Caminhos em Dias de Luz

Capítulo 19 — Dúvidas

Caminhos em Dias de Luz

Texto: Carolina Bivard

carolinabivard@gmail.com

Revisão: Nefer

Ilustração: Táttah Nascimento


 

Capítulo 19 — Dúvidas

Já se passara um mês e o clima na empresa, entre Laura e Alesha, permanecia pesado. Elas só se falavam em reuniões e isso se fosse, extremamente, necessário. O mau humor característico de Alesha retornara para a infelicidade da maioria no departamento; e Naomi se perguntava o que acontecera para que se separassem, já que Alesha não falava nada e se fechara mais do que antes. 

Uma auditoria externa fora instaurada em seu setor, a seu pedido, e Castelão autorizou, mesmo com os arroubos de Serrão nas reuniões de diretoria. A empresa jurídica que fora contratada para realizá-la era a mesma empresa em que Lúcia, filha de Amino, trabalhava.

XGXGXGXGXGXGXGX

— Laura.

— Oi?

Laura trabalhava em sua mesa adaptada, na sala de Amalie. Estava de cabeça baixa, verificando um acordo feito em juízo entre um empregado e a LH; aliás o quarto acordo feito com o mesmo funcionário, em épocas diferentes, pela empresa.

— O que houve entre você e Alesha?

Amalie e Laura já haviam desenvolvido certo grau de intimidade, durante esse tempo em que Laura começara a trabalhar na empresa. Amalie era uma mulher extremamente observadora. Havia percebido quando Laura e Alesha se aproximaram; Laura tinha lhe contado sobre o relacionamento e tinha percebido que algo se quebrara entre elas; nunca se permitiu perguntar para não invadir a intimidade das duas, mas na última semana, notava que Laura estava muito mais triste e retraída. 

Observou também que, muitas vezes, quando ela via Alesha, acompanhava-a com o olhar se deprimindo muito, logo em seguida.

— Não houve nada.

A resposta foi seca e a face da loirinha se contraiu em uma expressão de sofrimento.

— Talvez eu não seja a pessoa certa para lhe ouvir, mas não sou cega. Aliás, me considero uma pessoa até perspicaz. 

Laura baixou mais sua cabeça e seus ombros caíram, em sinal de fadiga. Amalie se levantou e rodeou a sua mesa, se colocando ao lado de Laura. Havia adquirido um carinho e uma confiança muito especial pela garota. Estendeu sua mão e tocou de leve os cabelos dourados, acariciando delicadamente sua cabeça. Laura deixou-se relaxar no afago suave da recente amiga e recostou-se no espaldar da cadeira, apenas se deixando levar. Suspirou levemente.

— Amalie, você tem sido uma grande amiga, mas há coisas que são melhores deixar para trás. 

Laura suspirou, novamente, fechando os olhos. Amalie intensificou o carinho, descendo para os ombros e iniciando uma massagem. Falou, suavemente, para não despertar Laura de sua aura de descontração.

— Sabe que tenho muito apreço por você. Não gostaria que se magoasse com nada.

Laura abriu os olhos. Seu rosto demonstrava certa confusão. Amalie foi parando lentamente a massagem, retirou suas mãos dos ombros de Laura delicadamente e retornou à sua mesa, caminhando com leveza. Sentou-se e abriu seu email, retornando ao trabalho sem falar mais nada. Laura continuava olhando-a, tentando entender seu gesto.

XGXGXGXGXGXXGG

Naomi levou contratos e documentos que Lúcia havia pedido de alguns funcionários que foram contratados e demitidos, mais de uma vez, pela LH. Estavam trabalhando na sala de Alesha, quando ela explodiu.

— Chega! Isso está parecendo uma brincadeira de “João bobo”! Por que essas pessoas foram contratadas e demitidas, tantas vezes, ao longo de seis anos? E… caramba! Seus salários eram altos para os cargos que ocupavam! 

Lúcia esboçou um leve sorriso. Já havia visto esse tipo de manobra, em outros lugares. Empresa de porte médio, várias lojas e muito espaço para encaixar a mesma figura e tirar algum proveito de um departamento mal coordenado.

