A Última Chance

Capítulo 4 – Idas e Vindas

Andréa se sentia totalmente perdida, sem rumo, desde aquele dia. Ela não sabia mesmo o que pensar, não reconhecia mais Marisa, não estava entendendo qual era a intenção dela com aquilo tudo, mas Marisa tinha deixado muito claro que não havia opção possível caso ela quisesse mesmo reconquistar a sua família e a vida que tinha.

Lívia tinha recusado a oferta de Marisa inicialmente, mas depois voltou atrás e topou ficar com Andréa mesmo após a humilhação sofrida, no fundo ela achava que Andréa estava com medo de mudar de vida, estava acomodada com Marisa depois de tantos anos e sentia um medo que ela considerou natural de mudar tudo de uma vez. O seu objetivo a partir daquele dia foi provar a Andréa que ela estava sim apaixonada e que o relacionamento com Marisa já tinha dado o que era para dar.

Marisa estava mais calada, mais centrada em si mesma. Tinha começado a fazer academia e cursinho pré-vestibular toda manhã, todo dia acordava e saia cedo, voltava cansada, porém feliz para casa. A vida tinha tomado um rumo totalmente diferente para ela, estava se sentindo realmente ótima e recuperou totalmente a autoestima e confiança em si mesma. Ter finalmente descoberto a verdade e dissipado de uma vez a dúvida que a torturava há tanto tempo tinha mudado tudo, o peso imenso que carregava nas costas e a nuvenzinha negra que a acompanhava a tanto tempo tinham sumido como por arte de mágica. A mulher se sentia leve, estranhamente tranquila e em paz consigo mesma, ela não tinha mais medo, tinha certeza de que o problema não era ela nem nunca tinha sido, a falta de caráter de Andréa não tinha nada a ver com ela.

Pouco tempo depois do acordo que as mulheres tinham fechado naquela noite, Marisa e Lívia estavam na sala, Marisa mostrava a Lívia uma coleção de cartões postais que Andréa e ela tinham trazido dos lugares que tinham visitado durante estes anos, Lívia olhava para eles com tristeza pensando no difícil que seria achar um lugar para viajar com Andréa no futuro que não lhe trouxesse alguma lembrança de Marisa.

De repente, a campainha tocou, Marisa foi até o portão abrir e deu de cara com Dani, uma das amigas mais antigas do casal.

— Mulher de Deus, achei que vocês tinham morrido. — Disse Dani dando um forte e apertado abraço na amiga.

— Danizinha, que saudade! —Respondeu Marisa retribuindo o abraço.

Dani foi entrando sem pedir licença, viu a moça loira na sala, a cumprimentou se apresentando e sentou no sofá pedindo a Marisa um copo de água.

— Amiga, faz tanto tempo que a gente não se vê que eu nem sabia que você estava com esse cabelo nos ombros já, a última vez que te vi você tinha acabado de cortar bem curtinho. — Disse Dani admirando Marisa.

— Eu sei, a gente está mesmo em falta com vocês, mas a vida está uma loucura ultimamente. — Respondeu Marisa. — Mas e você e a Naty, como vão? — Continuou Marisa rapidamente mudando o tema da conversa.

— Não estamos. — Respondeu, tristemente, Dani.

— Mas como assim? O que houve. — Questionou Marisa, surpresa.

— Ela decidiu voltar para ex. Acredita? Depois de tudo o que aquela cachorra fez com ela. Poxa a gente estava junta há três meses já ai a filha da puta da mulher começou a infernizar a gente, ligava toda hora para ela, mandava whatsapp o dia inteiro, eu falei para ela resolver de uma vez a história das duas, ir lá conversar com ela e…. já viu né? Estou solteira de novo. — Explicou Dani mostrando a mão esquerda com uma leve marquinha de aliança que não estava mais no dedo anular.

— Ai, amiga, você não dá mesmo sorte, né? Poxa vida… — Disse Marisa com um suspiro.

— É…. não foi ainda a minha vez de encontrar a “Andréa” da minha vida. — Respondeu Dani olhando para Lívia.

— E você, Lília? Acho que nunca te vi antes, é colega também? — Perguntou Dani sorrindo.

— Eu? Ah…. Eh…. Acho que sim. — Disse Lívia, totalmente sem graça.

