POR ÐIANA ŘOCCO
Revisão: Naty Souza
Cartografia: N. Lobo
Mapa de Âmina
>>> LX <<<
Dias depois, Agripina nos contaria que só falou porque reconheceu Alexandra. Nos seus primeiros dias no Castelo, servindo refeições pela casa, acompanhou muitas vezes as visitas que minha mãe recebia. Assim, conheceu sua sobrinha, e torcia secretamente por ela. Não só Agripina, aliás; muitos dos empregados se revelaram torcedores dos rebeldes.
Naquela noite, contudo, deixei um pequeno batalhão guardando a casa principal e parti com os soldados restantes. Ninguém deveria entrar ou sair da casa sem as minhas ordens, eu disse, agora certa de nossa vitória, mas muito temerosa quanto ao destino de meu pai:
— Ninguém nessa casa deve ser maltratado — ordenei — O Rei não está aqui, e os empregados são inocentes.
Os homens assinalaram em compreensão, e deixei Diana chefiando esse grupo.
Montei Amora, o coração assombrado, temendo o que encontraríamos.
— Se Matilde estiver mesmo com seu pai, então a luta já acabou.
— Será mesmo, Mestre?
— Sim — interveio Alexandra — conheço Matilde, não há chance de ter nos traído.
— Sem as informações dela, nem sequer estaríamos aqui, Aléssia, você sabe disso.
O raciocínio de Amaryllis era correto. Mas, como saber? Os empregados estavam certos quanto ao casamento. Segundo eles, meu pai teria começado os preparativos apenas dez dias antes. O que havia mudado depois de meu encontro com ela? Que propostas meu pai teria lhe feito?
Alex se destacou de nosso grupo e foi gritando por reforço, de maneira que éramos um pelotão quando chegamos à casa de Matilde. Esperava encontrar luta entre a guarda de meu pai e os soldados rebeldes, entretanto a casa estava vazia. Nas cercanias, populares buscavam lugar para se esconder. Gritei para que ficassem dentro de suas casas até que o conflito terminasse. E foi quando começaram a retornar para dentro dos prédios, que notei um pequeno grupo de pessoas vestindo mantos escuros. Um deles andava com dificuldade, atrapalhado com as vestes. Vi a ponta de uma lâmina aparecendo sob os panos e o apontei para Alex. Cercamos o grupo.
Soldados são treinados para reagir, não para pensar. O instinto básico dos guardas de meu pai foi protegê-lo. Então, atiraram longe seus mantos, cercaram o Rei e nos mostraram suas espadas. Éramos um grupo muito mais numeroso, contudo.
Acompanhada por Alexandra, desmontei Amora e me aproximei. Tive o cuidado de manter Brenda em sua bainha, e creio que, por alguns instantes, meu pai julgou que eu vinha para salvá-lo, por isso tomou a dianteira de seus soldados. Logo seu olhar vagou para Alex, e ficou claro que ela não era minha prisioneira. Também Matilde olhava para Alexandra, e dela para mim. Não sei o que passou por sua cabeça, se seu coração apaixonado compreendeu o vínculo que nos unia.
— Renda-se, meu pai, e nenhum mal lhe será feito, dou-lhe minha palavra.
— Por que não me disse que queria o poder tanto assim? Não precisava se unir a meus inimigos. Poderíamos ter chegado a um acordo, sozinhos.
— Renda-se, meu pai. É o melhor a fazer.
— Vocês acham que estão inaugurando um novo tempo em Âmina! E quem escolhem para colocar no trono? Uma Amaranto? — disse para Alex, provocando-a, e suas palavras se transformaram numa risada nervosa — Tolos! Nada mudará! Ela está usando vocês. Vai tomar o poder e será ainda pior do que eu! Ela fez o pacto da Pedra. Ela é governada pela Pedra, e muito mais do que eu!
— Cale-se! — ordenei, em voz agressiva. A Pedra não era assunto para ser tratado no meio do povo.
— A Pedra adorou você desde o início, não é? Ela gosta desse seu maldito sangue O’Liath!
— Morda a língua antes de falar de minha mãe! — vociferei. Ele se limitou a rir. Dei dois passos em sua direção, mas parei porque uma flecha caiu a meus pés. Não olhei em volta para buscar o atirador, contudo agora sabia que meu pai tinha homens cercando a região.
Matilde se mantinha cuidadosamente ao lado do Rei, observando-me. Estávamos muito próximas, e seu olhar duro é a última coisa da qual me lembro nitidamente, porque a partir daí as coisas aconteceram muito rápido.
