FREYA: A RECONSTRUÇÃO

Capítulo 32 – Ataque Mortal

Freya: A Reconstrução

Texto: Carolina Bivard

Revisão: Naty Souza e Nefer

Ilustrações: Táttah Nascimento


Capítulo 32 – Ataque Mortal

Vertana deixou seu subcomandante na ponte, para continuar o ataque à frota golpista, enquanto recebia no hangar de seu cruzador a tripulação da nave Zina. Coordenava a retirada de todos. A nave havia atracado há poucos minutos. Ela não queria que a tripulação inteira soubesse sua estratégia. Embora achasse que aqueles oficiais que não estavam dentro do golpe, não podia facilitar. 

O último a sair da nave foi o capitão que se apresentou a ela, prestando uma continência, que foi devidamente respondida.

— Teve dificuldades em sair da formação e atracar aqui, Capitão Niels?

— Não, senhora. A manobra foi fácil. Chegamos com relativo conforto. Tudo conforme, comandante.

— Ótimo! Agora nós dois voltaremos para a nave Zina. Precisamos preparar algumas coisas… Somente nós dois. 

— Não precisaremos de técnicos de manutenção conosco? O que iremos fazer?

— O que iremos fazer lhe direi assim que entrarmos na nave. Me acompanhe, Capitão.

— Sim, senhora.

— Tenente Hargnar.

Ela chamou o oficial do hangar e ele deixou o seu imediato na condução dos trabalhos, apresentando-se.

— Senhora.

— Quero que tire imediatamente todos do hangar, inclusive você deve sair. Só permanecerão aqui, eu e o capitão Niels.

Ele não questionou.

— É para já, senhora.

O tenente se afastou, iniciando a evacuação do local. O capitão Niels estranhou a conduta e não pôde deixar de questionar a ação.

— Se o hangar estiver sem ninguém, os caças avariados não poderão atracar, senhora.

— Não se preocupe com isso, Capitão, e me siga. – Ela tomou o rumo da ponte da nave de guerra. – Esse Cruzador é novo. Tem dois outros hangares e os caças serão direcionados para lá. 

Ele assentiu com a cabeça, acompanhando-a. Relaxou a postura, visto que a comandante também estava menos rígida, caminhando calmamente em direção à plataforma de acesso da nave Zina. 

— Eu o conheço pouco, Capitão, mas vi que teve sucesso na investida contra os golpistas. Analisei seus ataques, antes de atracar. Gostei do que vi.

O capitão sorriu brevemente, agradecido pelo reconhecimento.

— Obrigado, comandante. O que quer fazer com a nave?

Vertana sorriu também, retribuindo o gesto do capitão. Ela caminhava com calma e ele admirou, pois outra pessoa estaria correndo, de lado a outro, na situação que a frota enfrentava. Era uma guerra e estavam em dificuldades. Ele achava que esse posicionamento conferiria um certo ar de desespero e ela, não parecia abalada.

— Você verá. Aliás, é o único da frota de Freya que saberá o que irá acontecer. Conto com você.

— É claro! Tudo que precisar, comandante.

— Ótimo! Me acompanhe.

Conversaram sobre a batalha e sobre os desafios de romperem a defesa de casulo da frota golpista. Aos poucos, essa estratégia dos Bornors estava minando a frota, desabilitando várias naves. Muitas delas já se acumulavam para reparos nos hangares das naves de apoio que chegaram com o contingente da frota do espaço-porto espacial. 

Chegaram à ponte da nave Zina.

— Sente-se em sua poltrona de comando, capitão.

Ele não entendeu muito bem a posição da comandante, mas não iria questioná-la. Sentou-se. 

— Você será um herói, capitão.

Vertana falou calmamente e ele a fitou com um olhar de incompreensão. A comandante somente espremeu o olhar, travando os dentes antes de dar a ordem.

— Hup.

— Sim, comandante Vertana. O que deseja?

Uma voz masculina respondeu.

— Prenda o capitão Niels em sua poltrona. 

Tiras de aço saídos da própria poltrona prenderam os braços do capitão. Ele tentou se soltar de forma atabalhoada e desesperada, forçando as hastes que lhe prendiam.

— O que é isso, comandante!? — Perguntou desesperado.

— Sabe o que mais odiei de todo esse golpe? Foi descobrir, após vir para a batalha, que um capitão freyniano típico se vendeu para o inimigo. Tenha uma boa viagem, capitão. Em breve, estará entre os seus amigos.

— O quê? – Ele se sacudiu na poltrona – Não sou traidor! O que está fazendo?

— Ah, é sim! E disso, não tenho a menor dúvida. – Ela chamou a IA. – Hup, reproduza o áudio que captei da transmissão da nave. 