— O nome dela é Lívia, Dani, ela é a Lívia, uma amiga nova, ela trabalha lá com a Andréa, mas ultimamente está passando um tempo aqui em casa de tarde, vem me fazer companhia, estou ensinando ela a cozinhar. Você sabe como a Andréa adora comida francesa e italiana, né? Ai a Lívia vem e preparamos juntas, depois a Andréa chega, janta e fica admirando o seu harém aqui. — Disse Marisa, em tom de brincadeira.

— Ai que delícia! Eu queria um harém assim também, sua gostosa! — Falou Dani apertando a coxa de Marisa. — Falando nisso, amiga, você está gata pa’ caramba, hein? Tá fazendo o que de bom para ficar gostosona desse jeito?

— Criei vergonha na cara e estou fazendo academia. A idade vai chegando e a gente precisa começar a se cuidar, né? — Respondeu Marisa.

Lívia continuava olhando para as duas mulheres se sentindo totalmente fora de lugar. Dani parecia tão íntima do casal, tão por dentro da vida delas, mas ela nunca tinha ouvido falar na Dani, não sabia nem quem era nem como era que a Andréa a tinha conhecido nem a quanto tempo eram amigas.

Lívia olhou para Marisa conversando com a amiga e viu, pela primeira vez, a elegância daquela mulher. Não era uma elegância física, não vinha de roupas nem joias, era uma elegância da alma, uma integridade que lhe emanava de dentro e que fazia com que ­—mesmo tendo sido pega em casa na terrível situação de estar compartilhando o mesmo teto com a amante da sua mulher— ela tirasse a constrangedora situação de letra, explicasse tudo à amiga mantendo a decência, a graça, a pose.

A garota não pertencia àquela cena e tinha total consciência disso, se sentiu uma expropriadora da vida alheia, uma ladra furtiva, um segredinho escuro que deveria ser escondido das amigas e de todos. Lívia olhou para as próprias mãos, viu os cartões postais que estava segurando — as lembranças de uma vida inteira— e sentiu vergonha. Vergonha de ser “a outra”, vergonha de estar ali na casa de Andréa debaixo do mesmo teto que a mulher que tinha vivido vinte anos ao lado dela, vergonha da conversa que tinha tido com Marisa dias atrás.

— Marisa, eu vou embora, não vou ficar mais hoje, estou com muita dor de cabeça, quero ir para casa tomar um remédio e tirar um cochilo. — Disse Lívia, sem graça.

— Ah! Que pena, Lívia. Você sabe que se quiser pode deitar no quarto, né? — Respondeu Marisa.

— Não, eu prefiro ir para casa. Obrigada. — Respondeu a garota.

— Está bem então, Lívia. Até amanhã. — Disse Marisa enquanto conduzia Lívia até o portão.

Após a garota sair, Dani disse:

— Amiga! Onde você tinha escondida essa gostosa, pelo amor de Deus, pare de ser egoísta e divida o pão com os necessitados!

— Aí você vai ter que pedir para Andréa, quem está comendo desse pão é ela, não eu. — Respondeu Marisa, com um tom mais triste do que pretendia.

— Que é isso, Ma? Tá falando sério? — Indagou Dani sem conseguir dissimular o espanto.

— Seríssimo. Essa aí é “a reunião de última hora”, o “serviço que ficou para o sábado de manhã” e a “emergência da firma”. — Disse Marisa.

— Para com isso, sua doida! — Respondeu Dani rindo. — De onde você tirou uma coisa dessas, a Andréa nunca ia se enrolar com uma criança dessas, ela sempre disse que gostava de mulheres mais maduras, mais sérias.

— Amiga, prefiro não falar disso, tá? Outro dia a gente conversa, não estou legal para desse assunto agora. — Disse Marisa, com olhos úmidos.

— Tudo bem, gatona. Mas eu já sei do que você precisa. Pegue a sua bolsa, vamos ali no salão da Vivi, estamos precisando é de dar uma caprichada no visual.

Quando Andréa chegou naquela noite, encontrou Marisa sentada à mesa comendo uma salada grega acompanhada de frango, era o único que tinha dado tempo de preparar depois que chegou do salão. Andréa sentou, jantou e foi dormir sem nem perceber que Lívia não estava lá, a sua mente estava totalmente em outro lugar.

