UM ANO DEPOIS…
Ainda absorvia em meu corpo as últimas vibrações de teus toques quando te senti mais uma vez sugando toda a minha pele e me levando de volta pro mundo maravilhoso do qual acabara de chegar. Havia uma sede incomum em teus gestos, uma voracidade que me surpreendia, mas que, também, me avisava de uma mudança íntima. As crianças fariam um ano na semana que vem. Passavam o fim de semana na casa de Marina e nós tínhamos a oportunidade de nos darmos com mais liberdade. Mais um gozo e você me trancou em seu abraço como achasse que eu fugiria. Não permitiu um movimento sequer. Apenas consegui te beijar o rosto suado do esforço feito. Tua respiração ainda procurava se acalmar e em teus olhos o reflexo do que seria nossa conversa, do que foi tua atuação como amante.
– Vou viajar na segunda-feira.
Já tinha ouvido esta frase várias vezes, mas esta não me pareceu como as outras. Estava carregada de informações que viriam a seguir.
– E…
– Vou me demorar mais do que normalmente. – você me apertou ainda mais.
– Aonde vai? – segundos, minutos e não tive coragem de insistir na resposta.
Tentei me livrar de teu contato, mas você não deixou.
– Brasil… – te olhei procurando algum vestígio que me desse uma idéia do que seria. – Linda, preciso ir ao Brasil resolver assuntos… pendentes… e acho que vai demorar um pouco… eu… – senti a dificuldade pra me explicar o que pretendia fazer em nosso país.
– Nós vamos com você. – senti o exaspero impeculiar te tomando.
– O que vocês vão fazer lá?! Vou estar ocupada o tempo todo!
Consegui me livrar de seus braços e levantar indo direto pro banheiro, batendo a porta com força e, finalmente, você tinha acabado com o estoque de minha paciência.
Me sentia cansada e você me parecia da mesma forma. Vinha com isso há dias, mas fiz meu papel: o de te esperar. Esperar que confiasse o suficiente para me contar.
Nossos filhos eram a luz de nossa casa. Se davam bem entre si, mesmo sendo humanos e gatos. Não era raro vê-los brincar juntos, mas respeitando os espaços uns dos outros. Giovanna estava impossível. Lelo ficou no chinelo perto dela. Os criávamos e eles nos ensinavam muito. A paz… A calma… O conforto da existência deles. Pensando nessas coisas fiquei um bom tempo embaixo do chuveiro. Resolvi sair do banho demorado e percebi sua ausência na cama. Fui te encontrar na cozinha com um copo com água na mão olhando pela janela. Fiquei te observando e pela primeira vez não te decifrava, mas sentia que podia de algum jeito, te ajudar a resolver o que quer que fosse. Dei meia volta pra sair e você se virou me vendo. – Endless… – eu parei ainda de costas. – Me perdoa o mau jeito de a pouco. Só me dá um tempo pra absorver algumas coisas que estão me perturbando. Esclareço melhor quando voltar… Por favor…
– Quando NÓS voltarmos. – me virei e te encarei, vendo a mesma reação de antes em teus olhos. – Chega! Não imagino nem por um segundo sequer estarmos separadas por tanto tempo. Nós vamos para o Brasil não importa se vai ter tempo ou não. Vou estar todas as noites do seu lado esperando a hora em que vai me contar tudo, mas do seu lado, você entendeu ou vou precisar desenhar?!
A minha voz era tranquila, mas você sabia da força que as palavras pronunciadas tinham.
O clima entre nós não era dos melhores. Um silêncio que só era quebrado pelos bebês, e à noite quando te recebia nos braços e te guardava da dor que era também minha. Era quando te sentia relaxar aos poucos e adormecer depois de algumas lágrimas. Nestes momentos tinha a nítida sensação de que, sem você, eu apenas sobreviveria. E momentos, desde os primeiros e-mails até o nascimento dos gêmeos, me davam uma força desconhecida que me fazia te amar e querer, acima de tudo, proteger você e nossos filhos. Uma dor misturada a uma certeza de que sabia exatamente o fim de tudo ou o começo. Sabia o que te afligia, mas não o saber dos detalhes. Era o saber da essência. Sabia pelo o que passaria e te lia num livro sem palavras, mas repleto de sentimentos e emoções. Isso sempre te assustou. Isso sempre foi questionado por você e minha única explicação para o fato era… Amor.
