Capa: Tattah Nascimento
Revisão: Isie Lobo e Nefer
Texto: Carolina Bivard
Capítulo 5 – Um mundo antigo>
A porta da ponte se abriu e Bridget calou, imediatamente.>
– Chegamos? – Kara olhou para a tela, reparando o local que ela mostrava. – Não estamos em Anglada? – Perguntou ainda desnorteada pelo sono.>
– Estamos num lugar melhor que o hangar de Anglada para executar nossos trabalhos.>
– O que? Você mentiu para onde íamos?>
– Não menti. Apenas mudei um pouco os planos. Oton tem acesso ao hangar, assim como outros tripulantes. Temi que fossemos pegas em meio aos trabalhos que executaríamos. Teve outro motivo. Quando estávamos chegando na órbita de entrada, voltei para meu alojamento e mandei a IA da nave vasculhar o espaço em torno do planeta. Havia duas assinaturas de naves destroieres na lua de Anglada. Não tive mais dúvidas do que faria.>
– Deuses! Por que não me acordou?>
– Tive que tomar uma decisão rápida para nossa proteção, não tive tempo. Não me preocupei, pois contornei o planeta. Eles não esperavam a nossa saída imediata.>
– E onde estamos?>
Bridget se voltou para a tela, olhando a paisagem.>
– Estamos num lugar seguro e que não esperava voltar tão cedo. Coloque um traje térmico. Casaco, calças térmicas, botas para neve, essas coisas. Vamos até lá fora e eu te apresento o lugar.>
Não deixou que a engenheira perguntasse mais nada e caminhou para fora da ponte em direção a seu alojamento. Responderia as perguntas quando colocasse os pés na neve e pudesse chegar até a casa que se encontrava mais adiante. Kara saiu no encalço da comandante.>
– Ei! Eu não tenho essas coisas pra vestir.>
– Como não tem roupa térmica?>
– Nunca precisei sair da nave durante os trabalhos de transporte da Decrux. Quando atracávamos em Anglada, também não precisava desse tipo de roupa. Lá é bem quente. – Respondeu indignada.>
Bridget a olhou desconfiada.>
– Você tem mais alguma roupa, além dos macacões da manutenção e dos uniformes de oficial, que pegou no almoxarifado, quando assumiu a engenharia?>
Kara ruborizou.>
– Na verdade, só uma calça e duas blusas de manga curta. Como disse, Anglada é quente.>
Kara respondeu encabulada e a comandante esboçou um sorriso de lado.>
– Você não desembarcava, não é?>
– Não muito.>
Bridget soltou uma grande gargalhada. Era inacreditável o que acabara de descobrir. Vivera, literalmente, durante dois anos, sob o mesmo teto que a engenheira e nunca a encontrara. Quando atracavam, a nave se transformava num cemitério. Ninguém permanecia, além dela, exceto nos dias de manutenção, que antecedia alguma viagem.>
– Vamos ao meu alojamento para ver uma roupa e você me conta essa façanha. Como conseguia? Eu perambulava pela nave inteira e nunca desconfiei que tivesse alguém, aqui. – Colocou o braço sobre os ombros da engenheira, rebocando-a, alegremente, para dentro de seu quarto, deixando a engenheira encabulada outra vez – Você saía do seu alojamento em algum momento?>
– Raramente. Saí algumas vezes, mas um dia quase esbarrei em você no corredor. Entrei correndo no laboratório.>
– Por que? Você era uma funcionária da nave.>
– Bem, primeiro porque você não me conhecia e esta é a sua casa. Me senti invadindo, especialmente porque naquele dia você tinha uma visita.>
– Visita?>
– É.>
Kara respondia sem jeito e Bridget começou a não achar mais tanta graça na história. Temia que Kara soubesse mais do que falava. Caminhou até o outro ambiente, onde estava a cama, e comandou por voz que o armário abrisse. Uma porta ao lado da cama deslizou lateralmente, mostrando o conteúdo do compartimento. Pegou uma calça, uma blusa de mangas compridas e um casaco. Foi até a parte onde estavam os calçados e pegou uma bota.>
– Acredito que as roupas caibam em você. O tecido é ajustável, mas se a bota ficar grande, ou pequena demais, podemos verificar se no almoxarifado tem roupas de neve.>
– Obrigada.>
A curiosidade e a aparente intimidade que Bridget concedeu, fez com que Kara revolvesse uma curiosidade que tinha e, decidiu perguntar.>
