Capítulo 4

No caminho até o carro instantaneamente, os “casais” foram formados: Rafa e Bruna foram um pouco na frente, cerca de dois passos e eu e Clara ficamos conversando um pouco mais atrás, – obvio.

Minha “acompanhante” fez questão que a sua irmã dirigisse e quando entramos, ela me lançou um olhar nada discreto. Durante todo o trajeto até o local escolhido, Clara colocava a mão em minha perna, fazia um carinho no joelho. Dava sinais que estava “conhecendo o território”.

Sabem quando o assunto nunca acaba? Era isso o que estava acontecendo entre a gente e isso continuou dentro do carro, mas as outras duas também falavam conosco. Estávamos numa animação que parecia que nos conhecíamos já fazia bastante tempo, era uma soltando uma piadinha para a outra, algumas muito irônicas, o que adoro fazer e o que eu estava achando máximo, com minha amiga eu já estava acostumada, mas Clara e Bruna estavam acompanhando tudo o que eu falava. Sou muito irônica, acho que vocês perceberam, mas a única desvantagem é que às vezes passamos por idiotas quando não entendem – como já havia dito anteriormente –, mas nós quatro estávamos numa sintonia fora do normal para quem estava se conhecendo há cerca de uma hora.

Ao chegar à Casa Rosada, não encontramos muitas pessoas porque estava um pouco cedo (20h +/-). Tinha um carinha começando a tocar algumas músicas e o que eu mais gostava é que só toca MPB. Lá é um bar que não é grande, a maioria das mesas fica do lado de fora, num jardim que tem em frente. Sentamos um pouco afastadas do palco improvisado para podermos dar continuidade à conversa e pedimos nossas bebidas, eu pedi minha boa e velha Coca-Cola.

O papo estava ótimo, conversávamos de política a futebol, era incrível, mas em momento algum tocamos nas nossas vidas particulares, não que alguém tivesse algum receio ou o que esconder sobre o que faz da vida ou deixa de fazer, é que ali não tinha espaço para isso porque não faltava assunto para discutirmos. Sinceramente eu estava mais do que encantada com isso. Geralmente quando conhecemos uma pessoa, essas são as primeiras coisas que queremos saber, mas tudo ali estava fora do “padrão”, o entrosamento, o nível das conversas, as piadas pegas no ar, as diretas ditas somente com o olhar.

Em um determinado momento, Clara percebe que esqueceu o celular no carro, disse que ia até lá para pegá-lo e me pediu para ir junto lançando um olhar acompanhado com um sorriso que por pouco eu não me perco naquele mar negro. Claro que não me fiz de rogada e fui com ela, né? Obviamente depois de ouvir um “divirta-se” da minha amiga no meu ouvido.

Acompanhei Clara até seu carro que estava um pouco distante do bar e com pouca iluminação, o que desde o início achei que Bruna estacionou ali estrategicamente. Quando chegamos, encostei-me à porta traseira direita cruzando meus braços. Clara com a maior calma do mundo destravou veículo e ficou na minha frente, colou seu corpo ao meu e sussurrou no meu ouvido:

– Esqueceu que eu estava aqui atrás com você? – ela me perguntou e não desgrudou o seu corpo do meu afastando-se somente para poder me encarar, como fiz uma cara de quem não entendeu, Clara completou no mesmo tom de voz – não posso abrir a porta com você encostada nela – sorriu.

– Você tem certeza que quer que eu saia daqui? – respondi no mesmo tom que ela usou comigo.

– Querer eu não quero, mas você precisa fazer isso. Além do mais, tenho outros planos para você – provocou.

– Posso saber quais são?

– Assim que você entrar no carro.

– Vai me sequestrar?

– Ainda não – ela respondeu sorrindo e afastando-se de mim o suficiente para eu sair da frente.