Um áudio com a voz do capitão conversando com o Ministro Kevin começou tocar. 

— Você está destruindo naves nossas, Niels! Que tipo de aliado é você?

— Não estou destruindo naves. Se observar, meus tiros são de baixa intensidade e somente em naves que estão com a capacidade plena dos escudos. O senhor não pode me chamar aqui na Nave, Ministro; poderei ser descoberto.

— Dê o seu jeito para nos passar as táticas que Vertana está articulando. Quero acabar com isso logo. 

— A comandante Vertana está conduzindo uma nova abordagem para o ataque. Ela não disse o que seria. Tive sorte de ser a nave que ela pediu para se apresentar e…

— Ela pediu especificamente por sua nave?

— Não, não. Ela quer para a abordagem a menor nave da frota e por sorte é a minha. Eu me prontifiquei para fazer a manobra que ela está elaborando. Assim que ela me disser o que deverei fazer, passarei para o senhor. Infelizmente, terei que abandonar a frota após informar, pois serei descoberto. 

— Hup, pode parar o áudio. – Vertana pediu para a IA. – Como vê capitão, você é um traidor. Não sei o que Kevin lhe prometeu e nem quero saber.

— Se me matar, sofrerá consequências. As leis de Freya não permitem esse tipo de atitude. Esse tipo de abuso!

— Ah, agora está evocando as leis de Freya. É isso mesmo, capitão?

— É! É! É isso! Eu delatarei todos que me aliciaram para o golpe.

Ele falou afobado, lembrando que havia a lei de proteção ao delator.

— É isso mesmo que quer? Para ser um delator, você tem que se declarar culpado.

Ela falou calmamente, se contrapondo a expressão de revolta que havia em seu semblante anteriormente.

— Sim, é isso mesmo! Eu me declaro culpado.

— Só para constar, eu iria deixá-lo preso aqui até o final desse conflito.

— Como?

— É isso mesmo. Acha que eu seria estúpida a ponto de jogar minha carreira fora matando você, depois de ter anulado a sua ação junto à frota golpista? Seria uma tolice infinda.

— Você é uma dissimulada! — Ele gritou, irado.

— Vamos acabar com isso. – Vertana foi firme, fazendo-o calar. – Já que você se colocou na posição de infrator, eu, Comandante Geral da Frota de Freya, evoco a lei marcial do comando de Guerra. 

— O quê? Você não pode fazer isso.

— Posso sim.

Vertana se posicionou solenemente em frente ao capitão. 

-– Como oficial superior no comando da linha de frente e tendo como testemunha a IA Hup que está gravando todos os diálogos para posterior comprovação, condeno-o à morte, após autodeclaração de um ato de traição, compactuando com inimigos do Estado em pleno confronto armado. Essa é minha decisão, irrevogável. Irá morrer no último cumprimento do dever, em manobra executada para a derrota do inimigo. Que se cumpra a sentença.

Vertana se retirou da ponte sem mais explicações, ouvindo os gritos de protesto do capitão. Foi para a ponte do cruzador e assumiu seu lugar.

A nave Decrux entrou no espaço da batalha. Não estavam distantes e em menos de dois minutos de dobra normal retornaram. 

— Temos campo de visão, Brid.

— Coloque na tela, Decrux. 

Kara entrou na ponte no momento em que a imagem da guerra tomava o telão principal. O grande cruzador se mantinha na linha de frente, enquanto caças e naves de guerra da frota tentavam furar o bloqueio do casulo, incessantemente. 

— Ugor não chegou. – Helga comentou. – Kevin deve ter feito um estrago no sistema deles.

— E eles são uns bundões. – Bridget retrucou. – Por que não comunicaram a nós?

— Brid, não tínhamos um pingo de energia. Nem para comunicações. Como sabe que não falaram com a nossa frota?

Caeté perguntou em tom cínico.

— Porque são uns bundões e tenho certeza de que não o fizeram. Helga, – Bridget chamou a atenção da Olaf – abra um canal para Vertana.

— Agora mesmo. – Helga respondeu. – Canal aberto, Brid. 

— Vertana…

— Vocês estão bem? Não sabe o alívio de vê-las, comandante. 

— Estamos bem. Tivemos alguns problemas, mas voltamos com sessenta e cinco por cento da capacidade. É só nos falar em que podemos ajudar. 

— Me dê alguns segundos e somente observem. Dependendo do resultado do que articulei, talvez tenhamos que atacar massivamente. A frota de Ugor chegará em dois minutos. A Tenente-Brigadeiro Edith entrou em contato conosco.

— Certo. Ficaremos no aguardo. 