— Não se assuste. Isso é mais comum do que você pensa. Basta ter pessoas certas nos lugares certos.

— O quê? Você está insinuando…

— Calma, Alesha! Ainda não sei, mas…

— Mmm.

— Bem, esse tipo de arranjo, por assim dizer, é comum quando se quer tirar algum dinheiro fácil de uma empresa mal administrada. Mas ainda não tenho certeza. Temos que continuar procurando outros casos, pois não é vantajoso quando se faz com uma ou duas pessoas. Tem que haver uma quantidade considerável de pessoas, para se tirar proveito desse tipo de esquema.

— Quantas?

— Pelo menos, umas quinze pessoas. Imagine indenizações de mais ou menos cinquenta a setenta mil. Quinze pessoas, nesse esquema por ano, daria em torno de…

— Setecentos a novecentos mil reais, fora os desvios. Uma ou outra pessoa com acordos de cem mil reais. – Falou Naomi.

O cenho de Alesha se fechou.

— Existem, também, aqueles desvios desse padrão, que são pessoas com salários mais altos ainda e que ficam cerca de um ano na empresa e conseguem muito mais do que isso em um acordo. Esses só voltam a ser contratados com espaços de tempo maior. Se você tem uma quantidade razoável dessas pessoas, por ano, numa empresa como a LH, você pode chegar a desviar cerca de dois milhões a dois milhões e quinhentos mil. Estou calculando por baixo, pois uma empresa do porte da LH, com a quantidade de funcionários que apresenta, tem potencial para desvios muito maiores.

Alesha sentou e ficou olhando séria para Lúcia. Naomi observando a conversa falou.

— Precisamos falar com seu pai, Lúcia. Amino e Amalie não devem ter a menor ideia sobre isso e, se isso realmente aconteceu, o setor deles estava envolvido também. Talvez se Laura tivesse contratado uma empresa de auditoria, eles tivessem percebido, mas, naquela época, ela estava com um cano de canhão apontado para a cabeça. Não tinha como fazê-lo, entende?

— É, eu sei.

Nesse momento bateram na porta.

— Pode entrar.

A voz rouca de Alesha respondendo do outro lado da porta, deixou Laura com as pernas bambas. Inspirou para se impor uma postura que, na realidade, não possuía diante da morena. Abriu a porta devagar e viu que Alesha não estava sozinha.

— Desculpe-me. Não quis interromper nada.

O coração de Alesha acelerou ao ver a figura pequena sob o portal, mas manteve o seu tom sério.

— Pode entrar, Laura. Acredito que tenha vindo por algo importante.

Laura percebeu o tom sério e distante de Alesha. Seu coração contraiu, mesmo sabendo que era preciso, que as coisas tivessem que ser dessa forma para protegê-la.

— Acredito que sim. Ou melhor, não sei se é algo realmente relevante, mas foi um fato que chamou minha atenção nos processos que estou revisando e gostaria de obter algumas informações mais precisas desses funcionários. 

— Que informações?

Alesha permanecia impassível.

— Bem… Dados de como se deu a contratação, por que foi recontratado tantas vezes, mesmo depois de ter acionado a empresa…

Alesha, Naomi e Lúcia se entreolharam. Naomi agraciou Laura com um sorriso discreto que confortou um pouco a loirinha, mas quando reparou nas outras duas, essas também sorriam. Intimamente, Alesha se condenava por sua atitude tão descontraída, mas se sentia extasiada.

“Droga! Detesto quando ela me mostra esse seu lado que eu adoro! Eu fico mole com ela”! — Pensou Alesha.

— O que foi? — perguntou Laura.

— Bem… — Lúcia começou a falar. — Talvez se te mostrarmos algumas coisas que acabamos de descobrir e você nos mostrar o que você tem, nós conseguiremos chegar a algumas conclusões.