E foi o que fiz, ela entrou, logo depois fiz o mesmo e Clara travou as portas em seguida. Ela já estava com tudo planejado, sentou propositalmente no banco de trás e os vidros do carro eram revestidos com uma película de 95%, sorri com esse pensamento, o que não passou despercebido por ela. A mesma ligou o som e estava na Globo FM, como sou ousada mudei para a Nova Brasil FM e incrivelmente estava tocando “Um primeiro beijo” da Paula Toller:

“Um primeiro beijo/ Se acontecesse/ Se a gente se encontrasse/ Como ia ser/ Como saber/ Antes de nos conhecer/ Quiçá beijar/ Pensar em beijo/ Pra confessar/ Nem ao menos sei seu nome/ Eu nem ao menos sei seu nome/ Mas foi só um sonho/ Sem o lado avesso/ De outros primeiros beijos/ Foi tão romântico/Nós nos beijando”.

http://br.youtube.com/watch?v=yxja8yixS3w

– Do que está rindo?

– Nada demais.

Foram somente essas duas frases que trocamos dentro daquele veículo. Ela chegou próximo a mim e ali pude ter noção do quanto estava ansiando por aquele momento desde que nos conhecemos a poucas horas na Ribeira. Eu estava de frente para Clara, ela aproximou-se ainda mais, todos os meus sentidos estavam em confusão naquele momento, queria tocá-la, mas aquela visão que estava tendo era perfeita, tinha uma mulher que eu considerava linda, de sua pele exalava um perfume que era natural, claro que ela usava perfume, mas o cheiro dela era diferente, cheiro de mulher, não cheiro de mulher excitada, mas sim de maturidade, de sensualidade.

Quando escutei sua respiração alterada, foi o momento do meu descontrole, precisava sentir o sabor de sua boca, a maciez de sua pele, o contato com sua língua. Naquele instante senti sua mão em minha nuca e sua força que não era bruta e sim firme, de uma pessoa que sabia o que queria, me puxou e colou seus lábios nos meus.

Sabe quando você leva um choque que seu coração vai à boca, seu corpo treme quase que imperceptivelmente para a outra pessoa e você sente um leve latejar em seu sexo? Pois é, foi tudo isso que senti com um simples roçar de lábios. Até aquele momento, nenhuma de nós tínhamos sequer fechado os olhos, parecia que estávamos esperando a reação da outra, perecia que estávamos programando tudo, fechamos os olhos e nos entregamos àquele momento.

O teste de colar os lábios já não surtia mais efeito e nossos corpos queriam mais. Num rápido movimento, puxei Clara para meu colo e enfim o beijo aconteceu. Foi de forma intensa, exigente, exploradora. Queríamos conhecer a outra. Passei minha mão esquerda para a sua nuca e transpassei meus dedos em seus cabelos, segurei pela raiz, como resposta escutei um delicioso gemido entre o beijo, sinal verde para mim. A mão livre passava pelas suas costas causando arrepios e mais gemidos.

Só em saber que ela estava gostando, senti minha calcinha molhar, fui um pouco mais ousada, continuei acariciando suas costas, mas por baixo da blusa o que ela correspondeu da melhor forma possível – com um gemidinho que me tirou do sério.

Eu não aguentava mais, precisava tocá-la mais intimamente, a mão que estava em suas costas foi para a função da outra e essa desceu pelo pescoço, colo, seios – por cima da blusa –, barriga, coxa. Subiu novamente para a barriga e pousou nos seios, tinha um tamanho médio, encaixava na mão perfeitamente, durinho e o biquinho dava sinais que queria uma atenção especial e mais uma vez não me fiz de rogada.

Desci novamente a mão até a barriga e ao voltar para aqueles lindos montes gêmeos levou a blusa junto, acariciei, apertei, brinquei com eles até perdermos o fôlego e pararmos o beijo temporariamente, mas minha mão não saiu de “seu” lugar.

Quando nos separamos, lançamos olhares cúmplices e os dela transmitiam muito, mas muito desejo. Mais uma vez trocamos intensos olhares que diziam mais do que qualquer palavra naquele momento. Depois de alguns minutos assim, ela quebra o silêncio com uma voz que transbordava tesão:

– Se eu soubesse que seria tão bom e que você superaria tanto as minhas expectativas, teria te sequestrado há mais tempo – não consegui conter o riso e como não falei nada ela continuou – se só com um beijo você fez todo esse estrago, estou ansiosa para o próximo passo.

