Não conseguia dormir. Levantei, troquei de roupa e deixei o flat de Glória rumo para casa. Lá tudo estava quieto. Olhei o relógio e eram quase quatro da madrugada. Fui até nosso quarto, abri a porta devagar deixando a luz do abajur  me dar a visão de teu corpo nu. O lençol cobria suas nádegas, o edredom, pela primeira vez dispensado, jazia no chão. Havia um cheiro diferente no ar. Meu lado da cama estava bagunçado, cheirei meu travesseiro… Perfume masculino. Larguei como se fosse contagioso, tropeçando numa garrafa de vinho. No colchão uma marca enorme do mesmo líquido. Uma imagem tomou conta de meus pensamentos. Parecia estar vendo o que acontecera ali. O ar me faltou na hora, uma dor jamais sentida.  Precisava sair. Na praia os primeiros raios de sol despontavam no horizonte, caminhei meio que tonta até a água e me joguei no mar e, depois de levar uma surra das ondas, saí indo me deitar na areia, deixando o choro vir com força. Mais algum tempo e sobrava um vazio incomensurável no peito. Voltei a casa. Tomei banho no quarto de hóspede. Fui à cozinha e preparei um desjejum reforçado que você iria precisar. Cuidei dos filhotes. De volta ao quarto de hóspedes, arrumei minhas roupas que estavam lá numa mala. Ao terminar sentei numa espreguiçadeira que ficava na varanda. Não queira mais entrar no teu quarto… Teu quarto, agora eu sabia, nunca foi nosso. O que estivesse lá de meu eu deixaria, não queria mais nada que viesse de lá. Olhei o mar e lágrimas acompanhavam a sensação de solidão que eu sentia. Teu perfume chegou ao quarto… “Tomou café?”, perguntei num fio de voz que quase não saiu. “Sim, obrigada, tava morta de fome”. Respondi sem vontade… “Eu sei…” você sentou na cadeira ao meu lado, enquanto eu permanecia a olhar o horizonte. “Por que não dormiu em nosso quarto?”, silenciei um pouco antes de falar, “Não pude…” mais alguns segundos de silêncio. “Por quê?”, você insistia… “Alguém ocupou o lugar ao seu lado… Hora de eu partir, Love. A viagem pra China está marcada para amanhã. Volto daqui a quinze dias, mas recebi convite do boss pra tocar o projeto lá, são no mínimo cinco anos… Vou aceitar.” Levantei e você imitou o gesto me fazendo encará-la. “Me perdoa…”, te olhei num misto de tristeza e decepção.”Não sou eu que tem de te perdoar, Cristiane. O que havia entre nós era amizade pura, sem cobranças, apenas cumplicidade e lealdade, respeito, carinho, tudo o que eu podia te dar que você aceitasse e você jogou tudo isso no lixo. Não me sinto mais parte desse lugar, de sua vida…” segui para a cozinha,  precisava falar com os filhotes e você me seguiu calada. “Deixei as coordenadas na porta da geladeira com horários, telefones e tudo que precisar, só repara na Branca na hora da ração. Ela gosta de comer junto com a Plita que tá tomando umas vitaminas que se coloca na comida. Não posso levá-los comigo… É outro país, outra cultura, teria que tirá-los de um ambiente que eles já amam e você sabe como custou encontrar um veterinário que os amasse. Vão ficar melhor aqui com você… Já avisei minha irmã, ela vai te dar uma força…e você…vê se se cuida… não esquece dos remédios…e come comida saudável…deixei alguns pratos preparados no freezer…” me agachei pra falar com as crianças. Chamei os trigêmeos… “Mamãe ama vocês seus doidinhos… Lelo obedece a mamãe Love e deixa a almofada dela quieta…Kafka…bom menino, mas não seja tão bom assim…não se cala…se mostra, filho… Freud, cuida deles, conversa, viu? Mostra que os conhece como ninguém…Branca, Plita…” coloquei-as no colo….”Lembrem-se: almas gêmeas, mas pessoas diferentes…juízo, meninas…” as lágrimas eram profundamente dolorosas. Olhei pra Give, ela não se mexia, olhava o olhar do acima tão conhecido… “Você, princesa, cuida deles todos, da mamãe Love, principalmente… Eu te amo, meu amor…”, fiz um gesto para que ela viesse, mas não veio, então me levantei depressa e me dirigi à porta, quando sinto ela em minhas pernas pedindo carinho. Nunca o fizera, sempre a peguei. Abracei-a, já soluçando, lhe fazendo carinho, percebi seus olhinhos azuis lacrimejarem… “Não chora, meu amor… Vai com a mamãe, vai…” tentei passá-la para você que também chorava, ela não quis plantando as unhas em minha blusa, quase a rasgando, me feriu a mão resistindo sair de meu colo, “Calma, minha filha…por favor…” então tive que me abraçar a você para que ela se acalmasse, até que largou. Ficamos assim: nós três, abraçadas. “Ela vai ficar bem…”, eu te disse, beijando tua testa. ” Volto para vê-los.” Vi no teu olhar uma tristeza enorme. “Sinto muito”. ” Eu sei…e é isso o que mais dói em mim: saber que vai sofrer e não vou poder te confortar”. Ouviu-se uma buzina… ” Tenho que ir…”. “Leva o carro…” você disse rápida…”Não precisa e você tem as crianças.” Dei as costas, mas senti teu abraço novamente. “Diz que me perdoa.”… “É você quem tem que se perdoar, Cris…” você se colocou a minha frente, tentou um beijo e eu impedi com os meus dedos entre nossas bocas. “Isso pertence a outra pessoa agora, você já fez sua escolha.”  Saí com um único pensamento:  hora de contar comigo.

