Manhã. O peso anormal de teus braços e pernas. Tentei me desvencilhar com cuidado, mas você não deixou. — Fica… — Ronronou em meu ouvido  enroscando-se mais em mim. Obedeci. Queria, morreria assim em seus braços. Fazia tempo que meu corpo havia deitado com alguém, se é que havia. Sorri. Meu “polvinho” me fizera mudar. Dormi como um anjo em seus braços.

Domingo de sol ou quase. O sol ainda não era sol, não como na minha terra. Consegui te deixar na cama e tomei um banho gostoso de quem acorda bem. Me sentia em casa. A sombra veio até meus olhos lembrando a noite que se passou. Hora de por pra fora o sentimento. Hora de fazer você feliz. Parti pra tua cozinha não muito equipada, mas confortável. Abri a geladeira pra ver o que conseguiria fazer pra te dar um desjejum gostoso e saudável. “Não tem leite, nem queijo… Ovos! Muito bom!”. Saí pra ver se achava uma padaria. Procurei e achei pão quentinho e um mimo para meu amor.

Voltei sem fazer barulho, pois queria te fazer uma surpresa. Aprontei tudo no maior silêncio. Desjejum preparado, fui até o quarto ver se ainda dormia. Abri a porta bem devagar e meu coração perdeu o ritmo da batida com o que vi: você chorava abraçada ao travesseiro que usei e as lágrimas caudalosas surgiam de teus olhos. Eu me aproximei e deitei do seu lado. Você pareceu surpresa por me ver e me abraçou forte. Então entendi o que tinha acontecido.

— Não vou te deixar, vida… Tô aqui. — acariciava suas costas. – Só sai pra comprar nosso café da manhã. Vem! — Te tirei da cama e te arrastei pra cozinha.

Posto na mesa as comidinhas gostosas.

— Linda, não vou comer isso tudo. — Teu riso, meu desjejum preferido.

— Senta. — puxei a cadeira pra você. — Então? Gostou? — teu olhar encontrou o meu, você segurou minha mão, acariciando-a. — Vamos comer. — eu disse quebrando, mais uma vez, o clima. No final você me contava coisas da sua infância e ríamos.

— Acho que agora já chega. — você levantou já retirando as coisas da mesa.

— Espera! — eu me aproximei de você e retirei de dentro do armário uma rosa azul e te entreguei. — Por teu sorriso e por tua felicidade.

Você segurou a rosa, olhos brilhantes, um sorriso inimaginável se abrindo pra mim, se aninhou em meu corpo.

— Obrigada.

Minhas mãos em teu rosto fizeram com que você olhasse pra mim.

— Agora vou fazer um convite para a mulher do sorriso mais lindo deste mundo: tenho que estar em Recife na sexta pela manhã. Que tal me acompanhar? Passamos o fim de semana lá. Quero te mostrar meu lugar especial.

Você demorou alguns segundos antes de responder.

— Eu vou adorar. Quando você vai? Preciso reservar a minha passagem.

Eu silenciei você com o meu dedo indicador. — Não se preocupa. Já comprei as passagens e fiz reserva no hotel. Só precisa fazer as malas, mas se quiser posso providenciar isso também.

Você gargalhou e eu adoro quando faz isso. — Que amiga mais espertinha eu tenho. — você disse beijando meu rosto.

RECIFE  16/08

Já fazia mais de cinco horas que eu estava enfurnada no escritório com o boss me metralhando com as loucuras dele, todas inviáveis e eu tendo que argumentar contra cada uma delas até que, finalmente, chegamos ao consenso. Liguei pra você  que parecia ansiosa e disse que colocasse roupa de banho que eu já estava indo pro hotel.

Ficamos em quartos separados, você questionou isso também. Saímos, almoçamos num restaurante que fica a beira mar, conversamos muito sobre tudo, principalmente sobre nossa amizade. Resolvemos caminhar pela praia, então te mostrei um lugar que ficava a poucos metros. Lá tinha uma árvore enorme e bancos ao redor dela. Sentamos em um e fiquei de frente pra você segurando suas mãos.

— Há exatos três anos recebi teu primeiro e-mail. Quando recebia e-mails de estranhos eu simplesmente deletava sem sequer lê-los. Nunca gostei de aproximação com estranhos e até hoje sou assim, mas, Love Forever, atraiu, aguçou a curiosidade, me puxou pra dentro do “arrisque” e conseguiu me tirar de dentro da caverna para ver o sol. E foi por este sol que você me trouxe que eu me apaixonei. — teu semblante era sério e teus olhos se aprofundavam nos meus certificando-se da veracidade do que havia sido dito. Continuei.

