A Ilha - Livro 1

27. A Ilha

A casa na orla era a última da rua e ficava bastante isolada das outras, o que fez Victoria adorar.

Martina acompanhou a morena ao seu quarto que estava reservado, o maior da casa, na parte térrea. Uma moça bastante tímida se apresentou como caseira e cozinheira, logo deixando-as a sós.

Quando entraram na suíte, ficaram chocadas com o tamanho. Além de grande, era voltada para a praia, com uma varanda bastante harmônica. Um sofá em L de madeira com almofadas confortáveis, muitos vasos de plantas, tapete, caixote como apoio de centro pequeno e banqueta branca continham a aconchegante varanda. Tudo isto sobre um deck de madeira.

A cama era estilo japonês, bem baixa e ao lado de cada ponta, esteiras de bambu. O banheiro, embora não fosse tão grande quanto o quarto, contava com uma hidro vertical e uma sauna molhada.

― Paraíso! Vou tirar as férias que eu não tiro há muito tempo.

Victoria se senta e recosta na cama com um pouco de dificuldade enquanto Martina termina de ajustar o aquecedor. Fazia frio e batia uma brisa gelada.

Martina estava mais quieta que o normal. Sabia que com Victoria o melhor seria levar as coisas bem devagar e deixar que ela ditasse a velocidade. O beijo a surpreendeu e muito, mas tinha de ser cautelosa. A CEO por sua vez sentia-se libertar-se cada vez mais do que a aterrorizava.

No dia que beijou Vanessa foi algo libertador, sim, mas não apaixonante como foi com Martina. Beijar Vanessa foi como uma aventura que ela não se sentia orgulhosa. Beijar Martina era diferente. Não era uma aventura, mas sim uma conquista de algo que já parecia estar reservado para ela há muito tempo. Um território que já era seu. Parecia que tudo o que a impedia de enxergar seu amor por Martina havia sumido.

― Martina, quer conversar?

Ela acabava de fechar as cortinas e ligar os abajures, fazendo o ambiente ficar perfeito. Nada respondeu. Seus pensamentos estão a mil. Os olhos verdes, ao chocar com o olhar de Victoria, nunca ficaram tão dilatados. Vê-la ali, naquele quarto aquecido, recostada adoravelmente na cama, não era difícil imaginar coisas.

― Você está com medo de mim, Martina?

Martina abriu um sorriso lindo e recostou-se na cama ao lado de Victoria pronta a ouvi-la, fazendo esforço para dissipar pensamentos indecentes a seu respeito.

― Eu não tenho medo de você, Vic. Eu só acho que temos que ir com calma. As coisas não são tão simples quanto imagina.

A ruiva repousa a mão sobre a de Victoria, sentindo uma onda de excitação a tomar. Como o simples toque daquela mulher a ligava completamente ela não conseguia explicar. A ruiva se referia a Vanessa e William e também a si mesma. Ela não se entregaria por completo a Victoria sem saber o que a chefe realmente sentia sobre elas.

― Nós podemos ir com calma… Bem devagar.

Ao dizer isso, Victoria respirou e pousou a cabeça sobre a cabeceira da cama, olhando fundo nos olhos da ruiva. Martina poderia pular daquele precipício logo e iniciar um beijo que ela sabia onde daria: em um lugar onde seus mais devassos sonhos a levavam. No entanto, levantou-se da cama e deixou o quarto. Victoria não entendeu nada, mas imaginou que a amiga voltaria.

E assim ela voltou, sentou-se ao lado de Victoria, trazendo uma de suas peripécias.

― Olhe estas fotos.

Martina tinha um álbum nas mãos. Victoria abriu e logo de cara deparou-se com uma foto das duas abraçadas, ainda jovens, no período da faculdade. Virou a página e mais fotos daquela época. Seus olhos brilharam de tantas boas lembranças daquele tempo onde as fotos ainda eram reveladas em estúdios fotográficos.

― Você guardou o nosso álbum! Você anda com ele? ― Victoria arregalou os olhos e sorriu com os mesmos.

― Eu levo comigo sempre…

Passando de foto em foto Victoria percebeu que além de ter uma cronologia ali, as imagens contavam algo: não só a história de uma amizade, mas sim de um amor. A morena estranhou quando a foto que julgava ser a última, a da apresentação do projeto do professor Salvatore, havia chegado, mas… o álbum ainda estava no meio.

