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Segredo revelado: É assim que tudo deve ser?
Quando Sophie chegou em casa, só desejou sua cama.
Não que o sono estivesse presente, sua cabeça ainda dava voltas com tudo que estava lhe acontecendo. As atitudes de Helena eram uma novidade, Jenny com outra mulher também era uma desagradável novidade. Sophie afogava-se em pensamentos, quando o celular tocou, não se deu ao trabalho de olhar e identificar a chamada, estava certa de que era Helena, querendo certificar-se de que havia chegado e se estava inteira.
– Olá!
– Oi, Sophie!
– Jenny? Nossa, é você mesmo? Está tudo bem?
– Não lembra mais da minha voz, é?
– Jamais esqueceria a tua voz, mas está diferente.
– Você está bem, Sophie?
– Não consigo dormir… e você?
– Também não consigo, estou preocupada! O Carlos esteve aqui, ele disse que viu um beijo nosso. Saiu daqui se roendo de raiva e jurando vingar-se de você!
– Hã?!
– Ele acha que temos algo. Acredita que quero o divórcio por sua causa.
– Eu não tenho medo dele, já enfrentei coisas piores, deixa ele vir. Mas me preocupo com você, ainda mais aí, sozinha…
– Ele não faria nada comigo, mas não posso afirmar o mesmo em relação a você.
– Como disse, já passei por muitas, seu ex-marido não me assusta.
-Apenas tome cuidado, Sophie. Prometa?
– Se vai te deixar mais tranquila, eu prometo.
– Certo.
– Jenny…
– Oi, Sophie
– Não, nada.
– Diz…
– Eu sinto saudades de você. Quando eu te vi hoje, eu senti ainda mais saudade. Pensei que não sentiria, mas senti. Quase te abracei ali mesmo.
-Eu… confesso que ia adorar receber teu abraço. Também sinto saudades.
– Eu quero te ver, Jenny.
– Tudo bem, vamos nos encontrar na próxima sexta? No barzinho do Joe?
– Sério?
– Sim, você pode. Ou já tem algum compromisso?
– Claro que posso, que horas?
– Depois das 20:00!
– Estarei lá!
– Certo… agora vou tentar dormir, beijo Sophie.
– Beijo, Jenny.
Jenny nem acreditou que havia feito aquilo, mesmo depois de ter jurado que não iria mais ver aquela garota, acabara de quebrar sua promessa, marcando um encontro.
Sophie… ah, Sophie suspirou como se uma luz tivesse sido acesa em meio ao breu. Mas, pensando bem, entre elas as coisas sempre pareciam ser daquela forma. Oito ou oitenta! Ou tudo estava bem ou tudo estava ruim, parecia que nunca havia um meio termo.
A semana passou preguiçosa… arrastada.
Jenny sentia-se ansiosa pelo encontro, e brigava consigo por se sentir daquele jeito.
Quando finalmente chegou a tão esperada sexta-feira, Jenny conseguiu até sair mais cedo do trabalho, queria ter o tempo de chegar em casa, arrumar-se com calma, e precisou admitir que a realidade era que, queria estar bonita para Sophie.
A ansiedade era tanta, que a fez chegar bem antes do horário combinado. Estando no bar do Joe, tratou de escolher a mesma mesa com vista para o mar, pediu um drink e esperou.
Perdeu-se, ora admirando o mar, ora analisando o ambiente e o Joe, ele era um homem muito simpático, parecia ter saído daqueles filmes norte-americanos, mas se aquilo fosse um filme, ele estava mais para o barman. Era alto, musculoso, porém, sem exageros. Cabelos castanhos com algumas mechas queimadas de sol, olhos esverdeados, e parecia conhecer todos que frequentavam o lugar, sem contar que preparava os melhores drinks.
Jenny o olhava, imaginando como a Sophie o conheceu, eles pareciam ser amiguíssimos, mas sabendo o tipo de trabalho que a jovem levava… balançou a cabeça e afastou aquele pensamento que começava a se formar. Voltou seu olhar para o mar… o barulho do mar sempre lhe deu paz.
– Jenny?
– Hum… oi!
– Está aqui há muito tempo?
– Não, estava distraída olhando o mar, nem vi você chegar!
– Percebi… você está bem?
– Sim, obrigada. E você?
– Não sei, acho que sim.
– Acha?
– É!
– Uau, quanta formalidade entre nós, Sophie. Que estranho!
– Verdade…
Continuaram tentando engatar uma conversa trivial, mas elas eram mais que uma conversa trivial. Menos de meia hora depois, estavam até rindo. Falaram sobre como foi ruim ficar tanto tempo afastadas, e como aquilo causou saudades, mas não falaram sobre os motivos pelos quais afastaram-se, claro que em algum momento aquela conversa aconteceria, mas, naquele momento, uma estar desfrutando a presença da outra, fazia os outros fatos ficarem irrelevantes.