— Este lugar aqui, embaixo desta árvore aonde vim várias vezes para pensar em você e no que poderia fazer para estar ao seu lado, aqui neste mesmo lugar, quero te dizer: te amo. — passei os dedos por seu rosto. — De uma maneira só minha… maneira que encontrei para não deixar morrer o que nos sustenta de verdade: a amizade. Amo você e tudo o que você me dá. Amo como jamais pensei que amaria alguém, sem reservas, sem medo do não ser. Sem pressões de nenhum tipo. Livre e deixando ser o que tem de ser. É por esse sentimento que me preenche de tudo o que preciso que eu aceito estar do seu lado todos os dias. Este lugar é o nosso marco zero. O ponto de origem de nós duas. Quando uma de nós se sentir perdida, sem saber o que, nem como fazer é só chegar aqui e vamos nos encontrar sempre. Sem dúvidas, sem medo. Seguras do que sentimos e prontas para encarar o futuro seja ele qual for.

Levantei ainda segurando sua mão e seguimos para a beira do mar. Com um graveto  desenhei um enorme coração com as letras EL (Endlss Love) e FL (Forever Love) e te abracei forte. Ficamos assim até o sol ir embora dando até logo ao espetáculo maravilhoso que é a natureza.

PRESENTE

Ergui-me sobressaltada com esta lembrança. Olhei a data no celular: 15/08. Abri a porta do guarda roupa procurando algo que me faria ter a certeza de que estava pensando correto e achei a foto do coração na areia, no verso, tua letra dissipando qualquer dúvida: “Eu não esqueci”. A frase acompanhada da data em que você havia partido.

Fiz as malas mais que depressa, liguei pro boss, pois a reserva de passagem estava difícil pro mesmo dia, mas ele tinha contatos. Me ajudou. Cheguei em Recife ao meio dia. Não fui pro hotel, parti direto pro nosso lugar e lá, encontrei a última pessoa que imaginei encontrar. Estava sentada no nosso banco com a cabeça baixa, tristonha, quando me viu levantou rapidamente, como se o fato dela estar sentada lá me incomodasse.

— Onde ela está? — perguntei sem nem mesmo cumprimentá-la.

— Sou Cassandra, como vai? — Como se eu não soubesse quem era ELA, estendeu a mão, demorei a aceitar o gesto.

— Onde ela está?. — friamente, perguntei.

— Me pediu para vir aqui te dizer que não precisa mais se preocupar com a gravidez dela… Ela… Ela… — senti o nervosismo. — Perdeu a criança.

Não pude assimilar de imediato o que as palavras queriam me dizer, mas quando o fiz, senti lanças pontiagudas atravessarem meu corpo. Sentei, lágrimas profundas me fizeram as honras e, não aguentando a dor, gritei. Era a dor que sentia explodindo em mim. Meu ventre era acometido de uma cólica extrema me fazendo ajoelhar na areia.

— Você está bem? — sua AMIGA me tocou o ombro.

Com muito esforço consegui responder. — Não… Só vou estar bem quando encontrá-la.

Ela sentou-se no banco de novo. — Não quer ser encontrada. Está se culpando pelo aborto e nos pediu para esquecê-la.

DE VOLTA PARA CASA

Em casa, Lelo me alcança ligeiro, mal tinha entrado. Saudade de nossos filhotes. Quis poupá-los, mas parece que sabem o que há. Give só me olhava daquele jeito que só nossa princesa sabe. Parecia me pedir uma atitude. Mimei-os um pouco. Minhas forças estavam sendo minadas pela tua ausência, o amor e o desespero, me faziam agir apaticamente. “Só você pode encontrá-la. Volta pra casa. A resposta está lá”. Foram as últimas palavras de Cassandra que me vieram fortes. Levantei-me da cama, organizei tuas coisas, vi o que faltava, fiz uma lista, arrumei teu guarda-roupa, limpei tudo, peguei a correspondência e encontrei a conta de telefone. Abri, pois você não estava e eu não ia deixar de pagar.  Num impulso atentei pras ligações dos últimos dias e um fio de esperança se formava em meu ser. Anotei todos os telefones e as chamadas foram poucas, mas uma me chamou a atenção. Comecei ligando para as chamadas locais. Na última, uma agência de viagem. Pedi o endereço e fui até lá. O meu coração batia forte, mas estava consciente da batalha que estava por vir.

— Bom dia. — cumprimentei o atendente no balcão. — Acho que vai achar estranho, mas uma amiga me indicou esta agência e pediu que eu fosse atendida pela mesma pessoa que lhe atendeu..

O jovem sorriu meio atravessado e me pediu o nome da pessoa que comprou o pacote. — Siga em frente e entre na primeira porta a direita, Fernanda Travassos.

— Fernanda? — entrei já oferecendo minha mão ao aperto. Ela sorriu lindamente, coisa de vendedora. Acomodei-me na cadeira a frente de sua mesa. — Uma amiga minha comprou um pacote aqui contigo e, imagine, hoje é seu aniversário e eu sempre mando flores pra ela nesta data. Um pacto sabe. — Olhei profundamente nos olhos verdes. — Se quebrar este pacto é como se nossa amizade nunca existisse. Ela vai ficar triste e eu perco uma amiga querida. — fiz aquela cara de cachorro perdido na mudança. — Por favor… Não deixa isso acontecer… — as lágrimas eram sinceras. Ela me deu o endereço do hotel e o telefone. Sorri e beijei-lhe a face. — Acho que teu namorado tem uma sorte imensa. Você é demais.



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