A equipe de Ária ainda não havia instalado todas as metralhadoras. A movimentação estava intensa e Helena se preocupava em haver tempo para a coordenação de todos os grupos.
— Merda! Eu não devia estar aqui dentro! Minhas meninas vão morrer.
— Nem pense em sair daí, Helena. Se nós morrermos, Lewis ganha. Sabe disso. Encare como uma missão como outra qualquer.
— Que porra é essa? Agora está me escutando?
— Estou te escutando desde que os soldados te perseguiram e não adianta anular minha ordem para Annan, pois temos o mesmo grau de protocolo. Se você anular, volto a pedir que ela habilite.
— Então, quero que ela faça isso para mim também!
— Executando.
Escutaram a voz da IA pelo comunicador.
— Merda!
Elas falaram ao mesmo tempo e podiam se ouvir.
— Ok. Vamos parar com essa treta, Helena. Eu te ouço, você me ouve e tá tudo certo.
— Concordo. Mas saiba que você não vai cair de novo por conta de Lewis. Eu não vou deixar.
— Ótimo que pense assim, mas, sob a minha perspectiva, ele não vai derrubar nenhuma das duas.
— Estão vindo. Estão descendo a montanha aos montes.
— Estão escalando os rochedos aos montes, também.
Os tiros e explosivos começaram de todos os lados. A enseada estava cercada e os soldados de Lewis pareciam um exército de formigas, que avançavam de todos os lados. Annan lançou drones, alguns com bombas e outros com metralhadora. Era uma guerra cibernética, pois Lewis também contava com drones que tinham a função de perseguir e destruir os poucos lançados pela equipe de Isadora e Helena.
As duas chefes tiveram o mesmo pensamento; pegarem seus fuzis e abaterem os drones invasores, dando cobertura para Annan e as agentes mais expostas. Helena saiu de seu refúgio se alocando no alto de uma rocha para ter uma visão melhor do céu. Isadora não precisou se deslocar muito, a não ser, para se proteger um pouco, em meio a duas grandes pedras no alto do penhasco. Ela tinha uma boa visão do céu, e de onde os drones inimigos vinham.
Enquanto abatiam, mais drones chegavam e tentavam abatê-las também.
— Helena… tenho que descer pelo fosso para a caverna. Estou ficando sem munição.
— E eu tenho que me esgueirar para a minha caverna igualmente. As minhas também está acabando.
Ambas esperaram a oportunidade para correr. Isadora atirou em um drone próximo e aproveitou para correr e pular no buraco do fosso. A queda não era tão grande, mas tinha certeza de que sentiria dores nas pernas por um tempo, depois que atingisse o chão. Assim que sentiu o piso sobre os pés, jogou-se rolando para frente na esperança de minimizar o impacto.
A chefe sênior não teve tanta sorte. As balas do fuzil acabaram e teve que sacar a pistola para tentar abater os drones que a perseguiam. Derrapou por uma rocha a sua frente até atingir o chão. Caiu em um local cercado de arbustos e conseguiu despistar dois deles. Aproveitou a oportunidade para se esgueirar colada à parede, encoberta pelas folhagens e finalmente chegou à boca da caverna onde estavam seus equipamentos.
Inspirou profundamente para tentar acalmar a respiração ofegante e olhou à sua volta para ver o que tinha à disposição. Estava com seu colete tático, nunca entrava numa luta sem ele. Podia gostar da adrenalina, todavia não era estúpida. Viu muitos soldados que as atacaram sem os coletes e certamente se eles o vestissem, não teriam abatido tantos.
— Esses putos não vão entrar na enseada tão facilmente como pensaram!
— Isso mesmo, garota! Mostre quem é!
— Tá irritante ficar me escutando, Isa.
— Pois eu tô amando. Tô achando sexy essa sua rebeldia.
— Me diz o que tem aí, além de munição, lançador de granada e metralhadora?
— Nada muito prático. Tenho um lança foguetes.
— Meu deus! Nem vou perguntar como conseguiu levar isso para aí. – Helena sacudiu a cabeça, espanando imagem da outra carregando o lança foguetes. – Não importa. Ele será importante. Quanto de munição tem para ele?