– Ela é sua amiga de muito tempo? – Perguntou, tímida. – Bem, é que… Eu a vi algumas vezes e não uma vez só como lhe contei. Ela sempre vem quando atracamos em Anglada.>
– Quem você viu é uma mulher de aparência nipônica?>
Bridget devolveu a pergunta, sondando as expressões do rosto de Kara. Quase não conseguiu conter o sorriso, vendo o grau de timidez que a outra revelava. “É mais gracinha ainda, quando está tímida. Só espero que não me dê problemas.”>
– É.>
– Ela é uma grande amiga e de longa data. Mas é só isso. Uma grande amiga.>
Fez questão de frisar as duas últimas frases, reparando bem na reação da engenheira que, outra vez, ruborizou. Kara se sentia ridícula, por ter deixado a sua curiosidade falar mais alto e Bridget, saboreava cada momento e reação dela.>
– É… Na verdade, eu não tenho nada com isso. Vou para meu alojamento para me trocar.>
– Pode trocar de roupa aqui. Não me importo.>
A comandante não conseguiu segurar o sorriso malandro, que teimou em cingir seus lábios.>
– Aqui? Não. Não. Vou me trocar no meu alojamento.>
Kara saiu, numa rapidez maior do que pretendia, fazendo Bridget gargalhar, assim que a porta se fechou.>
– Esses dias serão curiosos e interessantes.>
Falou para si mesma e sentiu que Decrux aglutinava ao lado dela. Não se deu ao trabalho de olhar para a mulher.>
– Você é má, Brid. Tô começando a ficar com pena da Orelhinha.>
– E você é uma cretina. Sabia que ela estava aqui o tempo inteiro.>
– E o que tem isso? Ela era uma técnica de manutenção e funcionária da nave. Você sempre autorizou funcionários a permanecer na nave quando quisessem.>
– Sim, mas eles sempre me reportaram quando permaneciam. O problema é que eu achava que estava sozinha e você não me alertou.>
– Tive meus motivos.>
– E quais seriam?>
– Você pode achar que não tenho sentimentos, mas eu me sensibilizava pela situação dela. Se eu reportasse a você, poderia não gostar e poderia manda-la embora. Ela sempre foi uma boa funcionária e cuidava, muito bem, da nave. Também tenho meus interesses.>
– E nunca passou por esses seus “condutores sinápticos” que eu poderia não dispensá-la e esta informação me faria ter mais cuidado?>
– Não passou exatamente, isso, por meus “condutores sinápticos”, mas passou que você poderia cair de amores por ela. Imagina aguentar, bem antes, essas reações imbecis que tem apresentado?>
– Some das minhas vistas! Ou melhor, antes de sumir, faça um backup de seu sistema no emulador. Você vai ampliar seu raio de segurança dentro e em torno da casa.>
– Oh, grosseria! Já fiz isso, queridinha. Deixa eu sumir, antes que Orelhinha retorne.>
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Desceram da nave e o que para a freyniana parecia uma experiência estranha, pois nunca havia desembarcado em um local com neve e frio, para a comandante era uma sensação de liberdade. Há três anos Bridget não aportava naquele planeta. Afastara-se de sua casa em “Pontos” para não expor seus habitantes e a descoberta, daquele lugar, pelas autoridades da República.>
– Onde estamos?>
– Em minha casa. Meus pais eram antropólogos da República. Antes da guerra começar, eles trabalhavam viajando e estudavam novas culturas em espaço extra delimitado da República e da Corporação. Aprenderam, muito cedo, que muitos locais e muitas culturas não deveriam ser apresentados às autoridades do espaço delimitado.>
Elas caminhavam lado a lado, em direção à casa, que estava a pouco mais de cem metros de onde a nave desceu. O ar quente de suas respirações, condensavam em choque com o ambiente gelado, formando uma névoa que saía por suas narinas e bocas.>
– Não estamos em um planeta do quadrante delimitado?>
– Não.>
A engenheira se calou. Articulava mentalmente as informações que Bridget lhe dera.>
– Eu sabia que a nave tinha algumas tecnologias diferentes e interessantes. Nesses dois anos que estive na manutenção, descobri pequenas coisas que me levaram crer que, você andou por alguns locais bem longe da República. Mas fazer um salto dimensional para tão longe e em tão pouco tempo… Uau! Agora você me instigou.>
