Freya: A Reconstrução
Texto: Carolina Bivard
Revisão: Naty Souza e Nefer
Ilustração: Táttah Nascimento
Capítulo 3 – Alomar Primordial
A revolta de Bridget não diminuía. Sua mente turbilhonava tanto quanto seus sentimentos. Sentir-se impotente diante de alguma situação era o que mais a abalava, principalmente quando era algo relacionado a Kara.
— Decrux, dispense Oton e Caeté. Diga para ficarem de sobreaviso, pois estamos numa situação de alerta de segurança aqui no planeta. Não poderemos tê-los por perto, a não ser que o Ministério de Segurança nos autorize. – Bridget pediu.
— Certo.
— Você já me avaliou inúmeras vezes, Decrux. Talvez o que aquela mulher tenha dito, seja uma alucinação!
— Fique quieta, Kara.
Decrux ordenou, tentando fazer a amiga sossegar sobre maca de escaneamento da enfermaria.
— Amor, não sabemos nada dessa pessoa. Estamos somente seguindo pistas. Só mais um pouco.
Bridget falou, segurando a mão da companheira.
— Culpa é uma merda, mesmo. Veja só o que fez com Brid; está até te chamando de amor!
Decrux falou rindo, recebendo um olhar atravessado da comandante e um sorriso da ministra espacial.
— Acabei. Pode se levantar, Kara.
— Viu? Não disse que não havia nada comigo?
— Na verdade, Kara, há sim.
Depois da revelação de Decrux, o clima na nave pesou. Contataram Helga e contaram a descoberta, deixando a Olaf preocupada e agitada, com o que a sua esposa detectara no DNA da amiga. Ela disse para que a esperassem, pois iria até a nave para conversarem pessoalmente. Todas estavam conjecturando inúmeras possibilidades, mas nada conclusivo.
— Helga chegou.
Decrux comunicou assim que a esposa entrou na nave.
— Recolherei a rampa de acesso, Brid.
— Ótimo. Assim podemos conversar com tranquilidade.
Helga entrou na sala de reuniões da nave, onde tantas vezes elaboraram planos para se livrarem da República. Desde que se estabeleceram no planeta, aquela sala era utilizada unicamente para reuniões da equipe de antropologia. Embora tivesse sido uma época conturbada, tinha inúmeras recordações boas daquele lugar.
Decrux foi a seu encontro e a abraçou, lhe beijando. Ela retribuiu, porém seu ânimo não era dos melhores.
— Decrux, coloque esta projeção para que todas vejam. – Entregou um plate de memória para a esposa. – Explicará o problema que detectou no DNA de Kara.
— Do que está falando, Helga?
— Por favor, Kara. Primeiro veja a projeção e, depois conversamos.
Intrigadas, as ocupantes da sala se calaram até a projeção começar. Um holograma da própria Kara se materializou diante delas. Parecia muito mais nova. A projeção tinha a identidade da engenheira-médica com cerca de vinte anos.
— Kara, certamente se está me vendo nessa mensagem, está mais velha e ocorreu algo, na qual foi necessário que fosse revelado a você o motivo da reprogramação genética. Sei que parece misterioso, mas foi essa decisão que tomou quando tinha vinte e um anos. Ou seja, eu sou a sua projeção quando fez a mudança em sua gênica.
— Parar reprodução.
Kara ordenou, atônita.
— O que é isso, Helga?
— Assista, por favor. Essa não foi uma decisão minha ou do alto comando. Foi uma decisão sua. Assista e entenderá. Não posso explicar melhor do que você mesma explicou para si.
Kara somente anuiu. Estava sem palavras e Decrux voltou a reproduzir.
— Quando entrei na puberdade, sofri muito e acreditava que fosse o despertar do genoma alomar. Meu mal-estar passou e não detectaram que eu havia debutado como alomar. Tempos mais tarde, quando tinha vinte anos, comecei a sofrer novamente transmutações aleatórias, mas, desta vez, foi pior e mais doloroso. Fui direcionada para o hospital da universidade, pois estava sofrendo uma mudança radical. Descobriram que sou um alomar, porém minha mudança era diferente de qualquer outro. Era peculiar, pois sabemos que este despertar ocorre na adolescência. Fui virada do avesso em exames para descobrirem o que tinha e os médicos, enfim, descobriram: Tenho a genética exata de nossos ancestrais, sem qualquer interveniências.
Kara estava estupefata, porém, a ansiedade de saber, não permitiu que parasse novamente a projeção.