Laura pendeu a cabeça um pouco de lado com uma expressão interrogativa. Esse pequeno gesto desencadeou em Alesha uma enorme vontade de ter a loirinha em seus braços, novamente, e querer esquecer tudo.

“Que merda, Alesha! Deixa de palhaçada! Nem quando você largou tudo na sua vida, ficou assim tão frouxa, tão babaca”! — Novamente, Alesha se recriminava por seus sentimentos perante a linda baixinha.

Fizeram algumas comparações com os relatórios que Laura havia preparado, a partir do levantamento dos casos de acordos judiciais reincidentes, de vários empregados demitidos e recontratados pela empresa. Enquanto discutiam, Naomi reparava discretamente em Laura e Alesha. Ora uma olhava embevecida, ora a outra reparava os mínimos detalhes do rosto, do corpo, dos gestos enquanto discutiam sobre o que haviam descoberto.

— Basta. Para mim, já está mais que do explícito.

Alesha falou em uma atitude segura e resoluta.

— Laura, você pode levantar todos os grandes processos perdidos pela empresa e os envolvidos? Autor da ação, advogados que defenderam a empresa, períodos e reincidência de autores…

— Claro. Depois disso que eu peguei, já estava começando a fazer.

— Então, faremos o mesmo aqui. Cruzaremos nomes e documentos para ver quantas vezes uma mesma pessoa foi funcionária da empresa e depois, com as suas informações, compararemos com as causas trabalhistas que esta impetrou. Assim teremos uma linha de conduta provável e levaremos à direção.

— Por mim, está tudo bem. A Amalie e o Castelão estão encontrando uma resistência enorme na direção. O Serrão detém uma parte maior na sociedade, Sr. Arrais, apesar de ser majoritário, não pode negar apelos feitos por ele, a menos que Castelão e Amalie estejam juntos e com munição. 

— Você está dizendo que o Serrão está por trás? 

Alesha olhou para Laura, elevando uma de suas sobrancelhas, num sentido nítido de provocação. Laura enrubesceu, por ter deixado tão nítido a sua opinião sobre quem estava por trás de tudo.

— Não estou dizendo nada. São apenas suposições. 

Ela encarou Alesha retomando seu sentido prático. Sabia que, por dentro, estava completamente derretida pela presença da morena, mas não podia expor sua fragilidade. Não agora.

Alesha sorriu de lado, pois havia pegado a loirinha desprevenida. Estava flertando com ela, descaradamente, através de suas atitudes e sabia que a tinha desestabilizado. Apesar de saber que não deveria, gostava de ver que Laura perdia sua concentração perto dela.

“Para, Alesha! Não vê que o que está fazendo só vai causar mais dor de cabeça”!

Recriminava-se, mas, ao mesmo tempo, lhe dava imensa satisfação.

Laura pegou seus relatórios. Já estava tarde e era sexta-feira, provavelmente, eram os únicos na empresa. 

— Bem, vou subir e guardar essa documentação.

— Ok.

Foi a resposta de Alesha. Ela se virou para Lúcia.

— Está com fome? Quer ir jantar?

Os olhos de Laura estreitaram e escureceram em cólera. 

Lúcia havia percebido a tensão entre elas, durante toda a reunião. Sabia o que as duas haviam tido, achava Alesha interessante, mas, nessa confusão, ela não se meteria. Era uma pessoa prática e detestava dramas e confusões. Pelo que percebeu, se ela se enfiasse ali, quem sairia queimada seria ela mesma.

— Obrigada pelo convite, Alesha, mas já tenho compromisso.

— Está bem, dessa vez passa, mas, da próxima, você me deve um jantar por extrapolar meu horário em duas horas. — Falou, abrindo um grande sorriso para Lúcia.

Naomi percebeu o que sua amiga estava tentando fazer e o quanto Lúcia havia se esquivado.

— Então, vou reivindicar meu jantar também. Estou na empresa desde às sete da manhã com esses montes de papéis em pilhas na minha mesa. 

— Para de se fazer de vítima, Naomi. Você fica aqui, porque não tem ninguém que aqueça sua cama.

