APENAS UMA HISTÓRIA

Capítulo II — O amor é o bálsamo da alma perdida

 Ao entardecer, chegou ao rancho e foi direto para a casa de Sarah. Sabia que a esperavam. 

— A tia chegou, a tia chegou! — Gritava a pequena Xena, alegremente.

— Oi! Foi tudo bem? — Perguntou Virgil desconfiado.

— Foi tudo ótimo! Afrodite continua a mesma, mas ela sempre foi muito boa comigo. — Gabrielle revirou os olhos. — Quer dizer, na maioria das vezes. Deuses são… Deuses. Já temos o jantar? Estou morrendo de fome!

Todos a olharam. Há muito tempo que Gabrielle não se entusiasmava nem para comer, o que era um verdadeiro sinal de derrota, pois todos conheciam a voracidade da pequena guerreira antes de perder Xena.

— O que foi? Vocês não estão com fome?

Sarah se aproximou, segurou a tia pela cintura e a conduziu até a mesa.

— Sabe tia, espero que goste do meu javali, pois acabei fazendo uma quantidade que poderia alimentar um exército.

— Sarah, javali é javali e é gostoso de qualquer jeito, se temperou ficará melhor ainda.

Todos a olharam novamente, mas abriram um grande sorriso. Gabrielle estava empolgada e havia um brilho em seus olhos como há muito não se via. 

— Então sentemos! — Disse Lila empolgada.

Gabrielle foi a última a acabar. Todos estavam admirados com o retorno de sua capacidade de comer tanto. Ela parecia até feliz.

— O que Afrodite te falou, Gabrielle? Aconteceu algo importante para você estar tão feliz?

Perguntou Eve, desconfiada. Tinha sido uma mulher de estratégias militares. Sabia que alguma coisa havia ocorrido para ocasionar uma mudança tão radical e, possivelmente, algo muito importante. Se não julgasse ser impossível, diria até que poderia ser algo que implicasse sua mãe.

— Afrodite pode parecer fútil e despreocupada, mas ela é uma deusa sensível, sabe muitas vezes chegar até o nosso interior sem percebermos.

Eve se calou, mas não se convenceu pela explicação de Gabrielle. Para ela ter mudado tanto, não bastariam poucas palavras. A guerreira barda se sentou próximo à lareira, com todos à sua volta, e começou uma história.

“Era uma vez, duas guerreiras que viviam pelo mundo a defender pessoas de bem. Um dia, estavam acampadas em uma floresta a observar estrelas e filosofar sobre suas vidas quando um monge apareceu…”

Pela primeira vez, Gabrielle contava através de fábula o que havia ocorrido em Higuchi.

“… E assim a grande princesa guerreira libertou as almas condenadas e o enorme amor que carregava em seu coração pôde elevar as almas até seu estado de graça.”

As duas crianças já dormiam nos braços de suas mães. Todos estavam sensibilizados por saberem se tratar da história que acompanhou Gabrielle por tantos anos. Por saberem ser seu sofrimento de tanto tempo e que nunca permitiu compartilhar com ninguém. 

— Bom, parece que aquietei as crianças e que vocês já estão muito cansados também. Vou para casa dormir…

— Gabrielle, você ainda tem as cinzas de mamãe?

— Tenho, Eve. 

— Não gostaria de colocar no mausoléu de Anphipolis?

— Sua mãe me pediu para trazê-la comigo, e é comigo que permanecerá.

— Não acha que já sofre por demais? Não é por nada que digo isso, mas você sofre muito, vocês se amavam muito!

— Eve, meu amor por sua mãe não se foi com sua morte, bem como, não desaparecerá por eu ter os pertences dela comigo. Meu sofrimento foi por egoísmo e falta de compreensão dos atos de sua mãe e hoje começo a ver que eles foram mais que justificados.

As palavras de Gabrielle tocaram a todos na sala. Ficaram em silêncio. Um silêncio de compreensão e compaixão. 

