O Coração de Freya

Capítulo 3 – Ciladas

Capa: Tattah Nascimento

Revisão: Isie Lobo e Nefer

Texto: Carolina Bivard

 

Capítulo 3 – Ciladas

 

– Engenharia. Relatório de danos.

– Não fomos afetados, até agora, comandante. Os escudos estão segurando o ataque.

– Decrux, escanear nave inimiga. Localizar núcleo de dobra, fonte de disparos dos torpedos lasers e Ampolas negativas.

A comandante pedia a informação ao centro de inteligência artificial (IA*) da nave. Uma voz feminina tomou todo o ambiente da ponte de comando, respondendo à ordem de Bridget.

– Término de escaneamento em três segundos… dois… um… Concluído. Ampolas negativas da nave inimiga ativadas.

– Drenar o máximo possível de energia do núcleo principal e disparar lasers ininterruptamente, a toda carga, no núcleo de dobra e na fonte de disparos dos torpedos lasers.

– Bridget, Não!

Oton repreendeu a comandante, mas o computador de bordo já executava a ordem. Durante quinze segundos, Decrux bombardeou a nave inimiga, utilizando oitenta por cento de sua energia. Ficaram vulneráveis, pois os escudos não conseguiram se manter. A nave inimiga não conseguia revidar, diante da investida, até que as defesas caíram e a nave pirata explodiu, diante dos olhos de todos, deixando apenas fragmentos no espaço. A tripulação da ponte olhou consternada para Bridget. Nunca haviam entrado num conflito em que a comandante ordenasse a destruição total de uma nave, sem deixar sobreviventes. Etaram-se também, por ela ter utilizado uma manobra tão arriscada. Mesmo que, por segundos, Decrux ficou exposta completamente e sem defesas. Bridget olhava para a tela, sem demonstrar qualquer emoção, até aquele instante. Cerrou as pálpebras, momentaneamente, e as reabriu. A energia se reestabelecia aos poucos e ela acionou o comunicador.

– Engenharia, relatório.

– Alguns relês queimaram e a manutenção está trocando. A energia do núcleo se reestabelecerá completamente em torno de dois minutos. Sem maiores avarias, comandante.

A voz da freyniana era cadenciada, proporcionando tranquilidade à tripulação da ponte e, especialmente, a Bridget.   

– Era necessário, Oton. Viu que eles nos neutralizariam. – Finalmente se reportou a seu imediato. – Não deixarei mais ninguém morrer na Decrux.

Levantou-se e antes de sair da ponte, se dirigiu a Caeté.

– Faça um relatório do ataque e de nossa ação e, entre em contato com a segurança da República. Mas antes disso, ligue para o general Phil e passe a transmissão para o meu alojamento. – Voltou-se para o navegador. – Nos tire daqui, assim que a engenharia liberar, Tenara. Quero me livrar dessa entrega, logo. Espero que amanhã estejamos em Anglada.

– Certo, comandante!

Os dois oficiais responderam, prontamente. Oton seguiu Bridget pelo corredor. Os passos apressados, mostravam que ela queria se desvencilhar do amigo. Estava abalada pelo que fizera, mas não se arrependia.

– Brid… Brid!

– O que é, Oton?!

Virou-se, parando e respondendo ao oficial, rispidamente.

– Eu sei que não gostou de fazer aquilo e tampouco vou julgar sua ação. Apenas quero saber se está bem.

– Não. Eu não estou bem e sabe disso! – Inspirou fundo e deixou que o ar saísse completamente dos pulmões. – Sabe que não gosto disso, tanto quanto você. Mas, a alternativa deles nos neutralizarem, novamente, e dispararem contra nós, matando a todos, não era uma boa saída.

– Calma, Brid. Eu sei disso… todos sabem.

– Vamos entrar. – Bridget convidou, enquanto digitava a senha para abrir a porta de seu quarto. – Caeté já deve ter contatado com Phil.

– Não sei por que não faz o escaneamento de retina para a trava de seu alojamento. Por que ainda coloca senhas para abrir e fechar portas?

– Uma vez vi uma reportagem em que ladrões arrancaram o olho de um homem para acessar a conta bancária dele. Acho que fiquei traumatizada.

