Capítulo 18

Finalmente chegamos ao local desejado. O carinha estava cantando e tocando excelentes músicas. Escolhemos uma mesa, fizemos nosso pedido e ficamos conversando, trocando carinho. Apesar do bar não ser voltado ao público LGBT, era perceptível que a maioria dos frequentadores daquela noite era gay.

– Clarinha, não acredito que você está aqui – escutamos uma voz irritante atrás da gente.

A Clara virou-se para ver quem era e pela cara que fez, a pessoa não era nada agradável:

– Oi Renata – Clara cumprimentou-a secamente.

– Oi Clarinha, quanto tempo? Estava com saudades de você – disse a última frase maliciosamente e sentando-se conosco sem ao menos ser convidada.

– É a correria do dia a dia. – respondeu simplesmente.

– Pode até ser, mas dependendo do que seja, você arranja tempo.

– Justamente Renata, tem que depender muito para disponibilizar o meu precioso tempo.

As duas continuaram ali, Renata jogando indiretas para a Clara e minha namorada cortando-a, mas aquilo estava começando a me irritar seriamente.

– E que milagre é esse você por aqui? Até há pouco tempo você não conhecia nada da cidade baixa.

– Pois é, conheci a Eduarda e ela faz questão de me levar aos lugares mais simples e agradáveis que conhece e eu estou adorando.

A tal Renata me olhou de cima a baixo e jogou o veneno:

– Ela deve ser muito boa de cama para você aceitar isso.

Não aguentei, respirei fundo para manter minha tranquilidade:

– E você deve ser além de muito mau de cama, péssima observadora, porque conhecer a Clara e não perceber que ela prefere muito mais a companhia do que o lugar, isso é muita burrice. É válido citar também que, modéstia à parte, a levo nos lugares mais admiráveis da minha cidade.

– Quem você pensa que é para falar comigo dessa maneira?

Olhei para Clara sorrindo e voltei minha atenção para aquela mulher insuportável que estava na nossa mesa.

– A namorada dela e falo contigo da maneira que eu quiser porque desde o momento que você sentou aqui sem ao menos ser convidada e não foi nem um pouco educada conosco, tenho esse direito – disse calmamente.

– Desde quando eu preciso de convite para sentar na mesma mesa que a Clarinha está? – estava quase alterando a voz.

– Desde o momento que não é bem-vinda e que ela não está sozinha.

– Clarinha, é verdade o que essa daí está falando?

– É sim – Clara respondeu com um sorriso – e, a propósito, ela é a minha namorada.

– Você está namorando? – Renata estava incrédula e pareceu ter ficado surda.

– Tem exatamente três semanas.

– Isso não pode ser verdade – alterou a voz mais uma vez.

– E por que não pode?

– Porque eu tentei tanto – disse num fio de voz.

– Então você tentou de maneira errada porque começamos a namorar no mesmo dia que nos conhecemos – eu disse para provocá-la. Juro a vocês que quase limpei o veneno que escorria no canto dos meus lábios.

A Renata não disse mais nada e saiu que nem bala pegava, muito irritada:

– Eu achei que você fosse voar no pescoço dela.

– Só não fiz isso porque detesto escândalo – fiz um carinho em seu rosto – quem é essa louca?

– Uma mulher que já tive um caso, podemos dizer assim, mas não passou disso. Cobrava muito a minha atenção e eu não estava nem um pouco a fim de fazer isso.

– Quer dizer então que eu tive sorte? – sorri.

– Não só sorte, mas um olhar e um sorriso que me encantaram logo de início. Depois a conversa maravilhosa, um primeiro beijo perfeito, a primeira transa deliciosa.

– Se você continuar assim, vamos embora agora mesmo e vou querer relembrar aquele primeiro beijo ali no carro e dessa vez não vou me segurar. Vou querer fazer amor contigo também.

– Fazer amor?

Salva pelo garçom com nosso pedido. Sorri para ela e mudamos de assunto, ela me olhou de uma forma que eu sabia que mais cedo ou mais tarde eu teria que me explicar.

Eu já estava dando muita bandeira que estava começando a me apaixonar pela Clara. Começando não, eu estava completamente apaixonada pela Clara. Eu podia tentar enganar qualquer um menos a mim mesma. Eu confessaria a qualquer momento. Estava sendo mais forte do que eu.

