ERIS
Estou retornando do chuveirão enquanto Misha termina o banho no banheiro da casa. Adentro a sala e giro nos meus calcanhares, fechando a porta.
— Você sumiu boa parte da noite de hoje. Volta e meia fica mais na sua… — Misha aparece na sala com o típico short de flanela e camiseta de algodão de sempre, além de uma toalha na cabeça que indica que lavou o cabelo — é ela, não é? Demorei a reconhecer a doutora naquela foto… eu sabia que seu rosto era familiar. Denise e Daniela também têm o sobrenome Sartre. E, quando ela estendeu a mão para você pude perceber um anel como o seu do indicador… A doutora Paloma Sartre é a sua Paloma, não é?
*
Quimera, quase dois anos atrás
Olho para o meu relógio de pulso e vejo que já passa da meia-noite. Percorremos o jardim dos fundos e entramos na varanda. Caminho até a cozinha e vejo Daniela, aflita, preparando café. Ela me olha com um olhar baixo, e posso sentir sua preocupação daqui.
— Denise está te esperando em nosso quarto — ela diz.
Adria e Haru permanecem na cozinha, e eu sigo pelo corredor adentro. Ao entrar no cômodo, encontro Denise fumando um cigarro enquanto observa o céu, sentada na cadeira da varanda. Ela está virada de costas e ainda não me viu.
— Bebe conhaque, Eris? — fecho a porta atrás de mim e me aproximo dela.
Sob a mesa da varanda, vejo uma garrafa de Hennessy, um copo e um papel amarelado e dobrado.
— Não — respondo em um tom seco. Ao me aproximar, percebo que ela está com um copo quadrado igual nas mãos, contendo o líquido âmbar — onde está sua irmã, Denise?
— Agora? — ela olha seu relógio de pulso — Provavelmente dentro do avião.
— Avião? Que brincadeira é essa, Denise?
— Paloma aceitou a vaga, Eris — ela continua olhando para o céu.
— Que vaga? — minha surpresa é evidente em meu tom, Denise percebe isso e vira o corpo para mim.
— Ela não te contou… claro que ela não te contou — a mulher parece mais falando para si mesma do que para mim.
— Não me contou o quê? Denise, faz horas que estou dirigindo procurando sua irmã, poderia ser mais direta, por favor?
— Estou vendo que nossa conversa vai ser mais longa do que eu pensei. Se fosse você, aceitaria o conhaque — ela estende o copo em minha direção.
*
Fazenda, noite atual
“Eris, essa é a professora Paloma Sartre, uma das maiores psicanalistas e pesquisadoras na minha área! Ela é a razão real… da Inglaterra.“
Inglaterra. Esse maldito país. Quando penso que minha vida não pode piorar… ah, que se dane todo mundo.
O capeta usa perfume e o nome dele é Coco Mademoiselle.
Giro nos calcanhares e encontro Misha parada no meio da sala.
— Ela é o meu passado, Misha. E eu disse a você que Paloma não era um problema quando me perguntou na reserva — caminho lentamente em sua direção.
— Então é ela… — Misha diz, em um tom seco.
— A mulher é uma psicanalista incrível, além de professora convidada de um dos maiores institutos de pesquisa do mundo. Tem noção de como é concorrida uma vaga de orientação com ela? Como não seria um problema, Eris? — Misha solta todo o ar de seus pulmões e foca em seus próprios pés. — Você é toda culta, toda refinada… ainda que tente se passar por casual… e não venha me dizer que não é — Misha ri consigo mesma — ela é o seu número, Eris. Totalmente a a porra do seu número. Eu sou muito idiota em cogitar… — e volta a me encarar.
— Cogitar…? — pergunto.
Agora estamos a dois passos uma da outra e posso perceber sua respiração levemente descompassada.
— Esqueça, Eris. Esqueça tudo… só… me esqueça.
Misha ia girando seu corpo quando seguro seu pulso. Nosso toque faz com que ela me olhe mais uma vez.
— Por que está fazendo isso com a gente, Misha?
— A gente? Não existe a gente, Eris. Nunca nem existiu. Só existiu a minha ilusão em achar que estava rolando algo — ela soltou outra risada seca e balançou seu rosto para ambos os lados. — Por mais bizarro que isso possa parecer, eu vim para passar as férias antes de viajar, me envolvo com a irmã da noiva do meu pai e…
— Pode, por favor, não pensar no casamento do seu pai, Misha? Olhe para mim, o que você sentiu na noite do bar?
— Eris… — ela molha os lábios — por que isso agora? Que diferença isso faz agora?
— Faz toda a diferença. Por favor, me responda, o que você sentiu comigo na noite do bar?
Mas ela não respondeu.