— Ninguém da cúpula se lembrava da última vez que alguém nascera com a genética alomar primordial. Eu já fazia a primeira faculdade e abdiquei de uma posição para o teste de Olaf. O único problema seria divulgar a minha genética publicamente. Ter uma gênica alomar primordial significaria que os meus descendentes seriam alomares independente de quem seriam meus parceiros. Já estava apaixonada por minha esposa, irmã de uma alomar. Sabe bem quem. – A Kara jovem sorriu. – Nossa cunhada, Helga, era uma alomar que já passava pelos teste da cúpula. Se fosse competente, seria a sucessora do Olaf de Freya. Não haveria dúvidas que meu filho com Embla nasceria com a genética e com um percentual grande em ser um alomar primordial. Além disso, a população clamaria para me posicionar no cargo maior de Freya, pois esse seria o direcionamento de nossos protocolos. Eu não queria. Não queria para mim e não queria colocar essa carga histórica em meus descendentes.
— Que merda eu fiz?
Assim que Kara falou, a projeção parou imediatamente. Helga fitou a amiga.
— Eu não seria a Olaf de Freya. Você seria, Kara, e recusou-se terminantemente. Dizia que não era talhada para isso. Que seu despertar fora tardio demais e que não era apta. O alto comando a atendeu, visto a sua recusa. Nossos protocolos eram antigos e não faziam mais sentido, caso a pessoa que nascesse com a gênica primordial não quisesse.
— Então, por que não mudar os protocolos simplesmente?
— Eles foram mudados depois. Entretanto, se o fizéssemos naquele momento, talvez a população não aceitasse. Você sabe o quanto os freynianos prezam pela cultura ancestral. É quase como uma dádiva de “Eiliv”. Você mesma disse que se fosse revelado, a população não aceitaria a sua recusa.
— Pela Deusa Eiliv! O que mais aconteceu?
— Você disse a eles que não queria que a população soubesse. — Helga tomou um alento. – Eu não era nomeada, pois o Olaf Hakon ainda era vivo. Ele concedeu a você o que pediu, todavia gravou essa mensagem, quando assumi, e disse para que eu a guardasse. Me fez prometer que nunca lhe mostraria, exceto se acontecesse algo que fosse de suma importância, como por exemplo, você descobrir o que fez. Afinal, estudaria futuramente medicina genética e sua curiosidade sempre foi sua maior qualidade e, muitas vezes, sua maior dor de cabeça.
Kara silenciou, assimilando aquelas informações. Era um choque.
— Reproduza o restante, Decrux. – Pediu.
— Optei por reprimir meu genoma num processo de reengenharia-genética e, também, apagar este fato de minha memória. Imaginei que seria um grande fardo se não esquecesse. Minha vida seria mais tranquila e seguiria com um futuro limpo. Sem nada para trás. Não sei se quando você acionar este dispositivo, concordará comigo.
A Kara mais jovem da projeção sorriu novamente e voltou a falar.
— Na verdade, não sei se concorda consigo mesma, pois eu sou você. Peço que me desculpe, porque me conhecendo bem, se Helga precisar dar esta mensagem a você, sei que ficará furiosa. Odeio ser preterida de coisas que dizem respeito a mim e compreendo a sua ira. O problema é que sentirá raiva de si mesma. – O holograma gargalhou. – Irônico, não? Forças a você, “eu mais velho”, pois espero que supere o problema que causou a vista desta mensagem.
A projeção findou e Helga estendeu outro “plate” para a amiga.
— Tenho uma mensagem de minha irmã para você também. Embla gravou assim que você se decidiu, pois acreditava que, se um dia viesse a saber o que fez, ficaria furiosa.
— Acho que verei isso em particular.
Kara falou, pegando o plate, porém a sua expressão era uma incógnita. Não souberam se estava com raiva, triste ou mesmo chocada. Ela queria ver a mensagem de sua ex-esposa sozinha. Não foi contestado, nem mesmo por Bridget. Saiu da sala.
— Que maravilha, Helga! – Bridget explodiu, após Kara sair. – Excelente ter escondido isso de nós! Minha esposa tem uma genética que, para vocês de Freya é “foda”, e tem um alomar psicopata atrás dela por conta disso e, nos diz somente agora?
Helga a olhou impassível. Não cairia no nervosismo da comandante. Embora soubesse que era uma situação extrema, fez o que sua consciência lhe demandou. Não abriria esta lacuna na vida de sua amiga, sabendo que ela mesma havia lhe pedido em promessa.
— Agora, alguém me explica a inferência dessa genética para que eu possa colocar, sem remorso, um furo na cabeça da cretina que enganou minha esposa!
