A Ilha - Livro 1

33. A Ilha

― Vanessa, eu não concordo que esse gráfico seja mostrado dessa forma. Ele dá a entender o contrário do que queremos mostrar.

Vanessa olhou a tela que estava sendo projetada com certo desgosto e solicitou a assistente que editasse.

― Mude o eixo e oculte esses dados.

Vanessa apontava para os dados que queria que não aparecessem e Paula foi anotando as mudanças que deveria fazer. Max olhava calado a conversa das duas.

Paula veio do setor comercial para cobrir a função que Vanessa desempenhava para Victoria. A mulher tinha formação em economia e surpreendia Vanessa em tudo que fazia. Vanessa, porém, a tratava de forma neutra.

― O que você acha de avançar e mostrar as iniciativas do jurídico, Max?

A BRASFLY estava passando por sérios apuros se tratando de corte de gastos sem mandar ninguém embora. As ações tinham caído quase 30% no últimos dois dias e o RH juntamente com o setor jurídico tinham ideias para prevenir que a situação piorasse de forma que Maximiano e Vanessa tinham de estar com a apresentação enxuta para o próximo dia, apresentar aos diretores e começar a mobilização.

Maximiano abriu a apresentação de Mark.

― Pode me dar um resumo das sugestões. ― Vanessa tinha pressa.

― Não é nada enorme. Sugestão de cortes nas sedes menores, nos projetos de segurança e meio ambiente…

― É mesmo? E eu achava que o Mark gostava da Martina.

― Não são grandes cortes. Existe também uma proposta de relocação de equipe.

― Eu tenho uma coisa a dizer sobre isso. Como as buscas se cessaram e não terá investigação de acidente nenhum, podemos continuar com a ideia da Vic de relocar Martina.

― A ideia dela não foi oficializada, que eu saiba.

― Eu tenho isso na mão.

Vanessa pega um envelope pardo de sua mesa e estende a Max. Era uma carta formal de transferência preenchido a próprio punho por Victoria faltando apenas a assinatura e o carimbo de Maximiano.

― Minha nossa!

― Pois é. A verdade é que ela renderá muito mais em Brasília do que aqui.

― Tenho a impressão de que a Vic não a transferirá mais.

Maximiano ainda não sabia do envolvimento de Victoria e Martina, mas tinha conversado com a CEO por telefone após ela ter retornado do coma e ouviu dela só elogios sobre a competência de Martina.

― Veremos. Paula, você está dispensada. Preciso da apresentação com as mudanças amanhã de manhã, obrigada.

Maximiano sentiu pena da mulher. Já era quase meia-noite. Ela teria de chegar muito cedo para fazer os ajustes.

― Ok.

Paula levantou-se e despediu-se dos dois e saiu.

― Eficiente essa menina, hein!

― Ela é economista. Um gênio.

Maximiano tentava ler as expressões de Vanessa, mas não tinha sucesso algum. Ele presumiu que nada havia acontecido entre ela e Victoria na noite da virada, dado a completa tristeza da mulher ao ver Victoria partir com Martina. Em parte estava certo, não aconteceu nada significativo entre elas. Algo que perdurasse.

Em alguns minutos Vanessa também dispensa Maximiano, após o convencer de que Victoria havia deixado a carta para ser assinada. Ele levou a carta para avaliar com mais calma.

Vanessa sai da sala e toma um susto ao ver que Paula continua em sua mesa. As luzes do corredor escuras davam um aspecto sombrio ao hall. Em anos trabalhando ali, Vanessa nunca havia ficado até àquela hora trabalhando, somente quando era no escritório do apartamento de Victoria. Ver Paula ali a intrigou. Algo em Paula chamava muito sua atenção, algo que ela não sabia dizer e não queria descobrir.

― Você é vampira ou o que? Vamos embora?

Paula viu que Vanessa chegava a sua mesa e olha para ela de forma calculista. Vanessa sempre a tratava secamente e ela fazia questão de tratá-la assim de volta e sabia que isso a intrigava.

― Não sou de levar trabalho pra casa. Se você precisa pela manhã, pela manhã terá.