— Ei! Eu subi com ele nas costas com uma tranqueirada na outra noite. Tenho somente dois foguetes. Fiz três viagens para trazer tudo. Não dava para fazer mais sem ser descoberta. Não arriscaria.
— Dois foguetes?!
— Você queria que eu trouxesse a caixa inteira?
— Não! Não estou reclamando. Estou impressionada como conseguiu levar isso.
— Ah, tá! Beleza, então…
— Você consegue atirar um foguete nos barcos que estão parados antes da enseada?
— Não sei… A noite está escura e seria um tiro às cegas. Estão muito longe e só trouxe o monóculo. Mesmo com visão noturna, não creio que alcance os barcos.
— Erramos ao deixar os lançadores de foguete na parte baixa.
— Não tínhamos noção do quanto Lewis queria nos eliminar.
— Não está fazendo só para nos eliminar. Somos um símbolo dentro da Agência. Ele quer destroçar a ideia. É isso que os fascistas fazem.
— Concordo, mas certamente está tendo imenso prazer em nos caçar como animais feridos.
— Annan… – Helena chamou a IA.
— Na escuta.
— Lance um drone tático com iluminação radial. Posicione-o acima dos barcos na ala oeste e só ligue as luzes ao comando de Isadora. Isadora… Consegue lançar o foguete com isso?
— Acredito que sim. Quer fazer com que os barcos recuem?
— Sim, dessa forma conseguiremos realocar mais meninas para cá e, se precisarmos, para a entrada.
— Perfeito. Annan, se prepare.
— O drone já está no ar, chefe. 10 segundos para se posicionar.
— Janis…
Helena chamou a agente e Annan abriu canal para todas as equipes.
— Na escuta, chefe.
— Quero que venha com mais quatro garotas aqui para o morro na ala leste. Tragam lançadores de granada em seus fuzis e muita munição.
— Entendido, chefe.
— Ária…
— Na escuta.
— Reporte.
— Já estamos em operação, mas a equipe de Janis será muito bem-vinda. Eles surgem do nada. Não sei se conseguiremos segurar muito tempo.
— Helena para Ária. – Helena restringiu a comunicação para que somente a agente escutasse. – Se prepare. Seremos atacadas por foguetes e eu liberarei Annan para que ataque livremente.
— Por que acha que nos atacarão com foguetes? Dessa forma eles chamarão atenção das autoridades locais. Certamente Lewis não quer isso.
— Porque agora é tudo ou nada. Não sabemos quantos homens ele tem e ainda não perdemos ninguém. Quero continuar com essa estatística. Nós o atacaremos primeiro com um foguete. Já dei a ordem. Então, se prepare.
— Entendido…
A voz da agente morreu na boca como se tivesse engolido a seco. A ilha viraria um inferno na terra e ela não sabia se seria bom ou ruim.
A explosão foi ouvida em toda a parte. A carga do foguete que Isadora lançara tinha dimensões grotescas. Pelo menos, cinco barcos tinham sido abatidos e rapidamente os outros recuaram no breu da noite, visto que Annan ligou e desligou as luzes do drone somente para o ataque da chefe.
Isadora desceu pelo fosso para pegar mais um projétil para o lançador, pois quando subiu para abater os barcos, só conseguiu passar com ele já carregado com somente um foguete.
A partir dali tudo ocorreu muito rápido. Ária e as outras agentes que estavam na ala leste se esmeravam em proteger a trilha para que nenhum homem que passasse pelos ataques de Annan, pudessem descer para a enseada.
Helena protegia a parte do rochedo com a metralhadora. Ela havia retirado a arma da caverna e se posicionou na interseção entre o rochedo e o caminho da escalada para a plataforma de entrada.
Annan lançou drones com cargas dirigíveis e fuzis de mira precisa. Enquanto abatia drones inimigos, disparava os projéteis na retaguarda por onde os soldados inimigos avançavam. A dor da morte já não constrangia mais nenhuma agente. Era uma questão de sobrevivência.