— Que bom que esteja considerando Kara a sua esposa.
— O que quer dizer com isto?!
Bridget encarou a Olaf.
— Vocês duas podem parar com esse histerismo, agora! Não ajudará no que temos que descobrir. – Decrux interferiu e virou-se para a Olaf. – Já estamos cadastradas no Ministério de Segurança?
— Acredito que a esta hora, já. Saí da reunião assim que acabou e vim direto para cá.
— Como conseguiu guardar estes plates de memória? Você saiu por último do planeta, pouco antes dos destróieres da corporação Cursaz destruí-lo. Tempos depois, foi capturada.
— Eu tinha um cofre em minha sala do comando do planeta Freya, onde guardava bens pessoais importantes para mim. Levei-os comigo e quando me acomodei no espaço da República, coloquei em um cofre público. – Por que a pergunta, Bridget? Está desconfiando de que esta projeção seja falsa?
— Não é isso, Helga. É que estava imaginando que se conseguiu salvar isto, talvez tivesse salvo algo importante do governo.
— Infelizmente, não. Os arquivos do governo eram extensos. Não havia tempo para gravá-los. Trouxe somente coisas pessoais que estavam no cofre. – Helga fechou os olhos por segundos. – Espere, talvez não esteja de todo errada. Quando os freynianos começaram a chegar aqui neste planeta, alguns deles haviam sido oficiais na velha Freya e trouxeram arquivos que conseguiram salvar antes da destruição. Abrimos um espaço de memória na central do governo para os arquivos antigos, porém começamos do zero nossa nova base. Colocamos lá, para o caso de necessitarmos pesquisar.
— Posso acessá-los? – Decrux perguntou.
— Abra um link para que eu possa liberá-lo daqui. Está protegido com minha chave de segurança. Entre no canal do gabinete central do governo e faça o link.
Assim que Helga pediu, Decrux começou a vasculhar os caminhos pela rede do governo. Não era difícil, visto que ela havia auxiliado a compilar o novo sistema do governo de Freya, somente não era mais autorizada a acessá-los, pois voltara a trabalhar na nave com Bridget em explorações antropológicas. Não fazia sentido que ela tivesse entrada nas áreas de segurança do sistema do governo.
— Pronto.
Assim que Decrux falou, uma grade do sistema do gabinete central apareceu uma imagem multidimensional sobre a mesa. Helga colocou a mão espalmada sobre um leitor holográfico, liberando a base de dados de segurança do gabinete.
A Olaf começou a passar com os dedos as pastas e páginas de arquivo que não lhe interessavam, fazendo-as sumir da projeção até que finalmente achou o que importava para elas.
— Aqui está. Dividimos em áreas, pois são fragmentos do que existia no governo da antiga Freya. Todos os arquivos são incompletos e é uma colcha de retalhos.
— Que tal começarmos pelos canalhas. – Decrux sugeriu. — Vejo que há um arquivo de uma colônia penal.
— Sim, há. Felizmente, a diretora desta colônia conseguiu sobreviver aos anos de exílio na República e retornou. Aliás, é uma das base de dados que estão completas, pois ela fazia backup todos os dias para seu implante neural de memória.
— Como é? Vocês implantam chip de memória em seus cérebros? Isso é proibido!
— Acorda, Bridget! Era proibido na República. Freya não fazia parte da adesão de planetas do “Espaço Delimitado”.
Decrux a alertou e Bridget se sentiu idiota. Percebeu que ainda estava vinculada às convenções de seu antigo lar.
— Foi mal. Se acharmos alguma coisa, lembre-me de agradecer à ela.
— Não se amofine, Brid. Também não era uma prática vista com bons olhos em nosso planeta, porém, não era proibido. Dificilmente víamos pessoas que se rendiam a esse artifício para facilitar a vida. Mesmo Dedra, a diretora da colônia, não havia explanado para nós do comando, na época. Ela o fez, para facilitar seus reports diários de segurança.
Helga abriu o arquivo.
— Vejamos primeiramente o arquivo dos funcionários. Esse alomar não se arriscaria a entrar na nova Freya como ele mesmo, caso fosse detento.
— Detenta, Brid. Essa colônia penal era feminina. Concordo com você, entretanto não fiquemos animadas, pois estamos somente especulando. As colônia de detentos foram liberadas para o transporte na última hora, antes do ataque. Praticamente as naves penais saíram junto com a minha e só temos o arquivo de uma delas. Também não creio que detentos freynianos viessem para cá. Seriam presos e, após anos no espaço da República, já tem outra vida. Não se arriscariam.
