DOIS ANOS DEPOIS…

– Lelo Love?!!! – ouvi seu grito na sala e já sabia bem o que estava por vir.

Fechei os olhos, respirei fundo, contei até três e a porta do nosso escritório se abriu para que você entrasse.

– Seu filho fez de novo! – e jogou a almofada em cima de mim, irritada – Não suporto mais! Ele não tem jeito! – dizia, enquanto andava de um lado para outro. Verifiquei a almofada cheia de furos.

– Vida… – não pude continuar porque você tomou a almofada de minha mão e saiu do mesmo jeito que entrou.

Fui atrás, mas você entrou no quarto e bateu a porta na minha cara. Fui até a sala e encontro Lelo deitado, olhando pra mim, miando aquele mio de sempre. Olhei sério para ele, peguei-o no colo e levei até o quarto deles.

– Vai ficar aí até se comportar direito, ouviu? – tranquei a porta, peguei meu celular e liguei para Sílvia.

– Não sei mais o que faço com ele. Love está enlouquecendo! É a terceira almofada este mês… Preciso de um especialista… Procura um pra mim?… Certo… Agradeço, um beijo… Um pra Marina também.

Entrei no quarto já sabendo do teu estado de espírito.

– Não fale nada! – você já foi dizendo, deitada na cama com os braços cobrindo os olhos.

Não falei, subi na cama, fiquei de joelhos de frente pra você e peguei seus pés, beijando-os, lambendo-os. Senti toda sua pele arrepiar-se.

– Que você tá fazendo? – sua voz era um sussurro e meus lábios já comiam tuas pernas.

– Te falando em outra língua… – sorri já chegando em tuas coxas – Adoro quando veste essa camisola, vida…

– E eu odeio quando seu filho me tira do sério!

Tentou escapar, mas te prendi com meu corpo, colocando minha perna entre as suas.

– Já estou cuidando disso, amor. Sílvia vai achar um especialista e ele vai ficar bem… Olha pra mim… –  você abriu os olhos e nem mesmo um céu estrelado se compararia com este brilho. Brilho de mulher, da mulher que amo e quero. – Amo você… – não resisti dizer.

Beijei teu colo e ouvi as batidas de teu coração como uma música frenética. Tuas mãos agarraram minha nuca, assanhando meu cabelo e meus instintos da libido. O gosto de tua pele e teu perfume misturou-se ao suor já revelado pelo desejo. Fizemos amor. Demorado. Cheio de verdades e, ainda, descobertas, mesmo depois de tanto tempo. Ficamos abraçadas. Você mexia em meu cabelo e eu, atrevida, repousava minha mão em teu “lugar perfeito”.

– Vida? – você respondeu com um gemido – Acho que vou querer que o Lelo coma mais algumas de suas almofadas!

E soltei uma gargalhada enquanto você me dava tapas carinhosas. Dormimos.

Abri os olhos suportando o peso habitual sobre mim, o teu peso de 1,76m e constituição óssea proporcional, contra meus 1,67m de constituição forte, mas ainda pequena. Incrível sensação de bem estar como o costume de respirar tua grandeza. O código era meu beijo em teu pescoço e via teu corpo se virar, num alarme só nosso. Você sabia que me levantaria e teu sono seria preservado até chegar a xícara de leite queimado com canela, as torradas de alho que encomendava de Marina, minha irmã, e meu beijo em seus lábios.

– Bom dia, minha vida! – me deixava beijar sem a língua.

– Bom dia, linda…

Quando olhava a bandeja, me devolvia o olhar. Eu servia sua caneca, colocando a torrada em sua boca enquanto você tomava o leite.

– Sabe que dia é hoje? – perguntei enquanto te acariciava as costas.

– Não… – essa resposta veio entre uma mordida na torrada e um gole na caneca.

Cheguei mais perto, te envolvendo com os braços, fazendo você largar o café da manhã. Olhei bem dentro de teus olhos, tirei uma mecha de cabelo que caia sobre teu olho, passeei os dedos suaves por teu rosto.

– É dia de te fazer feliz como todos os outros que virão. Todos os dias, serão dias de te fazer feliz e eu farei.

– Marina! Que surpresa! – abracei-a assim que entrou.

Abraço apertado com ela se demorando no contato, permiti.

– Que saudades… – ela disse meio constrangida – Creio que não esperava que viesse.

Dei meio sorriso de quem sabe tudo.

– Desembucha logo! – sabia quando queria dizer o que não queria, quando tava forçando a própria barra.

– Cris, cadê? – sentou no sofá dobrando as pernas como de costume.

– Trabalhando, chega ás nove. E o Biel, como está? – senti o desconforto imediato dela.

– Está com a Sílvia, ela o levou pra ver o avô.