Muitas vidas estavam sendo perdidas por questões ideológicas, entretanto o coordenador de tudo, não se importava. Pagou o preço que os mercenários pediram e queria resultados.
— Mithil! O que está fazendo, idiota! Eu deveria ter ficado na base!
— Como assim, senhor?
— Lance os mísseis, seu arrombado! Essas porcas estão nos dizimando!
— Mas senhor, disse que não deveríamos lançar os mísseis?
— Elas já o fizeram, seu imbecil! Acha que já não fomos rastreados pelas autoridades locais? Agora já não importa mais. Quero que todas morram, antes que alguém chegue até aqui.
— Sim, senhor!
A ilha seria destruída se eles atacassem com seus mísseis, contudo, Lewis não se incomodava. Ele queria ver o sangue de Ária em suas próprias mãos. Ela o traiu. Tinha certeza de que Isadora e Helena morreriam no massacre, e isto bastava para ele e seus planos na Agência. Todavia, não poderia permitir que sua subordinada direta o traísse dessa forma.
Sabia onde ela estava, pois seus drones mostraram a ele. Via toda a movimentação da guerrilha através de seu tablet. À medida que descia pela montanha do vulcão, mapeava a localização dela. Levou um contingente grande e mandava os soldados na frente. Estava abrindo nova trilha entre as armadilhas de explosivos que a equipe de Helena e Isadora fizeram. Queria chegar diretamente até a ex-agente de sua equipe.
— Vão, vão, vão! Desçam essa merda de morro!
— Tem armadilhas, senhor!
— Se não querem morrer, não entrem nessa vida ou, sejam espertos e achem os explosivos antes de detonar vocês, porra! Temos que descer!
Um soldado tentou se afastar para o lado e Lewis atirou nele.
— Isso é um aviso. Se alguém tentar fugir, morre. Agora desçam essa merda de morro e façam a trilha!
Ele viu um drone acima deles. Mirou e o atingiu, fazendo o aparelho cair. Assim que bateu no solo, o drone explodiu.
— É assim que acabaremos com essas putas! Aprendam!
Ele gargalhou como um insano.
— Desçam, desçam!
Os soldados tinham avançado bastante e chegaram na parte mais densa da floresta, onde seria mais fácil caminhar por não ter o perigo dos tiros dados pelos drones. Mesmo na escuridão e com as roupas térmicas, eram pegos pela artilharia da equipe Hiena.
— Essas merdas colocaram câmeras espalhadas por toda essa mata. Me arrependo de não ter atacado assim que chegaram.
— O comando não autorizou, chefe.
Mithil estava na base controlando a saída de drones. A IA não tinha sido acionada quando da chegada do staff do resort. A infiltrada-chefe também não tinha entrado em contato. Estavam sem essa vantagem, mas tinham um contingente volumoso de mercenários.
— Você não é metade da inteligência da Ária. Pena que ela se bandeou para o outro lado. Estou cercado por bostas! A nossa infiltrada deve ter sido neutralizada, mas esperava mais do comando da Alpha Dìon.
Tinham quase chegado às trilhas do morro leste da enseada, quando escutaram os estrondos sobre a entrada e a enseada.
— Agora elas entenderam que não estamos de brincadeira.
Mithil tinha lançado dois mísseis diretamente no coração da enseada.
Um assovio no céu chamou a atenção de Lewis. Ele não olhou. Apenas reagiu correndo trilha acima. Um míssil atingiu seu contingente matando a maioria dos soldados. Ele caiu com a explosão.
— Filhas da puta! Como conseguem?…
Lewis não foi atingido e, ainda deitado, olhou o estrago feito pelo míssil.
No outro lado da enseada, Isadora tinha escalado outra vez o fosso até o alto. Mas dessa vez, conseguiu carregar o último projétil. Ela não atiraria a última carga pesada por um evento qualquer. Havia subido com muita munição para o fuzil e cargas para o lançador de granadas.
— Helena…
Estava confusa e não escutara Helena depois da guerra instaurada. Sua preocupação era justa, visto que ouvia pelo comunicador tiros e bombas explodindo sem parar.
— Agora não, Isa.