O que vou lhe contar agora é uma reconstrução que fiz usando tanto minhas memórias, quanto os relatos de testemunhas. Só tenho lembranças do horror, contudo, como chegamos a ele, ainda me parece uma incógnita.
Populares iam e vinham de todos os lugares, apavorados, uma desordem total. Não sei de onde surgiu a criança, vi apenas quando um soldado a atirou nos braços de meu pai. No instante seguinte, Aran estava com uma faca colocada no pescoço da pequena. Era uma menina de sete ou oito anos. Não derramou uma lágrima; olhava-me com uma expressão interrogativa, e vi nela todas as mortes que eu carregava nas costas.
— Renda-se você, e faça seu pessoal depor as armas. Pouparei a criança se fizer isso.
— Já me enganou assim uma vez, pai. Não cometerei o mesmo erro pela segunda vez.
— Vai deixar a criança morrer?
— Vou matar você, se preciso for.
Não era verdade. Como eu poderia fazer isso? Amava-o. Mesmo vendo seu rosto irado arrancando a cabeça de Lara. Aquele homem cruel era um Rei dos horrores. Mas, não era meu pai. O verdadeiro Aran de Amaranto estava preso por trás da coroa, para além do Espírito da Pedra. E meu sonho era resgatá-lo. Mais do que salvar o reino, meu sonho era salvar meu pai. Confesso essa falha de caráter: meu amor por meu pai movia-me, mais do que minha compaixão pelo povo!
— Me entregue sua espada, Princesa. Seu pai soltará a criança em seguida, eu prometo — disse Matilde, que depois se dirigiu ao Rei — Aléssia me entregará a espada e ficará como nossa refém. Você soltará a criança, para que todos aqui vejam que não somos perversos, e não temos nenhuma intenção além de manter o trono, que é nosso por direito. Está bem?
O plural e a falta de tratamento formal chamaram tanto minha atenção quanto a de Alex, que olhava a amiga de queixo caído. Aquela Matilde sedenta por poder era uma novidade!
Meu eto foi maior quando meu pai concordou. Havia em sua voz um tom de resignação que eu desconhecia. Sem alternativas, desembainhei Brenda com muita calma, temendo que qualquer descuido custasse a vida da menina. Meu grupo de soldados era maior, e eu torcia para que Alex fizesse o que precisava ser feito, mesmo que isso custasse a minha vida.
— Tenho sua palavra, Matilde? — eu disse, mais para ganhar tempo do que por qualquer outro motivo.
— Não há o que temer, Aléssia — respondeu com firmeza, encarando-me. Eu, entretanto, não estava em posição de discutir.
A maneira correta de entregar a espada ao inimigo é desafivelar e deixá-la cair a seus pés. Ao invés disso, liberei Brenda de sua bainha, cuidadosamente, e entreguei o cabo para Matilde, a ponta voltada para mim. Esperava que, tendo essa oportunidade, a cortesã cravasse a espada em meu peito, o que faria Alex reagir com fúria. Mas, não foi o que aconteceu.
Matilde segurou o cabo com leveza e, sem desviar os olhos dos meus, disse a meu pai para soltar a criança.
— Estou com a espada apontada para Aléssia. Solte a criança, Aran.
Havia tanta dureza e ameaça em suas palavras, que me perguntei se eu realmente conhecia aquela mulher. E meu pai, que eu nunca vira obedecendo ninguém, soltou a menina, que correu para longe, aos prantos, gritando pela mãe.
Foi então que as desgraças caíram sobre minha cabeça. Matilde firmou as duas mãos no punho de Brenda e, sorrindo para mim, girou minha espada no ar com uma velocidade impressionante. O gume da arma cravou-se no pescoço de meu pai, que tentou gritar. Sua voz borbulhou no próprio sangue, enquanto Matilde, histérica, o amaldiçoava por todo o mal que lhe causara. Alex e nossos soldados avançaram sobre os homens da guarda real. Segurei Matilde pela cintura e tentei fazê-la soltar a arma. Senti um movimento, quase uma brisa, raspar por meu braço e, nesse momento, Matilde soluçou, levando as mãos ao peito.
Havia sangue entre seus dedos enquanto o corpo caía sobre o meu. Tive a ilusão de que seria sangue de meu pai, contudo, enquanto a recostava no chão, vi a maldita flecha. Gritei de desespero, mas ela se limitou a sorrir tristemente, e acariciar meu rosto com os dedos ensanguentados.
— Meu amor…
Sua voz era um sussurro torturado, quase inaudível. Depois estremeceu e a cabeça pendeu para trás, os olhos vidrados, sem vida.
O corpo de Matilde pesou nos meus braços, e desejei que uma espada separasse minha cabeça do corpo. Porém, foi outra a cabeça separada. Com um baque surdo, Breno completou o que Matilde começara. E dessa maneira a profecia se cumpria, com meu pai sendo morto pela minha espada.