– E? – tentei estimular a conversa.

– Vou te dizer o que é… Sílvia tem dois congressos em Quebec. Eu recebi proposta de uma empresa alemã para analisar um projeto ambiental importante e vamos ficar fora quinze dias. – levantou em sintoma nervoso – Não quero deixar ele na casa daquela louca! Ela nunca aceitou que a filha me escolhesse como ‘esposo’! Não quero meu filho com ela! – ela chegou bem perto de mim e soltou – Fica com ele por estes dias? Ele é um lorde, você sabe.

Suspirei um pouco e ela entendeu o dilema.

– Sei que Cris ainda não superou o fato do aborto…

– Superou, sim! – rebati  com força demais – É só que tenho que falar com ela. Não posso decidir só. – vi os olhos de minha irmã lacrimejarem.

– Se achar que é muito sacrifício, não tem importância, só não queria meu filho perto de quem não o ama.

Me deu um beijo no rosto e já ia saindo quando a puxei de volta.

– Ele fica comigo.

Nos demos o abraço da cumplicidade que sempre existiu entre nós.

– E Cris?

– Converso com ela. – respondi sabendo do desafio.

Sexta-feira à noite. Nossos filhotes (só no modo de dizer) já se aninhavam em minhas pernas pedindo o colo antes de nanar. Um a um, fui dando o carinho merecido colocando-os em suas cestas. Voltei pra cozinha onde preparava nosso jantar cortando algumas verduras, quando senti teu abraço.

– O que minha rainha faz na cozinha? – disse e, ao me virar, recebendo teus lábios nos meus num beijo demorado, quente.

– Encontrando meu amor… – era tua voz suave me respondendo com carinho. Beijamos-nos mais uma vez.

– Pro banho, mocinha. – fui te empurrando sem parar de te beijar, até o quarto.

As roupas já não existiam. O chuveiro nos banhando e o carinho extremo entre duas pessoas que se respeitam e têm a coragem maravilhosa de se conhecerem e se permitirem. Estes momentos eram feitos de comunhão, pois sabia muito bem quando você só queria carinho. O mesmo acontecia com você. Sexo, nestas horas, era dispensado. O que queríamos, simplesmente, era sermos apenas… Nós.

Nosso jantar era regado a conversas das mais variadas: teu trabalho, o meu. Dávamo-nos ideias… Troca…

– Agora, me diz o que está te deixando tão apreensiva. – tua pergunta.

Não respondi de imediato. Peguei tua mão e te levei pro sofá. Acomodadas, teu corpo me servindo de repouso, tuas mãos massageando meus braços, me senti mais à vontade.

– Marina esteve aqui hoje. – teu toque foi interrompido.

– Algum problema com Biel? Ele está bem?

Eu, dessa vez, fui quem te massageou os braços, te tranqüilizando.

– Lembra quando  Marina o trouxe pra gente ver? – senti teu corpo estremecer um pouco. Mudei de posição pra poder te beijar a boca – Você o olhava com um misto de ternura e medo. E eu sabia que você estava ligando as coisas. Ele tinha quase a mesma idade de nosso filho ou filha, se vingasse.

Neste momento teu estremecimento me levou a te envolver num abraço carinhoso.

– Eu sei… Marina sabia. Nunca dissemos nada, apenas observamos teu jeito de amar sem se envolver. Você nunca pegou Biel no colo, mas teve uma vez, ele estava aprendendo a andar, eu e Marina o chamamos, mas não adiantou, caminhou pro teu lado e tropeçou… O que aconteceu? – senti teu beijo em minha testa.

– Não podia deixá-lo cair.

Deitei minha cabeça em teu ombro.

– Mesmo assim, não pegaste ele no colo. Deixou-o sentado no chão. Não vou fazer mais rodeios. Marina e Sílvia vão ficar fora 15 dias a trabalho e eu aceitei ficar com ele.

Você se levantou rápido, quase me derrubando do sofá.

– Ótimo! Então tudo já está resolvido. Que bom que me comunicou, eu agradeço!

Engraçado como eu conhecia cada reação sua e o quanto eu tentava contornar cada uma delas, mas, dessa vez, não era eu quem tinha que contornar essa situação.

– Você ouviu quando disse EU aceitei ficar com Biel? – você olhou pra mim como se não entendesse. – EU me comprometi com Marina. Só quero saber de você se posso ficar com ele aqui ou se fico com ele no flat do centro. Não quero te impor nada, mas gostaria que fosse aqui por três motivos: a praia, os filhotes e, principalmente, você!

Fiquei te observando ir pro quarto. Essas horas eram difíceis e como era difícil ir contra sua vontade, mas o fazia pelo bem de nosso amor te mostrando os dois lados.

