Caminhos em Dias de Luz

Capítulo 22 — Negociação

Caminhos em Dias de Luz

Texto: Carolina Bivard

carolinabivard@gmail.com

Revisão: Nefer

Ilustração: Táttah Nascimento


Capítulo 22 — Negociação

Após chegar ao restaurante, Laura caminhou lentamente até a mesa em que seu pai estava sentado. Tinha o rosto pesado e expressões de cansaço. Sentou-se à frente dele sem emitir uma palavra e ficou olhando um homem que parecia nunca ter realmente conhecido. Ele a olhou sério, mas parecia ter um olhar complacente.  Falou calmamente.

— Como vai, minha filha?

— Não me chame de filha. Agora mais do que nunca, eu não acredito que tenho o mesmo sangue que você.

Laura falava calmamente, mas em sua voz havia muita decepção.

— Você pode não acreditar, mas realmente gosto de você. Talvez eu devesse ter confiado em você, há mais tempo, e devesse ter apresentado a você os negócios da família. Você provou ser uma pessoa competente e eu não deveria ter afastado você de nossos negócios, mas agora não dá para voltar atrás. 

Laura estava estarrecida com o que acabara de ouvir. 

“Será que ele acha que, algum dia em minha vida, eu compactuaria com as coisas que ele faz?”

Resolveu aproveitar a oportunidade para pressioná-lo.

— Se você realmente acha isso, por que a guerra contra mim? Por que não aproveitar que eu estou entrando para a empresa como acionista e não começamos do zero, ao invés de sequestrar pessoas que são caras para mim?

— Eu não disse que sequestrei ninguém, só disse que estava guardando suas amigas para podermos negociar.

Laura balançou a cabeça em sinal de incredulidade.

— Tanto faz a forma como você diz, eu quero saber o que você quer.

— Quer alguma coisa para beber?

— Não. Já que você não quer voltar atrás, eu quero saber o que você quer comigo, para soltar Amalie e Alesha.

— Muito bem, então vamos lá. Você pode continuar com o nome de sua mãe, mas quero que abra mão das ações. Você continuará com os mesmos privilégios que sua mãe tinha, mas sairá da LH e viverá de sua herança. Não vou mais me intrometer na sua vida, você pode viver do jeito que quiser. Pode morar com a mulher que quiser, só não quero que você trabalhe e não quero mais sua intromissão nas nossas empresas.

“Então é verdade tudo que falaram dele! Está abrindo mão até de seu controle sobre mim só para me manter à distância”.

— Por que não fez essa proposta antes? Seria tão mais fácil. Teríamos nos dado muito melhor.

Seu pai inspirou fundo.

— Não cabe agora ficarmos colocando os erros que tive em relação a você. Você aceita ou não?

— Como vou saber se elas estão bem?

— Você acha que eu faria algum mal às suas amigas?

Laura balançou novamente a cabeça, com um sorriso sarcástico.

— Você as prendeu contra a vontade delas! O que acha que eu posso pensar? Eu não acredito que está me questionando isso! Eu quero falar com Alesha e aí tudo pode se resolver. Você terá o que quer, e eu também. Não vamos mais prolongar essa discussão, ok?!

Archiligias estreitou seus olhos e sorriu.

— Eu me enganei de verdade com você, Laura. Você é uma boa negociadora. Está bem, eu vou ligar para que fale com uma delas…

— Não. Não uma delas. Eu quero falar com Alesha!

Ele sorriu, novamente.

— Você gosta verdadeiramente dela, não é? Foi por ela que você fez isso tudo. Como eu lhe subestimei e aos seus sentimentos… Eu já devia ter aprendido com sua mãe. Ela tinha essa mesma força que você.

A vontade de Laura era gritar para esse odioso homem que ele lavasse a boca, antes de falar qualquer coisa de sua mãe. Engoliu em seco e esperou.

— Ok! Vou fazer a ligação, só espere um momento.

Levantou-se e caminhou para o fundo do restaurante. Do lado de fora, uma van estava parada com agentes da Interpol e da polícia federal. Laura tinha uma escuta e sabiam que seu pai não a revistaria. Mesmo com todos os sinais indicando que Laura não era uma pessoa ingênua, ele continuava subestimando-a, talvez por sua arrogância e seus muitos anos de manipulação sem ser contrafeito. 

— Vamos lá. Agora o show vai começar! Se ele estiver com um de seus números de celular será fácil, mas se não estiver, vamos depender de Laura.

— É, Lúcia, mas pelo que eu percebi, ela é uma mulher esperta. Pela conversa deu para perceber que não deu mole para ele.

— Meninas, ele já fez a ligação. O número não é conhecido, não estamos captando o sinal de nenhum número dele.

— Ele é displicente com ela, mas não é idiota. Nunca iria se comunicar com seus asseclas através de seu próprio telefone. Já começaram a triangular o sinal?