— Droga! Você tá na merda, é isso?
— Tô. Então sossega um pouco que tenho que me livrar dessa galera que está descendo agora.
— Annan…
— Já estou auxiliando a Helena, Isadora. Infelizmente são muitos e perdemos alguns drones.
— Reporte da enseada.
— Cinco agentes nossas morreram no ataque de mísseis; duas na entrada e três na enseada, mas a equipe de marines eliminou a esquadra com as minas subaquáticas e os lançadores por trás da frota de barcos. Elas retornaram para a enseada. Estão auxiliando o grupo de terra.
— Merda! Merda! Quem foram as agentes que perdemos?
— Ivana, Ravena, Martinez na enseada e na entrada, Viola e Camila.
Embora Isadora estivesse revoltada com a informação, a sua cabeça estava focada na ação de Helena do outro lado.
— Eles estão enfraquecendo. Já não tem tantos soldados subindo pela ala da entrada.
— Sim. Vou eliminar agora parte dos soldados dessa ala. Enviando dois drones de assalto com mísseis agora.
— Ótimo.
Isadora se posicionou com seu lançador. Assim que visse a detonação de Annan, lançaria seu último míssil para pegar a tropa restante ao ataque. E assim o fez. Depois que conferiu o resultado. Comunicou-se imediatamente com Sheira.
— Sheira…
— Na escuta.
— Ficou bom para você?
— Muito melhor, Isadora. Agora estamos com folga. Agradeça a atiradora do penhasco por nós.
— Ela está na escuta. Já recebeu seu recado. Veja o que pode dispensar da equipe Cymorth para a ala leste. Está difícil Helena segurar por lá.
— É para já. Posso enviar umas nove das minhas.
— Excelente. Elas têm que ir muito bem equipadas.
— Ok.
Isadora se distraiu e não viu o drone que se aproximou pelo lado do mar. Quando a bala a atingiu na parte superior do tronco, instintivamente se jogou na abertura do fosso. O drone lançou uma carga explosiva, no mesmo instante da ação da chefe e o fosso ruiu sobre ela.
Helena não conseguia se desvencilhar dos inúmeros soldados que passaram a persegui-la. Tinham ordens para eliminar a ameaça que os impedia de descer por aquele lado. Não compreendiam como uma única mulher e alguns drones conseguiam fazer tanto estrago na tropa.
— Annan…
Helena se viu acuada e se quisesse se salvar, teria que abrir toda a guarda para que Annan atuasse de uma vez por todas.
— Na escuta, Helena.
— Estou liberando seu protocolo de ataque para eliminar os invasores.
— Protocolo liberado sem restrições?
— Sem restrições, Annan. O protocolo retorna assim que a ameaça for eliminada.
— Entendido, Chefe!
A chefe sênior não soube definir o que aconteceu a partir dali. Ela estava sendo atacada por todos os lados; entretanto, uma chuva de tiros caiu do céu, eliminando boa parte de seus agressores. Escutou explosões por todos os lados e não sabia se eram vindos da IA ou do grupo de Lewis.
Ela se desvencilhou de mais dois soldados com a metralhadora e quando olhou para o lado, viu um outro com um lançador de granada virado para ela. Correu o quanto pôde, visto que ele destruiria a sua metralhadora e ela ao mesmo tempo. Jogou-se em um mergulho em direção a boca da caverna que era seu abrigo, mas o soldado a seguiu com a mira e quando ela atingiu a entrada, o projétil atingiu borda destruindo tudo.
Ária viu toda a ação. Estava próxima, pois foi avisada por Annan para ir de encontro a Helena. Ela e mais cinco agentes correram para salvar a chefe sênior. Quando chegaram, o desfecho da morte de Helena estava praticamente concluído. Jackie, atirou no algoz de sua chefe, disparando inúmeras vezes, retalhando o soldado com ira. Ela bradava como um animal raivoso.
Não houve tempo para a dor. Outros soldados chegaram e caíram sobre elas lutando. Ária se atracou com um deles e as outras igualmente lutavam por suas vidas.