Encurto nossa distância em um, dois passos. Misha dá um passo para trás e caminhamos dessa forma até seu corpo chocar-se contra o grande móvel de madeira com livros atrás dela. Ela parece se desequilibrar e amparo uma das minhas mãos na estante e com a outra ofereço apoio ao seu corpo.
— O que sentiu quando se jogou nos meus braços naquela música? O que sentiu quando me beijou na cozinha na noite de Natal? Quando bateu no meu quarto naquela madrugada? — continuo perguntando.
Mas ela não fala nada. Sinto seu hálito quente em meu rosto, sinto seu olhar me atravessar, sinto meu coração idiota clamando pelo…
— O que você sentiu quando gozou na minha boca enquanto chamava meu nome? — faço mais uma pergunta e ela aperta meu braço forte, cravando suas unhas nele.
— Qual o gosto do meu nome em sua boca, Misha?
— Eris, isso é injusto comigo.
— E não é comigo?
Misha passa o outro braço pela minha cintura.
— Olha, eu sei que daqui a alguns dias você cruzará o Atlântico para iniciar uma nova fase da sua vida. Eu sei que eles são contados. Eu sei que não planejou se envolver com alguém nesse meio tempo. Eu sei disso tudo. Eu sei que eu, definitivamente, não planejei isso. E eu sei também que eu não posso te prometer nada. Eu não vou te prometer nada. Mas estou disposta a passar esse tempo com você, se você quiser. Você não foi nenhum pouco idiota em imaginar que estava rolando algo entre nós duas. Existe algo entre nós duas.
— E a Paloma?
— Esqueça a Paloma, Misha. Ela é meu passado, fez parte da minha vida e passou. Paloma não é nada mais que um passado. Um passado, consideravelmente, denso, mas, ainda sim, um passado. É isso o que te incomoda? — tiro o maldito anel e coloco sob a estante que está atrás dela — um anel? Esse anel não significa nada, Misha.
Ela me analisa, tentando buscar alguma resposta de mim. Sei que faz isso porque já recebi muitos olhares deste tipo.
— Está disposta mesmo a fazer isso? A deixar rolar o que tiver que rolar até o dia da minha viagem? — me pergunta.
— Estou.
— E por quê? Por que você está disposta a ficar comigo sabendo que eu vou embora?
— Porque uma garota me disse uns dias atrás que eu era um universo incrível e estou disposta a mostrá-lo para ela. Não é isso o que você quer?
— Isso significa…
— Isso significa que eu quero você, carioca. E não outra mulher. Estou realmente disposta a te ajudar a criar recordações dos seus últimos dias em terras brasileiras.
Afinal, isso não pode terminar de uma forma ruim, pode?
Não respondam, eu não quero saber.
— Bom… — Misha dedilha um caminho até o meu pescoço, entrelaçando-o com os seus braços — neste caso, eu preciso te perguntar uma coisa.
— Pode perguntar — percorro sua silhueta com minhas mãos até chegar na barra de sua camiseta.
— Você ainda a deseja? Ainda pensa nela?
— Porra, Misha. É sério, isso?
— Existe uma boa razão para essa pergunta.
— E qual é a razão?
— Se a resposta for sim, e já adianto que não terá problema nenhum nisso, eu saberei que o que estiver rolando aqui não passará de apenas sexo entre duas mulheres que estão acumulando tesão há dias uma pela outra. Será apenas corpo… e não tenho problema algum em transar com você nesses termos.
— Mas… — quero saber até onde isso vai.
— Se a resposta for não, eu saberei que não foi apenas corpo. E, não, eu não estou falando de amor… — bate o indicador em minha têmpora — eu saberei que estive aqui, nos seus pensamentos.
Misha desce a mesma mão pela extensão do meu rosto, pescoço, clavícula, peito, barriga, barra do meu short. Ela passa a mão por cima dele e invade o meio das minhas pernas. Nossos olhos não se desgrudaram em nenhum momento do percurso.
— E não apenas aqui — Misha aperta, delicadamente, o meio das minhas pernas e percorre seu indicador de baixo a cima. Ela morde um sorriso e me olha demonstrando sua lascívia.
— Dessa forma… quando você estiver no ápice do seu prazer e gozar, será pensando em mim, na gente… E, Eris… vai ser muito mais gostoso foder sabendo essa resposta. Acredite em mim.
Filha. De. Uma. Puta.
O que me mata na Misha é que ela esconde o jogo… ela é sonsa. Morde um sorriso, me olhando com aquela cara de… ah, porra.
Ela foi tirando a mão, mas seguro seu pulso e guio para dentro da minha cueca. Misha entreabre a boca em um suspiro, declina sutilmente os olhos enquanto passa o indicador e o dedo do meio entre as minhas pernas.
— Ainda precisa que eu responda quem está em minha cabeça neste exato momento? — pergunto e ela me olha com olhos de desejo.