No avião os bebês estavam tranquilos apesar da situação nova. Engraçado que em ambientes desconhecidos eram perfeitos e educadinhos. Você ficava o tempo todo olhando pela janela sem dizer nada. Me deixou tratar do assunto “filhos”. Eles dormiam quando percebi que você também não tinha resistido ao cansaço. Sentei ao seu lado e nos envolvi na coberta. Recostei a cabeça em seu ombro sentindo seu perfume, o calor do corpo que pareceu ficar tenso de repente com a proximidade. Resolvi me afastar quando seus braços me impediram num abraço forte.
– Fica assim comigo… preciso descansar… o dia amanhã não será fácil, tenho alguns…compromissos difíceis.
Aprendi a conhecer teus medos, mas esse era bem maior que os outros já vividos. Reconheci no timbre da voz, no intervalo entre as palavras, na respiração pouco regular. Eram detalhes que eu conhecia como se fossem meus. Minha mulher estava tensa e sofria. Sofrimento físico que eu absorvia na pele. Deus como doía. Ficamos abraçadas. Você dormiu. Eu não.
No aeroporto quem nos aguardava era Carla, amiga sua, eternamente apaixonada por ti. A reconheci de imediato, mesmo tendo a visto apenas uma vez. Caminhou para nós num misto de apreensão e felicidade que se transformou em pura felicidade quando lhe sorri sincera, demonstrando que estava tudo bem. E ela sorriu mais ainda com os bebês que faziam festa nos carrinhos.
– São lindos! – disse se agachando depois de te abraçar forte e de apertar minha mão com calor.
– Como ela se parece com você, Cris. – mexeu com a bochecha de Giovanna que se derreteu para ela, depois olhou pra Gian que já mandava brasa nas risadas e levantava a mão como se quisesse pegá-la. – E esse mocinho lindo, hein? – ele se ria. – Cachinhos castanhos iguais aos da mamãe Mirian. – de repente observou mais profundamente. – E esse charme, essa maneira de olhar tão profunda. – olhou para mim novamente. – Tem o seu charme.
Ao ouvir isso, você fez uma cara de cinismo tão grande que não conseguimos conter a risada. Vimos como ficou vermelha de repente e paramos para não cutucar a onça com vara curta.
– Parece que estão se dando muito bem, não é mesmo? – mostrou todo o sarcasmo na frase.
– Vocês devem estar muito cansadas e os bebês também.
Carla disse já pegando boa parte de nossa bagagem e indo na nossa frente falando de como tudo estava, das providências tomadas para a chegada dos bebês no seu apartamento. Falando… Falando… E você continuava absorta em algum pensamento bem longe dali. Ela nos deixou em casa e disse que apareceria para o jantar. Esperou uma resposta sua que não veio então intervi.
– Será muito bem vinda, Titia Carla. – disse em meu, em seu e no nome dos gêmeos.
Te acomodei no sofá, enquanto preparava a comida dos famintos que estavam brincando no quarto preparado para eles. Um silêncio revelador pareceu se instalar de repente. Fui à sala para te ver e a cena que iria presenciar ficaria eternamente gravada na minha e na sua memória. Um menininho apenas de fraldas te acariciava o rosto e com a boca aberta te babava em todos os lugares dele, emitindo os mais variados sons. Teus olhos eram puro amor e ternura. Estavam marejados. Ele continuava a te babar e com mãozinhas pequeninas te apertava as bochechas, a boca alcançou teu nariz e ele parecia tocar um instrumento fazendo um barulhinho parecido com uma corneta. Quando ele o soltou, de todos os sons feitos até agora, reconhecemos uma meia palavra muito esperada por nós..
– Mama… buuu – meu coração veio a boca e ele repetia.- Mama…buuu…
Presenciei tua emoção até chegar aos soluços. Me aproximei e o segurei com carinho dizendo que mamãe Cris tinha que descansar e ele não parava de apontar para você e repetir a palavrinha mágica. Levei-o para o quarto e voltei com uma fralda na mão, me agachei e limpei teu rosto babado. Você segurou minha mão e a beijou docemente.
– Obrigada… – disse com voz embargada.
– Pelo quê? – respondi te acariciando as faces.
– Por eles… por nós… Por ter vindo comigo, apesar de minha teimosia.
Neste momento te beijei os lábios já me aconchegando em teu corpo ganhando espaço no sofá, colocando minhas pernas entre as suas numa pressão gostosa.