Em um único momento, perdi duas pessoas fundamentais em minha vida. Nunca vou superar completamente essa dor! Convivo cotidianamente com essas mortes, sendo que as de Lara e Matilde, pelas quais me sinto profundamente culpada, assombram-me em todos os meus sonhos, até hoje.
Naquela noite, contudo, empurraram-me na direção de Amora, e montei por puro instinto. Gritos de júbilo surgiram aqui e ali, para logo depois estarem por toda parte. Alex segurou as rédeas de minha montaria e puxou-a gentilmente. Breno esporeou seu cavalo e avançou, com a cabeça do Rei espetada na ponta de minha espada. Erguia-a como um porta-estandarte, e as pessoas se regozijavam por onde aquele horror passava. Alex começou a trotar, levando Amora a seu lado, e Douglas, o surpreendente Douglas, agarrou um dos meus braços e o ergueu em triunfo. Cavalgamos assim, comigo ao lado dos dois, e era como se saudássemos a multidão, que surgia por toda parte em urros de alegria. Não me envergonho de dizer que chorei copiosamente o tempo inteiro. O que as pessoas viram naquele dia foi a dor desesperada de uma filha, não a alegre vitória de uma Rainha.
Rumamos para a Casa Principal, seguidos pela multidão, em um cortejo vitorioso. Deixei que me levassem escada acima e, no momento seguinte, eu estava na janela de meu quarto. Lá embaixo, a multidão inundava todo o terreno, e aguardava meu discurso.
Exatamente como agora.
— Os nobres a esperam no salão, Majestade.
Essa jovem que está agora nos chamando, essa bela aia que cuida de mim, é sobrinha-neta de Lara. A terceira geração de mulheres de uma mesma família a nos servir. Fazem parte de quem sou, são minha família também.
Os nobres, hoje, são Alexandra, Breno, Douglas, Amaryllis, Diana e tantos outros que me serviram com lealdade na transição do governo. E foram tempos difíceis, aqueles. Tempos longos e escuros, como a Noite da Tomada do Castelo.
Como você vê, estão nos aguardando e terei que abreviar meu relato. Talvez, em outra ocasião, possamos conversar sobre o período de transição. Por agora, vou apenas lhe contar que o discurso de vitória foi interrompido pelo som de trombetas: o exército real.
Ao encontrar o primeiro vilarejo abandonado, Chad percebeu a cilada. Levou algum tempo para reunir o restante do exército. Eu os dividira em três, lembra-se? Foram para povoados em uma mesma região, mas não tão próximos. Os outros também estranharam ao encontrar os vilarejos desertos, no entanto temeram uma emboscada. Sabiam que corriam perigo, todavia, de onde ele viria? Foi Chad quem entendeu tudo: o alvo era o Castelo, não eles! Contudo, como eu disse, demorou a reunir o restante do exército.
Chegaram ao Castelo prontos para a luta, não obstante encontraram os portões fechados. E assim permaneceram os portões, até minha chegada à muralha. Fui recebida pelos insultos de meu ex-instrutor.
— Homens — gritei — dirijo-me a cada um de vocês. Deponham suas armas, e permanecerão a serviço do Exército Real. Tivemos uma troca no comando, nada que afete diretamente a vida de vocês, a não ser pelo fato de que sou uma pessoa mais benevolente do que meu pai. Sim, nessa noite tomei o poder de Âmina e sou sua nova Rainha. Não há mais nada que vocês possam fazer, além de morrer. O exército que tenho dentro dos muros é muito superior ao seu, numericamente. Por isso, apelo para o bom senso de cada um: larguem suas armas, e permaneçam servindo ao Exército Real.
Eu ainda não havia terminado de falar, e muitos soldados já estavam atirando longe suas espadas, lanças, facões. Minutos depois, apenas Chad e alguns cavaleiros de elite permaneciam em posição de defesa. A essa altura, os dois destacamentos enviados por Alexandra, cada um partindo de um portão diferente, já havia cercado aqueles homens, e os que não me ofereceram suas armas foram presos. Não permaneceram muito tempo detidos, contudo: não possuíam nenhum motivo para se rebelar contra mim, e me prestaram juramento dias depois.
Passamos aquela noite recolhendo corpos, cuidando dos feridos e perseguindo nobres. Acredita que Alex só soube da morte de Matilde ao encontrar o corpo? Veja só como é a guerra! Aconteceu ao lado dela e, no entanto, só se deu conta horas depois. Foi tomada pela euforia, ao ver meu pai agonizando. Ocupou-se com esse espetáculo, e perdeu de vista o que acontecia em volta. O choque de encontrar a amiga morta trouxe Alex para dentro dos horrores daquela noite.