Riu levemente, levando seu imediato e rir junto. Oton balançou a cabeça em negativa. Às vezes achava os pensamentos da amiga, surreais.

– Mantenha a tranquilidade, Brid. A gente sabe que ele não falará a natureza da entrega. – Oton pontuou se referindo ao general Phil da República.

– É. Ele se fará de desentendido.

Assim que entraram no quarto, Caeté se comunicou, informando o contato.

– Comandante, General Phil está em contato. Libero na tela de comunicação de seu alojamento?

– Segure a transmissão uns minutos, Caeté. Cozinhe o homem, porque ainda vou me arrumar.

– Pode deixar, Brid. Farei com prazer.

A comandante percebeu o riso da oficial de comunicações. Ela detestava o general. Falava que ele era cínico e devasso, mas a comandante sabia que o homem já havia tripudiado sobre a origem dela. Escutara quando o fato ocorreu em uma festa de confraternização no comando da República, em que haviam convidado a Decrux. Brid riu de volta. Gostou de ouvir sua oficial, chamando-a pelo apelido. Demonstrava que o que tinha feito, não afetara a tripulação. Eles aceitaram a sua decisão.

– Brid, tem que parar de se despir na nossa frente.

– Eu não me dispo na frente de todos. Só na sua. Você é que tem que parar de olhar a minha bunda, enquanto troco de roupas.

– E pra onde vou olhar? Você faz isso toda hora!

– Olhe para a escotilha, como um homem decente.

Respondeu, rindo, e Oton bufou e, depois sorriu, vendo que Bridget estava mais tranquila. Era uma implicância que acontecia entre os dois há muito tempo. A verdade era que, quando ela fez pela primeira vez, queria testá-lo e ele não caiu na armadilha.

Terminou de se vestir com o traje oficial da nave. Apesar de não precisarem usar uniformes, por serem mercantes independentes, ela mandou fazer os trajes para que pudessem se apresentar melhor em eventos oficiais. Parecia bobagem, mas estas pequenas atitudes que assumiam, contribuía para que Decrux se tornasse uma nave de referência e respeito em todo território da República. Nunca faltava trabalho e nunca faltava dinheiro para pagar, decentemente, a tripulação.

– Como estou? – Perguntou se colocando de frente para o amigo.

– Parece que está cheirosa, mas os Deuses e eu, sabemos que é só aparência. – Gargalhou.

– Menos mal, que só vocês saibam disso. – Retrucou, acionando o comunicador.

– Caeté, pode passar a transmissão.

Ordenou, aprumando-se de frente para a tela de transmissão.

– Entendido.

A imagem de um homem grisalho, rosto anguloso, barba bem-feita e uniforme, apareceu na tela.

– Como vai, Comandante? Hoje me deixou na linha. Espero que tenha sido por uma boa causa.

– Um ataque de uma nave pirata é uma boa causa para o senhor, general? Estava verificando as avarias e orientando a tripulação. – Justificou-se, alfinetando, mas, logo a seguir, desculpou-se. – Perdoe-me a grosseria. Foi um contratempo que me deixou irritada, mas já foi solucionado.

– Claro que a desculpo! Se foram atacados em espaço da República, é algo inconcebível. Me passe os detalhes e cassaremos a nave. Prenderemos estes criminosos!

– Não é necessário, general. Infelizmente, destruímos a nave numa ação para nos proteger. Relataremos o ocorrido para a segurança da República. – Ela deu uma pausa para tentar perceber a reação do general e logo continuou. – Espero que não tenhamos problemas legais, com relação a isto.

– Não… Não. Claro que não. Eu, pessoalmente, liberarei o relatório. Vocês têm minha total confiança e estes tramites de liberação sofrem uma investigação tediosa. Certamente não precisarão passar por isto.

– Por nós, não há problema nenhum, general. Não me incomodo se tiver que passar por auditoria. Não gostaria que o senhor se comprometesse por um assunto que, tenho certeza, a Decrux seria prontamente liberada.

– Com certeza seriam liberados. Mesmo assim, eu os livrarei desse enfado. Estou indignado por saber que existem piratas circulando, novamente, por nosso espaço delimitado.

– Como queira, general.

– E a carga? Está intacta?