“Você está bem?”, Glória me perguntou ao meu lado. A viagem já durava horas e a sensação era de que meu corpo era esmagado. Tudo doía, sufocava, como se houvesse pouca abertura pra muito corpo passar, um parto. “Não”, foi minha resposta sincera acompanhada de lágrimas. “Vem cá…”, aceitei o conforto dela. Estava muito cansada. “Acabou, minha amiga”. Ela me olhou, fazendo carinho em meu rosto. “Vai se sentir assim por um bom tempo, mas, acredite, vai passar. O que você esta sentindo nada mais é que uma linda transformação, forte, dolorosa, mas que vai trazer resultados maravilhosos, você vai ver. Descansa um pouco, dorme, te acordo quando chegarmos”. E me deixei, pela primeira vez em muito tempo, adormecer nos braços de outra pessoa que não fosse você.

Tudo perfeito. Nos quinze dias em que estivemos na China, conseguimos aprovar o projeto e a assinatura no contrato nos valeu uma boa comissão. Assumi o cargo de supervisora chefe do projeto. O cargo exigia muito do social e, com a ajuda de Glória, reformulei tudo em minha vida pessoal. Os cachos se transformaram em um corte moderno meio repicado e liso, curto. A roupa mais elegante de grife importada, estilo arrojado como deve ser para uma mulher de negócios.  Operei a miopia (nada de óculos ou lentes). Remodelei o corpo, nada muito significativo, mas virei adepta de artes marciais e exercícios orientais como tai chi, ioga e karatê. Comida chinesa milenar ajudando na recuperação do tempo perdido. Acupuntura para me livrar de fobias, e eu não me reconhecia no espelho, mas gostava do que via. Eram eventos, festas, raves. Os projetos vinham um após o outro e os chineses, então me apelidaram de Fênix. Eles diziam que eu fazia uma cidadezinha renascer das cinzas com minhas ideias.

Em Hong Kong, depois da apresentação de mais um projeto, eu e Glória fomos convidadas para uma festa pra lá de esquisita. Dançamos muito, bebemos muito. No outro dia, minha cabeça doía, meu corpo estava todo marcado de mordidas e chupões.  Senti um corpo pesando sobre o meu e tentei me livrar dele, quando percebi de quem era esse corpo, me assustei. Levantei rápido demais, senti tudo rodar e a cabeça parecia que ia explodir. As imagens da noite anterior vieram fortes, causando sensações distintas.  Olhei pra ela dormindo, minha amiga… Glória…agora, amante. Foi carinhosa no início, depois me devorou com uma fome guardada há muito tempo. Me comeu quase que literalmente. Olhei pra meus braços com arranhões múltiplos, meus seios com marcas roxas. Lembrei-me da sensação e estremeci. Me amou de todas as formas, me fez gozar mais numa noite do que jamais gozei na vida inteira. Me ensinou práticas que duvidava querer experimentar,  minha pele queimava só de lembrar. Me iniciou e agora nascia uma mulher que eu não conhecia, mas já tomava conta de mim: Fênix Loveless, a predadora,  senhora dos desejos, e eles foram saciados, um a um. Daí pra frente era só o começo.