— Mesmo assim, Helga, essa alomar não devia ser boazinha na velha Freya. Presos com delitos leves, podem se emendar, enxergar uma nova chance, mas aquela pessoa que foi atrás de Kara, com certeza era…
— … Uma psicopata.
Escutaram a voz de Kara complementar o que Bridget falava. As outras mulheres olharam para a porta, vendo a figura da engenheira-médica entrando. Estava com os olhos inchados.
— Não liguem para minha aparência. Minha carga de choro acabou e agora estou com muita raiva. Quero pegar quem fez isso comigo!
Kara mostrou as mãos e, em um segundo, elas se transformaram em garras de caranguejo, voltando ao estado normal, logo a seguir.
— Pelo visto, na clínica, não pesquisaram somente uma forma de fazer a mudança para inseminação. Desbloquearam meus genes alomar que o “eu mais novo” havia inibido.
— Essa mulher quer ter um filho alomar primordial. Que corna safada!
Bridget destemperou.
— Sei quem ela é.
Helga falou de súbito. Seu rosto estava desfigurado. Há tantos anos que não pensava nos problemas da antiga Freya que eles se tornaram distantes em sua mente.
– Vejam. – Falou entredentes.
Ela procurou dentre as detentas, uma em especial. A imagem apareceu, juntamente com a descrição dos delitos e da identidade.
— Único alomar que até hoje foi preso. Todos eram identificados desde cedo e acompanhados, até o momento de decidirem o que fariam de suas vidas. Esse sempre foi o fardo dos alomares. Nunca deixamos que qualquer um ficasse sem supervisão, pelas inúmeras implicações de nossa genética. Esta mulher, o pai era contra qualquer tipo de interferência governamental. Sempre dificultou a identificação dela.
— E ela se revelou uma mulher contra o sistema. – Decrux concluiu.
— Sim, e não somente isso; Ela assassinou várias pessoas do governo, tomando a identidade delas e assumindo cargos importantes. Quando percebemos, já havia tomado o lugar de alguns funcionários e estava no cargo de Ministro da Justiça. Seu erro foi que, cada vez que pulava de um cargo para outro, o funcionário anterior sumia. As investigações revelaram onde os corpos eram desovados, mas nunca o assassino. Foi quando desconfiamos sobre o assassino ser um alomar, querendo chegar até o topo.
— Não estou desculpando a cretinice desta alomar, mas convenhamos, o governo interferir na vida particular de alguém é muito invasivo. – Decrux pontuou. – Não condiz muito com a filosofia de liberdade e respeito à individualidade de uma pessoa, que o sistema de Freya sempre prega.
— Ninguém interferia, ou interfere, com a liberdade de ninguém. Os alomares eram mapeados, bem como os freynianos típicos no nascimento. É a nossa forma de identificação individual dentro do sistema social. Apenas orientávamos para quando chegasse o momento da transmutação na adolescência, a procurar os centros de auxílio. Todos viviam suas vidas conforme queriam. Ninguém os obrigava a nada. Tanto é que, na adolescência, quando o pai dela se recusou a mandá-la para um destes centros de orientação, não interferimos.
— Helga, meu amor, você disse que ela não havia sido identificada.
— E não foi. Freynianos típicos e alomares são identificados no nascimento, entretanto, na puberdade, alomares são identificados novamente, pois sua gênica modifica. Foi nesta hora que o pai dela recusou. Se ela não tivesse sido presa, nunca a teríamos no sistema de identidade.
— Como a pegaram?
— Ela se esqueceu que não havia só ela de alomar no governo. – Helga sorriu. – Eu a atraí, tomando o lugar de minha secretária e me fiz de rebelde. Foi uma ação orquestrada com a segurança. Me infiltrei em meu próprio gabinete, pois pelas investigações, quem estivesse fazendo aquilo, queria chegar ao poder maior. Ela mesma me contatou, achando que eu era uma mulher descontente com o status quo.
— Eu lembro disso. Agora que falou, me lembro dela.
Kara se adiantou, olhando para a imagem da mulher.
— Coloque a imagem dos funcionários da colônia penal, Decrux. Ela não se infiltrou no planeta como ela mesma e teve que ter alguém próximo para se metamorfosear. Provavelmente, uma carcereira. Cruze com a identificação do sistema de segurança para ver quem veio para a Nova Freya.
Decrux obedeceu a Bridget imediatamente. Poucos haviam sido os funcionários da colônia penal que chegaram ao novo planeta: Três carcereiras, um auxiliar da cozinha, sete guardas da torre de vigilância, a diretora e cinco funcionários administrativos. Os perfis passavam pelos olhos de todas, aos poucos.