Os dias se passaram e cada vez mais Gabrielle se mostrava ser a pessoa que era antes. Alegre, emotiva e simples. Brincava com as crianças, admirava a natureza com reverência amorosa, cuidava dos animais e todas as noites se reunia com família e amigos para contar suas histórias.

Uma noite, quando entrou em sua casa, sentiu um aroma amadeirado no ar. Procurou a fonte de tal perfume por toda a casa e não viu nada de diferente em qualquer ambiente. Foi se deitar para dormir. Deixou a janela aberta para que entrasse a luz da lua e para que pudesse ver as estrelas. Já sentia falta de dormir sob as estrelas e ao ar livre. Adormeceu.

Estava diante da caverna que havia visitado em sonho há duas atrás. Entrou e reconheceu o aroma que havia sentido em sua casa e agora percebia de onde o conhecia. Sentiu aquela presença acolhedora e virou-se. 

— Lao Ma?

— Sim, Gabrielle, sou eu. Creio que a conversa com Afrodite tocou sua alma. 

— Acredito que sim. O que eu mais quero na vida é dar o meu amor a Xena. Com minha tristeza não podia mais senti-la. Essa foi a grande diferença.

— E a sente hoje?

— Cada dia, após meu encontro com Afrodite e as palavras que ela proferiu, me tocaram e é como se sentisse Xena comigo a cada passo, a cada ato meu.

— Muito bem, então agora te direi o segundo motivo de te trazer aqui. Deverá sair da Grécia e seguir para o oriente, nas terras de Chin; terá que subir o monte mais alto de Chin. Não chegará ao topo, mas precisará de muita roupa quente, pois faz muito frio. Subirá pelo oeste até alcançar o primeiro platô, lá encontrará uma abertura escondida atrás de algumas rochas rochas. Dentro da caverna terá uma fonte de água quente e outra de água fria. Darei a você muitos panos de seda e com esses panos fará primeiro um pequeno saco onde depositará as cinzas de Xena e o colocará na fonte de água quente. A cada dia terá que cozer um saco maior onde pegará o saco anterior, colocará dentro do outro e trocará de fonte e assim sucederá todos os dias. Meu livro com todos os conhecimentos que escrevi estará lá. Deverá lê-lo todos os dias, após a troca. Terá comida que irá ser posta por seus deuses para que possa se alimentar, a água poderá beber da fonte fria e o banho será a água da fonte quente. Não poderá falar com ninguém e deverá ir sozinha. A cada dia é como se passasse um verão.

— Um verão para quê?

— Você saberá. Você entenderá. O dia que achar que está pronta, abrirá o saco. Apenas mantenha seu coração aberto ao amor e à bondade. Seus pensamentos terão de ser de esperança e serenidade. Nunca deixe sentimentos de medo, rancor, raiva ou ódio povoar sua mente, pois você poderá abrir portas para o bem, mas poderá abrir portas para o mal também. Este local é sagrado e é um portal de grande poder. Há outros como este em outros locais na terra, mas muito poucos os conhecem.

— E o que acontecerá se eu abrir o saco na hora errada?

— Não há hora errada, há apenas a hora melhor, mas esta, você terá que decidir. Nem eu nem ninguém poderá te dizer. A escolha é sua e será essa escolha que fará com que possamos combater Yodoshi.

— Já sei que não me falará o que conterá o saco!

— Ao longo do tempo, você também saberá e perceberá. Apenas tenha fé no amor e na humanidade. Se possível, deverá partir em sua jornada amanhã.

Gabrielle acordou, mas desta vez estava calma, serena. Era alta madrugada. Gabrielle resolveu que seria mais fácil partir àquela hora para que não houvessem perguntas. Escreveu um pergaminho dizendo que a haviam solicitado nas terras dos faraós para resolver um conflito e que não se preocupassem. Não seria a primeira vez que isso aconteceria e, possivelmente, isso resolveria.

Reuniu as roupas mais quentes que possuía, alguns mantimentos e alguns dinares. Foi ao estábulo, olhou para Agláio e depois para Argo. Pegou a sela e escolheu Argo.