No dia seguinte, Andréa acordou e foi para a cozinha onde Marisa já estava tomando café. Ela olhou para a esposa durante alguns minutos, uma luz parecia irradiar dela. Andréa estava realmente encantada com a mudança de Marisa. Os olhos dela tinham um brilho diferente agora e as roupas começavam a mostrar a mudança no seu corpo propiciada pela academia que ela fazia religiosamente todas as manhãs.

— Você fez alguma coisa no cabelo? — Disse Andréa.

— Cortei as pontas e fiz luzes ontem. — Respondeu Marisa inclinando a cabeça para mostrar os novos tons no cabelo.

— Ficou legal. Você parece até mais nova. — Respondeu Andréa chegando perto para passar os dedos por entre os cabelos de Marisa. — Quero almoçar com você hoje, o que acha?

— Eu tenho cursinho até o meio dia hoje. — Respondeu Marisa.

— Eu posso te levar agora de manhã e passo para te buscar no horário de almoço. Podemos ir almoçar naquele restaurante italiano que você tanto gosta. Aquele que fica na Asa Sul. — Disse Andréa, em tom sugestivo.

— Ok, pode ser. — Respondeu Marisa.

Ao meio dia em ponto Andréa parou o carro na frente do cursinho de Marisa. Quase ao mesmo tempo, uma grande quantidade de pessoas começou a sair pelas portas do prédio. Garotinhas em shorts e havaianas, rapazes de óculos escuros, algumas moças de mais idade carregando livros no colo, todo tipo de gente saia por aquelas portas, pensou Andréa. Uns dez minutos depois ela viu um casal saindo, precisou olhar novamente para reconhecer Marisa, a esposa estava mesmo muito diferente, tinha perdido muito peso e aquele cabelo a fazia parecer muito mais nova.

Marisa não viu Andréa ao sair, estava distraída conversando com um homem alto vestindo um terno cinza, o homem parecia ter uns trinta e poucos anos, tinha o cabelo castanho bem comprido, amarrado atrás rente à a cabeça, eles ficaram parados frente às portas de vidro conversando, O homem, que estava carregando os livros de Marisa, se inclinou para devolvê-los e lhe deu um beijo no rosto que ela retribuiu. Ambos falaram mais alguma coisa, Marisa sorriu, e se despediram novamente.

Andréa ficou curiosa em saber quem seria aquele cara:

— Bem charmoso o rapaz. — Pensou enquanto observava Marisa vindo na sua direção.

O homem, que estava andando na direção oposta, se virou ao chegar perto de um carro prata e ficou apenas observando Marisa se aproximar do carro de Andréa.

— Oi, não tinha te visto. — Disse Marisa sorrindo quando chegou perto do carro.

— Eu percebi. — Disse Andréa, ainda olhando para o homem.

Marisa abriu a porta traseira, deixou os seus livros e bolsa encima do banco e entrou no carro pela porta da frente.

— Quem era o bonitão? — Perguntou Andréa.

— O professor de Matemáticas. — Respondeu Marisa dando um sorrisinho. — É um fofo ele.

— Muito charmoso. — Disse Andréa.

— É sim, né? Também acho. Aquele cabelo…. — Falou Marisa abafando um suspiro. — E é tão alto ele, não é? Acho mesmo um charme.

Andréa não respondeu. Nunca tinha visto a esposa elogiar a beleza de um homem, normalmente Marisa mal notava a presença deles em algum lugar, muito menos comentava sobre a aparência de algum deles. Na maioria das vezes Marisa era totalmente indiferente aos homens, o que fazia Andréa se sentir bem mais confiante em relação a Marisa, pois a maior de todas as inseguranças da vida dela era pensar que se algum dia Marisa tivesse uma recaída heterossexual ela não poderia fazer nada para reconquistar a esposa. Andréa se sentia extremamente insegura toda vez que Marisa tocava no assunto dos seus relacionamentos anteriores, que tinham sido sempre com homens, tendo inclusive sido casada com um durante quase 5 anos. Andréa tinha sido a primeira mulher de Marisa, a única, o que tinha seu lado bom, mas deixava Andréa bastante apreensiva pensando que algum dia Marisa poderia voltar a querer um homem na sua vida e contra isso ela não teria chance de competir.