“Quero você em Nice amanhã ao meio-dia!”. Revirei os olhos fitando o telefone com raiva, replicando…” Como a Glória faz falta nessas horas…”. O boss riu cínico, “Não sei porque está reclamando! Se não tivesse trepado com ela não precisaria ficar estressadinha com a viagem! Agora faça as malas e vá para Nice! Meio-dia! Entendeu?!”, desligou na minha cara. Ele me culpava por Glória ter aceito a oferta da concorrente. Ela havia me ensinado o caminho das pedras, e as pedras eram muitas e, algumas vezes, surpreendentes. Quando deixei claro pra ela que era só sexo, maravilhoso, mas apenas sexo, ela saltou fora. Senti muito, afinal, ela era minha amiga. Bom, eu acabara de chegar à China depois de um mês na Malásia, e tinha que ir à França. Estava exausta. Entre negócios e reuniões infindáveis, havia as maratonas sexuais que nunca dispensava. Tempo…tempo pra mim sempre teve que passar rápido. No aeroporto, sempre a mesma sensação desconfortável. Me submetia a sessões de acupuntura toda a semana para perder o medo. Admito que agora, ele era bem menor do que já foi um dia, mas ainda estava lá, parecia que não ia me acostumar nunca. De repente uma mão fria toca em meu braço: “Por favor, você também está nesse vôo?” Me virei e encarei os olhos castanhos temerosos, aflitos, de um rapaz jovem, aparentando uns 19 anos e, pelo sotaque, de origem latina. “Sim”, respondi com um sorriso sem deixar de olhar-lhe nos olhos extremamente castanhos, brilhantes. “Pode ajudar-me?” uma palavra escorregou num ehol cálido. “Claro…” ele viajava só, era sua primeira vez na China, estava perdido sem saber como se orientar. Eu não parava de olhá-lo. Cabelos castanhos ondulados na altura dos ombros, sobrancelhas grossas, unidas, a pele alva, limpa. Quis tocá-la, quando percebi estava desejando aquele menino com todas as minhas forças. Carlos… Nascido em Cancun, México. O olhar dele tinha um brilho especial, sua voz era suave e comedida, inteligente, conversamos a viagem inteira, eu estava encantada por ele. Finalmente chegamos.

No desembarque, fiquei observando a expressão do garoto que, de vez em quando, me olhava num misto de desejo e medo. “Está hospedado em que hotel?”,  perguntei para quebrar o clima. ” Hilton…minha mãe vai chegar lá pelas duas da tarde…” me aproximei dele: “Tenho ainda três horas antes de meu compromisso, que tal um drink e mais um papinho?” passei a mão suavemente pelo braço dele.

Estava atrasada! Droga!  Embaixo do chuveiro, relembrei os acontecimentos de duas horas atrás. Fechei os olhos e viajei. Não consegui me controlar quando entramos no quarto do hotel onde ele se hospedou. Tomei-lhe os lábios com ânsia, macios, gostosos.  Arranquei-lhe a roupa com fúria, seu tórax era macio, um pouco de pelo entre os peitos e ao redor dos mamilos. Passeei minhas mãos por toda aquela extensão lisa e, em poucos segundos, já me via nua, colando meu corpo ao dele num abraço carinhoso: “Meu menino…te quero…agora…” ataquei-lhe os lábios novamente, empurrando-o para a cama. Seu membro já estava mais que ereto… “Calma, meu menino… ainda quero te ensinar algumas coisinhas”,  senti a eminência do gozo dele. Peguei o pênis e lubrifiquei-o em minha vagina molhada,  bem devagar, sem pressa. Senti a respiração dele chegar ao limite, antes de me deixar penetrar fiz com que ele alcançasse meio seio e chupasse muito. Coloquei o membro dele em mim, movimentando lentamente,  num espasmo ele mordeu meu seio. Dor e os movimentos foram aumentando até que gozamos juntos.  Quando ele saiu de dentro de mim alcancei sua boca com meu sexo… “Chupa tudo, menino… bem gostoso…” e ele o fez. Gozei no rosto dele mais de uma vez, e outra, sempre olhando nos castanhos daqueles olhos brilhantes. Eu queria mais dele, queria ensiná-lo, queria que ele sentisse sensações jamais experimentadas. Comecei masturbando-o, enrijecendo seu pênis mais uma vez. Fiquei por trás dele fazendo estes movimentos. A minha excitação era enorme e, com a outra mão, colhi o meu líquido lambuzando meus dedos e colocando-os na entrada de seu ânus. Ele ficou tenso… “Shhhh…você vai gostar, querido..fica calmo…” acelerei o movimento no pênis e penetrei-o com os dedos.  Ele começou a rebolar neles enquanto eu o fazia ejacular. Tombamos exaustos e ele apagou imediatamente.  O celular tocando insistente me devolveu a realidade. Me enxuguei e fui atender. “Glória? Aconteceu alguma coisa?…”, a voz irritada e grossa se ouviu: “Você está atrasada…” falou seca e não entendi. ” Como assim estou atrasada? O que…” ela cortou bruscamente: “A reunião que você TINHA as doze horas era comigo. Minha empresa está tratando de negócios com a sua. Você tem meia hora ou o acordo vai pras cucuias! Até logo, meu bem”, o cinismo dela me irritou. Fiquei olhando pro celular depois que ela desligou, pensando no que eu tinha feito com ela. Se arrependimento matasse eu estaria mais do que viva. Ri do pensamento bobo.