— Pare, Decrux! – Helga pediu. – Essa foi a única funcionária da colônia penal que não quis reassumir a função antiga. Disse que no “Espaço Delimitado” tinha uma nova profissão e não queria voltar ao sistema.
— Kara, esse rosto apareceu lá na clínica?
— Não, Brid. Nunca vi essa mulher.
— Ela é inteligente. Nunca se arriscaria a se infiltrar na clínica com o rosto do qual entrou em Freya.
— Helga tem razão. – Decrux pontuou. – Se ela foi tão esperta para enganar o governo da antiga Freya, não falhará num quesito como esse. Podemos voltar ao plano em que Helga conseguiu capturá-la, com algumas variações.
— Ela ficará atenta, Decrux. Mas diga o que está pensando.
— Amo quando admite que sou mais esperta que você.
Decrux riu debochada para Bridget.
— Não admiti coisa nenhuma. Você é mais inteligente que eu. Pudera com seu cérebro de hipopótamo… Ser mais esperta, nunca. Ainda terá que “comer muito chão” para isso. Desembucha logo o que pensou, vai.
— Hipopótamos têm cérebros mínimos, Brid.
Decrux retrucou.
— Ops! Desculpe.
Bridget sorriu, escarnecendo da piada que fizera. Decrux revirou os olhos.
— Vamos deixar as suas infantilidades de lado. – Voltou-se para Helga. – Podemos afastar Brid e você se colocar no lugar dela. Kara será ela mesma e nós, faremos a vigilância de vocês à distância. Quando se afastar de Kara, estaremos na espreita. Há algum alomar na equipe de Inteligência da segurança?
— Não apenas um. Temos vários. Muitos alomares que retornaram, já eram da Inteligência e foram realocados.
— Ótimo! Pois nenhum alomar consegue ficar tanto tempo transmutado. Terá que sair de casa para dar lugar a outro e descansar. Kara poderá eventualmente trocar de identidade, para sair de casa sem ser rastreada, já que é um alomar, agora.
Decrux falou, reparando na engenheira-médica com compaixão.
— Ela é alomar, porém temo que deverá aprender como se transmutar, preservando sua integridade física. – Helga contestou. – Aprendemos como nos resguardar, quando começamos nossa mudança. Ela não teve essa chance.
— Você pode me ensinar, enquanto fica comigo em casa.
— Posso, porém não é algo que se controla de uma hora para outra. Leva algum tempo, Kara. – Helga voltou-se para o sistema e acionou os canais de comunicação.
— O que vai fazer, Helga?
— Investigar essas pessoas da colônia penal que entraram na nova Freya, Brid. Quero saber se alguma delas desapareceu. Achamos que é esta garota que não quis retornar para a sua atividade anterior no sistema penal, todavia, não sabemos efetivamente.
Helga se afastou para se comunicar com a Segurança de Freya através da comunicação codificada da nave.
— Ótima ideia, Helga. – Bridget falou, virando-se para Decrux. – Entre no sistema da nossa casa. Vasculhe qualquer indício de violação da segurança. Essa mulher transmutada em mim, ou mesmo em Kara, pode ter entrado na casa anteriormente e ter feito alguma conexão externa do sistema.
Decrux meneou afirmativamente e buscou as conexões da nave com a casa de Bridget e Kara.
— Entrei no sistema. Bem pensado, Brid. Se ela estivesse transmutada em uma de vocês, o sistema da casa não detectaria qualquer invasão. Levará algum tempo até eu conseguir escanear todo o sistema.
— Recebi resposta da Inteligência. – Helga alertou. – Nos enganamos. Não foi a moça de quem “Saga” capturou a identidade.
— Saga?
— Esse é o verdadeiro nome da alomar que estamos procurando, Brid. Ela entrou no sistema como Niels Hardag. Um dos guardas vigilantes das torres. Ele sumiu há uma semana. Vinha faltando ao trabalho há algum tempo. Dava sempre desculpas, dizendo que estava difícil a adaptação ao ciclo de horas do planeta.
— O ciclo de horas deste planeta é mais próximo ao da antiga Freya do que o meu, de vinte e quatro horas, Helga. Desde que comecei a tomar os reguladores de periodização, não tive mais problemas.
— Sim. A verdade é que a maioria dos freynianos nem precisa. A variação daqui é de somente três horas para o ciclo da antiga Freya. Eu mesma, não tomo.