— Já, mas leva tempo. Primeiro temos que pegar os sinais emitidos da antena mais próxima daqui. Devem ter milhares de celulares conectados agora. Até separarmos as ligações e isolarmos para os sinais que vem de dentro do restaurante vai levar tempo. Depois fica mais fácil. 

Naomi e Lúcia olhavam com apreensão os painéis de transmissão. Naomi sussurrou mais para si mesma do que para alguém que estivesse presente.

— Vamos, menina, você vai conseguir…

No restaurante, Archiligias ainda falava ao telefone, antes de entregá-lo à Laura.

— Queiroz, o Serrão é imbecil ou o quê? Eu não disse que não queria ninguém identificado? Como que ele próprio vai ao encontro de Amalie?

— Ela não sabe que foi ele, Sr. Archiligias! Ele só a atraiu para um jantar, mas a droga que ele colocou na bebida dela só fez efeito quando ela foi embora. Ela desmaiou, depois que saiu do restaurante.

— E você acha que ela e a Alesha são burras? Elas vão cogitar a possibilidade de ter sido ele. Elas têm muitas coisas contra ele na empresa! Droga! Como vou soltá-las, agora? E se eu não soltar, a Laura virá pra cima de mim! O que é que vocês esperam que eu faça com minha própria filha?! Imbecis! Idiotas! Passa logo esse telefone para Alesha que eu não vou nem mais discutir com Laura por querer falar com essa sapatão dos infernos! E vê se não dá as caras para ela, Queiroz. Fica fora disso; depois eu penso em alguma coisa para remediar essa merda que o Serrão fez!

— Então o senhor não iria matá-las?

— Eu teria Laura na mão se eu as soltasse, mas agora… Depois eu penso nisso. Peça para um desses palhaços que vocês chamam de segurança dar o telefone à Alesha.

Laura se remexia na cadeira. Estava nervosa, pois seu pai já estava falando há um bom tempo ao telefone. Isso poderia ser bom para a Interpol, mas algo dizia que alguma coisa estava saindo errada. Ele parecia nervoso. Seu coração disparou.

“Será que aconteceu alguma coisa à Alesha e Amalie”?

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Um homem, empunhando uma arma, entrou no ambiente em que as duas estavam presas. Apontou a arma para elas e atirou um pedaço de pano no colo de Alesha.

— Coloque isso nos olhos e não faça nenhuma gracinha. Aperte bem o nó.

A pulsação de Alesha aumentou e sua respiração se tornou um pouco mais pesada.

— O que vocês vão fazer com ela? 

Amalie perguntou exasperada e o homem apenas a olhou com indiferença, sem nada responder. Alesha já havia colocado a venda.

— Não se preocupe Amalie, se eles quisessem me matar teriam feito isso aqui mesmo.

— Para de conversa e levanta daí!

O homem segurou Alesha pelo braço e a empurrou para fora do ambiente. Um vento soprou em seu corpo e ela percebeu que estava ao ar livre. O homem continuava conduzindo-a. Ela aguçou seus sentidos, percebendo cheiro de maresia e escutando barulho de ondas batendo contra algo. Madeira ou rochas.

“Não. Não são rochas! É uma doca. Eu estava em um contêiner. Eles o revestiram para que não parecesse um contêiner por dentro! Podemos não estar tão ferradas assim. Estão se esforçando para que não saibamos onde estamos. Devemos estar em alguma parte do porto, onde alguma empresa de Archiligias faz a recepção de cargas”.

— Segure no corrimão e comece a subir as escadas.

O homem colocou a mão de Alesha no corrimão e foi conduzindo-a para cima. Parou, abriu uma porta e empurrou-a para dentro. O ar estava gelado dentro do ambiente e percebeu que, talvez, se tratasse do escritório. O homem levou-a até uma cadeira e empurrou-a para que se sentasse. Apesar de vendada, suas mãos estavam livres e as apoiou em algo que parecia ser uma mesa à sua frente. Esbarrou em um objeto e um sininho começou a tilintar. 

“Minha bolsa… Meu chaveiro está pendurado nela”…

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Na van do lado de fora do restaurante, a tensão começava a aumentar, pois apesar do tempo de ligação, ainda não tinham conseguido isolar o sinal dos celulares daquele local específico.

— Merda! Parece que todo mundo resolveu ligar à essa hora. São milhares de sinais para essa torre!

— Calma, Macedo! Infelizmente são oito horas da noite e as pessoas estão indo para casa e se comunicando com familiares e amigos, marcando coisas ou simplesmente avisando que estão no trânsito. A gente sabe que esse horário é um inferno de ligações, mas a Laura nem começou a falar ainda com Alesha.

Archiligias parecia impaciente, diante da demora em colocarem Alesha na linha. Mais um minuto e ele escutou uma voz masculina falando.

— Pronto, chefe. Ela já tá aqui.

— Coloque-a na linha e avise à ela que falará com alguém que ela conhece.

— Ok, chefe.

Archiligias se aproximou da mesa, estendendo o celular para Laura.

— Vamos logo com isso, veja se ela está bem e desligue. Deixe para namorar depois que tudo acabar.