Fiz coisas com e para ela que nunca imaginei que um dia chegaria a esse ponto e ainda por cima, em tão pouco tempo. Rafaela já havia me dito que a minha namorada tinha confessado para a Bruna sobre os seus sentimentos por mim, mas eu precisava ter certeza, eu precisava escutar isso dela, mas a pior parte era essa, como fazê-la confessar? Foi então que o cantor adivinhou meus pensamentos e começou a dedilhar no violão “Nos seus olhos” do Nando Reis. Gosto muito e percebi que a Clara também, pois como já estávamos com as cadeiras muito próximas, ela deitou a cabeça em meu ombro e cantou junto com ele baixinho em meu ouvido:

 “Olhe nos meus olhos/ E diga o que você/ Vê quando eles vêm/ Que você me vê/ Olho nos seus olhos/ E o que eu posso ler/ Que eles ficam melhores/ Quando eles me leem/ Eu leio as suas cartas/ Eu vejo a letra/ Meu Deus que homem forte/ Que me contempla…

Levantei seu rosto com a intenção de fitá-la e perceber que tudo aquilo é sincero, ela continuou:

– Sou sua, mas não posso ser/ Sou seu, mas ninguém pode saber/ Amor, eu te proíbo/ De não me querer…

Seus olhos lacrimejaram. Eu não duvidava de seus sentimentos, mas precisava de uma certeza e ela me deu sem ao menos eu pedir:

– Olho nos seus olhos/ E sinto que você/ Faz eles brilharem/ Como astro rei

Uma lágrima sua começou a cair, mas eu impedi com meu polegar:

– Olhe nos meus olhos/ E o que você vai ver/ Seu rosto iluminado/ A lua de um além…

Mais uma lágrima, sequei-a da mesma forma:

– Eu leio as suas asas/ Borboletas/ Meu Deus que linda imagem/ Me atormenta…

Clara fechou os olhos e mais duas lágrimas caíram:

– Sou seu, mas eu não posso ser/ Sou sua, mas ninguém pode saber/ Amor eu te proíbo/ De não me querer. ”

Sequei essas duas últimas lágrimas com meus lábios beijando seu rosto carinhosamente.

– Quer sair daqui?

Ela negou com a cabeça, afastou-se um pouco de mim, terminou de enxugar as lágrimas e sorriu o sorriso mais lindo, mais doce, mais tímido que já vi em seus lábios.

Ficamos mais um longo tempo sem trocar uma palavra sequer. Incrivelmente tenho que usar uma frase pronta, mas necessária: naquele momento não era preciso nenhuma palavra, sabíamos o que a outra estava dizendo só assim, nos olhando, nos estudando, ainda nos conhecendo.

Na volta para casa, Clara pediu para que eu dirigisse, mas antes de partirmos, fiz o que tanto queria: relembrei aquele sábado que nos conhecemos, o nosso primeiro beijo. Mas, esse foi mais carinhoso, mais cuidadoso, mas não menos desejado. Ela ficou o tempo inteiro durante o percurso me observando, sorrindo, me fazendo carinho.

Acho que aquela música mexeu em algo dentro da minha namorada. Não estou dizendo que ela não era carinhosa, muito pelo contrário, ela estava num carinho diferente, não aquele que só tinha desejo, tesão, mas tinha alguma coisa diferente do que estava acostumada e que não conseguia identificar, mas certamente faria de tudo para descobrir.

Quando chegamos, a Clara me disse que ia tomar banho, mas que queria ir sozinha, tive que concordar. Depois de alguns minutos, ela saiu do banheiro e eu fui fazer o mesmo. Não senti falta de desejo ou algo parecido por parte dela, muito pelo contrário, acho que ela estava querendo pensar em alguma coisa, sei lá. Lembram do meu sexto sentido? Pois é, ele disse que eu não precisava ter medo ou receio de nada, era só agir naturalmente.

Ao sair do banheiro, encontrei a Clara já deitada – de barriga para cima e nua – e de olhos fechados, mas percebi que ela não estava dormindo. Joguei a toalha de lado, deitei ao seu lado, apoiei minha cabeça em um dos meus braços que estava apoiado no meu cotovelo esquerdo e fiquei observando-a respirar.

O quarto estava em total silêncio, enquanto fazia carinho em sua barriga com as pontas dos dedos, comecei a cantar bem baixinho – tenho uma voz horrível, confesso – a música Condição Humana do Línox:

– Desculpe, mas não posso prometer/ Que eu nunca vou te machucar por que/ Sob a dura condição humana, / Vivemos, eu e você/ Como sempre foi/ Todo dia é um novo dia…

A Clara abriu os olhos, estava com um brilho intenso, apesar da pouca luz que tinha no quarto.

– Eu sei que mal a gente se juntou/ E já mudou no modo de pensar/ E o medo de mudar assusta, eu sei/ E custa a aliviar! / Mas não há de ser/ Mais forte que um novo dia…

Ela sorriu timidamente.

– Afinal tudo aconteceu de repente/ Num sinal era tudo tão diferente/ O amor chegou e eu cheguei pra você/ Você me olhou e a gente pagou pra ver…

Ela acariciou minha face, comecei a ver sua figura embaçada por causa das lágrimas.

– Desculpe, mas não posso prometer/ Que eu nunca vou te machucar por que/ Sob a dura condição humana,/ Vivemos, eu e você/ Como sempre foi/ Todo dia é um novo dia/ E se eu não for do jeito que espera que eu seja/ Não veja isso como uma coisa ruim/ Assim as nossas diferenças/ Jamais serão nosso fim…

Beijei seus lábios levemente.