Marisa nem mesmo pensava na possibilidade de se relacionar com um homem novamente, Andréa sempre tinha satisfeito todas as suas necessidades, tinha lhe preenchido a vida, e sinceramente, o amor que sentia por ela era tamanho, que o restante das pessoas do mundo eram simplesmente invisíveis para ela. Depois de vinte anos ao lado dela, Marisa não conseguia se imaginar nos braços de mais ninguém.

— Você tem aula todo dia com o bonitão? — Indagou Andréa após quase cinco minutos dirigindo em silêncio.

— Ah? Tenho sim. — Respondeu Marisa, distraída.

— Ele estava dando mole para você, você percebeu, né? — Disse Andréa tentando fazer parecer que esse tinha sido um comentário trivial.

— Dando mole para mim? — Gargalhou Marisa. — Você é louca. Não tem nada disso.

— Tem sim, ele se virou e ficou te olhando entrar no carro, me pareceu estar bem afim. — Disse Andréa, sem conseguir esconder a pontinha de ciúmes que estava sentindo.

— Bom, quem sabe, né? — Disse Marisa calmamente. — Se ele estiver mesmo afim eu posso pensar no seu caso, ele é mesmo bem charmosão. — Terminou ela num tom casual intencionalmente tentando provocar Andréa.

Andréa parou de falar e ficou em silêncio até chegarem ao restaurante onde ela parou o carro e foi até a porta do carona para abrir a porta para Marisa. Andréa entrelaçou o seu braço no de Marisa e ambas entraram juntas.

— Mesa para dois? — Perguntou um garçom.

— Sim, por favor. — Respondeu Andréa. —. E se for possível, por favor já nos traga uma garrafa de vinho branco. Tem Casal Garcia? — Perguntou.

— Temos sim, o trago num minuto, senhora. — Respondeu o garçom.

Ambas mulheres almoçaram, conversaram uma sobre a vida da outra, Marisa deu alguns pitacos sobre o trabalho de Andréa, Andréa questionou a Marisa sobre suas intenções de fazer vestibular, qual faculdade pretendia fazer, qual era melhor, a conversa parecia não ter fim.

— Meu Deus, já são as três! — Disse Marisa, consultando seu relógio.

— O tempo voa mesmo conversando com você. — Respondeu Andréa, sempre galante.

— Podemos pedir a conta? — Perguntou Marisa.

— Deixe comigo. — Respondeu Andréa.

Após pagar e dirigir até a casa de ambas, Andréa anunciou:

— Não vou voltar ao trabalho hoje, quero ficar com você.

— É? Eu tenho que fazer o jantar e a Lívia me pediu para ensinar ela a fazer torta de limão, ela sempre quis aprender. — Disse Marisa.

— Esquece isso, Marisa. Fica comigo hoje, vamos curtir um filminho, uma cerveja, fala com a Lívia que hoje não precisa vir… aliás, você podia desistir de vez dessa palhaçada e voltar a ser tudo como antes. — Disse Andréa, abruptamente, como se estivesse pensando nisso há muito tempo e apenas agora tivesse reunido forças para falar.

— Tudo como antes? Está se referindo ao antes quando era uma otária que se dedicava por inteiro a você enquanto você me metia chifre com uma garotinha do escritório? Eu prefiro não voltar a isso não, obrigada. — Respondeu Marisa, sarcástica.

— Você entendeu o que eu quis dizer. Podia tudo ficar bem entre a gente, hoje foi tão bom, é sempre tão bom ficar com você, passar tempo com você. Olhe para você! Você está um tesão hoje. — Disse Andréa enquanto pegava nos cabelos de Marisa. — A gente podia aproveitar este dia só para nós duas, vamos esquecer disso tudo, virar a página, meu amor.

— E as juras de amor eterno para a Lívia? E a promessa de me deixar e casar com ela? Tão rápido você descarta as pessoas, Andréa? É isso que os seres humanos significamos para você? Acha que estamos aqui para te divertir, te dar prazer, para nos usar e depois descartar?

— Lá vem você de novo com isso, Ma. Eu já reconheci que errei, já pedi perdão, o que mais você quer de mim? A Lívia não é criança não, ela sabia muito bem no que estava se metendo, eu não sou obrigada a lhe prestar contas do que faço ou deixo de fazer com a MINHA mulher dentro da MINHA casa e hoje eu quero você para mim, meu amor, hoje eu quero você só para mim. — Disse Andréa, encostando Marisa na parede e beijando-a apaixonadamente.