O trabalho se estendeu por toda a madrugada, e entrou sem pausas no dia seguinte. Passava bastante do meio-dia quando alguém tocou de leve em meu ombro. Eu estava em uma das muitas casas do círculo intermediário, onde Alexandra improvisara espaços para cuidar dos feridos.
— Majestade, por favor, vá descansar!
— Ainda temos muito trabalho, Douglas, como posso parar?
— Deixe-nos cuidar disso, Majestade. Alexandra lhe aguarda na Casa Principal.
— Pare com esse formalismo, rapaz! — ralhei — Você me conhece desde criança!
O marido de Amaryllis ficou roxo de vergonha, e tropeçou nas palavras seguintes. No fim, optou por não me chamar de coisa nenhuma, apenas insistiu para que eu fosse para casa, e assim o fiz.
Alexandra me aguardava em meu quarto. Estava banhada e com roupas novas. Uma tina com água morna estava preparada, e Alex dispensou as criadas. Ajudou a me despir, depois esfregou minhas costas, exatamente como no dia em que nos amamos pela primeira vez. Seu toque sutil, a respiração próxima, tudo isso fez meu sangue ferver. Era nosso primeiro momento de intimidade após meses de separação. E céus, como foram meses difíceis! Como ficou nítido para mim o quanto amava aquela mulher!
Após o banho, comemos e dormimos, exaustas demais para qualquer coisa além. Porém, horas depois, com o sol já se pondo, acordei com beijos miúdos distribuídos em minhas costas. As carícias desceram por minha coluna, despindo-me suavemente, e assim eu tinha novamente as mãos de Alex em minha pele. Tocou minhas nádegas, passou a mão por baixo de meu corpo e bastou que um dedo resvalasse em meu clitóris para me ter molhada de paixão e saudades! Deixei que minha mulher fizesse o que bem entendesse comigo e, apesar do cansaço extremo, nos amamos por horas.
Nos meses seguintes à conquista do trono, fizemos dezenas de julgamentos diários. A velha nobreza foi morta ou enviada para servir nos campos. E agora a multidão se espreme entre minha janela e o muro. O movimento vai além, saindo das dependências do castelo. Há um acampamento gigantesco no nosso entorno, pessoas que vieram de longe para as comemorações, e esse acampamento avança ao longo das árvores mais próximas. Sim, agora temos árvores por quase toda a planície. Abrimos canais para que a água do Rio Raso pudesse fertilizar a terra. É uma paisagem bonita de se ver, não é?
A multidão de hoje é várias vezes maior do que a da Noite da Vitória. Mas, uma coisa me leva à outra de forma inexorável. Não, não vou me aproximar da janela, não quero que gritem por um discurso, não tenho mais fôlego para discursar.
Há vinte anos, na Noite da Tomada do Castelo, também não tive fôlego. Trouxeram-me à janela e ergueram meus braços para o povo, que gritava meu nome em triunfo. Foi Alex quem falou com eles, e não sei o que disse. Eu estava ali, porém não via nem ouvia nada. Alexandra já me repetiu mais de mil vezes tudo o que falou naquela noite, e eu sempre me esqueço. Se pudesse, esqueceria aquela noite como um todo. Todavia, não posso, e até hoje sonho com ela. Com a declaração de amor de Matilde, e seu corpo tombando sem vida, a cabeça de meu pai exibida pelas ruas do Castelo de Três Círculos.
A multidão se agita na expectativa de me ver. Olhe os mantos negros das mulheres da Irmandade Matilde Casares, consegue ver? Ao fundo, à esquerda dessas mulheres, há um jardim florido que avança pelo antigo Bosque Sagrado. Derrubei todas as árvores até o local em que ficava a Pedra. Essa foi destruída em pedaços, e suas lascas forram o forno da nova forja da ferraria. Não há força de limpeza melhor do que o fogo! Nunca mais sonhei com o Espírito da Pedra, nem senti a marca. Essa, aliás, praticamente desapareceu de meu braço.
No local onde antes ficava a Pedra, está erguida a estátua de uma jovem, posicionada de modo a olhar eternamente para meu quarto. Lara. Tudo à volta dela são flores, só depois começam as árvores do bosque. Essas avançam para além dos muros e saem do Castelo. Foram as primeiras árvores na planície. Hoje a paisagem que vejo de meu quarto é verde até o sopé do Monte Vermelho.
A Rainha Aléssia de Amaranto O’Líath me sorri com doçura, depois faz um gesto para que sua jovem aia ajude-a com o manto. A porta se abre e Alexandra, com seus inesquecíveis olhos cinza, nos sorri.