Os tais dois minutos que a comandante da frota de Freya falara, pareceram horas. Na ponte da nave Decrux, Bridget apertava os braços da poltrona como se eles pudessem aplacar a sua ansiedade. Inúmeras estratégias passavam por sua cabeça para furar a barreira do casulo. Finalmente a frota de Ugor entrou no espaço de Freya, com pouco mais de quarenta naves. Eram de porte grande como o cruzador de Vertana.

— Atenção todos os aliados. – Vertana abriu o canal para a frota de Freya, Ugor e a nave Decrux. – Caças e naves de guerra de Freya, afastem-se do casulo e mantenham a artilharia à distância.

Viram as naves se afastarem, mesmo mantendo os ataques.

— Que merda está fazendo, Vertana?…

Bridget perguntou a esmo, espremendo o olhar para tentar definir o que via e acontecia no espaço de batalha. 

— Sinceramente, não sei, Bridget, mas ela é excelente em estratégias.

Kara respondeu e Bridget se voltou para trás para encará-la. A ministra estava de pé, observando com interesse a tela principal, onde todo o conflito era mostrado.

— Espero não precisar me preocupar com a sua comandante.

Bridget foi enfática e diretiva, chamando a atenção da noiva para ela. Kara balançou a cabeça com um sorriso disfarçado.

— Se fosse o caso, já teria que se preocupar mesmo antes que eu conhecesse você. Vertana é minha segunda em comando, há muito tempo, e me apaixonei por você quando te conheci, não foi?

— Boa resposta.

Bridget voltou a atenção para a tela.

— Para de palhaçada, Brid. O “negócio” está sério.

Decrux chamou a atenção de todas. Uma nave acabara de sair do hangar do cruzador e parou orbitando a grande nave. Ouviram outra vez a voz da comandante.

— IA Hup, executar a ordem cinco, dois, quatro. 

— Entrando em dobra. – A IA respondeu.

Viram a nave desaparecer e os comandantes e capitães das naves de Ugor e da frota de Freya que conheciam a nova tecnologia, sabiam que tinha entrado em dobra ponto-a-ponto. Em poucos segundos, uma explosão ocorreu no meio do casulo de defesa dos golpistas, abrindo uma grande brecha. 

— Ataquem, abrindo espaço na ruptura de defesa!

Viram as naves de Ugor atuarem em auxílio à frota.

— O que fazemos, Brid?

Decrux perguntou para a amiga que parecia estar hipnotizada. A comandante se aprumou.

— Não precisamos fazer nada. Com as naves de Ugor, os golpistas não terão chances. Foi um belo “Cavalo de Troia”.

— O quê? — Kara perguntou perplexa.

— Eu disse que agora não temos mais nada a fazer. Nossa nave não é imprescindível. Vertana colocou um “Cavalo de Troia” na armada golpista e abriu um buraco para que Ugor com as naves pesadas entrasse. Kevin e os outros estão acabados. Nossa nave não tem mais nenhum poder nessa briga. 

O silêncio prevaleceu na ponte até que Helga se pronunciou. 

— O que é “Cavalo de Troia”?

Bridget estendeu os pés, apoiando-as em uma barra à frente de sua poltrona.

— É uma história mitológica da Terra que fala sobre uma guerra. É longa. Uma hora conto a vocês.

Relaxou. 

Viam a armada de Ugor abrindo espaço na defesa golpista. Os guerreiros de Barnors começaram a debandar, saindo da formação, fugindo. 

— São ratos abandonando o navio. – Bridget falou, como se assistisse a um filme. – Voltarão para seu sistema, escravizarão os freynianos que estavam nas naves deles e tentarão reproduzir a tecnologia. Isto é um fato antropológico. – Virou-se para Helga. – Quando voltar para seu cargo, sugiro que faça uma força-tarefa para tirar essa tecnologia deles, senão se voltarão contra os outros planetas do sistema.

— Anotado, “antropóloga-consultora” Nícolas.

As brincadeiras entre elas não demoraram muito. Helga abriu um chamado para o cruzador e a imagem de Vertana apareceu na tela.

— Vertana…

— Sim, Olaf.

— Aquela nave que enviou estava sem ninguém, não é? Me diga que sim, por favor.

Helga parecia agoniada. Não admitiam sacrifícios voluntários em prol de vencerem batalhas. Seria uma dor de cabeça infinda para a comandante, caso ela tenha autorizado. Sofreria um processo militar para avaliação. 

— É… Sinto muito, Olaf, mas não posso afirmar isso. Mas não se preocupe. O que aconteceu com o capitão Niels foi totalmente legal.

— Uau! Quer dizer que tinha alguém dentro daquela nave? Eu mesma vou querer saber dos detalhes, comandante Vertana. 