Andréa ligou para a Lívia e pediu para não ir para a casa delas naquele dia, inventou uma desculpa qualquer e dispensou a garota. Enquanto isso, Marisa tinha ido tomar um banho, fazia um calor desgraçado — Segundo ela — e precisava de um banho para se refrescar e trocar as roupas suadas que estava vestindo desde cedo. Andréa suspeitava que a necessidade do banho tinha mais a ver com beijo cheio de desejo e luxuria que tinha acabado de lhe dar do que com o clima.

Andréa abriu a porta do banheiro devagar, sem fazer barulho, através da porta de vidro do box viu Marisa, toda nua, de olhos fechados debaixo do chuveiro, a cabeça levemente inclinada para atrás, a agua lhe escorrendo pelo rosto, pelo pescoço, pelos seios. Ela estava simplesmente irresistível, Andréa tirou rapidamente as suas roupas, as jogou de qualquer jeito num cantinho e entrou no box com ela. Marisa levou um susto quando ouviu a porta do box abrindo, mas ao ver Andréa entrando nua para se juntar a ela não conseguiu conter um sorrisinho leve no cantinho dos lábios.

Andréa não falou nada, pegou Marisa pelos cabelos puxando a cabeça dela levemente para atrás, delicadamente lhe beijou o pescoço para logo mordê-lo de leve, foi subindo com a boca, lhe deu umas mordidas no queixo, no rosto, já não tão de leve. Marisa ficou quieta, imóvel, de olhos fechados, por puro instinto afastou o rosto de Andréa, mas logo o aproximou novamente, os lábios de ambas se encostaram e Marisa mordeu o lábio de Andréa primeiro de leve e depois com raiva, forte, quase até machucar. Andréa deu um puxãozinho mais forte no cabelo de Marisa e a fez encostar na parede do banheiro batendo levemente a cabeça, lhe beijou novamente o pescoço, desceu para os seios, sentiu seu corpo todo enrijecer enquanto agarrava firmemente sua nádega com uma mão e o seio om a outra, Andréa desceu aos poucos até ficar de joelhos, a água morna escorrendo pelo corpo de Marisa, lhe caiu pelo rosto, pelos olhos, lhe encheu a boca, ela não se importou com nada disso, enfiou de leve a cabeça entre as pernas de Marisa acariciando-a com os lábios e a língua enquanto lhe segurava e arranhava as nádegas com força, só desgrudando os lábios dela ao sentir todo o seu corpo estremecer entre as suas mãos.

Ao sair do chuveiro, Andréa pegou Marisa, ainda encharcada, pela mão e a conduziu até a cama na qual a jogou com um empurrão leve subindo encima dela e a cobrindo toda com seu corpo. Beijando cada centímetro, cada pedacinho da sua pele dourada. Quanto mais a beijava, maior era o calor que emanava do corpo de Andréa, a pele lhe queimava, não sabia mais o que era água do banho e o que era suor, ambos se misturavam deliciosamente no corpo das duas. Cada beijo, cada toque, tinham como resposta do corpo de Marisa tremores musculares, secreções que cheiravam a prazer e pequenos gemidos finos que aos poucos foram se transformando sons que ecoaram pela casa inteira como notas tocadas por um experiente violonista.

O sol se pôs, a noite caiu, e ambas mulheres ainda continuavam se amando como se fosse a primeira vez. Andréa não se lembrava mais de ter sentido a esposa tão conectada consigo, tão sua, tão entregue antes. Essa deliciosa tarde, terminou com ambas exaustas, com os corpos amolecidos de prazer, caindo no sono abraçadas como nos primeiros meses de namoro, tanto tempo atrás.

Marisa acordou no dia seguinte com o corpo dolorido, marcas da tarde de paixão por todo o corpo, a lembrança do corpo de Andréa ainda na sua pele. Foi tomar um banho, escolheu uma blusa e uma calça que cobrissem todos os pequenos arranhões e marquinhas roxas e vermelhas espalhadas por todo o corpo, as colocou numa sacola para vesti-las depois de ir para academia e antes de ir para o cursinho. Preparou um café da manhã rápido e saiu deixando Andréa ainda dormindo.