— Ah, olhe Alexandra — a Rainha me diz — começou a deixar os cabelos crescerem na noite do triunfo. Já lhe disse mil vezes que sinto falta de seus cabelos curtíssimos, mas ela sabe que a acho linda de qualquer jeito. Parece tão jovem quanto era quando a conheci! E pode parecer insano que eu diga isso, pois Alex é vinte e um anos mais velha do que eu e, na juventude, eu pensava nela como uma jovem senhora. Como eu era tola! Minha Alex era tão jovem e tão triste naqueles dias de guerra! É bom vê-la agora, sempre sorrindo, sempre bem disposta e humorada. Feliz. No entanto, sinto falta dos cabelos curtos…
Alexandra ri dessas palavras, e oferece o braço para que a Rainha se apoie. Embora mais velha, é mais alta e mais forte que sua mulher. Rainha Aléssia quebrou o quadril em um tombo de cavalo há poucos anos, e desde então anda com dificuldade.
Alexandra usa os cabelos em um charmoso coque enfeitado com flores. Traja um vestido verde, que combina muito bem com a cor de seus olhos. A Rainha Aléssia veste seu fardão predileto, e leva a capa como símbolo de soberania.
Saímos do quarto, deixando a jovem aia cuidando dos aposentos reais. Nossa Majestade interrompe o passo, pouco antes da escada, e aponta para as pessoas reunidas lá embaixo:
— Clausius e Serena, filhos de Breno e Irina, os futuros soberanos dessa terra — a Rainha me conta, como se eu não soubesse. Mas, não a interrompo — Sim, Breno assumiu Irina como esposa. Foi a forma que encontramos para recompensá-la pelos danos que meu pai e eu lhe fizemos. Foi uma decisão acertada, porque os dois aprenderam a se amar e são felizes juntos. Mas, apesar disso, e de todas as histórias que as pessoas do Castelo lhe contam, Irina ainda me odeia. Não entra em minha casa. Há muito a dispensei formalmente de todas as nossas celebrações. Não há porque torturá-la com minha presença. Por isso, a presença dela aqui, hoje, é um marco. Ali está ela, atrás dos meninos, de mãos dadas com Breno. Ao lado dela está Diana, com seu sorriso radiante. Gustavo, seu marido, de mãos dadas com Margareth, a linda filha do casal. E atrás de Diana está Aleka, sua belíssima aia. Que os deuses abençoem a união que há entre elas. Como eu gostaria de ter ainda o mesmo com Lara!
A essa altura a Rainha faz um sinal para que eu me aproxime, apoia-se em mim e recuamos alguns passos até a soleira de seu quarto:
— Durante muitos anos fomos grandes companheiras, Diana e eu. Dias após a vitória, Alex me disse afinal o que pretendia dizer no dia em que meu pai me capturou: que eu não era um objeto para ser sua propriedade, e que poderia aquecer minha cama com quem quisesse, desde que jamais fizesse isso em sua frente. E assim levamos nossas vidas, ambas sucumbindo à ternura de algumas encantadoras mulheres. E fomos cúmplices nessas paixonites, e felizes nessa nossa forma de dividir a vida. Amar é deixar ser. Aprendi isso com Alexandra dos Olhos Cinzentos.
Saímos do quarto, a Rainha interrompe o passo, e continua a me apontar as pessoas:
— Amaryllis e Douglas são esses nos primeiros degraus da escada. Sei que Heitor e Renan, filhos deles, devem estar do lado de fora da casa, aguardando com seus colegas, os soldados de minha guarda pessoal. Mestre Renan nos deixou dez anos depois da vitória. Viveu o bastante para ver seu sonho concretizado, e para conhecer os netos. Morreu feliz, mas entristeceu nossos corações.
Dou um passo em direção à Alexandra dos Olhos Cinzentos, mas a Rainha me segura. Demora-se um instante observando o pequeno hall que separa seu aposento particular da escada. Há, aqui, uma estátua de Rei Aran.
— Mandei esculpi-la, apesar dos protestos de todos os que me são próximos. Digam o que quiserem, amo meu pai. Não o Rei, não o homem cruel que empobreceu o povo e se regozijou com seu sofrimento. Não esse homem, e sim meu pai. O homem que deixava seus conselheiros esperando e brincava comigo. O homem que me ensinou a ser quem sou.
Retira uma rosa do belo buquê que enfeita o hall, e a coloca na mão daquele homem garboso.
— Mandei retratá-lo em trajes civis, e com o olhar doce com que sempre me olhava. Meu pai — disse, emocionada — o homem que, apesar da maldição, abriu uma brecha no próprio coração e me ensinou a amar.
