquele dia que você me ligou me cobrando para nos encontrarmos, matarmos um pouco a saudade que sentíamos, assistir o por do sol no Humaitá, tomar o sorvete da sorveteria da Ribeira, iríamos encontrar as mulheres das nossas vidas? – desviei o olhar e encontrei o brilho negro da minha esposa – duas amigas se divertindo acabam encontrando duas irmãs indo pela primeira vez à cidade baixa e logo nesse dia nos conhecemos e alguns dias depois, conheço minha irmã e um ano depois ela se casa com a Cris e nesse dia eu estava com ela – disse em tom de brincadeira. Bom, há exatos dez anos eu conheci a mulher que conseguiu suportar minhas chatices, minhas manias, me ajudou a ser menos cabeça dura, me ajudou a me entrosar com meus pais e o melhor de tudo, me deu minha própria família do jeito que sempre sonhei. Sempre me apoiou, sempre esteve ao meu lado para o desse e viesse, largou tudo aqui no Brasil para alimentar um sonho que era meu, para ver o meu crescimento profissional e, consequentemente, o pessoal e depois de tantos desentendimentos que agora os vejo como tolos, mas que nos ajudou no nosso relacionamento, estamos aqui, comemorando dez anos que nos conhecemos, dez anos que estamos juntas, ah, claro que não posso esquecer que são dez anos de muito sexo e da melhor qualidade – todas riram e minha esposa ficou da cor de formiga, um charme a mais. Depois paro para pensar, minha melhor amiga é minha irmã e minha cunhada ao mesmo tempo, também está super feliz com sua família, enfim ela foi convencida pela minha cunhada que é bom ter uma criança em casa – sorri com a lembrança dos meus filhos. Grandona, êta que essa daí foi usada muito por mim quando eu e a Clara discutíamos e ela sempre tentando apaziguar a situação, há nove anos resolveu casar-se com a Cris. Olhe, abra seu olho porque seu filho está de olho da Sophia, viu? E se ele puxou a você, não o quero na minha família.
Todas nós rimos as gargalhadas e nesse momento os garçons entraram com três buques de rosas cor de rosa entregando as nossas mulheres. Começamos a olhar fotos nossas desses dez anos que nos conhecemos, foi uma noite perfeita, muito divertida mesmo.
Mais uma vez, eu, a Bruna e a Dani nos olhamos, sorrimos e tiramos do bolso os anéis que compramos para presentearmos nossas esposas e as carinhas delas foram lindas:
– Você continua a minha caixinha de surpresas favorita.
A Clara sussurrou em meu ouvido, virei meu rosto e ganhei um beijo delicioso. Ela tentava parar, mas eu segurava e prolongava, sorria e continuava com a brincadeira.
Resolvemos ir embora por volta das 2h da madrugada e percebi pelo olhar da minha mulher que aquela noite não terminaria tão cedo, sorri com essa constatação.
– O que vocês vão fazer amanhã? – a Cris nos perguntou.
– Amanhã é dia para meus filhos, fizemos um acordo dizendo que se eles nos deixassem sair hoje, já que eu tinha acabado de chegar de viagem, eu os levaria a farra amanhã: vou levá-los a praia pela manhã, vamos almoçar o que eles escolherem e depois vamos a Ribeira – sorri – tomar o velho sorvete.
– Podemos nos encontrar na Ribeira com as crianças, né? – a Rafa opinou.
– Eu acho uma ótima ideia, a pirralhada vai adorar esse encontro – concordei.
– Então está fechado, amanhã no final da tarde nos encontramos na Ribeira – a Dani deu o veredicto.
Despedimo-nos e fomos em direção ao carro novamente, abri a porta para a Clara se acomodar, dei a volta e quando entrei, bateu uma enorme alegria, liguei o som do carro e estava tocando “Gatas extraordinárias” na voz da Cássia El er:
”O amor me pegou e eu não descanso enquanto eu não pegar aquela criatura/ saio na noite a procura/ no batidão do meu coração, na pista escura/ se pego: ui, me entrego e fui/ será que ela quererá, será que ela quer, será que meu sonho influi/ será que meu plano é bom/ será que é no tom/ será que ela se conclui/ e as gatas extraordinárias que andam nos meios onde ela flui/ será que ela evolui, será que ela evolui/ e se ela evoluí, será que isso me inclui/ tenho que pegar, tenho que pegar, tenho que pegar, essa criatura/ tenho que pegar, tenho que pegar, tenho que pegar…”
Eu cantava alegremente, fazendo caras e bocas e a Clara ria muito com todas elas, nós estávamos finalmente felizes.