— Não faz isso, Eris…
Misha retira a mão de mim e a leva em sua boca. Caralho…
Rapidamente, engancho meus indicadores nas laterais de seu short e calcinha, deslizando-os, lentamente, por seu corpo. Ajudo Misha a levantar uma perna de cada vez para livrar-se das peças. Ficando totalmente exposta e amparada no móvel de madeira. Subo o percurso de seu corpo, distribuindo uma trilha de beijos que começa na panturrilha, joelho, coxas… Faço o mesmo percurso em sua outra perna. Misha espalma sua mão em minha nuca e puxa meu cabelo de um jeito nada delicado.
— Eu quero você, Eris — ela diz, enquanto afasta mais as duas pernas e me leva até ela. Guiando minha cabeça exatamente até o lugar que ela quer — eu quero você… quero…
Sinto seu aroma. Sua maciez. Seu gosto. Não economizo tempo em percorrer toda a sua extensão de sua boceta com a minha língua, lentamente, enquanto escuto os gemidos baixinhos dela. Sentir o seu corpo tremer de tesão atinge diretamente o meu, um arrepio me toma, me dando mais vontade dela. Percorro os lábios e encontro sua entrada. Misha rebola sutilmente em minha boca.
— Você… me chupa… tão… bem… — escuto o som abafado da voz de Misha enquanto formula frases totalmente espaçadas — essa boca macia… ninguém… ah…
Escutar isso só me dá mais vontade de tê-la em minha boca. De tê-la em mim. Eu preciso sentir essa mulher em mim.
Misha cruza os braços na frente do seu corpo e puxa a blusa, retirando também a toalha de sua cabeça. Ela está totalmente nua. Ela e essas malditas marcas de sol que deixam à mostra o degradê de sua pele. A pele negra com as marquinhas mais claras onde seu biquíni a tapou, revelando os mamilos amarronzados e seus fartos e pesados seios. Seu corpo cheio de curvas, seus lábios carnudos deixando sua boca entreaberta, os olhos perdidos no meio de tanto tesão que não desgrudam dos meus e seus cachos molhados que exalam o seu cheiro.
Aqui, ajoelhada em sua frente, a visualizo apenas com a penumbra da luz que vem do corredor, e posso constatar com todas as letras: Misha é a mulher mais linda que já vi.
Subo e deixo um demorado beijo em sua boca enquanto a puxo e caminhamos até o sofá. Misha tira o meu short e boxer como eu fiz com ela, enquanto eu me ocupo em tirar o meu top.
Ela percorre todo o meu corpo com suas mãos curiosas. Por conta da nossa diferença de altura, Misha bate na reta dos meus seios e levanta a cabeça sutilmente para me olhar. Pequena demais…
— Você é tão linda… e ainda vai me enlouquecer, sabia? — ela pergunta e me joga no sofá.
— Vem para mim, carioca — digo, enquanto tiro todos os anéis dos meus dedos, deixando-os na mesinha de centro — vem para mim… só para mim.
Engancho meus dedos em minha corrente com a intenção de retirá-la, mas sou impedida por sua mão.
— Não… — ela diz, toda manhosa — não tira, não — me olha nos olhos — gosto de você com ela.
Faço o que pede e me acomodo sentada no sofá. Ela caminha até mim e passa uma perna de cada lado. Deixo minha mão em meu colo, com a palma para cima para que eu possa recebê-la.
Misha desce, sentando, lentamente, em dois dedos meus e montando em mim.
— Como eu imaginei… — ela alcança minha boca em um beijo cheio de vontade.
— Eris… — diz, naquele timbre que só ela faz, deslizando seu quadril, suavemente, até a base da minha mão.
Percebo que ela está esperando seu corpo se acostumar com meus dedos e começa a subir e descer em um rebolado que só quem tem a cintura solta faz. E ela sabe muito bem.
— Me avise se eu estiver te machucando — aviso quando ela sobe o quadril e desce mais uma vez — ah, tão macia — ela sobe e passo meu polegar para frente, friccionando em seu clitóris quando ela desce — tão molhada…
— Sua culpa — ela diz rente ao meu ouvido e morde o lóbulo da minha orelha — ah — Misha deixa mais um gemido rouco — isso é muito gostoso.
— Feche seus olhos — peço, e Misha abre um sorriso largo e prazeroso. — Se permita escutar apenas o som da minha voz, Misha — ela faz o que eu peço e aumenta o seu ritmo gradualmente.
— Rebola para mim? — falo bem rente ao seu ouvido, capturando seu cheiro e o som dos seus gemidos — Quero sentir você rebolando em mim — sussurro.