Duas horas depois, entrei no nosso quarto. Você estava virada de costas pra porta e fui direto pro banheiro fazer os rituais de sempre. Deitei quieta, olhando o teto e louca pra sentir seu abraço, seu contato tão necessário para meu sono. Não vi nenhuma reação. Deu-me as costas pela primeira vez em quase três anos e eu não te procurei.

Meu coração era uma batucada desordenada, doía cada compasso e descompasso. A luz do abajur era a única e eu, que era quem quebrava o clima sempre, me vi sem reação. Não conseguia deixar de chorar. Meu pranto era de dor por sua dor. Sabia da batalha que travava e teria que deixar você travá-la só. Queria tanto te dar o carinho que transbordava em mim, mas não podia. Era tua decisão. Deixei escapar um soluço, me encolhendo mais um pouco na cama, quando senti teus braços me puxando, tua boca em meu pescoço.

– Não sei se posso… – teu abraço se estreitou mais ainda.

Virei-me para olhar seu rosto.

– Não aceitaria o pedido de Marina se soubesse que não poderia. É só deixar ser o que tiver de ser, vida. Não se force a nada. Deixe-o vir, não faz nada que não queira. Ele é só uma criança… Uma criança que nem tem dois anos, indefeso… Imagina ele na casa daquela louca. – teus lábios alcançaram meu colo.

– Nunca. Ele fica conosco, mas não prometo nada. – a tua língua já massageava meus seios.

– Nunca mais me dá as costas, vida… Tua rejeição é minha morte. – e nos amamos muito.

E lá estava ele no braço de Marina. Cabeça loira, olhos esverdeados meio de gato. Vestia um macacão azul de bolinhas brancas e o boné também azul. Segurava um coelho que já não tinha uma orelha. Foi colocado no chão e já partia em minha direção.

– Oi, amigo! – abracei-o apertado e o sacudindo. Ele gargalhava quando fazia isso. Te olhei de soslaio. – Titia Cris também quer abraço.

O soltei e ele te viu.  Te olhava daquele jeito curioso que sempre teve quando isso acontecia, e tua reação era sempre sair dando uma desculpa antes que ele te alcançasse. Ele foi meio inseguro, sempre olhando você, talvez esperando a mesma reação. Você ficou parada, quando ele alcançou sua perna com uma mão enquanto a outra ainda segurava o coelho de pelúcia que ergueu pra você balbuciando.

– Têio… têio… – era como chamava o brinquedo.

– Bem vindo, Biel. – acariciou-lhe a cabecinha e se retirou.

Meu suspiro foi maior que o esperado.

– Ela está se esforçando, né? – Marina disse pegando Biel no colo pra se despedir.

– Ela ama esse menino, Marina, mas tem medo de sentir isso. É difícil pra ela, mas sei que vão se dar bem.

Ela me passou o fofinho e deu-lhe um beijo na testa.

– Fica comportado com as tias, entendeu? Ou vamos ter uma conversinha séria quando eu voltar. – me entregou a valise dele. – Fica com as chaves de casa. Se precisar de alguma coisa que eu tenha esquecido. – me abraçou e depois beijou com carinho o menino loirinho que se derretia pra ela.

– Vamos ficar bem, não se preocupa. Ligo pra você falar com ele todos os dias. Também contratei uma babá que me dará uma força. Vai com Deus.

Depois que Marina saiu, fiquei com aquela preciosidade nos braços.

– Que tal vermos os gatos, hein?

O pus no chão e o levei pela mão até o quarto dos bichos. Give, que não era assim tão social, amava-o e amava o “Têio” também. Cheguei a comprar um parecido pra ela, mas não adiantou. Ficamos a tarde assim. Você não apareceu e eu não queria forçar tua barra. O jeito era esperar.

Depois de brincarmos muito, notei que Biel estava com fome e parecia um pouco sonolento. Marina havia deixado o cardápio e eu havia providenciado tudo.

Enquanto ele permanecia um pouco quieto na cadeira eu fazia a comida dele e a nossa. Dei-lhe um banho primeiro, a minha experiência com os sobrinhos no Brasil me valeram nessa hora. Oito horas da noite e ele dormia tranquilamente agarrado no Têio.

O quarto de hóspedes ficava bem ao lado do nosso, então mantive a porta aberta por via das dúvidas. No nosso quarto, você deitada na cama, lia concentrada. Eu me despi e fui pro banheiro. Precisava relaxar e sabia muito bem o que me deixava completamente relaxada. Mal tive tempo de terminar meu pensamento quando teus braços fortes me envolveram por trás. Recostei a cabeça em teu peito fechando os olhos e entendendo porque te amava tanto. Essa sensação de paz, mesmo o mundo se acabando lá fora.