– Endless… – teu sussurro quase detona meu tesão inteiro.
Eu continuava a pressionar teu sexo devagar, sugando seus lábios com calma, envolvendo tua língua, ouvindo teus gemidos. Senti a tensão de teu corpo chegando e fui parando devagar, me separando de você e te olhando com desejo.
– Eu sei… Fica calma… não vai precisar fazer nada… nenhum esforço… só recebe… relaxa… Vai te fazer bem…
Essas foram as últimas palavras antes de eu te dar um orgasmo revigorante e apaziguador. Te deixei dormindo no sofá, alimentei as “draguinhas” que dormiram imediatamente, e fui preparar nosso quarto. Te acordei com um beijo, te levando pro chuveiro. Água bem quentinha. Na cama, você voltou a me envolver na paz que nos unia agora. Agora que você precisava tanto dela.
A campainha estridente me irritou. Levantei meio grogue e abri a porta querendo matar quem a tinha tocado. Carla com a cara surpresa me disse meio confusa.
– Atrapalhei alguma coisa? Volto amanhã…
Então lembrei que ela havia avisado que viria jantar. Eu estava de penhoar, certamente os cabelos desalinhados e a cara do maior sono.
– Não… – segurei seu braço fazendo com que ela entrasse. – Fica, desculpe, o cansaço me fez esquecer que tínhamos convidada para o jantar.
Ainda meio atordoada, fiz com que ela sentasse no sofá. Sentei junto fechando os olhos. De repente uma ideia.
– Faz o seguinte, você é tia oficial. – a puxei até o quarto dos bebês. – Troca a fralda deles que eu vou tomar um banho. Volto logo. – deixei a coitada lá, eles nem se mexeriam.
Ri um pouco da situação, mas queria mesmo que ela se sentisse parte da família. Era importante pra você. Era importante pra mim. Precisávamos muito dela. No quarto dos filhotes encontrei-a com Gian no colo, ninando.
– Acho que está com fome. – disse carinhosa, beijando a testa de nosso menino.
– Sim, tem mamadeira pronta na geladeira.
Depois de alimentar o guri, ficamos na cozinha enquanto eu terminava o preparo do almoço que serviria de jantar. Sua amiga se mostrou um ser interessante, conversava eloqüente e me fazia rir de quando em quando. Falamos muito, não de você, mas dela. Entendi então porque são tão amigas. Sentimos sua presença. Sabia que quando acordava não falava muito.
– Vão ficar aí me olhando?
Continuamos a conversa de onde paramos dando risadas e trabalhando no andamento do jantar. Carla me dava dicas que seguia sem pestanejar. Fixava seus olhos de quando em quando e sorria. Você ignorava.
– Estou com fome, vai demorar muito?
– Não. – dissemos em sincronia.
Minutos depois estávamos sentadas comendo, conversando e rindo. Você também parecia ter recobrado o humor. Apertava minha mão sem cerimônia. Trocamos ideias, por fim a hora da despedida. Carla pegou sua bolsa.
– Posso dar uma olhada neles? – Nos olhou.
– Vai. – incentivei-a levando-a a porta do quarto.
Voltei e te abracei apertado.
– Ela é maravilhosa. – disse te beijando a face.
– Eu sei. – me abraçou com carinho.
Os dias que se passaram depois disso foram cansativos. Contratei uma babá temporária para os gêmeos, pois precisava dar conta de você e do trabalho que me atormentava com exigências bestas. Dispensei-a uma semana depois. Nestes dias você e Carla saíam cedo e só voltavam tarde da noite. A cada dia você parecia mais tensa, mas me dizia que tudo corria muito bem, seja lá o que “tudo” fosse. No entanto notei que o humor desaparecia a cada pergunta que eu fazia sobre o assunto.
Mais um dia amanhecia. Era muito cedo. Saí para comprar algumas coisas pro café da manhã te deixando com os filhotes em nossa cama. Voltando para casa percebi as vozes alteradas como numa discussão. Abri a porta exasperada. Você e Carla duelavam numa troca de insultos que não esperava.
– Tome conta de sua vida! – a última frase sua que ouvi antes de Carla notar minha presença deixando a vermelhidão tomar conta das faces.
– Eu desisto! – ia caminhando para a porta, mas eu a impedi.
– Espera, vai à cozinha e toma um copo com água.