Em meio ao comentário de Bridget, um canal de comunicação se abriu para todas as frotas. Uma imagem bizarra surgiu. Era tão incomum… surpreendente, que chamou atenção até mesmo das naves golpistas. O fogo cessou de ambos os lados e Bridget se ajeitou em sua poltrona, retirando os pés da barra, retornando a uma postura mais austera.

— Que ótimo, que todos estão dando atenção à casa Jorn.

Saga tinha Kevin sob seu poder. Uma faca de campanha na garganta, continha o traidor sob o jugo da rebelde. Ela estava atrás dele, empunhando a arma numa posição de degola. 

— Não me interessa o que pensam… O que ninguém pensa! – Afirmou com segurança e veemência. –  Essa mensagem é unicamente para a Olaf Helga, embora queira que todos testemunhem. Ela saberá por que faço isso.

Kevin se debateu nos braços da rebelde. Saga rasgou a garganta do ministro traidor e viram-no se afogar no próprio sangue. A rebelde o soltou e ele caiu, o sangue ainda estava vertendo através do ferimento. O foco da imagem ampliou e viram todos que estavam na ponte da nave Hide mortos. 

— Esse presente é para você, Olaf, e sei que me compreenderá.

— Não havia necessidade disso, Saga. – Helga tentava conter o horror estampado em sua face. – Ele seria julgado e provavelmente condenado à morte.

— Exatamente, Olaf. A palavra “provavelmente” foi o que ditou minhas últimas ações. Freya se tornou um planeta tão benevolente com seus inimigos que seria provável esse crápula escapar da morte. 

— Ele não escaparia.

— Não sabe disso, Olaf.

— Como conseguiu se esconder após se transportar?

— Ah, Olaf! Ainda duvida de minhas habilidades? – Ela gargalhou cínica e olhou diretamente para Bridget. – Você viu que mesmo quando estou na minha forma real, sou uma mulher difícil de encarar; não é mesmo, comandante?

—  Sei… Tem horas que você parece apaixonada por mim, Saga. 

Está tudo muito bem, mas agora é hora de ir. Só pra constar; matei todos aqui nesta nave. 

Ela não deu tempo de mais ninguém a interpelar.  Acionou a contagem regressiva de autodestruição da nave. Explodiria em 10 segundos. A rebelde fixou o olhar na câmera, segurou a faca em seu pescoço e cortou a própria garganta. O sangue espirrou, embaçando a transmissão. Provavelmente, as câmeras dos sensores haviam sido encharcadas com o líquido vermelho-intenso.

Helga sentiu uma ligeira vertigem. Se apoiou em um console qualquer. O estarrecimento geral estampava os rostos de todos.

— É a primeira atitude dessa louca que admiro.

As palavras de Bridget quebraram o silêncio desagradável que a atitude da rebelde provocou. A tripulação se voltou para a comandante, que continuava a olhar o vermelho vivo estampado nas imagens. Ela parecia imune à ação. Estava calma

— Brid! – Kara censurou a noiva.

— O que foi? Acha que por ter se matado eu sentiria pena dela? Pelo cosmo! Essa louca, junto com esse corno, nos levaram a uma guerra. Fora todos que ela matou e feriu para atingir seu objetivo. Essa, – apontou para a tela principal – foi a única coisa sensata que Saga fez até hoje. – Se voltou para a amiga-IA. – Decrux, migra a tela para as câmeras externas!

Bridget foi prontamente atendida. Viram o restante das naves golpistas dispersarem para todos os lados. Nem a frota de Freya ou de Ugor conseguiram conter a evasão. As naves pareciam insetos, voando em diversas direções, entrando em dobra. 

— Que merda! 

Escutaram a voz de Helga. A Olaf se sentou na poltrona do console de comunicações. O golpe havia acabado, entretanto haveria consequências. Ela não sabia bem o que sentir, rememorando tudo que passaram nos últimos dias. Decrux se aproximou, beijando o topo de sua cabeça. Ela conhecia bem a esposa para saber que Helga estava entre o sentimento de alívio e o de responsabilidade e tristeza.

— Todos estaremos com você. Não pense em mais nada agora.


Nota: Já perceberam que está chegando ao final, não perceberam? Preparem-se, pois agora não falta muito para acabar. Não esqueçam; se gostaram, deem um like ou comentem. Encherá de alegria o coração desta escritora que vos fala. rsrs 

Ah! Só para lembrar: Nós ainda estamos com a campanha de doações. Já tratamos com o web designer, mas ainda não temos o valor necessário. O início do próximo mês haverá novo sorteio entre as pessoas que doaram. 

Um beijão a tod@s!

O que achou deste história?

© 2015- 2021 Copyright Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem a expressa autorização do autor.