Ela passou a manhã toda ausente do mundo, estava tão entregue aos seus próprios pensamentos que nem viu as horas passarem. A lembrança das viagens feitas, dos momentos felizes vividos com Andréa e com as crianças, os dias de zoológico, de piquenique à sombra das árvores do parque da cidade, as risadas, os jantares, as inúmeras alegrias vividas nestes vinte anos se amontoavam na sua mente. Uma vida inteira lhe passou diante dos olhos naquela manhã. Tantos sentimentos, tantas alegrias, tantos momentos incríveis já vividos e tantos ainda por viver, seria possível que o amor tivesse mesmo acabado? Seria possível que tudo aquilo não tivesse passado de mentiras e enganação?

— Vinte anos. — Pensou Marisa murmurando baixinho a frase sem perceber.

— O que tem os vinte anos? — Perguntou sorrindo Renan, o professor de matemáticas, olhando fixamente para Marisa que acordou de súbito do trance em que se encontrava e percebeu que a sala estava já vazia, todos tinham já saído, só sobraram os dois na sala.

— Nada. — Respondeu ela corando. — Desculpa, estava distraída pensando em que mês que vem a minha esposa e eu completaremos vinte anos de casamento e eu nem mesmo pensei em alguma forma de comemorar.

 — Você tem uma esposa? — Perguntou Renan, sem esconder o desapontamento e a surpresa.

— Tenho! E duas filhas também. — Respondeu Marisa, fingindo não ter percebido o tom da pergunta.

— Legal. — Respondeu o homem. — Deveria comemorar, hoje em dia não é qualquer casamento que chega aos vinte anos, isso é uma raridade. — Completou ele.

— É mesmo. O casamento é uma opção difícil, muita coisa muda na vida, muita coisa muda dentro da gente, não é fácil uma pessoa se adaptar a tanta mudança, imagina duas mudando ao mesmo tempo.

— É sim, muito complicado. Eu que o diga! Já estou no segundo divórcio. — Disse Renan gargalhando.

Marisa nem continuou a conversa, estava de novo absorta nos próprios pensamentos. A nostalgia daquela vida, da sua vida, era insuportável. Sentia falta de Andréa, não sabia o que poderia ser da vida sem ela. Tinha vontade de ir até o escritório, se ajoelhar aos seus pés e lhe suplicar que nunca mais a machucasse, que nunca mais traísse a sua confiança e seu amor. Lhe implorar que as coisas voltassem a ser como antes, como no começo, como tinham sido no dia anterior.

Ao chegar em casa, Marisa trocou de roupas e logo ouviu a campainha tocar. Foi abrir e viu Lívia no portão. Ela tinha se esquecido completamente da Lívia, não lembrava mais nem que ela iria hoje, não lembrava mais dela de jeito nenhum, tomou um susto quando a viu, mas se recompôs rapidamente e a convidou a entrar.

A menina estava mais pálida do que de costume, os olhos irritados, olheiras, era evidente que tinha passado horas chorando.

— O que houve, Lívia? Está doente? Você não parece muito bem hoje. — Perguntou Marisa enquanto entrava em casa.

— Nada não. — Disse Lívia.

Os olhos da garota se fixaram nas marcas por todo o corpo de Marisa, haviam arranhões nas costas, nos braços, pequenas marquinhas vermelhas por todo o pescoço, no colo. Não precisava ser muito inteligente nem muito experiente para entender que aquilo eram marcas de uma noite de sexo selvagem.

— A Andréa não falou nada? — Perguntou Lívia.

— Nada de que? — Questionou Marisa.

— Nada sobre mim? Não perguntou por mim antes de ontem? Não disse nada sobre por que não quis que eu viesse ontem? Ela não disse se já decidiu o que vai fazer da vida dela, da sua, da minha?

Marisa sorriu, de repente tinha sentido exatamente o mesmo que sentiu a vez em que Giovana, com uns nove anos de idade, tinha perguntado:

— Mãe, você e a tia Andréa fazem bebês à noite?

Depois da criança ter assistido um documentário sobre reprodução humana num canal da TV a cabo.

— Ainda é cedo para isso, Lívia. Dá um tempo para ela. — Respondeu Marisa.

— Eu acho que está bem claro que ela não precisa de mais tempo, parece que já está bem claro na cabeça dela quem ela escolheu. — Disse Lívia fazendo cara de choro.

— Por que você diz isso, Lívia? — Indagou Marisa.

— Você está toda cheia de chupões, arranhões, eu não sou idiota. Foi boa a trepada? — Respondeu Lívia insolente.