“Minha amiga, iremos para um lugar muito distante e acho que você já deve estar cansada da vida mansa.” 

Partiu.

Algumas luas depois, Gabrielle já atravessava de barco o mar para o oriente. Resolveu ficar no porão com Argo. Apesar de não mais sentir enjoos com viagens através do mar, não queria se expor nem arrumar confusões durante a viagem.

Sentiu uma presença que arrepiou sua nuca.

— O que faz aqui, Ares?

O deus da guerra se fez presente.

— Apesar de não confiar em mim, zelo por sua segurança. Vejo que realmente aprendeu muita coisa com Xena.

— É fácil sentir você. Sempre causa arrepios…

— Então não é tão ruim assim. — Falou com um tom sarcástico.

— Não esse tipo de arrepios. É sempre aquele arrepio de preocupação.

— Nós temos uma coisa em comum e eu admito que você soube aproveitar. O que ainda tem que entender é que eu não quero um mundo de caos. Apenas sou parte do equilíbrio da humanidade, pelo menos da nossa parte da humanidade. Não haveria Afrodite na Grécia se não houvesse Ares e vice-versa. Apenas nós dois sobramos da arrasadora interferência de vocês duas no Olimpo. Isso, simplesmente, porque é o que é. 

Gabrielle o olhou com complacência.

— Ora, também não preciso de sua indulgência, se não houvesse você, certamente arrumaríamos um jeito. — Ares desapareceu.

Gabrielle sorriu e balançou a cabeça.

— É, Argo, alguns deuses não mudam mesmo. — Argo relinchou e Gabrielle riu em resposta.

Já cavalgava com Argo há muitas luas e o frio se fazia mais intenso apesar da estação de primavera ter chegado e alcançado seu auge. Parou numa aldeia ao pé da montanha para descansar e dar de comer a Argo. Entrou num estábulo e negociou a estadia da égua. 

Foi até a estalagem, pediu um quarto com banho e comida para entregar no aposento. Subiu, esperou que trouxessem a comida e desenrolou o pergaminho com um mapa que havia comprado no porto. Estava muito perto, a partir dali começaria a subir o monte. Resolveu que deixaria a estadia de Argo paga durante, pelo menos, cinco ou seis luas. Subiria sozinha. No dia seguinte, passou no estábulo e negociou a estadia durante seis luas.

No início, a subida até que estava fácil. O caminho estava aberto e sem empecilhos. A partir do terceiro dia, ficou mais íngreme e o vento castigava seu corpo. Aumentava o número de peças no vestuário, mas o frio penetrava sem clemência.  

“Lao Ma disse que seria difícil, mas não disse que não chegaria. Disse para ter fé”.

Falava consigo mesma para manter a razão e o objetivo, quando esmorecia pensava em Xena e tudo que fez para impedir que Yodoshi vencesse. Revigorava-se e continuava a caminhada.

Após o sexto dia, chegou a um platô.

“O primeiro platô a oeste. Foi o que ela disse.”

Começou a procurar alguma abertura por trás das rochas. Tudo estava coberto por uma neve espessa. Pegou o seu cajado e começou a dar estocadas por toda a extensão da parede. Batia em paredes duras e não conseguia descobrir a entrada, até que olhou uma estreita passagem à esquerda entre um paredão de rochas e um escarpado. Circundou e viu uma pequena entrada, quase tapada por uma camada de gelo. 

Caminhou com cuidado até a passagem e com o bastão começou a retirar o excesso de neve. A abertura  mal dava para uma pessoa passar engatinhando. Esgueirou-se e arrastou-se para dentro do cubículo. Quando conseguiu atravessar completamente seu corpo, um grande salão se descortinou à sua frente.

Levantou-se e viu uma grande mesa de pedra como muitas frutas, peixes e carne seca. Olhou a direita e viu uma cama feita de peles em cima de uma rocha com um livro pousado, uma caixa sobre tecidos de seda de diversas cores. Havia, também, um braseiro no chão — que já estava aceso — e muita lenha acumulada na parede da esquerda da caverna. Ao lado da “cama” havia uma tina e, ao fundo, duas fontes de água. 