Coloquei os braços sobre o ombro dela, olhando fixamente para você. Fui imediatamente para o quarto dos bebês. Gian com olhos assustados, já fazia bico pra chorar e Giovanna estendeu os braços pedindo colo. Abracei-os pedindo calma. Você entrou e colocou Gian no colo pedindo desculpas, eu peguei Giovanna e me aproximei. Você beijou a cabecinha dela repetindo o pedido. Nos abraçamos um pouco até que eles adormeceram em nossos braços. Você se encaminhou pro nosso quarto sem palavras e eu fui ter a conversa necessária com uma pessoa que esperava na cozinha.
Sentada, apoiando a cabeça nas mãos encontrei uma mulher que, agora, me era muito importante. Sabia por que discutiam.
– Ela tem a cabeça mais dura que já conheci. – a ouvi dizer quando me viu entrar.
– Você não conhece muitas pessoas, então. – sorri pra descontrair o clima, concluí. – Nós também o somos quando convém.
Carla me olhou e parecia ter chorado.
– Ela é uma pessoa incrível, mas quando quer sabe bem como atingir.
Sentei ao lado dela e segurei a mão que estava fria.
– Sim, mas a amamos assim mesmo como é, porque, se fosse diferente, que graça teria? Ela é sincera com o que sente, não sabe fingir e isso eu admiro muito, nos dá algum trabalho, mas a alegria que proporciona ser sua amiga é indescritível.
Vi o balançar positivo de cabeça concordar com cada palavra.
– Eu só queria que ela abrisse pra você o que está acontecendo. Não acho justo que não saiba.
Interrompi séria.
– E quem disse que não sei o que está havendo? – ela me olhou incrédula – Não, ela não me disse uma palavra sobre isso, mas aqui… – pousei a mão no lado do coração -… todas as palavras são ouvidas, mesmo as não ditas.
Conversamos mais um pouco até que a senti mais aliviada e pronta para recomeçar.
– Tenho que levá-la pra mais um… Compromisso. Voltamos à tarde. Amanhã…
Fez pausa como se não devesse continuar. Apertei suas mãos com força.
– Amanhã vai dar tudo certo, você vai ver.
E observei a saída de vocês num silêncio que dizia tudo. As duas se entenderam sem precisar falar.
Eu estava especialmente aflita. Esperava por sua volta e esperava também que você me contasse o que estava acontecendo. Precisava te ajudar antes que fosse tarde. Fiquei com os gêmeos até que caíssem no sono vespertino, era sempre assim: dormiam pelo menos uma hora à tarde. Quando saía do quarto, ouvi a porta se abrir e fui ao seu encontro. Aparentava estar mais cansada que nunca. Me olhou e, ali, vi um pedido de socorro, mas foi rápido, o olhar instantaneamente ficou duro. Segui seus passos até nosso quarto e vi quando se despiu e entrou no banheiro. Demorei ainda alguns minutos me preparando para o que tinha que ser feito. Precisava te contar. Abri minha bolsa e, de lá, retirei um terço e a bíblia. Abri e li uma passagem em voz alta. Recitei a Ave Maria e o Pai Nosso, me despi e fui ao teu encontro no banheiro. Não tinha noção do que aconteceria agora, pois já havia me colocado nas mãos Dele e pedido pra que intercedesse como fosse a Sua vontade. Você apoiava o corpo com as mãos coladas na parede e deixava a água cair em sua cabeça. Comecei então a sentir uma espécie de arrepio, encostei meu corpo as suas costas e percorri com as mãos o seu ventre, deixando uma mão repousar em seu seio direito. Percebi teu estremecimento e não era excitação. Fiquei de frente para você sem afastar o toque. Teus olhos encontraram os meus.
– Confia em mim… – sussurrei e percebi que iria falar. Te impedi.
– Não desvia o olhar do meu e ouve, é importante. Aconteça o que acontecer não se assusta e espera até terminar… Vou estar com você, prometo.
Minha mão continuava em teu seio e começava a transmitir um calor anormal.