Depois dessa noite regada aos drinks do Joe e conversa descontraída, Sophie e Jenny voltaram a se encontrar, fazer compras, passar noites assistindo filmes, matavam o tempo mergulhadas em conversas simples sobre o cotidiano e conversas com tons filosóficos e mais profundos, sobre a vida, o universo e tudo mais. Tudo parecia ter voltado ao normal, mas, ainda havia algumas pedras no caminho…
Jenny pegou-se muitas vezes tendo que controlar-se, sendo apenas amiga, evitando perguntas mais intimas e queria acreditar que aquilo era o suficiente. Obvio que não, já que em inúmeros momentos, continha-se para não beijar Sophie, para não criar situações constrangedoras entre elas. Complicado? Com certeza, afinal, ela tinha consciência de que continuava apaixonada pela jovem, sabia que Sophie não lhe era indiferente, porém, não conseguia expor, falar o que realmente ia no seu íntimo; o quanto gostaria que a jovem mudasse de vida e escolhesse ficar com ela. E tudo piorava todas as vezes em que Sophie se despedia, Jenny a imaginava saindo dali e indo para os braços de outras pessoas.
Sophie, achava aquela reaproximação estranha. Ficar se passando por amiguinha, enquanto elas tinham a intimidade de namoradas. Estar perto daquela mulher, embriagar-se do cheiro que ela exalava, morrer de vontade de beijar-lhe a boca e não poder, era torturante. Sophie sabia que estava apaixonada e não havia mais como disfarçar àquela altura. Ficava pensando se a Jenny soubesse o quanto seria capaz de abrir não de qualquer coisa, só para ter a oportunidade de ficar com ela…
A situação chegou ao limite, e não era para menos.
Elas tinham assuntos pendentes, e ficou insuportável tanto para Jenny quanto Sophie fingir que tudo estava realmente bem.
Foi em uma noite, entre um gole e outro de vinho, troca de olhares e disfarces, que Sophie contou sobre a declaração de Helena e o convite feito, sobre ir embora para outro Estado.
Medo, raiva, ciúmes, e até mesmo as boas emoções, que quando em demasia, nunca são boas conselheiras. Sophie não reconheceu a Jenny que se revelou, acabaram por brigar, e dentro daquela discussão, Jenny acabou falando coisas horríveis para a jovem. A ofendeu, magoou… e se ela parasse só por alguns segundos, talvez, teria prestado atenção quando Sophie informou que não estava mais fazendo programas, e a ideia de ir embora só se tornou convidativa, porque ela não sabia mais ficar naquela situação. Mas, claro que a raiva tapa os ouvidos e Jenny continuou com as ofensas, decerto, era tudo que estava guardado durante todos aqueles meses. Sophie tentou evitar as lagrimas, mas não conseguiu, tentou disfarçar, mas não soube se sair tão bem, principalmente quando o silencio reinou, porém, antes que as lagrimas fizessem-na parecer uma garota desprotegida e machucada pelas palavras ouvidas, ela deu as costas e foi embora.
(Sophie) … depois daquela noite, não havia mais a possibilidade de continuar mantendo contato com a Jenny, a melhor opção seria me afastar, em definitivo. Ela tentou falar comigo através de ligações e mensagens, mas confesso que eu não tive forças para responder. Talvez, o mais certo, seria guardar as boas lembranças e seguir com a minha vida. Mas, não vou mentir, estava desolada, parecia que havia terminado um relacionamento de décadas e a única coisa que me era cabível, seria ficar jogada na cama. E foi assim que eu estava quando a campainha tocou desesperadamente, não ia atender, mas as batidas na porta me fizeram levantar da cama. Abri a porta e era a Jenny, nem tinha forças para convidá-la a entrar, suspirei, dei as costas e me joguei no sofá… ela entrou já pedindo desculpas, e como ela era boa naquilo, quanto a mim? Nunca fui grande fã de pedidos de desculpas, principalmente quando é certo que a pessoa vai continuar tendo as mesmas atitudes.
Não disse nada, só fiquei sentada no sofá, encarando-a, deixando que falasse, que se lamentasse, que continuasse a pedir desculpas e a dizer o quanto seu coração ficou partido ao perceber que eu saí chorando de sua casa. Ela parecia ter realmente entendido que daquela vez, conseguiu me magoar, e precisaria de muito mais que um pedido de desculpas.
Ela respirou fundo, caminhou até a minha frente, parecia aquelas meninas de colégio quando vão fazer alguma apresentação para toda a classe, mas está morrendo de vergonha e não faz ideia de por onde começar. Mas, era como havia dito certa vez, quando menos percebemos, as palavras surgem…
– Sophie, eu… enfim… eu… hã…, estou tentando entender a sua vida, mas tente compreender o quão é difícil para mim. Essa situação é tão diferente, nossa, muito diferente de todas as realidades que já vivi. Não podíamos continuar fingindo que as coisas haviam se acertado, que tudo estava realmente aonde deveria estar, porque não estava!
– Uhum…
– Eu… sei que pode ser tarde…, mas…. é.… eu gostaria que você. Que você se mostrasse verdadeiramente para mim. Quem é a Sophie? Quais seus sentimentos? Suas emoções? O que é real? Porque eu até posso supor alguns, imaginar respostas, mas não tenho certeza que minhas suposições são as certas. Eu não quero conhecer apenas a Sophie que encontrei no parque, aquela é apenas um pedaço teu. Preciso saber de você por inteira, pelo menos o que é possível saber, mesmo que isso inclua a Scarlet. Eu realmente preciso saber quem és, preciso saber tua história, te definir… porque me sinto muito confusa, cheia de perguntas que apenas você pode responder. Me entende?
Então, finalmente Sophie estava tendo a oportunidade de contar tudo para Jenny, de fazer o que tentara meses atrás sem grande sucesso, ao seu jeito, com suas palavras.