Aproximou-se da cama improvisada e colocou a bolsa que trazia com todos os pertences. Estava acordada há mais de dois dias. Estendeu seu corpo na cama e simplesmente adormeceu.

Acordou sem noção do tempo que levou dormindo. Olhou para a pequena entrada e ela emanava luz. Era de dia. Foi até a mesa que continha comida e comeu algumas frutas. Voltou para a cama e abriu a caixa que se encontrava a seus pés. Tinha linha e agulhas de osso. Pegou o primeiro pano, o observou, era pequeno. Começou a costurá-lo e, por fim, precisava pegar a urna de Xena. Uma sensação de paz invadiu seu ser. 

“Sim, é isso que farei… Farei por você e pelo que acreditou quando se foi. Esse é o correto.”

Derramou seu conteúdo dentro do saco. Foi até a fonte da esquerda e colocou a mão na água. Era fria como o gelo. Caminhou para a fonte da direita. A água era acolhedora, quente e convidativa. Prendeu o saco por um fio e o depositou na água. Pegou o livro de Lao Ma e começou a ler.

“A escuridão entorpece a alma, faz-se presente e o vazio se instala. A verdadeira essência é limpa, sem amarras, sem enganos, sem mentiras. O mais sublime que há no ser é a pureza que emana a luz e não escraviza, não cria correntes, mas liberta o espírito… O mal existe porque nós o criamos e o fazemos vivo…”

Gabrielle resvalava para um sono profundo depois de horas que havia lido e entoado as palavras que saíam fáceis de sua leitura. Acordou e a luz já se fazia evidente pela pequena abertura da caverna. Olhou o saco e seu conteúdo parecia estar muito maior. Pegou o segundo tecido de seda e coseu um saco do tamanho do tecido. Pegou o outro saco que repousava na fonte quente e colocou-o dentro. Já tinha um peso considerável também. Passou-o para a fonte fria. 

Pegou água na fonte quente e tomou um banho, se alimentou. Pareceu que os alimentos estavam frescos, era como se alguém tivesse entrado e posto a mesa novamente. A caverna parecia limpa também, como se durante seu sono, por mágica, os detritos tivessem sido retirados e tudo tivesse sido arrumado. Pegou novamente o livro e recomeçou a leitura.

“O mundo inteiro está movido por uma vontade cega e desumana. Para transcender as limitações desse mundo, precisa deixar de querer, deixar de desejar, deixar de odiar.”

Assim aconteceu durante quatro luas e Gabrielle não sentia mais solidão, medo, temor. Seu coração era preenchido pelas palavras de Lao Ma expressas no livro e por uma esperança de que ninguém havia lhe dado, mas que sabia ser o seu maior impulso para tal tarefa. O saco já era de um tamanho considerável e era difícil transportá-lo de uma fonte para outra, mas deixou de crescer a mais ou menos uma lua e meia ou duas luas. Fazia suas tarefas serenamente e adquirira uma rotina que, agora, estava acostumada e até a satisfazia. Não cansava de reler o livro e gostava de interiorizar suas palavras.

“O céu resiste e a terra dura uma estadia longa porque não vivem para si mesmos. Portanto, quem deseja viver por longo tempo, deve viver para outros, servir a outros.”

Mais uma lua se passou e, um dia, Gabrielle acordou cedo com as palavras que Lao Ma havia lhe dito antes de subir a montanha. “A cada dia é como se um verão houvesse passado”.

Correu até a fonte de água quente, retirou o grande saco da água e começou a desamarrá-lo. Quando abriu a primeira parte, apareceu um rosto, cabelos escuros e fortes, retirou às pressas o resto do saco que envolvia o corpo. Não conseguia conter o choro. A felicidade parecia que não cabia dentro de si. Derramou lágrimas por aquele momento e por todos os anos que havia sonhado em estar com Xena novamente, apenas nunca imaginou que pudesse ser ainda nesta vida. Mas seu corpo estava inanimado. “O que eu fiz de errado?” No entanto, antes do desespero se apoderar de si, tentou rememorar tudo que Afrodite e Lao Ma haviam lhe dito. “Apenas tenha fé no amor. Foi isso que Lao Ma disse antes de eu vir”.