— E nem eu. – Kara afirmou. – Desde que saímos do ciclo do Espaço Delimitado, nunca mais tomei. Não conheço ninguém que teve dificuldades com isso, visto que adotamos aqui um período menor de trabalho para que o nosso período de sono pudesse se adequar. Ela fazia isso para poder se recuperar dos dias que ia a clínica. Ficava transmutada muito tempo. Primeiro na colônia penal como guarda e depois, na clínica como funcionária.
— O órgão da segurança penal já havia aberto uma investigação para o sumiço do guarda Hardag.
— Creio que deva passar essa investigação para a Inteligência, Helga.
— Farei isso agora, Brid. Me deem licença. Vou falar com o Ministro de Segurança diretamente.
— Não faça isso por seu comunicador pessoal. Faça através da comunicação da nave. Assim, Decrux pode garantir que sua ligação não seja rastreada.
— Não estou fazendo…
Helga parou por segundos, olhando Bridget indecisa.
— … Existem protocolos e eu estou burlando.
— Sei que existem protocolos, Helga, e concordo com eles, porém, há situações que devemos saber se os protocolos nos atenderão.
— Brid tem razão, meu amor. Sabe que se não houvesse uma probabilidade grande dela estar certa, não apoiaria a ideia.
— De quanto de probabilidade estamos falando, Decrux?
— Até agora, sessenta e oito vírgula sete por cento. Escaneei somente a casa de Brid e Kara e estou na metade do sistema primário do gabinete central. Já encontrei duas linhas criptografadas, estranhas ao sistema. E a casa das meninas, com certeza está sendo monitorada remotamente. Não desfiz a conexão externa para não levantar suspeitas ao que vamos fazer.
— Se as linhas criptografadas do gabinete também forem de monitoramento externo, não interfira também, para não a alertar. Alguém terá que tomar meu lugar no gabinete, para que eu esteja com Kara.
— Não será melhor você continuar no gabinete e colocar os alomares da Inteligência comigo?
— Não!
Tanto Bridget, quanto Helga falaram juntas. Entreolharam-se e Helga meneou a cabeça para a comandante.
— Eu conheço a genética intrínseca dela. Na época em que a prendemos, quando ela voltou a forma normal, fiz um contato direto. Assim que, se ela invadir a casa, transmutada em outra pessoa, eu poderei identificá-la.
— E você, Brid? Por que não quer deixar outro alomar a esse encargo?
Kara estava calada, até aquele momento, e a sua ira se avolumava aos poucos, como uma caldeira de pressão. Sentia-se violada e, ainda mais, por uma condição de sua vida e genética que, até então, desconhecia. Seu “eu mais jovem” tinha razão. Estava furiosa consigo mesma. Como pudera fazer aquilo consigo? Achar que bloquear sua genética alomar a livraria de problemas futuros? Por que não deixou a lembrança do que fez?
— Porque confio em quem conheço; e Helga, eu conheço. – Bridget respondeu para a namorada. – Sei que ela fará tudo para pegar essa cretina. Além do que, eu não costumo deixar a cargo de outras pessoas o que é importante para mim. Estou abrindo mão de estar com você, por saber que é o melhor para pegar essa criminosa… Por mim, estaria junto, mas se algo saísse errado, Decrux não me deixaria esquecer disso, mesmo que, eu mesma, não me deixasse esquecer.
— Eu só não entendo por que ela se arriscou tanto, se poderia ter esperado para que você colhesse material. Ele ficaria disponível na clínica para a fertilização “in vitro”. Era só ela roubar.
— Pois eu sei por que, Helga. – Kara respondeu. – Como é ainda uma pesquisa, tudo é sigiloso. Desde as amostras, os relatórios e análises… Tudo mesmo, para que não haja interferências ou violações. O grupo de indivíduos que participam têm seus próprios cofres com as suas análises e materiais, onde, todo dia, só pode ser aberto através da liberação do próprio, juntamente com o pesquisador responsável. O leitor da trava do cofre identifica o nosso DNA.
— Ela trabalhou na clínica para conseguir desbloquear o seu DNA junto com os estimulantes hormonais. – Decrux deduziu.
— E após desbloqueados, você passaria pela fase de transmutação. Não conseguiria acessar seu próprio cofre. – Helga conjecturou.
— A cretina não poderia correr esse risco, então, arriscou-se com a invasão em nossa casa. Essa mulher pensou em tudo!
Bridget concluiu o raciocínio das amigas com raiva na voz.
— Desculpe… – Kara falou, abatida. – Não estou bem. – Voltou-se para Decrux. – Vou à enfermaria. Você pode me acompanhar?