Bridget parou de caminhar, sendo acompanhada por Kara. Encararam-se e a comandante se preocupou, quando ouviu a engenheira falar sobre a tecnologia diferenciada da nave. “Afinal, o que você sabe, Kara?” Pensou, mas não expressou em voz alta. Percebendo a preocupação da comandante, pela ruga que se formou entre as sobrancelhas dela, Kara sorriu e se adiantou para explicar e demolir as apreensões da outra.>
– Não se preocupe, Bridget Nícolas. Se a nave tem algum “grande segredo”, ainda não descobri.>
Voltou a caminhar, ainda com um tom jocoso na face, sendo acompanhada pela comandante. Bridget permanecia calada e observando a engenheira. Pedia, silente, para que ela continuasse a esclarecer as tais descobertas. Chegaram à varanda, pararam de frente e Bridget ainda a encarava numa atitude ostensiva. Kara não conseguiu segurar o riso, mas se adiantou em explicar, antes que a comandante lhe segurasse pelo pescoço para extrair a informação.>
– Então a nave realmente tem um grande segredo? – Provocou. – Como disse, não se preocupe, porque não vi nada demais, se isso é algo que te aflige. – Sorriu, recebendo um olhar severo de volta. – Está bem! – Kara revirou os olhos e bateu com as palmas das mãos nos quadris, desistindo da provocação. – Descobri apenas alguns condutores provenientes de “Brasa”, que não deveriam estar ali e, algumas vezes, deparei com linhas de programação que não conseguia identificar. O mais interessante é que elas se reestruturavam, na medida que consertava um painel ou um console qualquer. Às vezes, após tudo ser liberado pela manutenção, eu retornava ao painel para verificar com mais calma estas linhas de programação e, incrivelmente, elas não estavam mais ali. Estas pequenas coisas me levaram a crer que a nave sofrera algum upgrade em alguma tecnologia diferente do que conhecemos no espaço delimitado. É só isso. Satisfeita?>
– Não estou nada satisfeita. Você é uma xereta, Kara Lucrétia, e isso me irrita.>
– Eu não sou xereta!>
Kara respondeu indignada, enquanto via Bridget se abaixar e pegar algo embaixo de um velho tapete, quase congelado pelo frio.>
– Isso se chama curiosidade da profissão. – Continuou. – Tenho certeza de que se visse algo estranho, enquanto estivesse fazendo seu trabalho, você quereria saber o que é. Aliás, é exatamente por isso que estamos aqui.>
Bridget não retrucou. Permaneceu calada, enquanto colocava a chave na fechadura e girava. Abriu a porta e entrou, dando espaço para a engenheira passar.>
– Não acredito. Foi isso mesmo que eu vi?>
– O que é agora? – Rebateu, Bridget enervada.>
– Você deixa uma chave manual embaixo de um tapete? Que espécie de segurança tem nessa casa?>
– A segurança de que este planeta não será encontrado pelos “nossos amigos”. Você está se transformando num “pontapé na minha bunda”, sabia? A casa é minha e eu gosto dela parecendo que não existe tecnologia, entendeu? – Olhou para o alto, impaciente. – Luzes. – Ordenou que as luzes fossem acesas e voltou-se para a engenheira. – Satisfeita? Aqui dentro também tem a tecnologia de que tanto gosta. Vou cadastrar seu timbre de voz, para que possa tomar seu “banhinho” quente e poder fechar as venezianas, quando for dormir, sem precisar fazer esforço.>
– Por que você está irritada?>
– Porque você é xereta e nunca ninguém pisou aqui antes. Nem mesmo meus amigos. – A comandante respondeu, caminhando na direção de um corredor. – Vou para meu quarto tomar um banho. O seu quarto é a última porta do corredor à direita. No armário tem algumas roupas que deverão servir em você. Pode deixar que a casa está limpa. É vedada e tem um sistema de esterilização contínua. Não terá problemas com nenhuma poeirinha, ou mofo, obstruindo seu nariz, ok?>
Bridget saiu, deixando a sua hospede de pé, no meio da sala. Entrou no quarto e trancou a porta. Largou no chão a mochila que trazia nas costas.>
– Droga! Em que encrenca eu estou me metendo?! – Perguntou para si.>