Fim, por enquanto…
Aléssia, um sonho que continua: notas, dedicatórias e uma surpresa
Aléssia foi escrito entre 2012 e 2013, em dois certames do NaNoWriMo, uma espécie de competição literária que consiste em escrever cinquenta mil palavras ao longo do mês de novembro. Escrevi 50552 palavras em 2012, e me desesperei ao perceber que a história mal estava na metade.
A ideia do NaNoWriMo é oferecer ao escritor uma oportunidade para escrever o primeiro rascunho de um livro. Sendo “forçado” a escrever uma média de 1667 palavras por dia, o desafio do autor é encontrar maneiras de lidar com as dificuldades que normalmente nos atrapalham: bloqueios criativos, dificuldade para encontrar tempo para escrever todos os dias, preocupação excessiva com a qualidade do texto, coisas assim.
Quando terminei meu primeiro NaNoWriMo, sentia-me cansada e frustrada: apesar de ter preparado um roteiro para a história, o resultado final não se parecia com nada do que eu pretendia dizer. Agora tinha mais de cinquenta mil palavras e não sabia o que fazer com elas!
Esqueci o arquivo em uma pasta do computador e não pensei mais no assunto.
Mas novembro chegou novamente e, com ele, a euforia de meus amigos escritores: mais um NaNoWriMo! Acompanhando os preparativos de meus amigos, e lembrando da sensação única de cruzar a linha de chegada, no dia primeiro de novembro de 2013, de maneira bem intempestiva, decidi retomar o texto de Aléssia e concluí-lo. Perdi dois dias relendo meus originais, e então me atirei na empreitada, decidida a concluir a narrativa, que precisou de outras 52281 palavras.
Dedicatórias:
Às meninas do Lesword, sem as quais não teríamos Aléssia
A história que vocês acompanharam ao longo desses onze meses, aqui no Lesword, ficou esquecida em meu computador até meados de 2016, quando Isie Lôbo e Carolina Bivard me incentivaram a revisá-la. Meu eto ao mexer nesses arquivos abandonados foi perceber que a história era boa. Sim, tinha uma série de erros, como é natural com os primeiros rascunhos, mas havia ali um material a ser trabalhado. Isie foi fundamental na primeira fase da reestruturação. Sua dedicação, opiniões sinceras e excelentes ideias me mostraram a direção a seguir com o texto. As inúmeras horas de conversa e sua revisão detalhada da história, observando incoerências, esquecimentos e problemas técnicos determinaram o sucesso de Aléssia, nessa sua primeira publicação. A revisão gramatical de Isie também poupou vocês, leitoras, de meus vícios de linguagem e de minhas péssimas vírgulas (valeu, Lobão, pelas aulas! De agora em diante todos os meus escritos terão um pouquinho de você ).
Carolina Bivard, minha amada Mestra e uma especialista em Fantasia, trouxe para esse texto do Lesword – e continua trazendo, para aquilo que será o texto final de um livro, a ser lançado em 2018 – orientações de como aprofundar temas e explorar melhor a narrativa fantástica.
À NatySouza, pela inestimável ajuda na reta final
Como vocês devem ter observado, no último mês de postagens a revisão de Aléssia passou a ser feita pela NatySouza, que trouxe um frescor maravilhoso ao projeto. Além de um olhar de rapina para localizar conjunções mal empregadas e desagradáveis repetições de palavras, sua visão crítica da história ajudou – e muito! – a reestruturar o final do texto, trazendo muito mais emoção e colorido ao que era, inicialmente, um texto apressado e focado exclusivamente em fechar as arestas da narrativa. A Naty ainda não sabe, mas pretendo explorar um pouquinho esse seu talento crítico no projeto do livro (não contem pra ela, é segredo!)
Às leitoras comentaristas
Não existe termômetro melhor do que a opinião do leitor, nem nada mais gratificante do que comentários em um texto compartilhado na internet. Quando “desengavetei” Aléssia, percebi que o texto poderia ganhar mais detalhes e se transformar em livro. Dessa maneira, ao postar no Lesword, tomei o cuidado de guardar cada um dos comentários recebidos, para que me servissem de norte durante a reestruturação do texto. E foram tantos incentivos, sentimentos compartilhados e ideias sobre os rumos da história, que decidi dar um presente a essas leitoras mais do que especiais: todo mundo que comentou em Aléssia, do dia 11/11/16 a 06/09/17, receberá um eBook em edição especial, com o texto completo publicado aqui no site. Foi a forma que encontrei de retribuir o carinho e o apoio de cada uma de vocês, e de deixar claro a todos quão importantes são os comentários, e como todo mundo se beneficia com eles.