Vanessa cerrou os olhos e imaginou-se calando aquela boca rosada com um tapa bem dado. Além de inteligentíssima era malcriada como um capeta.

Algo em si a tocou para que a esperasse.

― Eu te espero. Não são tantos ajustes afinal…

Paula olhava para Vanessa querendo saber por que aquela mulher tinha o interesse de esperá-la e Vanessa a olhava tentando entender porque ela fazia questão de mostrar tanto serviço. A ocorreu que ela seria uma boa concorrente a ser assistente de Victoria, talvez.

― Obrigada. Só preciso de cinco minutos.

Paula respondeu com certo sorriso nos olhos ao ver que Vanessa estava desconcertada e provavelmente achando que ela queria roubar seu emprego.

Vanessa recostou-se numa mesa de canto e repousou a bolsa, abrindo o celular e olhando a mulher por trás. Paula era loira e muito semelhante a uma jogadora de futebol sueca, um pouco bruta para variar. As mãos brancas ágeis editavam a apresentação com maestria e Vanessa olhava tudo praticamente babando, mas não deixava transparecer.

― Pronto. Tudo conforme vossa alteza deseja.

Vanessa olhou para ela com certo eto achando muita ousadia ela fazer piada. Quando a mulher se virou Vanessa desfez qualquer expressão e seguiu para o elevador.

hall estava estranhamente escuro.

― Não gosta de escuro, Vanessa?

Vanessa não respondia perguntas que não tinham sentido para ela… Geralmente.

― Eu gosto. Para dormir, por exemplo.

De tão idiota que foi a colocação, Paula abriu um sorriso e gargalhou alto ao entrarem no elevador. A substituta afinal tinha senso de humor. O elevador começou a descer e Paula se pôs séria novamente.

― Será que a recepção ainda está aberta?

― Fica um guarda lá, geralmente. Alguém te buscar?

― Sim. Meu namorado.

― Ah, sim.

Saindo do elevador Vanessa despediu-se da mulher para seguir ao hall do estacionamento.

― Te vejo amanhã. Boa noite.

Paula respondeu de volta e agradeceu por tê-la esperado, embora soubesse que na verdade Vanessa queria mesmo sondá-la. No entanto, Vanessa não admitiu a si mesma que admirou Paula desde o momento em que se conheceram. O orgulho era maior. Ela nunca se perdoaria por ter investido seus sentimentos em Victoria para terminar daquela forma, com a primeira mulher que aparecesse na frente. O que sentia por Victoria já tinha passado de amor, tinha virado psicopatia.

*****

― Osmund, o que deu em você? Já disse que não fico confortável andando de mãos dadas em público.

Osmund veio ao encontro dele como se fosse o beijar e se vira, indo em direção a cozinha.

― Viu? Esse é o sentimento. Decepção, Max.

Maximiano podia ser tudo: carinhoso, compreensivo, maduro, mas tinha sérios problemas para sair do armário. Parte disso se resumia a seu receio em abrir o jogo para Vanessa, embora ela já soubesse. Osmund era irmão dela, afinal.

― Eu prometo que vou melhorar.

― Melhorar? A questão não é você melhorar. A questão é ser você mesmo.

Osmund voltou com uma maçã mordida nas mãos e encostou na parede para o ouvir falar. Max sempre foi ele mesmo, só que nunca havia passado por aquele situação antes. Tudo era muito novo.

― Eu quero esperar a Vic voltar. Eu quero oficializar.

Osmund arregalou os olhos.

― Oficializar o que, que você me dá a mão em público? Nós não somos nada um do outro.

― Não? Só preciso que respeite o meu tempo.

Maximiano disse indo para o quarto. Não gostava das brigas que andavam tendo por causa daquilo. Osmund não media palavras em nada. Ele era totalmente transparente.

Para Osmund havia o privado, que ninguém devia se meter, e tinha o público, que era reflexo do privado e natural, primitivo também. Andar de mãos dadas era uma consequência inevitável, um resultado e não uma performance. Performance para ele era outra coisa. Um acordo entra o corpo e alma de brincarem entre si de faz de conta para determinado fim.



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