– O depósito da Decrux não sofreu avarias. Normalmente, piratas atingem pontos que imobilizam a nave, mas nunca o depósito. Não estragariam o fruto de seu assalto. Não se preocupe, o contêiner está intacto e lacrado, conforme recebemos. Será entregue assim que consertarmos a nave. Perdemos o núcleo de dobra e uma das propulsões.  Estamos a cerca de uma hora de Anglada e lá eu tenho meu hangar. Devemos levar dois ou talvez três dias para consertar.

– Tudo isso?

– Sinto muito, general. Este não foi o único ataque. Ontem passamos pelo mesmo e tivemos que parar na estação Virgo. Meu engenheiro chefe morreu no ataque de ontem e os outros dois estão em estado grave. Contei com a ajuda dos técnicos e dos engenheiros da estação. Desta vez, terei apenas os técnicos e meu conhecimento para consertar a nave. Talvez consiga em menos tempo, se arrumar algum engenheiro espacial capacitado em Anglada. Quer enviar outro cargueiro para nos encontrar e levar a encomenda?

– Não… Não. Confio na Decrux e ninguém melhor do que vocês para nos entregar. Espero um contato, assim que a nave estiver a caminho. Agora eu tenho que desligar. Desculpe-me a pressa, mas tenho uma reunião com o comando. Desejo um bom retorno.

– Obrigada, general. Até mais.

A transmissão foi interrompida.

– Por que falou que fomos avariados? _ Oton perguntou intrigado.

– Já lhe respondo, Oton. – Bridget acionou o comunicador. – Caeté, você enviou o relatório para a segurança da República?

– Ainda não, Brid. O relatório ainda não está concluído.

– Não envie agora. Quero fazer este relatório, pessoalmente.

– Entendido.

– Eu sabia que tinha algo errado, Oton. – Bridget encarou o amigo. – Há quanto tempo não vemos piratas circulando por este quadrante? O general está escondendo alguma coisa. Não era para termos sobrevivido. A República armou para nós e tenho certeza de que naquele contêiner tem algo ilegal.

– Ele se prontificou muito rápido em nos livrar de uma investigação e quando você falou que fomos atacados duas vezes, ele não se abalou.

– Não se abalou porque já tinha conhecimento do ataque anterior. – Bridget falava irritada.

– Enviará o relatório acrescentando avarias do segundo ataque na nave, Brid?

– E por que não, Oton? Eles não sabem o que aconteceu e assim terei tempo para pensar no que fazer.

– Não podemos ir para Anglada, agora que ele sabe que estaremos lá. A gente pode se complicar.

– Vamos para Anglada, sim. Vou dispensar a tripulação. Não quero que ninguém saiba disso, até decidir o que vou fazer, talvez não fique atracada lá. Eu posso navegar tranquilamente com a IA da Decrux.

– Eu vou com você, Brid, não importa o que fale. Sei que está pensando em me dispensar.

– Não vai, não. Eu enfiei todo mundo nisso e eu vou tirar a Decrux disso. Você tem família e se algo acontecer…

– Brid…

– … Não discuta comigo, Oton! Preciso de alguém baseado para ser meu apoio. Você me ajudará mais em terra.

– Como você é teimosa!

– Sou sim!

Os dois se encaravam raivosos. Oton sabia que não convenceria Bridget. Precisava, minimamente, que ela aceitasse sua ajuda, mesmo que estivesse em terra.

– Me prometa que me acionará, ou eu caço você até o fim do universo, sua teimosa.

– Isso é fácil. Eu prometo. Precisarei de alguém que não esteja na nave e que eu confie, independente do que eu resolva fazer. Talvez até faça a entrega para me livrar do fardo. Só tenho que achar um jeito de chegar até a base da República sem morrer antes. – Sorriu sem ânimo. – Eu tenho toda a documentação de contratação e se alguém se ferrar com essa entrega, não serei eu. Quero sair limpa disso e que o general Phil se foda! – Inspirou fundo para conter a ira. – Por favor, assuma a ponte para mim, mas não parta ainda. Tenho que achar um jeito de desviar a rota para Anglada sem que a tripulação desconfie. Depois quero descansar um pouco. Estou há dias sem dormir direito.

****

– Entre.