Os estrondos continuavam e alguns deles muito distantes. Não pareciam estar detonando na enseada. Ária se desvencilhou do soldado, conseguindo sacar sua pistola o matando. Sua trégua foi breve. Alguém a agarrou por trás, arrastando-a para a mata. Lewis não queria que alguma agente os visse e atrapalhasse sua guerra pessoal.
Ela se debatia, mas o seu algoz era muito grande e forte. Lewis era corpulento e mantinha em dia seu físico, bem como seu treinamento nas lutas corpo-a-corpo. Era orgulhoso sobre isso. Ninguém da sua equipe ganhava dele numa luta.
Ele a largou, jogando-a como um boneco sobre rochas que brotavam do solo, pois queria vê-la sofrer. Não a mataria tão rápido.
— Achou que não veria você trabalhando para aquelas putas na enseada? Ah, deixe-me falar o que você ensaiou para me dizer: “Não. Lewis, eu estava encenando para que elas acreditassem em mim”…
Ele falou a última frase, com um tom fino e estridente, fazendo chacota da voz de mulheres assustadas. Ária fazia cara de dor intensa. Ela sentia dor, todavia, não nas proporções que demonstrava. Queria inflar o ego de seu agressor para que ele a deixasse pensar mais alguns segundos sobre o que faria.
Tinha perdido a pistola, quando ele a pegou, e ele tirara o rifle dela, jogando-o na trilha da mata.
— Ora, vamos! Não a lancei tão forte assim. Levante-se e me encare como homem!
Ele riu ao falar. Sabia que Ária era lésbica desde que ela foi para sua equipe, mas ela aguentou o tranco das “provações” que ele impôs, sem reclamar. Isso o fez respeitá-la.
— Fala a verdade, Ária. Cada vez que eu transava com você, pensava em deixar essa vida de lésbica, não é? Eu devia ter mantido as nossas relações desde o início. Meu erro foi não ter continuado a lhe ensinar a ser mulher.
— Sabe o que você me ensinou de verdade, Lewis?
— O quê?
— Foi a matar você sem pena alguma.
Ela apoiou seus pés firmemente no solo e projetou seu quadril e tronco para frente. Quando se posicionou agachada, girou o corpo, lançando o pé vigorosamente no joelho que ele havia feito uma cirurgia anos antes. Ouviu um estalo e um grito de dor intensa.
Ela não queria brincar com o sofrimento dele ou apreciar a sua morte. Queria somente eliminá-lo da face da terra como uma praga a ser dizimada.
Sacou sua faca de campanha e, em menos de um segundo, atingiu o coração, encravando até a guarda numa estocada só. Os olhos de Lewis se esbugalharam, aterrorizados e antes que perdesse os sentidos, ela o fitou vendo a vida se esvair.
— A partir de hoje, você não é mais nada para ninguém. Pense nisso até seu cérebro apagar.
Ele ainda segurou a mão dela, sentindo a faca sendo puxada de seu corpo.
Acabou. O corpo inerte caiu para frente e o sangue se acumulou numa poça sob ele.
Ária escutou um berro na floresta e se virou com a faca em punho. Sua reação foi reagir ao ataque. Assim que o soldado foi de encontro a ela, estocou-o com força. Foi derrubada com o empurrão e o soldado que a agredira caiu sobre seu corpo. Sua primeira reação foi em continuar a lutar, contudo não o fez, permanecendo inerte com o olhar fixo sobre a pessoa que a derrubara. Ainda estava viva.
— Natasha… Natasha… O que fez?
Seu sofrimento era genuíno. Se ajeitou, segurando a cabeça da amiga em seu colo.
— Você tinha que matar Lewis, eu sei. Mas era a única coisa que me segurava nessa vida. Meu sofrimento acabou e eu agradeço a você por isso.
— Por que fez isso? Eu disse que te ajudaria. Disse que tiraria ele de sua vida.
— E você fez…
Natasha sorriu com sangue escorrendo por sua boca. Seus pulmões se enchiam, visto que a faca os atingiu diretamente, dilacerando algumas artérias.
— Tudo que eu queria era acabar com minha loucura. Você via como era. – Ela sorriu outra vez. – Eu estou bem… vou ficar bem agora. Obrigada.