Colocou a cabeça de Xena em seu colo, percebeu todas as suas nuances, acariciou seu rosto. “Parece um pouco mais velha… como eu…” Inclinou-se e roçou os lábios de Xena com os seus. Beijou de leve, mas um beijo cheio de emoção. Afastou-se novamente para olhá-la e, de repente, Xena tossiu e golfou um bocado de água. Gabrielle amparou sua cabeça e Xena abriu seus olhos devagar. Demorou um pouco para conseguir focar.

Sorriram juntas, se abraçaram… Choraram. Não conseguiam segurar a saudade e o amor. 

De repente, Gabrielle soluçava e Xena se sentou para ampará-la. Gabrielle começou a bater nas costas de Xena.

— Você nunca mais faça isso comigo! — Falava batendo cada vez mais em Xena. — Da próxima vez que alguém tiver que morrer, esse alguém será eu. Não vou conseguir ficar novamente sozinha sem você nesse mundo.

— Se tudo correr bem, Gabrielle, pretendo morrer só quando estiver bem velhinha. — Falou, segurando os braços de Gabrielle e aproximando seus corpos.

Xena abraçava Gabrielle e a acalmava.

— Vamos, você tem que parar de chorar senão eu morrerei novamente, mas de frio aqui nessa caverna. — Disse, mostrando seu corpo completamente nu. Gabrielle riu, limpando as lágrimas.

— Não sei se minhas roupas darão em você!

— Ei! Não trouxe nada para me vestir?

— Espere aí, engraçadinha! Ninguém me disse que eu te traria a vida novamente. Desconfiava, mas só me dei conta que realmente estava acontecendo depois de uma lua e meia.

Xena olhou para a mesa, estava com fome.

— Quem trazia isso para você comer?

— Exatamente quem, eu não sei, mas sei que muitos deuses estão zelando e torcendo por sua volta.

— É! Eu sei. Estive com Lao Ma e ela me disse que se encarregaria de arranjar ajuda para me trazer de volta, só não disse como seria. Estou feliz que tenha sido através de você.

— Vou ver o que posso arrumar para você se aquecer, enquanto você come.

As duas se levantaram e enquanto Xena ia até a mesa, Gabrielle se aproximou da cama. Iria pegar a coberta quando viu uma sacola de couro aos pés da cama, estranhou, pois não estava lá antes e nem ela havia trazido consigo. Pegou a sacola e a abriu, tinha roupas e pareciam do tamanho de Xena.

— É… Parece que se incumbiram de te vestir também.

Aproximou-se da mesa, mostrando a sacola para Xena.

— Vou acabar me acostumando mal com essas regalias. Você ainda tem minhas armas?

— Acha realmente que eu me desfaria delas, Xena?! — Gabrielle a olhou incrédula.

— Não, não acho. Só falei para te irritar. Eu tava com saudade disso também. — Disse mordendo um pedaço de maçã e sorrindo ironicamente. Gabrielle jogou a sacola em cima de Xena e sorriu também.

Xena olhou para a cama e tinha um par de Sais e um chakran.

— Vejo que se apossou dele, mas pode ir se desapegando, ele voltará a ficar comigo.

— Você é muito convencida mesmo, né? Esse chakran não é o seu, o que lhe pertence está guardado.

— Como assim não é o meu? — Agora quem não entendia era Xena.

— Eu usava o seu chakran, mas sempre tive medo de perdê-lo em alguma luta. Então Hércules forjou esse para mim com o aço de Hefesto. Se você observar, ele é um pouco menor e tem uns pequenos símbolos. Como pode ver, é um pouco diferente do seu.

Xena o pegou e percebeu a diferença. Olhava admirada a perfeição com que Hércules o forjou.

— É, parece que agora somos duas garotas com chakran, mas o meu, continua sendo o maior. 