Olhou para Martina com certo receio, virando um pouco a cabeça para o lado. Virou a página e viu uma foto que parecia ser um recorte de um jornal, com a notícia do enterro de seu pai, o que fez seu coração acelerar. Logo ao lado outra reportagem recortada, uma foto de Victoria sentada numa mesa, assinando alguns papéis, contratos da BRASFLY após alguns meses, no lugar de seu pai, já grávida de quatro meses.

Foi virando as páginas e ficava cada vez mais maravilhada com tamanha enciclopédia da sua existência, detalhes que ela mesma havia se esquecido. Fotos de Lucy quando completou cinco anos numa reportagem que saiu numa revista de famosos, seu primeiro prêmio como gestora da empresa, e mais e mais memórias de sua vida guardadas carinhosamente.

― Martina, eu estou boba! Impressionada. ― Seus olhos brilhavam de emoção.

― Vic, eu nunca te abandonei e disso eu tenho orgulho de dizer. Quando você se foi eu fiquei irreconhecível, depressiva e totalmente obcecada em você. Eu dei todo o espaço que você pediu e sempre te respeitei. Segui com a minha vida. Eu trouxe isso aqui pra te mostrar que ainda podemos ser amigas e antes de qualquer coisa que façamos. Eu não espero nada de você. Se você só puder me dar sua amizade para mim já é o bastante, Vic!

Martina deu uma pausa tentando respirar e se concentrar. O rosto dela ficava mais vermelho à medida que falava. Vê-la abrir-se assim cortava o coração de Victoria que não fazia ideia de como sua decisão de terminar a amizade com ela havia quase destruído sua vida.

Naquela época ela não mediu as consequências. Ela só queria fugir. Essa fuga a levou para longe do que ela achava ser a causa dos seus problemas e longe dos problemas ela então imaginaria estar livre para continuar a viver em sossego e recomeçar.

Mas porque eliminar Martina significava ter sossego? Por que fez isso? Por quê?

Victoria abraçou Martina junto de si o mais forte que pôde num abraço que significou muito mais do que mero toque de corpos: uma reconquista, a morte de uma saudade eterna. O abraço da ruiva encaixava tão bem que não havia lugar nenhum no mundo melhor para estar.

― Tina… Quantas vezes eu vou ter que dizer que te amo?

Victoria sentiu-se não poder errar o alvo e perder Martina mais uma vez. Num ímpeto segurou a nuca de Martina e com uma das mãos a trazendo para si e para o seu beijo que se mostrou mais profundo que o primeiro, cheio de significado, quente e forte. Estavam sozinhas e ninguém as atrapalharia dessa vez.

O toque de Martina, ao mesmo tempo que demonstrava cuidado por Victoria, demonstrava força de quem se preocupa em agradar e conduzir.

Victoria amou cada beijo e cada toque daquele momento, até que se recostaram na cama lado a lado.

― Eu nunca fiz isso.

A morena pensava agora nos próximos passos que possivelmente viriam daquela “relação” e não escondeu seu medo.

Martina sorria debilmente com os lábios fechados. ― Isso o que?

Victória apontou para ela e depois para Martina e após repousou a cabeça sobre o ombro da ruiva.

― Não se preocupe. Pense que temos o mesmo equipamento e então vai ser fácil. Eu vou cuidar de você. ― Martina sabia que Victoria gostava de pisar em solo rígido e odiava a ideia do desconhecido. A verdade era que a ruiva havia imaginado aquele momento muitas vezes durante sua existência e parecia saber exatamente como agrada-la e o que dizer.

Quando sentiram a noção do espaço e do tempo perceberam o barulho da chuva e das trovoadas. A noite já dava seus indícios com a queda da temperatura. Martina percebeu Victoria respirar mais fundo que o normal. Estava cochilando em seu ombro, agarrada em seu braço esquerdo.

Ficou com receio de mexer e acordá-la, mas era preciso. Queria que recosta-se completamente. A cobriria com uma coberta e iria tomar providências para o jantar. Torcia para que sua mãe não viesse e conhecesse Victoria. Isso seria o fim.

Sim, sua mãe. Lucinda Ferret estava na cidade para um de seus concertos pela Europa.

Fez carinho no rosto de Victoria e chamou-a muito suavemente para que deitasse e ela atendeu, grogue, mas muito atraente. Perguntou com a voz rouca: ― Onde você vai?

Martina já vinha com um cobertor a cobri-la.

― Shhh… Descanse. Eu vou ver o jantar. ― Observou como continuava exuberante, mesmo prestes a desmaiar de sono.

Muito linda! Perfeita!



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