Natasha perdeu a consciência e Ária sentiu a vida dela se esvair. Uma lágrima caiu dos olhos da agente e ela berrou sofrida, segurando a amiga morta em seus braços. Os sons de tiros e explosões cessavam aos poucos. Helicópteros sobrevoavam a ilha e parecia que tudo havia acabado.
O dia amanhecia quando soldados de uma nação próxima recolhiam os prisioneiros feitos pelas equipes Hiena e Cymorth. Alguns enviados da Agência Alpha Dìon estavam com eles.
— Onde estão Helena e Isadora?
O diretor de estratégia perguntou diretamente para Margot, pois ela quem era a agente mais graduada da equipe principal que o recebia. Ela baixou a cabeça sentida. Jackie se adiantou.
— Helena morreu e eu vi com meus próprios olhos. Vocês a mataram. Quem sabia dessa armação na Agência?
— Isadora também morreu. Eu a escutei até seus últimos minutos e a IA que instalamos confirmou, mostrando o exato momento em que foi abatida.
— Meu nome é Zéfiro. Tenho muito a explicar a vocês. Mas antes de tudo, saibam que sinto muito a perda delas.
— Sente a perda delas? Vocês deixaram esse monstro crescer dentro da Agência!
— Não discordo de você, agente Jackieline. Esse é seu nome, não é? – Ele não deixou que ela respondesse e continuou. – Como disse antes, tenho muito a explicar a vocês, inclusive que Helena sabia de tudo e posteriormente, contou para Isadora, que aceitou o trabalho. Reúnam-se para que fale a todas o que aconteceu.
As agentes estavam atordoadas com a informação. Não acreditaram a princípio. O diretor de estratégia da Alpha Dìon se retirou, indo conversar com o comandante da tropa da nação aliada. Tinham que evacuar os mercenários da ilha o quanto antes. Ela seria reconstruída o mais breve possível para que as filmagens e o contrato pudessem continuar.
— O que aconteceu aqui? Alguém pode me explicar?
Urze perguntou a esmo, sem que esperasse alguma resposta real. As suas companheiras de armas certamente não sabiam também. Ela saiu em direção ao restaurante que estava parcialmente destruído.
— Esse é o único lugar que podemos ter essa conversa. Alguém vem comigo?
Jackie a seguiu. Todas as outras agentes se atinaram para o que estava acontecendo e as acompanharam.
— Não vem, Margot?
— Ainda não. Tenho que retirar algumas agentes do bunker e uma traidora também…
— O quê? O staff do hotel ainda está no bunker?
— Sim e não. — Margot sorriu de lado. – Descobrimos que Datrea era infiltrada juntamente com Talíria. Todas as funcionárias do resort eram agentes escolhidas a dedo pelo diretor de estratégia. Quando Datrea não conseguiu se comunicar com Talíria e nem com Lewis, ela mesma se predispôs a ir ao bunker verificar a situação. Tive somente o trabalho de retirar o acesso dela aos comandos.
— Você sabia disso tudo, Margot?
— Não! Não sabia. Não me julguem. Soube de parte da história depois que o ataque começou. Isadora contou comigo, pois ela e Helena conseguiram falar com o diretor Zéfiro. Ele havia descoberto quem eram as infiltradas.
— Mas como elas falaram com o diretor?
— Annan conseguiu quebrar os códigos das IAs dos satélites. Olha, eu mesma não sei bem e espero que Zéfiro nos conte. Apenas confiei em Isadora. Sei que ela morreria por nós.
— Como morreu…
Após meia hora, o que não estava destruído no restaurante havia sido colocado no lugar. As agentes se sentaram às mesas recuperadas. Comiam petiscos tirados das máquinas e bebiam as bebidas que sobraram inteiras.
O bunker havia sido aberto e Talíria e Datrea estavam algemadas e amordaçadas, sendo vigiadas por um bando de agentes. Foram encaminhadas para os helicópteros de transporte de prisioneiros. Caso a situação ficasse fora de controle, as agentes do bunker seriam acionadas para auxiliar. Uma espécie de cavalo de troia.