— Lógico, Kara!
Decrux respondeu, chegando perto da Ministra Espacial, amparando-a e Bridget se adiantou, para apoiá-la também.
— Vamos!
Bridget falou alarmada, sendo tocada no braço pela namorada.
— Não, Brid. Estou só cansada e Decrux pode avaliar se há algo errado. Fique com Helga e planejem a captura dessa louca. É a única coisa que me fará sentir bem.
A comandante anuiu, deixando que elas se fossem. Estava furiosa, porém, não mais do que o temor que tentava esconder. E se esse desbloqueio genético afetasse a saúde da mulher que amava?
— Falarei somente uma coisa a você, Helga. Se pegarmos essa mulher e eu sentir que ela escapará da justiça, terá que me prender por assassinato, pois não permitirei isto.
Falou com raiva.
— Saiba que convenci a cúpula a dar carta branca para você, Brid.
— O que isso quer dizer?
A comandante perguntou, intrigada.
— Que a cúpula interpreta que você está dentro do sistema e eu interpreto que é alguém que pode atuar…
— É arriscado para você. Sabe disso. Está me dando permissão para matá-la.
— Não é arriscado, se você ainda for a pessoa que conheci quando me resgatou. Sei que não matará por nada. Não quero que ela seja morta. Tenho um sentido de justiça muito particular. Alguém como ela, pode nunca melhorar, principalmente se sua pena é perpétua. Porém, ela estar presa numa colônia penal, significa trabalhar. Seus ganhos são revertidos para mantê-la em boas acomodações no sistema e o excedente do que produz, reverte para a família.
— Ela ainda tem família?
— Não. Mas não é disso que se trata. Se não tem família e puder ter condicional, o dinheiro excedente ficará num banco, para quando sair. Se for prisão perpétua sem condicional, alimentará crianças órfãs, idosos e por último, sistema de educação e saúde.
— Entendo. Não há maior castigo do que isso. A morte é uma solução fácil.
— Mais ou menos isso, Bridget. O fato é que pessoas que não tem tanta periculosidade, podem ser reintegradas socialmente. Aprendem uma profissão, se querem estudar. Trabalham e tem um ganho, e quando saem, questionam-se se é vantajoso retornar à antiga vida. Alguns retornam, mas quando presos novamente, produzem para sua existência. Não causam ônus ao sistema e ainda, tem oportunidade de mudar.
— Você quer colocar na minha cabeça que não é bom acabar com a vida dessa cretina.
— Está errada. Tento dizer a você que, se matá-la, que seja por não ter alternativa. Ter alguém como ela no sistema, é uma dor de cabeça para nós, entretanto, é uma punição muito maior do que a morte.
Kara deitou-se na cama de exames com dificuldade. Sentia-se enjoada e com vertigens. O peito pesava como se uma camisa de força apertada a esmagasse.
— Você queria sair da sala somente?
Decrux a confrontou, puxando o escâner de exames sobre ela. A engenheira-médica continuou muda e de olhos fechados por alguns instantes, respondendo a pergunta da amiga em seguida.
— Estou realmente nauseada, mas acredito que seja emocional.
— Pode ser também. Não é só isso que vejo aqui.
Decrux virou a tela do escâner para que Kara olhasse, afinal, ela entendia bem sobre engenharia-genética.
— Sabe que tenho conhecimento de muitas civilizações, entretanto, “meu pai” me deu, somente, um conhecimento geral sobre medicina dessas mesmas civilizações. Não sou especialista em nada, em termos médicos, e principalmente da fisiologia de freynianos. Vocês praticamente não existiam na base de dados de Ugor. Acredito que você possa interpretar melhor essas mudanças em seu corpo.
— Pela Deusa Eiliv! Meu genoma está sofrendo mudanças muito rapidamente. Um alomar costuma sofrer “a transformação” ao longo de semanas, dependendo, meses até!
— Então, seu corpo poderá sofrer muito, com esta mudança brusca.
Kara engoliu em seco. Não tinha a menor ideia do que poderia lhe acontecer, porém, pelo que sabia da transformação de alomares, onde as mudanças se davam paulatinamente, sofreria muito, com algo ocorrendo tão rápido.
— Chame Helga. Ela acompanhou a transmutação de muitos alomares. Era uma acompanhante-orientadora na época de faculdade, antes de se tornar a Olaf. Espero que consiga dizer o que está acontecendo comigo…
Kara urrou, sentindo uma dor aguda no abdômen, fazendo Decrux acionar a comunicação interna da nave, chamando a esposa com urgência.
