Victoria põe-se de pé, apoiando-se na mesa momentaneamente e logo após erguendo a postura iniciando a reunião da pior forma possível.

― Senhores, bom dia. É com imensa insatisfação que nos reunimos aqui hoje. Nunca em toda minha carreira, imaginei ter um avião perdido. Confesso que já cogitei vários cenários: fatalidades, incêndios, lesões. ― ela passa a caminhar pela sala, olhando nos olhos de cada um que ali estava, inclusive Martina. ― Conto com a contribuição de todos aqui e principalmente com a disponibilidade de vocês. Serão dias difíceis. A senhorita Martina Ferret será a indicada como investigadora interna e dou a ela aval para tal. Quero que comecem as investigações o quanto antes.

Olhou para Martina por alguns segundos com confiança. Após, continuou sua tour pela mesa de diretores os fuzilando com o olhar e a postura.

― Sra. Oshikaido, como diretora de finanças, não quero que se abstenha de contratar a melhor tecnologia de investigação que achar. E você Mark, como nosso advogado sênior, mobilize a equipe para que seja prioridade atender aos requisitos legais deste acidente. Quero investigação e jurídico andando de mãos dadas, ouviram? Estamos prontos para “dar a cara a tapa” e também para “arregaçar” nossas mangas em prol da BRASFLY!

Victoria parou ao lado de Mark, congelada. Havia perdido a fala. Respirou fundo e ponderou no íntimo, tentando disfarçar seu nervosismo. Ela não sabia por que havia dito aquilo. 

Tudo que seu coração menos queria era que Martina e Mark andassem “de mãos dadas”, mas entendia que era para o bem da empresa. Era mais do que natural eles trabalharem juntos. Mas era quase certo que aquele “tarado de calças”, como costumava ser chamado por William, tiraria proveito da situação.

Mark Klein tinha seus 40 e poucos anos, pinta de jovem, atlético e jovial. Andar de “mãos dadas” com Martina não seria problema para ele que havia a admirado desde o momento que ela havia entrado naquela sala. O advogado não tirava os olhos da ruiva nem por um segundo. Ele era do tipo galanteador que usava a lábia e usualmente conseguia tudo que queria apenas com a persuasão. Ele chegou a causar reações nela, a fazendo erguer as sobrancelhas, se perguntando se estava de verde ou tinha uma melancia pendurada no pescoço.

― Algum problema, Victoria? 

Quando Mark a tirou de seus devaneios ela percebeu que estava ali estatelada a sua frente, imóvel, perdida na interpretação dos seus sentimentos mais profundos. Exclamou que “não” com a cabeça e voltou a seu lugar, resoluta por fora, receosa por dentro.

Ao final da reunião, a presidente rumou para sua sala sem falar com ninguém. Vanessa a seguiu e tinha uma ideia do que tinha deixado a chefe naquele estado. Só precisava confirmar.

 

POV Vanessa

Meu Deus, será que minhas conclusões estão certas? Desde que Martina entrou nessa empresa a Vic mudou completamente. Pelos olhares que trocam dá para perceber que há algo ali que eu não sei. Mas como saber? Ela não se abre comigo. Eu tenho que descobrir, de uma forma ou de outra.

Antes das portas do elevador se fecharem, Vanessa entra, para a surpresa da chefe.

― Quer conversar, Vic?

A chefe não respondeu de imediato. Continuava olhando para o cinza das portas metálicas do luxuoso elevador que havia se fechado diante delas.

― Almoça comigo? ― Victoria responde.

― Claro. Abriram um restaurante novo aqui por perto. Quer que reserve uma mesa isolada?

― Não precisa. Quero ver gente. Sentir o calor humano, o burburinho da rua.

POV – Victoria

Por que não foi por você que me apaixonei ainda por completo, Vanessa? Olha só para você: linda de morrer, elegante, intelectual, bem-sucedida… Praticamente você consegue ler meus pensamentos e me agrada de todas as formas.

― Combinado. 

Vanessa olhava para Victoria com uma expressão de carinho. Sentiu a confusão interna pelo qual a chefe passava.

Enquanto isso, na sala de reunião, Mark investia numa conversa com Martina.

― Obrigada pelo convite, Mark, mas eu havia combinado de almoçar com meu filho hoje.

― Vamos todos juntos, assim aproveito para conhecê-lo também.

POV – Martina

Será que a ficha dele não cai que eu não quero almoçar com ele? Bonito ele é, mas sinceramente está indo com muita sede ao pote.

Ela rapidamente pensou em uma desculpa verdadeira.

― Seria legal, mas como iríamos conversar somente sobre trabalho o menino iria ficar entediado.

― Entendo. Deixa para outro dia então?

O telefone dela de repente toca.

― Oi filho.

― Mãe, não poderei almoçar contigo hoje. Tenho de ir a uma base aérea na Barra para um projeto. Nem sei se terei tempo de comer hoje!

― Cuidado com o trânsito, Thomas. Se cuida.

POV – Martina

Enfim, acho que não tem como fugir mesmo. Vou aproveitar e já adiantar os assuntos da investigação com ele. Talvez não seja tão ruim quanto parece.

― Imagino que ele tenha desmarcado. 

Mark acompanhou a breve ligação dos dois e avaliava cada movimento que a ruiva fazia. Parecia se degustar de sua presença como uma esponja absorve água.

― Sim. Desmarcou. Podemos ir? Estou morta de fome.

Martina percebeu que Mark parecia um tanto fútil pelo modo como a olhou durante a reunião. Quando se apresentaram e ela pôde perceber que ele era capaz de ter uma conversa decente, decidiu dar uma chance ao encontro. Afinal, iria depender da visão jurídica dele para a investigação.

― Onde você quer almoçar? 

Martina queria que ele a surpreendesse. O restaurante que ele escolhesse deixaria claro quais eram as reais intenções do advogado naquele encontro.

― Ouvi falar num restaurante novo aqui perto. Vamos?



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