Kara demorou um tempo para sair da catatonia que a reação da comandante lhe deixou. De repente, começou a rir, sozinha, da situação toda. Descrente, falou no meio da sala:>
– Porra! Sou eu que estou num planeta que nem sei onde é e ela que está dando chilique?!>
A engenheira foi para o quarto que Bridget havia indicado e quando entrou, reparou na decoração. Embora a arquitetura da casa tivesse um estilo mesclando entre o rústico e o “neo-tecnológico”, ainda assim era bem diferente. As paredes imitavam a madeira, mas, se bem reparadas, percebia-se ser de um material sintético. A claridade natural entrava no quarto por uma grande porta de correr que dava para uma varanda. Pelo pouco que conhecia da comandante, certamente era de um vidro estruturado para suportar impactos e, talvez até, disparo de armas. Era muito devassado e a personalidade que observara de Bridget, não deixaria que se sentisse insegura em sua própria casa.>
Kara olhou a cama com curiosidade. Embora conhecesse muitas culturas, nunca vira uma cama feita em madeira legítima. Aproximou-se e colocou a mochila sobre o colchão. Passou a mão pela cabeceira entalhada, sentindo a textura. Sorriu.>
– Quase me enganou, comandante. Que trabalho bem feito. Nunca tinha visto um material sintético tão perfeito. Bom, deixa eu tomar um banho. Será que ela já comandou o cadastramento da minha voz?>
Questionava-se, enquanto conjecturava sobre a personalidade interessante de sua comandante. Arriscou um comando de voz para testar a liberação.>
– Luzes.>
As luzes se acenderam, mas ofuscaram os olhos da engenheira. O dia estava escuro e não vira o sol quando desembarcaram, por conta das pesadas nuvens. A nevasca estava inclemente, o que deixava a luminosidade natural ofuscada.>
– Apagar luzes diretas.>
As luzes mais fortes se apagaram, deixando o ambiente ameno, pelas luzes amarelas dos spots de canto, que permaneceram acesas. Kara olhou em volta e não via o tal armário do qual Bridget falara.>
– Abrir portas.>
Deu um comando geral para ver onde o armário se localizava. Todas as portas se abriram, trazendo o ar gelado para dentro do quarto. Tremeu, ao receber, inesperadamente, o golpe de ar vindo das portas da varanda.>
– Fechar porta da varanda e corredor.>
Em pouco tempo a climatização do ambiente se reestabeleceria, mas ela esfregou as mãos, que estavam sem as luvas térmicas. Viu um compartimento aberto e se dirigiu até ele. Não era simplesmente um armário. Era uma câmara em que se podia entrar e lá estavam roupas diversas.>
– Estas roupas não são suas, comandante. – Falou alto, reparando na diversidade de vestimentas. – Quem morava aqui com você? Apenas seus pais?>
Passou os dedos sobre as bordas das roupas penduradas nos cabides. Parou de frente as calças, que também estavam penduradas, e viu uma de um tecido grosso, de azul índigo manchado. Pegou, fascinada pela peça. Observou o restante e pegou uma camisa de manga comprida branca e de botões. O tecido era leve e a temperatura do quarto já normalizava. Viu botas com um pequeno salto em uma prateleira. Pegou.>
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Não é só a orelhinha que gosta de doses homeopáticas hahah você também.
Hummm essas duas viu rsrs duas bicudas .
Quem será quem foi aquele quarto onde a orelhinha se encontra.
Xero Carol, muito foda o cap. Ansiosa por mais uma dose homeopática desse linda história
??
KKKK Até gosto de doses homeopáticas, mas nem tanto! rsrsrsr
Bom, de quem foi o quarto, acho que até já desconfie, Flavinha. Tipo: Alguém que viveu com a comandante, alguém que deu a aparência a uma certa IA… rsrs
E vamos que vamos! rs
Bjus, Flavinha!
Curiosidade só aumentando rsrsrsr Tô achando que a Kara vai engravidar a comandante rsrrrrsrsrs
Abrs ?
Nossa, Lins, elas nem deram um beijinho ainda! kkkkkkkk Mas gosto do seu raciocínio, só não acho que a comandante goste da coisa… Vamos ver no que dá esse segredo todo. rsrsrs
Valeu, Lins!
Beijo carinhoso pra você! (;