Nota: Pessoal, hoje estou um pouco enrolada para responder os comentários da semana passada, mas amanhã estarei livre e começarei a respondê-los, ok?
Um beijo à tod@s!
Carol, vou sair correndo e te abracar…vc brocou geral!!
Nao pude esperar porque fui deixar as páginas prontas pra ler outro dia a estória e tinha uma forca gravitacional maior que a do buraco negro me chamando…kkkk.
Cabrito disse ” safe”, “Ione” outra,entao..sobrevivi! Cada dia vc se supera, de onde vc tirou essa??!! Star trek e todas as demais!!!!!!Hauhauhau.. até a nave é igual! Hauahuahua
Me sinto bem,sem crises de ansiedade e agora comecarei a ler os zumbis…as les devem ser punk!! Será q uma se transforma e a outra tem q buscar a cura?! Ou uma é imune ou simplesmente sao as que saem atirando em todas.. que vergonha, n cheguei a ler a propósta de Marcela..
Até terca com FREYA!!
vEREI ZUMBILESLÂNDIA!!
Beijusss na ALMA
Oi, Lailicha!
kkkk Adorei a força gravitacional. kkkk Buracos negros são poderosos mesmo. kkkkkkk
Em falar em Star trek, Você começou a assistir a nova temporada de Discovery? Cara, não assisti o primeiro episódio ainda pra deixar acumular. rsrs Sou daquelas que se deixar, faz maratona. rsrs
Eu acho que já leu a de Zumbi. rsrs Errou nas duas hipóteses. rsrs Mas tá valendo, vi que comentou lá, então, sei que gostou. rsrs
Valeu, Lailicha pelo carinho de sempre!
Um beijão pra você e fica na paz!
Será que Kara engravidou, sei lá de que jeito e o bebê está crescendo veloz e furioso?! Tá, tô viajando, mas sei lá, tanta coisa que a gente não esperava acontecendo! hahaha
Só sei dizer que estou gostando muito.
Bjãoooo
Oi, Pregui!
Olha, nada é impossível. Vamos esperar para ver. Quem sabe o novo capítulo responde algumas perguntas… E cria outras. hahahahaha
Brigadão pelo carinho, Pregui!
Um beijo grande pra você!
Nossa!!! Que situação difícil. Tá complicado pra nossas meninas, mas vamos esperar o desenrolar disso tudo, ainda mais a Brid com carta branca.
Ótimo capítulo e aqui a espera pelo próximo
Bjs
Oi, Blackrose!
Olha que a situação vai ficar mais hard… E Brid vai ficar mais irada. rsrsr
Vamos ver o que acha do capítulo de hoje. rs
Valeu, Blackrose!
Um beijo grande pra ti!
Mulher, praticamente nem pisquei lendo esse capítulo! Que trama é essa, misericórdia! Louca, como sempre, pela continuação.
Abrs, o/
Tudo bem, Lins?!
Então veremos o que acha do capítulo de hoje. O bicho vai continuar pegando. rsrs
Valeu, Lins, pelo carinho!
Um beijo grande!
Meninaaaa!!!! Quéisso!?? Intrigante demais, sufocante a espera pelo desenrolar desta trama! Acho que vou aprender a roer as unhas (coisa que nunca fiz) deste jeito. Barbaridade tchê!
Oi, Ione!
Ih! se eu fosse você não pegaria esse vício, não, porque a coisa vai ficar um pouco mais intensa. rsrs
Depois me diz o que achou do capítulo de hoje. rsrs
Brigadão, Ione!
Beijão pra você!
Situação difícil. Mas com certeza é com amor e paciência irao superar.
Oi, Carla!
Então, concordo contigo. Sem amor e calma, nada vai pra frente.
Brid pode parecer “ogra”, mas ela é apaixonada pela Kara.
Valeu! Um beijo, Carla!
É assim??
Sem nenhuma dica do q vai acontecer?? Só nos deixa na aflição.
Q coisa feia a se fazer com as leitoras…
PIOR… UMA SEMANA AGUARDANDO O NOVO CAP.
Tu tá mto má Carol,
Um cap. maravilhoso, parabéns.
Tudo bem contigo, Nádia?
A espera terminou. rsrs Não ou má, não. Só quero dar emoções para vocês. rsrs
E essa semana tem mais emoções. Não terminou ainda. rs
Olha, se eu conseguir escrever bastante essa semana, pode ser que na outra solte cap extra, mas não vou prometer. Sacomé, nem sempre as ideias conseguem sair para o word da forma que a gente quer. rs
Brigadão, Nádia!
Beijão pra ti!