Bridget chamara a chefe engenheira em seus aposentos e autorizou a entrada, assim que ouviu o sinal da porta. Ficara durante uma hora pensando se confiaria na freyniana, mas ela era a única que poderia ajuda-la. Não tinha escolha. Observou a mulher entrando e parando no meio do cômodo. Às primeiras vezes em que a viu, vestia o folgado macacão dos técnicos de manutenção e agora que fora promovida, trajava o uniforme de oficiais. Bridget gostou bem mais da aparência, pois as curvas da mulher eram valorizadas pela vestimenta ajustada ao corpo. 

– Quer beber alguma coisa?

– Por que eu sinto que a conversa será longa e complicada? Desculpe-me, comandante, mas estamos parados há uma hora, sem qualquer destino, e isto me diz que alguma coisa aconteceu. Principalmente por estarmos sem rumo depois do ataque.

Bridget riu da forma direta com que Kara a abordou.

– Preciso da sua ajuda e não será um pedido fácil, assim que, acho melhor você beber algo.

– Para quem permaneceu dois anos longe das suas vistas, tenho para mim, que me dei mal quando apareci.

– Eu sinto muito, mas devo concordar. Talvez fosse melhor que não tivesse aceitado quando ofereci o cargo. – Sorriu desalentada. – Pelo menos pegue a bebida. Do que gosta?

– Nada de coquetéis com coisas estranhas de planetas cuja culinária é duvidosa. Um whisky me satisfaz. – Devolveu o sorriso.

– Hum, uma mulher de gosto simples e apurado. Gostei disso. – Bridget foi até o bar e derramou a bebida num copo. – Gelo?

– Sim, por favor.

A comandante estendeu o copo, reparando na chefe da engenharia. Ela a atraía. – “Há quanto tempo não sinto isto perto de uma mulher?” – Questionou-se. As mãos se tocaram e a comandante demorou um pouco mais a soltar o copo, permitindo-se apreciar a textura suave da pele da subordinada. Fechou e abriu os olhos, aprumando-se. Não estava ali para conquistas ou satisfações pessoais. A freyniana sorriu, mordendo o lábio, como um tique, depois baixou o olhar por segundos, e voltou a encarar a comandante. Bridget sabia o que era aquilo. Um sinal de que a mulher havia percebido a sua sutil investida. “Foi um deslize. Não sorria e se contenha, Bridget Nícolas”. Não escutou a própria consciência e devolveu o sorriso. Virou de costas, lentamente, rodando copo na mão para misturar o gelo na bebida. Queria ganhar tempo e cortar a interação entre elas.

– Desculpe-me, eu… Bom, vou direto ao assunto.

Bridget se voltou, outra vez, de frente para a engenheira. Narrou detalhadamente o ocorrido, suas decisões e, por fim, pediu:

– Preciso que relate um problema grave na nave nos obrigando a atracar. Quero dispensar a tripulação e que todos desembarquem, sem que saibam o que está acontecendo.

– Eu não farei isso. – Kara respondeu de pronto.

– O quê?

– É muito nobre o que está fazendo, mas isso é suicídio. Acha que conseguirá encarar a República, comandante? Essa nave é grande para que a conduza sozinha, mesmo que a inteligência artificial da Decrux possa navegar apenas com as suas ordens. Se acontecer alguma coisa, você não terá ninguém para auxiliá-la no conserto da nave e muito menos equipe médica.

– Eu enfiei a tripulação nisso e eu assumo a responsabilidade, ok? Não me importo em jogar esta porcaria contra o hangar da República, contanto que todos estejam seguros.

– Você nem conseguirá chegar lá. Olha…

Kara passou as mãos pelos cabelos, assanhando-os, nervosamente, gesto que despertou, mais uma vez, os sentidos de Bridget.

– … Eu era engenheira chefe do ministério aeroespacial de Freya. – Soltou a informação de uma só vez. – Lidei com autoridades da República, da Corporação e de planetas independentes. Eles não ligam. Se a carga não chegar do jeito que querem, não se incomodarão em destruí-la, contanto que não os denunciem.

– E o que quer que eu faça, hum?  Quer que coloque todos da nave dentro dessa merda? Eu só quero este favor e poderá seguir com a sua vida.

Bridget respondeu raivosa, diante de mais uma revelação que a surpreendeu. Incrivelmente o momento de enlevo se desfez, diante da contrariedade em ter informações sobre a vida pregressa da outra. Afinal, acabara de saber que aquela, que há dias atrás era uma simples técnica, foi uma mulher de influência dentro de sua nação.