O ar de deboche de Alesha na frase proferida, apesar de não ser para si, fez Laura sair do lugar e se encaminhar para a porta, sem nem ao menos se despedir. Caminhou rápido para o elevador, pois não queria mais ouvir as provocações. Naomi olhou para Alesha com reprovação e pegou sua bolsa para sair. Lucia só olhou a cena e se retirou sem nada dizer.

— Ei! O que é que eu fiz, Naomi? — Alesha perguntou indignada.

— Nada, Alesha, você não fez nada…

Naomi saiu, deixando-a só na sala.

— Que saco! Posso trabalhar com ela, mas não posso conviver com ela! — Alesha esbravejou.

Laura abriu a porta da sala de Amalie com o semblante cansado, depositou os relatórios em cima de sua mesa, pegou sua bolsa, saiu e trancou a porta. Na metade do corredor para o elevador, resolveu ir ao banheiro, antes de sair. Optou pelo banheiro dos funcionários para não ter que voltar e abrir a sala, novamente. Acendeu a luz, foi até a pia lavar o rosto para dissipar o cansaço. Ao levantar o rosto, viu a imagem de alguém refletida no espelho. Paralisou.

— Muito tarde, não?

Laura se voltou de supetão.

— O que você quer?

A voz saiu estrangulada.

 


Nota:

Olá, pessoal! Quero me desculpar por não ter postado na semana passada. Tive alguns probleminhas, mas resolvi colocar um dia fixo em minhas postagens. Caminhos em dias de Luz será postado toda segunda-feira.

Para quem acompanha os casos de Evernood e Blindwar, como havia dito antes, não é uma história corrente. Cada caso termina em si mesmo. Como o oitavo caso ainda não está todo estruturado, não postei. tentarei terminá-lo para enviar para revisão. Se acaso conseguir, talvez o próximo saia ainda esta semana, mas não prometo.

Obrigadão e um beijo grande!

 



Notas:



O que achou deste história?

6 Respostas para Capítulo 19 — Dúvidas

  1. Meu Deus! Eu tinha perdido o capítulo 18, agora que vi. Tô querendo matar este pai, caramba! Espero ansiosamente como conseguirão derrubá-lo e Alesha desculpar Laura quando entender o tamanho do amor que a fez agir desta forma. Bjs

    • Oi, Como assim perdeu o cap 18? rsrs
      Olha agora toda a segunda tô postando, então, não precisa perder, ok? rs
      No que postei ontem, a ofensiva contra o pai já começou. rs Lê lá e veja o que acha.
      Brigadão, Ione e um beijão!

  2. Carolzinha, que alegria ver mais um capítulo da sua estória! Amei separador XGXGXG
    Alesha foi muito imatura, totalmente sem noção!!! Ainda bem que Lúcia analisou bem a situação e foi muito observadora! Qndo escutei o nome Lúcia, já sabia q Dona Alesha ia fazer algo…
    Naomi foi mass,Alesha tava precisando..
    Vixi, quem será? Com essa reação ou era o pai ou era Alesha…medo e amor dão paralisia e a voz sai estrangulada kkkkkk

    Até segunda com mais um capítulo, saberemos quem a interceptou!

    Ótima news, Bi!! Acho q apertar eu meu acelerador de tempo…os dias tem passado bem rápidos pra mim!!

    Quando Evernood & Blind estiver no ponto, então será! Tô MT satisfeita com o último,o
    efeito n passou ainda! ?
    Beijos grande, cuidem-se!!!

    • Oi, Lailicha!
      Gostou do separador? rsrs Foi homenagem as nossas heroínas. rsrs
      A Alesha é esquentada e está indignada com o corte da Laura. Quer provocá-la. Mas não deu muito certo. rsrs
      Evernood e Blindwar já está no gatílho para sair. Vou fixar as postagens para sexta-feira e já deve sair essa semana. rsrs
      Se cuidem aí.
      Um beijão e valeu, Lailicha!

Deixe uma resposta

© 2015- 2020 Copyright Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem a expressa autorização do autor.