– Nem me chamou pro banho, linda…

Fiquei de frente pra você sem desgrudar meu corpo nem um milímetro do seu, afagando seu rosto, enviando-lhe o olhar de todo amor incontido…

– Sim… Te chamei e você ouviu, por isso está aqui.

O beijo começado na ânsia de demonstrar carinho foi se perpetrando mais e mais. Queria que você entrasse em mim, literalmente falando, quando senti tua mão avançar para onde eu queria e, quando chegou, foi forte, quase desfaleço de tesão. Estávamos quase lá quando ouvimos um choro. Teu afastamento foi tão rápido que quase caio no chão do banheiro, mas você me segurou a tempo.

– Desculpe! Me assustei.

Te abracei de novo. – Vou lá ver o que aconteceu…

– Deixa que eu vou.

Você disse e saiu apressada, depois voltou por que estava nua. Pegou o roupão enquanto eu sorria de teu atrapalho. Depois te vi voltar de novo e lavar as mãos. E meu sorriso se transformou em gargalhada.

Cinco minutos depois que você saiu, pus o roupão e fui até o quarto de hóspedes. Sentada na beira da cama, você balbuciava uma música de ninar entre soluços contidos pra não acordar o menino, enquanto acariciava a cabeleira loira com extremo carinho. Meu rosto já estava tomado pelas lágrimas. Sentei-me por trás de você e te abracei pela cintura te ninando também, cantando contigo a canção antiga.

– Ele poderia ser nosso, não é? – você sussurrou.

– Sim… O nosso seria tão lindo quanto… Ele já dorme, vem.

Te puxei pela mão em direção ao nosso quarto. Deitamos e eu te protegi com meu corpo.

– Agora vai ficar tudo bem, vida. – você me olhou com tanta ternura que me senti corar. – Que foi? – perguntei beijando teus lábios de leve.

– Às vezes eu acho que você não existe, que é um sonho. Aí eu preciso te apertar, te fazer reagir, pra sentir que você é de verdade. Te amo tanto… Não saberia o que fazer sem você. – teu abraço foi ficando mais forte.

– Vida, você sabe o quanto sofremos para chegar até aqui, eu e você. Tudo o que passamos de bom e de ruim. Me sinto culpada pela perda de nosso filho. Se eu tivesse ficado e lutado por você, por nossa família…- disse com a voz estremecida pelo choro.

– Não, linda… Você não teve culpa. Na verdade, ninguém teve e eu sei disso agora. Vai ficar tudo bem.

Esta era uma certeza que havíamos conquistado naquele momento em que expressamos nossos pensamentos sobre teu aborto. Agora via em seu olhar algo diferente: não havia mais aquela pequena sombra que nos afligia de vez em quando. Agora você e eu estávamos livres e prontas para nunca mais temer nenhum sentimento, nem mesmo o da perda.

E os dias seguintes foram maravilhosos. Muitas vezes, quando chegava em casa, te encontrava dormindo no sofá com Biel, e isso me dava uma sensação de completude incrível. Eu te acordava e você colocava Biel na cama. Fazíamos o ritual de toda noite: teu chá ou teu leite que, sem você perceber, troquei por desnatado (mas com ingrediente secreto pra não notar), nossa conversa antes de dormir.

– O anjo foi maravilhoso hoje. – você disse se aconchegando. – Pena que ele vai nos deixar amanhã.

Te abracei mais forte. Durante minutos longos permanecemos assim, quando te puseste em cima de mim, segurando meu rosto.

– Quero um filho nosso. – fiquei te olhando com a dúvida. – Quero um filho seu. – disse tão suave que nem compreendi direto o que a frase queria dizer. – Quero um filho seu. — repetiu e eu nem sabia mesmo o que responder, mas a conversa prometia ser muito longa. – Quero ser mãe, Endless. – você recostou a cabeça em meu ombro e eu afaguei teus cabelos com cuidado.

– Sabe muito bem no que isso implicaria. Cuidar do Biel durante estes dias foi ótimo, mas quinze dias não dão noção do que é cuidar de uma criança, temos viagens constantes. Está disposta a abrir mão de coisas que levaram anos para ser conquistadas? A mudar completamente nossa vida? Quer mesmo tanto assim ser mãe?

Tua resposta foi um silêncio duvidoso, então fiz com que olhasse pra mim.

– Eu estou. – te disse sem tirar um só segundo meu olhar do seu, e esse olhar que nos demos, tratou de selar o destino de nós duas para algo novo: transferir para um outro ser todo nosso amor construído e fortalecido.



Notas:



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3 Respostas para Capítulo 1

  1. Coma…..complicações

    Não acredito….trate de acordar Endless Love…não é o momento de desistir

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