– Afinal tudo aconteceu de repente/ Num sinal era tudo tão diferente/ O amor chegou e eu cheguei pra você…

Sorri.

– Você me olhou e a gente pagou pra ver”.

A Clara me puxou de uma forma firme, porém delicada pela nuca. O beijo começou carinhoso, saudoso. Passei minha mão direita em seu pescoço, entre os seios, na barriga, nas pernas, voltava pelo mesmo caminho, passava a mão em seu rosto, cabelo, tudo com a ponta dos dedos, era realmente uma carícia.

Sentei na cama e puxei-a junto para fazer o mesmo, mas de frente para mim e suas pernas abraçando minha cintura. Nossos sexos se tocaram, mas não queríamos isso naquele momento. Queríamos conhecer ainda mais nossos corpos, onde a outra gostava e queria ser tocada. O beijo continuava calmo, desejado e delicioso.

Nossas mãos não paravam de explorar nossos corpos, eu observava cada reação da minha namorada em novos pontos que eu acariciava. Ficamos assim durante algum tempo que não sei dizer com exatidão porque não estávamos preocupadas nem um pouco com isso. Dessa vez não queria saber quantas vezes a minha Clara gozava, queria que ela gozasse na melhor maneira possível, da forma que ela queria naquele momento e eu estava ali para respeitar e fazer isso.

Teve um instante que o corpo da minha morena estava começando a estremecer porque eu começava a fazer carinho perto do seu sexo, ela soltou um gemido tímido em meus lábios. Com uma mão eu ficava na região que já estava e com a outra comecei a brincar com o biquinho de um de seus seios, mordendo seu pescoço. Clara me puxou pela cintura para mais perto dela fazendo nossos sexos colarem, continuei o que estava fazendo, mas com a mesma calma anterior:

– Du… me come… agora… por favor.

Claro que obedeci. Já sabia o quanto que a Clara estava querendo, mas para variar, queria que ela pedisse. Penetrei-a com dois dedos e comecei o movimento de vai e vem, não tão forte quanto estava acostumada a fazer com a minha namorada, mas de uma forma que ela aproveitasse e prolongasse o máximo aquele momento. Por causa do contato com minha própria mão, eu já estava tão excitada quanto a Clara:

– Olha pra mim.

Seus olhos transmitiam muito desejo, mas consegui ver ali também: amor. Não resisti:

– Te amo.

Disse com os lábios colados aos dela e olhando-a intensamente. Suas unhas passaram forte em minhas costas, ela me puxou mais para si, mordeu meu ombro e estremeceu ainda mais o corpo, gozamos juntas.

– Minha caixinha de surpresa preferida – ela disse após um tempo recuperando o fôlego e as forças, fiz cara de quem não entendeu e ela continuou – me levou para sua casa no dia que nos conhecemos e sei que nunca fez isso, me faz ter maravilhosos orgasmos em uma só noite. Te ligo durante a semana e você me intima a ir te ver, me apresenta lugares de Salvador que eu já conhecia, mas me mostra a sua forma de apreciar. Me faz perder o medo das outras pessoas me verem com uma mulher mesmo com toda a minha família e meus amigos sabendo da minha orientação sexual. Aceita namorar comigo me conhecendo há sete dias, me apresenta a seus amigos e eles me confirmam que faz muito tempo que você não namora justamente por nenhuma outra mulher te passar confiança. Me encanta com diversas mensagens no celular quando eu estava viajando, descubro que você tem uma mente mais brilhante do que já sabia por causa do seu projeto, pratica esporte, excelente humor, ficou amiga dos meus amigos mais próximos, romântica tradicional – sorriu – minha defensora das ex ficantes com dor de cotovelo – sorriu mais uma vez – de uma sensibilidade sem igual para me aturar cantando e chorando – mais um sorriso – tem uma linda e tímida voz – beijou levemente meus lábios – conseguiu me fazer gozar com tanta calma e ainda me surpreende com uma frase de duas palavras.

Definitivamente a Clara conseguiu me deixar encabulada. Sorri timidamente e a abracei na mesma posição que tínhamos acabado de fazer amor. Fiquei com o nariz em seu pescoço sentindo seu perfume, ela acariciava minhas costas do jeito que eu adorava: passando as unhas.

Nossos corpos amoleceram ainda mais e decidimos dormir, incrivelmente não deitamos já quase amanhecendo, ficamos satisfeitas fazendo amor somente uma vez aquela noite, mas foi perfeito. Dormi com a Clara aconchegada em meu corpo e com o nariz enterrado em meu pescoço.



Notas:



O que achou deste história?

Deixe uma resposta

© 2015- 2017 Copyright Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem a expressa autorização do autor.