No escritório…

“Ora vivas, se não é a famosa Fênix! A que devemos a honra de seu atraso?” Glória alfinetou sem piedade. Cheguei bem pertinho dela e, no seu ouvido, sussurrei com malícia: “Não acho que vai querer saber, AMIGA, mas te garanto que valeu cada minuto…” o olhar dela foi de raiva intensa. De repente a tela de vídeo conferência se abre e o boss aparece meio avermelhado, possesso eu diria: ” Bom, devemos aguardar ainda alguns instantes, tem mais uma pessoa que vai participar da reunião. Acho que já deve estar chegando…”, nisso a porta se abre e eu, distraída com a imagem do chefe, só percebo o perfume. Meu coração vem a boca, aquele perfume… Não podia ser. Virei-me devagar e uma mulher alta, loira e de olhos verdes, sentou-se logo depois de Glória. O coração acalmou-se. Que coincidência terrível. Comecei a analisá-la imediatamente. Cabelos compridos e ondulados. Tinha um corpo delicado apesar de “grande”. A pele era branca, muito, e usava aquele perfume. “Luana Yumi…”, me estendeu a mão que segurei delicadamente: “Pode me chamar de Fênix”, ela me olhou profundamente e percebi uma tristeza naquele olhar: “É eu sei. Você tem uma fama extraordinária”, neste momento o boss se pronuncia e a reunião toma início.

Duas horas depois…

“Eu simplesmente não acredito! Você vai largar a firma na mão delas?”, o chefe ria divertido: “Em suas mãos, enfezadinha! Elas só vão te ajudar na administração. Eu não posso mais te administrar, criatura difícil! Alguém tem que fazer isso, e eu estou cansado. Quero aproveitar o resto de minha vida descansando, vivendo! Vocês são jovens e vão cuidar de tudo muito bem… Mirian…” quando ele me chamava pelo nome verdadeiro a coisa era séria: ” Você é mais que uma funcionária pra mim… É minha sócia, praticamente, sabe disso, confio em você como não confio em mais ninguém. Preciso de você agora e preciso que toque isso pra frente com a ajuda de Glória e de Luana que é muito experiente. Confia nelas”, senti um aperto no peito Meueu boss estava se despedindo: “Tudo bem, chefe… pode contar comigo. E não desaparece!”, ele sorriu terno e era muito raro ver esse sorriso: “Mas é lógico que vou desaparecer!! Mas venho te molestar algumas vezes!! Tô sentindo que as garotas vão precisar”.  Ele saiu da tela e eu fiquei pensando em tudo: nova etapa, Luana Yumi. Tinha algo de familiar nela. “Podemos conversar?”, a voz calma e elegante surgiu por trás de mim. Tomei um susto, ela percebeu: “Nervosa, Fênix? Pelo que soube essa não é uma característica sua”, os olhos verdes pareciam desafiar-me a todo custo: “Tenho outras características que, com certeza, você ainda não ouviu falar. Bom, podemos almoçar, estou morta de fome, aproveitamos para ajustar os ponteiros”, ela sorriu, meio sem graça. Ponto pra mim.



Notas:



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