— Hum, exibida! — As duas riram a valer.

Xena terminava de se vestir.

— Quanto tempo você ficou aqui na caverna?

— Cinco luas e a julgar pelo que Lao Ma me falou, hoje você deve estar com trinta e sete verões. Ela disse que cada dia era como se fosse um verão.

— Ei! Eu morri com trinta verões!

— Não, você morreu com cinquenta e cinco se contarmos aquele tempo que permanecemos dormindo congeladas. Mas já se passaram dez verões desde que você se foi e eu nem trouxe você com quarenta verões. Não acha que te faria mais nova do que eu, acha? Você agora tem a diferença só de três verões para mim e ainda tá reclamando?

Xena bufou.

— Vamos, Gabrielle. Fiquei muitos anos fora de circulação e você terá que me ensinar a viver por aqui de novo.

— Então vamos descer que eu tenho uma surpresa para você.

— O que é?

— É surpresa.

— Será surpresa se você me falar do mesmo jeito, já que eu não sei o que é e quando falar eu ficarei surpresa.

— Não adianta Xena, conheço seus truques. Espere e verá.

— Então vamos, que depois que você me fez mais velha, vou ter que compensar fazendo exercícios. — Xena olhou Gabrielle de soslaio.

— Não adianta também querer me colocar com a consciência pesada, porque você não iria ser mais nova do que eu nem morta! — Gabrielle olhou para Xena antes de abaixar para passar pela abertura da caverna. 

— Estou feliz que esteja aqui! Senti muito a sua falta.

Xena olhou sua pequena barda. Tinha os olhos marejados. Uma grande emoção tocou seu coração. Poderia abraçá-la novamente, poderia acampar com sua companheira novamente, poderia sentir o seu amor de perto.

Xena a abraçou ternamente. Um sentimento de plenitude as enlaçou. Xena sentiu seu corpo tremer. Quando estava no lado espiritual, compreendeu que seu amor pela pequena transcendia a amizade. Sabia que quando retornasse deveriam ter uma conversa sobre isso. Suas almas se completavam e não mais poderiam fingir que isso não as afetava na pele.

Xena a olhou e baixou até poder alcançar seus lábios, roçou levemente e um calor inundou seu corpo. Gabrielle mantinha o rosto voltado para cima e seus olhos se fecharam ao sentir o toque de Xena, esperava que o toque se fizesse mais intenso. Como sonhou com um momento como esse, mas nunca teve coragem de abalar sua amizade com um assunto tão delicado.

Xena a beijou docemente, tinha medo também da reação de Gabrielle, porém não conseguiu segurar a vontade de senti-la em tão sublime ato. Desvencilhou com suavidade e viu que os olhos da pequena tinham um verde intenso, como um campo na primavera.

“Aaah!!! Como amo esse olhar, como sentia falta de seus olhos a me observar!!!” — Pensou.

Gabrielle também olhou diretamente para os olhos de Xena. Amava-os. Tinha dúvidas a respeito da atitude de Xena. Pendeu a cabeça um pouco de lado com uma expressão interrogativa. Sempre fazia isso quando queria uma explicação de Xena e não sabia como perguntar.

— Não me olhe assim. Não sei por que fiz. Simplesmente fiz. Agora vamos, pois não sabemos, depois de tanto tempo, o que está acontecendo no mundo lá fora.

— Certo. 

Gabrielle se abaixou e começou a engatinhar e Xena mal conseguia se arrastar para fora. Quando chegaram do outro lado e andaram até a borda do platô, Xena ficou admirada com a altura da montanha e o quanto Gabrielle tinha caminhado para subir.

— Não me admira que essas fontes sejam tão desconhecidas.

— Mesmo que as pessoas chegassem até aqui, as fontes não são nada demais se não souberem o que representam.

— Tem razão. Então, vamos descer.



Notas:

Olá!

Não demorei muito dessa vez.  😉

Bom final de semana a tod@s!

Um beijão!




O que achou deste história?

© 2015- 2024 Copyright Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem a expressa autorização do autor.