Um sorriso irônico bordava seus lábios e Laura segurou seu ímpeto para não contrariá-lo.

— Alô, Alesha?

— Laura! Que raio você…

— Alesha, estou negociando sua soltura. Você está bem?

“Que droga! Não é possível que implicaram a Laura nisso!”

— Nossos amigos estão preocupados, você está bem? Fizeram alguma coisa com você?

“Nossos amigos… Pensa, Alesha! Pensa! ‘Nossos amigos’ significa que Naomi e Lúcia querem alguma dica! Pensa”…

— Apesar do calor, dentro de um cubículo que parece mais um corredor, o raio de gaivotas piando, enchendo o saco sem deixar dormir, o cheiro desagradável de peixe podre e um corte na cabeça, está tudo ótimo!

— Corte na cabeça?

— Não se preocupe, vou sobreviver. Já está fechando.

— Como está Amalie?

— Um pouco assustada, mas está bem também. 

— Termine essa ligação, Laura. Você já viu que ela está bem… 

Seu pai segurou o celular e o puxou, encerrando a ligação. Laura encarou-o, incrédula.

— Você disse que ela está bem? Ela tem um corte na cabeça!

— Infelizmente, existem efeitos colaterais nessas ações, mas nada para deixar sequelas.

— Efeitos colaterais? Jesus, pai! O senhor está se ouvindo?!

— Laura, não vamos perder o foco e começar com uma discussão novamente, por ter alguns imbecis que não sabem fazer as coisas direito. Não planejei que ela tivesse sido ferida, mas ela não tem nada demais então… Gostaria que, amanhã, você providenciasse a documentação, abrindo mão das ações.

— Ei! Ei! Ei! Você quer que eu faça tudo primeiro, para depois soltá-las? Quer deixá-las presas? Não esqueça que, em termos de vivência e palavra, a minha sempre foi mais confiável que a sua. Nunca faltei com a minha palavra, mas você…

— O que você quer dizer? Quer que eu as solte, para depois preparar a documentação?

— Estamos num impasse, pois você é menos confiável do que eu. E depois, elas não podem ficar presas por dias, até porque, darão falta delas, chamarão a polícia. Será que você não vê que está em uma situação difícil! Posso fazer tudo que me pediu, pois o senhor me deixou em uma situação confortável, elas, entretanto, se começarem a faltar ao trabalho, vão desconfiar.

— Ok! Ok! Mas nem pense em me passar para trás, Laura. Contudo, só soltarei a Amalie. Você vai ter que controlar essa situação. Terá que convencê-la a não denunciar e dirá que Alesha teve que fazer uma viagem às pressas. Só soltarei Alesha depois que fizer tudo que combinamos.

Conhecia seu pai e sabia que ele não arredaria mais o pé. Resolveu concordar, pelo menos Amalie estaria livre.

— Tudo bem. Solte-a hoje.

— Não. Você terá que dar entrada na documentação, primeiro. Comece a fazer isso de manhã e, ao meio dia, eu a solto. Eu saberei que você iniciou o processo e terá tempo de suspender, caso ela não estiver livre à tarde.

Seu pai era um homem de negócios, hábil e desconfiado. Não resistiu mais e concordou com os termos. Passaria mais um dia de tormento, se a Interpol e a polícia federal não achassem o cativeiro.

— Ok! 

Levantou-se para sair.

— Ei! Não vamos comemorar o nosso acordo?

Laura não aguentava mais suas ironias. Apenas o olhou e virou-se, indo em direção à porta. Saiu do restaurante, torcendo para que a polícia tivesse conseguido rastrear a ligação. Olhou a van do outro lado da rua, encaminhou-se para seu carro e saiu, retornando à empresa. Havia combinado com Lúcia e Naomi de se encontrarem lá, por ser mais seguro.


Nota: Feliz segunda-feira e que a semana seja boa para tod@s. 

Beijo o coração!



Notas:



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5 Respostas para Capítulo 22 — Negociação

  1. Como você já postou essa estória a um tempo atrás, tenho certeza que já li, pois quando conheci seu trabalho no site ABCles saí vasculhando a internet em busca de todas as outras que havia postado. So que pelo jeito não me lembro de detalhes dela, então está sendo como estória nova.
    Alesha da Interpol?? Que charme, meu pai!!!

    Beijo, Carol

  2. UAU! UAU! UAU! As dicas foram boas, vamos ver se os policiais são espertos e consigam localizar o cativeiro. Logo, pelo amor de Deus! Não aguento tantas emoções rsrsrs Bjs

  3. Esse pai dela, merece apodrecer na cadeia, crápula, nojo de homem assim… Tomara que eles consigam achar elas, antes de assinar esse acordo.
    Amando d+.

  4. Oiee!!
    Fiquei com gostinho de quero mais!! Vc tá parcelando em 50 x?!;D
    O pai de Laura nem me surpreende mais…
    Espero q consigam rastrear…
    Bela semana pra vc TB!!Linda segunda!!
    Beijos no coração

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