 – E quem é você, de verdade? – Bridget continuava a questionar irada. –  Cada vez que conversamos, me conta mais uma… uma vírgula de sua vida. Está me contando as coisas em doses homeopáticas, por quê?

Kara a olhou, temerosa e pensativa. Tinha medo de se revelar, mas estava diante de uma mulher desesperada, que pedia a sua ajuda para se defender das mesmas forças que destruíram seu mundo. Tomou uma decisão.

– Hoje eu não sou ninguém, mas tem razão. Estou contando em doses homeopáticas, como você mesma disse, porque já levei muita porrada na cabeça.

– E tem mais alguma “gota” de sua vida que eu precise saber, nesse exato momento? Não me leve a mal, Kara, mas conduzo esta nave há seis anos, executando o meu trabalho tranquilamente. Em menos de quatro dias sou atacada duas vezes, descubro que meus contratantes estão armando para mim e que uma mulher trabalha há dois anos na minha nave e nunca a vi e, agora, tenho que confiar nesta pessoa da qual desconheço cada detalhe da vida. Prognóstico ruim, não acha?

Kara não conseguiu conter o riso, diante da narrativa da comandante. Tinha que concordar com Bridget. Se estivesse na mesma posição, teria largado a funcionária no primeiro planeta de fronteira aberta. Tomou um gole do whisky, para dar tempo de arrumar os pensamentos e responder a pergunta que a outra havia feito. 

– Está certo. Vou contar mais uma “gota” do que eu sou, mas não dá para contar tudo sobre mim numa conversa breve. Como eu disse, antes era engenheira chefe do ministério aeroespacial de Freya e fazia parte do governo. Fui uma das pessoas que tomei a decisão, burra, de não contra-atacar a Corporação. Carrego o fardo de ter auxiliado na condenação meu povo. Por isso falo a você: não conseguirá sobreviver. A República não é melhor do que Cursaz. Avisamos a eles, antes do ataque, sobre a investida e a declaração de ataque que Cursaz fez. A resposta da República foi que a guerra era nossa e não deles, mesmo sabendo das intenções de Cursaz lançar o phaser de nêutron.

Bridget meneou a cabeça em negativa. Não era possível que a República tivesse chegado a um nível tão baixo e se tornado tão corrupta. Estava atordoada. Kara viu a mulher se debater entre ira e desolação. Entendia este sentimento. Havia passado por ele. Por fim, a engenheira falou:

– Tudo bem. Eu ajudo você, mas com uma condição: eu vou junto. Antes de partirmos, instalo as Ampolas. Você sabe que não conseguirá fazer isso sem mim.

– Por que levaria você? Instala as Ampolas e eu deixo você num lugar que conheço. Ficará segura lá. Você não tem nada a ver com essa briga.

Kara balançou a cabeça em negativa, diante da teimosia da comandante.

 – Depende da perspectiva. A República também não tinha, supostamente, nada a ver com a nossa guerra. Essa inatividade da República fez com que cinco planetas independentes, deixassem de existir nesse quadrante. Estou há anos fugindo… me escondendo. Seus pais que não tinham, realmente nada com a nossa guerra, foram os únicos que se sacrificaram por nós. Acho que passou da hora de me redimir, um pouco, com a minha consciência e deixar minha covardia de lado. É pegar ou largar. Eu faço o que me pede, mas vou junto.

A comandante a encarou. Pela forma como escutara a engenheira falar, tinha quase certeza que ela atenderia o pedido, mesmo se Bridget não aceitasse o acordo.

– Não vou rejeitar e nem concordar com o que me pede. O acordo é o seguinte: se você relatar um dano na nave, teremos três dias antes que eu decida o que farei. Convença-me a levar você.

– Seu acordo é muito frágil. – Kara olhou para seu relógio de pulso. – Tem mais de uma hora e meia que estamos parados. A tripulação começará a especular. Ou eu vou, ou nada feito.

– Droga, Kara!

Bridget bradou e começou a andar pela sala. Segurou a empunhadura da arma em seu coldre e apertou com força. Acreditava que conseguia perceber as pessoas e suas intenções e, normalmente conseguia. Mas a freyniana a confundia.