O diretor chegou no restaurante e viu que o lugar estava arrumado, diante das condições dos ataques.
— Explicarei a vocês o que aconteceu aqui. Nada foi premeditado. Peço que me ouçam para depois tirarem suas conclusões.
— Então fale logo!
Urze estava impaciente. Embora tivesse fama e jeito de durona, ela sofria pelas perdas das agentes e principalmente, pela descrença diante da Agência. Tinha encontrado o seu lugar no mundo quando se associou a Alpha Dìon e parecia que tudo havia ruído dentro dela.
— Vocês são diretas. Pois bem, serei direto também. – Ele mudou de postura, ajeitando o corpo sobre o outro pé de apoio. – Alguém pode me dar uma bebida? – Estava nervoso. – Acreditem; não é fácil explicar tudo que aconteceu.
Urze se levantou, pegando a garrafa de whisky que estava sobre a mesa, uma das poucas que sobreviveu ao ataque. Pegou um copo e o levou para o diretor. Deu a ele e verteu o líquido dentro.
— Pronto, já tem sua bebida. Agora se sente em algum lugar e conte tudo. Terá muitas perguntas a responder.
Embora acuado, não se sentia desconfortável. Tinha sido agente numa época em que a Alpha Dìon ainda tentava se estabelecer mundialmente. Fora um dos diretores que estabeleceram diretrizes e apoiaram normas para que mulheres fossem agregadas à Agência.
— Por onde começo… Bem, acho que por quando descobri que o diretor do setor de pessoal e treinamento era um misógino e ultimamente só contratava novos agentes homens. Nessa época contava com Helena na chefia sênior. Ela foi minha pupila e eu confiava nela com todo meu ser. Isso é um defeito para um agente. Não esqueçam disso.
Ele sorriu de lado, dando um gole em sua bebida. A cena era apocalíptica. Um restaurante com escombros, e muitas pessoas sentadas em cadeiras e mesas recuperadas de uma explosão. Ele riu novamente como se aquele “quadro” o remetesse a outras épocas.
— Continuando… Anos atrás, houve uma parceria entre duas equipes para um resgate de prisioneiros. Eram civis, mas pessoas com dinheiro e foram sequestrados em uma viagem turística. Os sequestradores pediram muito dinheiro para as famílias e a verdade é que não tinham intenção de cumprir o acordo.
— E o que isso tem a ver com o que passamos hoje? Conheço essa história. Eu estava lá.
A voz de Ària superou a do diretor. As agentes a viram entrar coberta de sangue e terra. Estava um trapo humano. Jackie se levantou e foi de encontro a ela. Viu o quanto ela lutou para salvar a sua chefe e também, quando Lewis a arrastara para a floresta. Lutando com os soldados e só pôde procurar a agente depois, porém a única coisa que encontrou foi o corpo de Lewis e muito sangue. Pensou que Ària havia retornado para a enseada como o restante da equipe.
— Senta aqui. O que aconteceu? Fui te procurar depois que me desvencilhei do soldado, mas só achei Lewis morto.
— Deixa o diretor Zéfiro contar a historinha dele primeiro, que quero saber a merda que a Agência fez dessa vez. – Ela olhou para Zéfiro diretamente. – Você me manipulou. Vim para cá com uma única missão: Proteger Helena e Isadora. Disse que Lewis estaria aqui atrás delas, mas não me contou o inferno que ele estava planejando.
— Você queria pegá-lo há muito tempo. Eu só proporcionei a oportunidade. Pelo visto, não cumpriu a sua missão a contento. Não estou vendo Helena e Isadora salvas.
— Ora seu…
Ela partiu para cima do diretor e foi impedida por Jackie e Margot.
— Eu não sabia se podia confiar em você, Ária. Não consegui me comunicar com Helena e Isadora até que a IA se conectou comigo. Isso ocorreu somente hoje… ontem de manhã, na verdade. – Ele olhou pela janela e os raios de sol começavam a alcançar as vidraças. – Eu apostei que você faria de tudo para pegá-lo.