Continuei sem dizer nada, apenas agi. Beijei-a novamente, agora com mais calma, somente provando o sabor de sua boca, brincando com sua língua, mordendo os lábios, acariciando a pele, sentindo cheiros. Ficamos assim por longos minutos até meu celular vibrar no meu bolso. Como Clara estava sentada em meu colo, também sentiu e nos afastamos um pouco para eu pegar o objeto e verificar no visor do aparelho quem estava nos interrompendo. Resolvi atender:

– Velho, você incomoda para caralho, sabia?

– Vocês vão ficar aí a noite toda, é?

– Eu sei que você me ama amiga, mas pode me deixar ser feliz um pouquinho?

– Não, vamos logo. Vocês podem fazer o que quiserem, mas mais tarde.

– Porra, você está me saindo uma bela de uma empata foda, viu? – disse e levei um leve tapa de Clara que estava rindo da conversa.

– Eu sei que aí está muito bom, mas vai nos deixar aqui a noite toda, é?

– Duvido que você esteja preocupada em ficar sem mim, confessa que você está querendo é a vez aqui no carro, vai – Clara sussurrou sedutoramente em meu ouvido um “você não presta” que me deixou louca.

– E eu estou errada, é?

– Tá bom, a gente já está indo – disse para encurtar a conversa.

– Beleza, estamos esperando, beijos.

– Tá, tchau.

Nem dei tempo de Rafa falar qualquer coisa, desliguei imediatamente a ligação e ataquei ferozmente aquela boca que estava me provocando durante toda a conversa. Como prêmio, ouvi deliciosos gemidos da Clara.

Se eu não me controlasse com o restinho de consciência que me restava, tinha transado com ela ali mesmo. Não foi por falta de vontade minha ou dela, mas por incrível que possa parecer, não queria que fosse ali no carro a nossa primeira vez.

Sei que nunca dei valor a isso, transava mesmo onde eu queria, a adrenalina sempre me excitou, aquela expectativa de poder ser flagrada a qualquer momento era um tempero a mais para o sexo. Mas, não queria que fosse assim com a Clara, não me considero romântica, nunca me achei uma, mas queria fazer diferente com ela, acho que comecei a pensar assim porque desde o momento que nos conhecemos, tudo entre a gente aconteceu de forma que nunca esperava, de forma que nunca havia acontecido comigo.

Naquele momento tudo para mim era novidade, a forma que ela me abordou, os vários pontos de vista em comum, várias ideias e ideais que eram iguais ou se completavam, a forma que foi o primeiro beijo, a intensidade, a descarga elétrica que ele gerou foi fantástica. Mesmo que a gente não se visse nunca mais, queria que a nossa primeira ou única vez também tivesse aquele encanto que estava acontecendo conosco desde a primeira troca de olhares.

Com um esforço sobre humano, consegui parar aquele delicioso e excitante beijo.

– Se a gente não parar agora, não me responsabilizo pelos meus atos.

Parece que ela leu meus pensamentos e disse rindo descaradamente.

– Pra onde você quer ir?

– Primeiro vamos lá fora falar com as meninas e passar a vez do carro para elas porque senão Rafa vem aqui nos tirar aos tapas, lá a gente resolve, caso contrário, não vou sair daqui tão cedo.

– Tudo bem, mas depois a senhorita não me escapa.

– E nem eu quero.

Disse isso roubando mais um caloroso beijo daquela boca que estava me tirando do sério. Depois de uma intensa luta interna, consegui me separar dela e saímos do carro. Clara ajeitou a roupa e fomos em direção onde as meninas estavam. Quase que no mesmo momento em que sentamos, elas levantaram e foram para o carro, obviamente que antes disseram várias piadinhas sobre a nossa demora.