Marisa sorriu brevemente e logo disse:

— Senta aqui comigo.

Lívia sentou.

— Me explica qual é o problema de eu transar com a minha mulher, porque eu não entendi. Você não passou dois anos transando com ela enquanto ela ainda estava comigo? Qual é a diferença agora?

— Nenhuma. Eu só, achei…. Eu não entendo…. Por que você quer que eu venha aqui, que eu continue dormindo com ela, para que você me ensina tudo o que ela gosta, o que ela quer, se você na verdade quer é ficar com ela para você?

Marisa desta vez não conseguiu segurar o riso. A ingenuidade de Lívia era de muitas formas encantadora.

— Lívia, a Andréa é a minha mulher, tem sido a minha mulher há vinte anos e eu a amo. É claro que eu a quero para mim, ela é minha, tem sido minha sempre. Você pode tê-la tido por alguns minutos, algumas horas, alguns dias, até meses, mas ela nunca deixou de ser minha, ela é a MINHA mulher. E até agora nada mudou isso. — Respondeu Marisa calmamente.

— Ela me ama, Marisa, você não entende? Vocês duas já eram, ela já não quer você, ela me ama! — Gritou Lívia quase como uma criança birrenta grita no mercado querendo um doce.

Marisa sorriu e respondeu:

— Fica hoje aqui, dorme aqui, eu deixo a cama grande para vocês, vou dormir no quarto da minha filha. Mas primeiro vamos para a cozinha, hoje tem muita coisa para a gente preparar.

As duas foram para a cozinha, prepararam a entrada, o prato principal e fizeram até sobremesa. Marisa disse que era um jantar especial para que Lívia ficasse mais feliz, Lívia não parecia feliz, mas quando Andréa chegou, a garota tentou fazer a melhor cara que conseguiu, não queria que Andréa percebesse o ciúme que estava sentindo.

— A Lívia vai ficar para dormir aqui hoje, podem ficar com o quarto de casal. — Disse Marisa, olhando nos olhos de Andréa.

— Que é isso? Não, eu não quero! — Andréa soltou quase por impulso. — Quer dizer… Lívia, eu tenho que conversar com você. — Andréa tentou corrigir a forma em que tinha acabado de falar.

Andréa não esperou o jantar terminar, estava pensando nisso desde o dia anterior, precisava mesmo esclarecer tudo com a Lívia e terminar toda essa situação logo:

— Lívia, eu sei que eu errei com você, eu sei que eu te iludi e fiz você perder um tempo precioso da sua vida comigo. No seu momento eu não via as coisas dessa forma, eu não achava que estava te prejudicando com isso, não pensei que você se importasse com isso, mas a Marisa — Disse Andréa esticando o braço para pegar a mão de Marisa do outro lado da mesa. — me fez entender que eu estava errada, muito errada.

— Por que você não fala logo o que tem para falar, Andréa? Para com esses rodeios que nós nunca precisamos disso. — Disse Lívia com lágrimas nos olhos.

— Eu estou tentando te pedir perdão, Lívia. Eu queria muito que você me perdoasse por tudo, mas você confundiu tudo… quer dizer, eu fiz você confundir tudo. Eu te levei a achar que o nosso relacionamento era muito mais importante do que ele realmente era. Você é linda, é novinha, vai achar alguém que mereça você rapidão… — Concluiu Andréa.

— Você é mesmo uma filha da puta, Andréa! Eu nunca pensei que você fosse assim, nossa como me enganei com você! Sua filha da puta! — Gritou Lívia aos prantos.

— Lili, por favor, não fica assim! Não faz isso…. Você é incrível, é maravilhosa, mas eu sou casada, meu bem! Eu amo a minha mulher, nós temos uma vida uma família, temos toda uma história. Não dá para jogar tudo isso no lixo! Você é novinha demais, de aqui a pouco acha uma garota da sua idade e eu vou dançar nessa, você sabe disso. — Disse Andréa num tom desesperado.

— Nossa! Você está ouvindo o que acabou de dizer? Você é mesmo uma otária, viu? Sério mesmo, você não merece que eu goste tanto de você, não merece o amor da Marisa, você tinha mais é que ficar sozinha pra sempre, morrer sozinha, sua babaca! — Disse Lívia pegando a bolsa e saindo da casa correndo.



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