— Ária, você foi enviada pelo diretor? Quer dizer que só a ralezada aqui não sabia de nada?
Urze estava cada vez mais indignada e furiosa com o que escutava.
— Não, Urze. Eu não sabia dessa bandalha toda. Ele só me disse que a Alpha Dìon precisava de mim para proteger a Isadora e a Helena. Que Lewis planejava um atentado contra elas, se aproveitando da oportunidade de estarem isoladas nessa ilha. Também me falou para não confiar em ninguém, porque haveria uma infiltrada.
— E havia. Vocês comprovaram isso.
— E o que a porcaria da história da missão da equipe Gladiador em conjunto com a equipe de Helena e Isadora tem a ver com isso que aconteceu aqui? Já tem anos que isso ocorreu.
— Simples, Ária; a ascensão de Lewis na Agência e os planos dele começaram lá atrás, quando vocês deixaram Isadora para morrer a mando dele.
— Ele era o chefe da missão…
A voz da agente saiu abafada, quase envergonhada.
— Não se envergonhe. Você era uma novata na época. Helena também a deixou, embora tivesse retornado no mesmo dia para resgatar Isadora, ela também aceitou a ordem dele.
— Por motivo diferente. Ela não queria comprometer o resgate dos prisioneiros e colocá-los em perigo. Também contou na Agência tudo que aconteceu e enfrentou a cúpula para resgatá-la.
— Isso mesmo. Ela conseguiu retardar até hoje a promoção de Lewis, mas a cúpula realmente não a deixou ir à época. Era muito perigoso voltar lá. Fui eu quem resgatou Isadora.
— Você?!
— Sim. Se eu não fosse, ela sairia da Agência e iria sozinha sem apoio nenhum. Eu não deixaria que ela jogasse a carreira dela pelo ralo. Mas isso não tem mais importância. O que importa é que, por conta desse acontecimento, Lewis se dedicou de lá para cá a minar a Agência com suas ideias retrógradas. Infelizmente, conseguiu angariar simpatia de alguns. Ele dividiu a agência em dois, quase como uma Alpha Dìon paralela, até culminar no que ocorreu hoje.
— E os outros diretores que estavam junto com ele? Serão presos também?
— Eu e alguns que estão comigo já nos encarregamos dessa limpeza. Vocês sabem quem é o presidente da Alpha Dìon?
— Senhor Hakon.
— Isso mesmo, Margot. Ele é o filho do fundador da Agência. Hoje tem oitenta anos, mas não é menos rigoroso do que antes com traidores, além de continuar com muita influência no mundo todo.
— Dizem que ele não fica mais à frente da Agência.
— Ele se afastou das decisões da cúpula. Foi ele quem formou a estrutura, pois sua filha não queria se entrosar nos negócios da família, mas não quer dizer que ele não tenha voz. Muito pelo contrário. Ele pode retornar a qualquer tempo e decidir o que quiser.
A conversa se estendeu por algumas horas. Zéfiro respondia a todas as perguntas, pois se quisesse reestruturar a Agência, como o presidente Hakon havia atribuído, ele escolheria os agentes a compor a nova cúpula. Avaliaria, não somente dentre as agentes das equipes de Helena e Isadora, todavia tinha certeza de que acertaria na escolha de algumas agentes que ali estavam.
hehehe acertei uma das infiltradas…
Mas Carol espero de coração que seja armação a morte das meninas, tirando isso que capítulo cheio de ação, foi fantástico.
Bom final de semana pra vc
Oi, Blackrose!
A sua curiosidade será satisfeita hoje mesmo. rs E quanto ao capítulo, foi um desfecho bem agitado mesmo. Eu gosto de escrever “tiro, porrada e bomba”! hahahaha
Valeu, Blackrose!
Um beijo pra você e bom fim de semana!
É claro que Helena e Isadora não estão mortas. Elas vão fingir a morte para sair da agência e viverem juntas? Esperando pela continuação.
Abrs, o/
Oi, Lins!
Saudade de você, menina!
Então… será que não morreram? rs Hoje veremos se a sua teoria está ou não certa.
Obrigada, Lins!
Um beijão e bom fim de semana!