Agradecimentos finais
Sendo Aléssia um projeto tão extenso, que me acompanha desde 2012, é difícil agradecer a todo mundo que efetivamente contribuiu para que essa história estivesse hoje publicada no Lesword. Entretanto, não posso encerrar sem um agradecimento especial à Fabi Mendonça, primeira pessoa a conhecer Aléssia, e que me deu incentivo, apoio e ideias durante o frenético processo de escrita inicial. Foi ela também que impediu que a primeira metade do texto terminasse no lixo, tal meu desgosto com o que estava escrito, e é quem atualmente me ameaça de morte, caso mude o nome de Âmina, coisa que eu pretendia fazer no livro. Então, se mais alguém aqui detesta esse nome, saiba que a culpa é todinha da Fabi
Agradecimentos especiais também à Fabiula Bortolozzo e Tattah Nascimento pela leitura crítica dos originais, apontando falhas de continuidade e problemas de ambientação histórica do texto.
Literatura está longe de ser uma arte solitária. Uma obra literária é o resultado da técnica e inventividade do escritor, aliada às opiniões, sugestões, críticas e correções de amigos, leitores críticos, revisores, editores e todas as pessoas que se envolvem durante o longo processo de preparação de um livro. Fica aqui meu reconhecimento público a todo mundo que contribuiu para que Aléssia fosse um grande sucesso, deixando já meu apelo para que permaneçam do meu lado enquanto encaro o desafio de fazer dessa história uma saga inesquecível.
Até 2018!
Que história incrível.
Eu venho lendo a dias e por ser tão antiga acho que nem comentei nos capitulo anteriores,mas fiquei vidrada a cada momento, amei todo o contexto e desenvoltura. Infelizmente, cheguei bem tarde, mas,parabéns a Diana e todas envolvidas.
Simplesmente ótima sem palavras, ?????
Parabéns…
????
Ainda bem que comecei a ler depois de concluída fico agoniada com a espera do próximo capítulo, é que ruim que não acompanhei com isso não vou ganhar e-book ???
Qual é, Bichão… eu que agradeço o imenso prazer de conhecer Aléssia e a incrível oportunidade de acompanhar esse processo criativo impar, que é você imersa nas palavras, como quem manipula elementos da natureza e porções mágicas.
Claro que seus momentos de consubstanciação de sentimentos irados,com o ciume escorrendo dos olhos e das palavras, foram de fazer esse lobo bobo sair ganindo desesperado. Mas nois é forte e lá estávamos para o próximo capítulo, mesmo que tremendo de medo.
Esperando, ansiosamente, por mais das letras da Diana Rocco
😉 🙂 🙂
Queria dizer q estou sem palavras para essa historia e que historia em !!!
Alessia esta sendo umas das minhas historias favoritas! não tenho nem o que dizer, só sentir com o fim dessa historia 🙁 Nao vejo a hora de chegar 2018 pra entrar na fila e comprar esse livro!! e vc n tem noçao do quanto fico ansiosa em saber que nao é o fim definitivo de Alessia *-*
Você é demais Diana !! você sabe como conquistar os leitores em cada palavra, cada paragrafo !!
Quero muito mais historia sua e muito mais sobre Alessia!!
beijoo :* <3
Queria acrescentar que valeu a pena cada minuto lendo esse historia!
Gratidão pelo carinho e pela generosidade do comentário, Beatriz! O fundamental no trabalho de escritor é isso: tocar o coração das pessoas. Literatura é comunicação; se não há diálogo, algo está errado. Esse é sempre meu foco quando escrevo: trazer algo que seja relevante para o leitor. Ainda que à primeira vista possa parecer “uma história bobinha”, procuro deixar um rastro a seguir, um “algo mais” para reflexão, uma abertura para nossos sentimentos (acho que minha próxima história aqui no LW – que será bem diferente de Aléssia – se encaixa nessa descrição). Então, quando depois de meses de elaboração, a gente tem um retorno tão positivo, isso é o sinal claro de que o trabalho está indo na direção correta.
Pretendo dedicar 2018 à elaboração de Aléssia. O texto, a ser publicado na Amazon, será uma versão mais aprimorada deste que vocês acompanharam aqui. Novos personagens, novas situações, aprofundamento de questões que passaram meio raspando nessa primeira versão. E uma vez que esse texto esteja concluído e publicado, então será a hora de olhar a história de Aléssia por um outro ponto de vista, dar voz a personagens que só conhecemos pelos olhos da Princesa de Âmina e, de quebra, aprofundar nossas reflexões sobre coisas como patriarcado, misoginia, feminismo e identidade de gênero. É, tem um bocado de coisas vindo por aí
Um beijo enorme, muitas felicidades pra você, e até a próxima história
Diana,
li duas vezes esse capítulo. Amei o desfecho da história! Aléssia é sensacional para terminar por aqui. Por isso é merecedora da continuidade dessa aventura fantástica!