— Eu sinto… Eris… Ah… isso é tão…
Encosto minhas costas no sofá e a vejo cavalgando em mim totalmente livre para ditar seu próprio ritmo e isso me deixa ainda mais excitada. Ela levanta os braços e faz um coque em seu cabelo, o que revela o peso de seus seios que balançam na medida que senta em mim. Porra como ela é gostosa…
Sinto seu corpo endurecer quando os leves tremores ameaçam aparecer. Nesse momento eu a levanto um pouco e a travo pela cintura. Começo a fodê-la com mais firmeza e ela agarra o meu colar.
— Venha comigo, Misha… — o coque dela solta e seus cachos ficam por todos os lados.
— Eris, eu vou go… ah. Eris…
Ficamos nesse embalo até que ela libere seus espasmos em um orgasmo intenso e meu corpo seja tomado por uma explosão gostosa e posso sentir o seu coração acelerado em cima de mim. O meu coração acelerado dentro de mim. Tudo muito, muito acelerado. Tudo muito, muito…
Tiro minha mão de dentro dela e a puxo seu corpo para mim.
— Caralho… — ela arfa, sinto suas pernas ainda trêmulas — isso foi incrível.
— Você é incrível — ela me puxa para mais um beijo e não economizamos tempo nos sentindo e aproveitando essa vibe gostosa enquanto nossas respirações equilibram.
— Quer descansar um pouco? — pergunto enquanto tiro uma mecha de cabelo que insiste em invadir seu rosto e ela me encara com olhinhos de satisfação.
— Não mesmo, por quê?
— Porque eu quero te comer na minha cama agora — digo e ela me responde com um sorriso, ela ameaça sair do meu colo mas agarro seu corpo e levanto nós duas.
— Eris, eu sou pesada!
— Realmente, muito pesada… — se ela soubesse que não pesa nem metade dos pesos que eu levanto na academia — acho que você esqueceu que eu já te carreguei, fadinha.
Ela me responde com uma reviradinha de olhos e um beijo. Seus lábios macios colam nos meus e sua língua pede entrada, explorando mais do nosso gosto. Ela passa a língua pelo meu lábio inferior até chegar no meu piercing e o chupa, delicadamente. Posso perceber que soltou um riso sutil.
Caminho pelo corredor com ela em meu colo e entramos no meu quarto.
— Posso saber do que está rindo? — resolvo perguntar.
— Seu piercing.
— O que tem ele?
— É gostoso senti-lo. Eu nunca tinha ficado com ninguém que tivesse um. Você sente mais sensibilidade com ele? É gostoso beijar com isso?
Minha eu idiota sorriu ao ouvir isso. Misha é muito espontânea e isso é muito gostoso nela.
— Você gostou? E sim, eu sinto mais sensibilidade e é bem gostoso beijar estando com ele. Especialmente quando o beijo encaixa.
A deito na cama, deixando suas costas contra o colchão, enquanto fico parada em pé à sua frente.
— Gostei pra caralho — ela responde de forma animada — e nosso beijo encaixa, eu também gosto pra caralho disso… — encaixa, Misha.
Misha levanta a perna e percorre o caminho entre os meus seios até o umbigo com o dedo de seu pé.
— Eris, posso te pedir uma coisa? — pergunta olhando dentro dos meus olhos e abre um enorme sorriso malicioso.
— Claro — respondo.
— Me come de quatro?
*
Desperto, com o quarto ainda muito escuro, e deduzo que não tenha amanhecido o dia. Olho para o lado e vejo Misha totalmente nua e destapada. Puxo o edredom, tapando-a. Seus cachos então perdidos em minha roupa de cama e o nosso cheiro misturado pelo quarto. Não faço a mínima ideia da hora que o cansaço nos venceu e fomos dormir.
Lembro das roupas que deixamos pela casa e que não vai ser nada bom se Miranda ou Raimundo as encontrarem.
Deixo Misha dormindo na minha cama, pego um top e um short que estão na pilha de roupas limpas e saio do quarto tentando fazer menos barulho possível, no intuito de arrumar nossos vestígios e voltar para ela. Daqui a pouco essa casa estará um caos…
No percurso, consigo escutar os barulhos que vêm da cozinha. Miranda já acordou? Mas ainda está escuro.
Paro no batente da cozinha e encontro uma Adria em pé passando o café, uma Catarina sentada no balcão da cozinha com um milkshake nas mãos, fazendo barulhinho enquanto bebe, e uma Haru que chega pela sala com um saco de pão francês em uma mão e outra sacola cheia de coisas. Ela sempre se emociona quando vai fazer padaria.
— Como vocês entraram aqui? — é impressionante.
— A Miranda nos recebeu, bicho do mato — Catarina me abre o maior sorriso — bom dia!
— Que horas são? — ainda estou meio zonza de sono.
— Bom dia, meu coração — Haru fala, cheia de dentes — hora da diversão começar, partiu Lumiar!
Olá! quando haverá actualização da história!