– *Ainda que falasse a língua dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine… – o calor de minha mão aumentava a cada palavra, mas, como te pedi, você não reclamou e continuou dentro de meus olhos.- E ainda que tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria…– agora teu olhar parecia perdido em algum lugar seguro, pois a paz emanava dele. — E ainda que distribuísse toda minha fortuna para os pobres, e ainda que entregasse meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria… – o calor de minha mão parecia quase que insuportável, mas eu não sentia dor e me parecia que nem você a sentia… – O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso, o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece… Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal… Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade… Tudo sofre, tudo crê… Tudo espera… Tudo suporta…
Nessa hora segurei teu seio mais firme, o calor ainda aumentando…
— O amor nunca falha e é com essa convicção que determino que teu sofrimento cesse, que o que seja dor se transforme em bem estar, que teu coração se encha dessa certeza… Que meu amor infinito, o amor infinito que Deus me deu a glória de poder te ofertar cure… Aqui e aqui… – com a mão livre toquei tua cabeça e o lado de teu coração. – Amém…
De repente me senti zonza, quase desfaleço. Retirei a mão de teu seio e repeti…
— Amém… – depois, só uma agradável escuridão.
*Coríntios 13.
Senti uma mãozinha apertar meu nariz e uns balbuciados conhecidos. Sem abrir os olhos, agarrei o corpinho de nossa filha, fazendo-a gargalhar.
– O que meu amorzinho faz aqui sozinha? Cadê a mamãe e o irmãozinho? – você entrou com Gian no colo se unindo a nós.
– Estamos bem aqui. – me olhou profundamente. – De onde não deveremos nunca sair… – me beijou com carinho.
– Que horas são?
– Oito horas. Agora que acordou, preciso ir… Pro compromisso.
Segurou minha mão e colocou no seio direito, dando o sorriso mais tranquilo que vi durante aqueles dias.
– Estou bem e vamos pra casa logo. – beijou minha testa e saiu.
Voltou tardezinha com Carla a tiracolo, entraram dando risadas. A alegria era palpável. Os bebês estavam na sala e foram logo sendo colhidos e jogados ao ar por duas malucas sem noção. Você me abraçou apertado. O coração tamborilando como um recém-nascido…
– Obrigada… – disse com a boca grudada em meu ouvido.
Carla se via as voltas com os gêmeos, sendo “atacada” pela baba deles e não parava de sorrir.
– Não havia mais nada para ser resolvido. O médico quase tem um ataque achando que diagnosticou errado.
Abracei você. – Foi só amor, vida. É o que temos, não importa o que haja, é só o amor que nos ajudará. Agora, mocinha… – disse tocando seu rosto. – vamos pegar uns dias na praia e curtir nossos filhos e a tia Carla. Que acha?
Você me deu um beijo categórico.
– Somos felizes é o que acho.
Carla percebeu o clima e o celular dela começou a tocar. Notamos o quanto ficou encabulada, depois de uns minutos de cochicho, veio com uma.
– Eh… Vocês precisam ficar um pouco a sós, né? – concordamos com o olhar.
– Bem… É que Catarina (a babá temporária) está aí em baixo e… E… Perguntou se nós… Quer dizer… Se podemos levar os bebês pra um passeio… Sabe… Ela… Eu… Quer dizer nós… Gostaríamos muito… Ela gostaria… Sabe ela adora eles… E…
Acabamos com o atrapalho dela dizendo em uníssono:
– Sumam com eles daqui!
O sorriso no rosto dela foi impagável. Correu pro quarto para pegar todos os apetrechos necessários e que rapidez, parecia que tinha recebido aulas sabe-se bem de quem.
Enfim sós. Às vezes tentamos classificar por ordem de prazer e importância os momentos mais preciosos de nossa vida. Eu não conseguiria, nem se quisesse. Todos, sem exceção, eram os melhores momentos. Era só sentir seu olhar, seu toque, o sorriso, o jeito de me pegar nos braços, de se enroscar na cama, de brincar com os filhos. A cara séria quando se preocupa. O jeito forte. A cara lisa quando apronta. O olhar sincero da verdade. Verdade de nós duas. A que nunca conseguiu ser omissa. Cada detalhe, cada cheiro, cada tom de voz. Tudo fazia parte de um gigantesco universo de amor que construímos e continuamos a construir como se fosse possível torná-lo maior (e é). Assim. Sem medida. Sem limite que não fosse muito mais que tudo. As mãos entrelaçadas, as pernas misturadas entre os lençóis, tua mão passeando por meu corpo, tua respiração quente entre meus seios, a sensação de unidade e plenitude que nos envolve quando fazemos amor. Teu amor magnífico me descobrindo quando achei que já havia entregado tudo. Tua fragilidade ao encontrar em minha mão a porta direta para o gozo. As lágrimas de emoção nos fazendo saber que nada mais importa. Nada.
FIM
Até a próxima temporada.