Obrigada!
“li duas vezes esse capítulo”
Vamos por partes, Vania rsss No momento minha preocupação é preparar o texto final de Aléssia e publicá-lo na Amazon. Mas, sim, pretendo escrever outros livros dentro desse universo. Como eu disse lá em cima, “fim, por enquanto…”
Gratidão pelos comentários e por todo o carinho ao longo dessa jornada /|\
Me entristeço com o fim da história, mais ne alegro em ver que Aléssia terá um futuro. Foi maravilhoso acompanhar essa jornada, valeu a pena cada minuto de espera para esse desfecho. Obrigada por ter me mostrado esse mundo, Diana, sentirei falta de suas palavras nos Domingos e nas Quartas.
Um beijo, que mais histórias como essa venham de você.
Oi Letty,
tô respondendo os comentários de vocês e chorando de emoção e saudades Aléssia foi minha primeira história longa. E foi tão acolhedor ter a companhia de vocês durante essa aventura! Fico muito feliz em saber que você gostou, e espero contar com seus comentários na próxima história, que chegará dentro de algumas semanas. Tem uma pegada bem diferente de Aléssia, espero que você goste, porque adoraria contar com sua companhia em mais essa jornada.
Um grande beijo, obrigada por tudo /|\
Oi Diana
Eu me apaixonei pela história da Aléssia. Passei por várias emoções enquanto lia este último capítulo.
Sem falar de suas notas e dedicatórias.
Te conhecia por nome mais nunca tinha lido nada de sua autoria. Simplesmente amei Aléssia desde o primeiro parágrafo que li. E acompanhar religiosamente as atualizações e suplicar por capítulos extras foi num pulo só! Rsrsrr
Ainda bem que estamos pertinho de 2018! Falta pouco pra você lançar Aléssia. E com certeza já estou na fila para comprá-lo!
Não demora tá?! ?
Abrs ?
Oi Lins
já estou com saudades Fico muito feliz que você tenha gostado tanto de Aléssia. Vou dar umas semanas de descanso pra vocês, e depois venho com outra história, dessa vez um romance… caprichado na pimenta rssss
Aléssia vai virar livro, mas antes de chegarmos nisso, não se esqueça: você vai receber um eBook exclusivo com o texto publicado aqui no Lesword. Assim dá pra controlar as saudades até 2018 😉
Beijos e muito obrigada pela companhia ao longo desses meses /|\
Ahhhh… Alessia é um dos meus romances prediletos. Amo absolutamente tudo. Os personagens, o enredo, a profundidade da narrativa… Não queria que acabasse… Poderia acompanhar por anos a historia de Alessia, sua luta interna e externa para ser quem é. Vou morrer de saudade da Alex tbm. Não demore muito a nos presentear com mais!!!
Parabéns! Ta lindo!! Muito amor!! Beijos
“Alessia é um dos meus romances prediletos”
“Poderia acompanhar por anos a historia de Alessia” é muito cedo para falar, por isso me faz uma gentileza e não conta pra ninguém, mas meu projeto original vai bem além do texto publicado aqui. Então, se eu tiver fôlego, é provável que tenha mais, bem mais, para ser lido num futuro próximo.
Quero te agradecer muito pela companhia ao longo das postagens de Aléssia. Seus comentários sempre me emocionaram e me apontaram um rumo. E você sabe que sou sua fã, não é? Pra mim é sempre uma emoção encontrar comentários seus nos meus textos. Um beijo enorme, e gratidão por tudo /|\
Foi um prazer enorme poder participar desta história olhando pelo lado de dentro, algumas vezes com olhos de leitora, eu confesso. Na leitura, me perdendo nas linhas embevecida pela riqueza da narrativa.
Obrigada, Diana Rocco pela sua dedicação e preciosismo em relação a sua escrita e literatura!
Que venham mais e mais histórias e projetos literários!
Um beijo enorme para você!
Carol obrigada pelas dicas, pelo papo e pela oportunidade de postar Aléssia aqui no Lesword /|\
Gratidão infinita pela história, que acompanhei desde o início, e também pela oportunidade de ajudar! Pode contar comigo para o próximo projeto!
Eu é que sou grata a você por toda a ajuda, Naty. Foi um prazer trabalhar com você, e espero que tenha sido apenas o primeiro de muitos projetos juntas /|\