Quando sentamos, Clara aproximou um pouco mais a sua cadeira da minha e continuamos nossa conversa. Obviamente que ficava me provocando o tempo inteiro com frases ambíguas, uma mão aqui outra ali por baixo da mesa, mas tinha momentos que por mais que o papo estivesse empolgante, parávamos de falar para nos enfrentar com os olhos. Era indescritível a sensação até que sem interromper o contato, ela falou:

– São raras as pessoas que fazem isso, sabia?

– Isso o que?

– Sustentar meu olhar.

– Por quê?

– Não sei direito, dizem que transmite medo.

– Medo de você ou algum medo que tenha?

– Medo de mim.

– Sabe, desde a primeira vez que te vi lá na Ribeira, antes de você ir falar comigo, tinha algo em ti que estava me fascinando e eu não conseguia entender o que era, agora já sei: seu olhar.

– Por quê?

– Ele para mim não transmite medo, mas sim segurança de si, define imediatamente o que deseja.

– Isso ninguém nunca me disse.

– É? E o que mais ninguém nunca disse ou fez para você? – perguntei já bem próxima a ela.

– Ninguém nunca me fez perder a cabeça da forma que você está fazendo.

– Eu? Eu ainda não fiz nada, linda.

– Então quando você vai fazer?

Dei um rápido e estalado beijo em sua boca e chamei o garçom, pedi a conta. Ela fez questão de pagar já que eu só tinha bebido uma coca cola, tentei protestar, mas a Clara estava irredutível. Fomos para o carro e claro que eu tinha que pregar uma peça na minha querida amiga, né? Bati desesperada e propositalmente no vidro para elas se assustarem.

Eu e Clara só escutamos as duas nos xingando lá dentro de todos os palavrões possíveis. Rafa abriu a porta quase me batendo:

– Você é palhaça, é?

– Eu não amor da minha vida, só retribuí a foda que você interrompeu, mas claro que eu tinha que lhe dar um susto gostoso, né? – disse isso rindo muito e usando a Clara como “escudo”.

– Tá, tá, tá… E o que vocês estão fazendo aqui?

– Vamos embora, temos coisas mais “importantes” para fazer – sorri maliciosamente olhando em direção a Clara.

– Importantes, sei…

– Vocês vão para onde? – perguntou Bruna.

– Não sei, estou por conta da Duda – disse lançando um lindo sorriso para mim.

– Vamos lá pra casa – respondi a dúvida de todas.

– Você vai levá-la para aquele cubículo que você chama de casa?

– É a única que tenho e, além do mais, não preciso mais do que a cama e o banheiro, é claro.

– Poupe-me desses detalhes, tá?

– Meu Deus! Vocês se amam, né? – perguntou Bruna.

– Ela é o amor da minha vida, Bruna. Às vezes ficamos com outras pessoas para nosso relacionamento não cair na rotina e sempre brigamos na frente dos outros para acharem que somos somente amigas, mas isso aí na cama… Humm… Prepare-se, viu?

Nós quatro rimos as gargalhadas, eu puxei Clara de lado e perguntei no seu ouvido abraçando-a:

– Bom, o que Rafa disse é verdade, meu apartamento é bem pequenininho e não tem nada de luxo, tem certeza que você quer ir?

Clara envolveu meu pescoço com os braços, apertou ainda mais o abraço e respondeu de uma maneira que quase tive um orgasmo ali mesmo:

– Contanto que você esteja lá também…

Dessa vez não consegui controlar e nem queria. Puxei sua cintura para um contato maior e a beijei, mas não foi um simples beijo, foi daqueles de tirar o fôlego: as línguas se procurando, mordidas, suspiros, sussurros, gemidos, mão passeando pelo seu corpo, mas tive que diminuir a intensidade. Aos poucos o beijo estava delicado, carinhoso até se resumir em vários estalados e sorrisos.

– Vocês podem deixar isso para mais tarde? – agora foi à vez de a Bruna interferir.

A única coisa que Clara fez foi virar-se de costas para mim e se apoiou em meu corpo, enlacei sua cintura e apoiei meu queixo em seu ombro, já que tínhamos quase a mesma altura. Conversamos mais algumas besteiras até as outras duas se decidirem para onde iriam.



Notas:



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