– Está bem. Mas as coisas acontecerão do meu jeito, ouviu bem? Se em algum momento eu perceber que ficaremos sem alternativa, você pegará um módulo de transporte e deixará a nave.

– Está bem. Eu concordo. Agora me diga qual o defeito no seu painel de controle de segurança?

– Eu não tenho defeito no meu painel de contro…

Bridget interrompeu a fala quando viu o sorriso de lado que a engenheira chefe lhe deu.

– Na verdade, o defeito começou há mais de uma hora e meia atrás.

A comandante respondeu, sorrindo, se encaminhando para o painel e digitando a senha de liberação para que a engenheira atuasse. Kara se colocou diante da tela luminosa e começou a programar. Em três minutos induziu o sistema a um defeito, retroagiu no tempo a linha de ação do defeito e programou outra linha, escondendo a ação de sabotagem do sistema. O painel enviou um alerta para o sistema geral na engenharia.

– Sinto muito, comandante, mas só consigo consertar o defeito lá da sala de engenharia.

Kara falou com um ligeiro tom de ironia e sorriu, instruída, recebendo um sorriso de Bridget de volta. Estavam lado a lado. A Comandante, num ato instintivo, estendeu a mão e pousou no rosto de textura aveludada, acariciando-o com o polegar. Encararam-se por segundos e a engenheira não sustentou o olhar, baixando a cabeça, ruborizando.

 

Nota:  IA ou Inteligencia artificial  – “Não existe uma definição para inteligência artificial (IA), mas várias. Basicamente, IA é fazer com que os computadores pensem como os seres humanos ou que sejam tão inteligentes quanto o homem”, explica Marcelo Módolo, professor de Sistemas de Informação da Universidade Metodista de São Paulo. Assim, o objetivo final das pesquisas sobre esse tema é conseguir desenvolver uma máquina que possa simular algumas habilidades humanas e que os substitua em algumas atividades.

A inteligência artificial faz parte dos estudos de Ciências da Computação. Os programas utilizam a mesma linguagem de sistemas convencionais, mas com uma lógica diferente.

Fonte: https://novaescola.org.br/conteudo/1115/o-que-e-inteligencia-artificial-onde-ela-e-aplicada

 



Notas:



O que achou deste história?

7 Respostas para Capítulo 3 – Ciladas

  1. Não costumo ler muito histórias como essa, dei uma chance é estou mais cativa a cada capítulo.

    • Oi, Isa!
      Que bom que está gostando. Eu sei que ficção científica não é muito o estilo de muitas pessoas, mas queria fazer um romance diferente. Algo que juntasse possibilidades alternativas e dilemas, mas que fosse leve e dinâmico ao mesmo tempo. Espero que continue gostando!
      Obrigada, Isa! Beijão!

  2. Não sei qual das suas é mais apaixonante, mas não nego que me inclino muito para a Kara. Haha… Apesar da inteligência e firmeza, ela tem um jeitinho de perdida, dá vontade de cuidar! rs…

    Beijo, Mestra!
    (Cumprindo nosso acordo! Haha)

  3. Casal mais fofo e adverso ? a comandante é sangue nos olhos e a engenheira é a calmaria em pessoa . Quem venha mais aventuras
    Parabéns autora , começo de história muito foda
    Bjos da sua fã .

    • Oi, Flavinha! rsrs Engraçado que eu vejo muitas similaridades nelas, mas tem algumas diferenças grandes sim, principalmente culturais e em relação a espécie. rsrs As duas terão um caminho a percorrer nessa história que terá muita aventura também.
      Um beijão, Flavinha!

  4. Oi Carol,

    Puxa armaram pra comandante! Quero ver como ela vai se livrar dessa roubada. República safada ou só o general?! Hummm Brid e Kara rsrsrsr Torcendo pelos capítulos extras.

    Abrs ?

    • Olá, Lins!
      Armaram e armaram feio. Você nem sabe. rsrs E agora a Brid conta com a Kara para ajudar, mas que de segredos, ela tem muitos mais. rsrs
      Legal ver você por aqui e que esteja gostando! Daqui para frente as coisas começarão a esquentar muito para o lado da comandante, engenheira e nave Decrux!
      Beijão, Lins!

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