Já era tarde da noite, quando Juliana aguardava Hugo e Isabela na redação. Junto a ela estava Silveira, que quando soube da exclusiva, a felicitou infinitamente, e fez questão de ficar para ver o resultado de tal entrevista. Os dois conversaram, quando Hugo e Isa chegaram visualmente exaustos. Silveira foi logo perguntando:
– E então. O material é bom? – disse esfregando as mãos
– O material garantiria a nós umas mil promoções! – diz um Hugo empolgado
– Ótimo! E quais foram às formas de entrevista? – Silveira perguntou
– Áudio, vídeo e uma cópia de uma carta da mãe de Alexia… – Isabela respondeu
– Da mãe?? – Juliana se pronunciou, estranhando
– Você já vai entender Juliana. – Hugo diz
– Você está bem amiga? Preparada pra ver isso tudo? – Isa demonstra preocupação
– Sim, preparada pra tudo. – Juliana responde firme
– Então vamos ali para o computador, vamos assistir! – diz Silveira sem entender muito bem o porque Juliana deveria estar preparada.
A entrevista começa a passar e só de ver a primeira imagem de Alexia na tela, o coração de Juliana se aperta no peito. Isabela segura a mão da amiga, discretamente, e a entrevista começa:
– Então Srtª Alexia, conte-nos como foi receber a notícia da morte de seu pai…
– Hugo, não é? Pois então Hugo, antes de vocês começarem a fazer perguntas óbvias, e provavelmente estragarem a oportunidade de uma entrevista exclusiva como essa, gostaria de falar umas palavras, é possível?
– Claro, fique a vontade.
– Então, para vocês dois e todos que lerão e verão esse depoimento que eu estou a dar.
Meus avós maternos sempre foram podres de ricos. Donos de dois Hospitais, ser médico era tradição em nossa família. Eduardo, era um bolsista da escola que minha mãe estudava. Ele tinha uma paixão por ser médico, mas por ter origem humilde temia nunca conseguir realizar tão sonho. Minha mãe Alexandra logo simpatizou por ele e viraram grandes amigos. Quando minha mãe tinha 16 anos, acabou engravidando e assim casou com Eduardo. Até ontem, eu acreditava que meu pai era Eduardo, mas pra felicidade, descobri que não era.
Uma pessoa muito ligada a nossa família nos contou a transformação que Eduardo sofreu ao longo dos anos. Na realidade, essa pessoa sempre achou que ele agira de forma premeditada em tudo, mas nunca obteve provas. Após o casamento, Eduardo já havia mudado de comportamento, mas nada grave. As coisas pioraram depois que ele se formou em Neurologia, junto com minha mãe e assumiu o hospital com a morte de meu avô. Ele teve o poder, e o dinheiro que sempre ambicionou. Minha avó não aguentou muito tempo após a morte de vovô e seguiu o mesmo caminho.
Território livre para Eduardo fazer quase tudo o que quisesse. Só tenho lembranças de Eduardo como um homem muito agressivo, arrogante, e maldoso. Sempre me fez sofrer, e fez sofrer a minha mãe. Nos batia, ameaçava e traumatizava com suas palavras e atitudes. Desde criança foi assim, e depois que minha mãe morreu, isso só piorou. Ele tinha uma insistência muito grande para que eu me formasse no nível superior, e sinceramente era um contraste muito grande, ele ter essa preocupação sendo que não se importava comigo. Até que me foi revelado o primeiro testamento de minha mãe, revelando que me formar era um acordo no testamento deixado por minha mãe, para que ele tomasse posse se uma grande fortuna que temos, investida em joias. Além disso, foi descoberto um segundo testamento, que deve ter sido achado por Eduardo antes de sua morte, que anulava as cláusulas do primeiro, ainda relevando para mim, que ele não era o meu pai biológico. Minha mãe sempre prezou muito pela educação, achava que isso era o maior tesouro que ela poderia deixar como legado. Não me pressionava a ser médica, eu poderia ser o que eu quisesse. Sinto sua falta todos os dias…
Alexia, emocionada, permite que uma lágrima escorra de sua face, e abre um pequeno envelope rosa, e continua a falar:
– Desculpe, não costumo me emocionar facilmente. Continuando: junto com esse segundo testamento, minha mãe me deixou uma carta, que eu gostaria de ler para vocês agora:
“Querida Filha,
Se você chegou ao ponto de ler esta carta, é porque infelizmente eu já não estou mais ao seu lado. Saiba que deixar você nesse mundo foi a coisa mais difícil que eu estou sendo obrigada a fazer. E me perdoa por ter deixado você continuar a conviver com um homem que sempre a fiz acreditar que era seu pai, mas Daniel lhe explicará as razões e peço compreensão. Fico feliz que tenha se formado em uma faculdade, e seja lá qual o curso que você escolheu, espero que seja feliz. E se não for, procure outra coisa que a faça feliz, mas tenha juízo minha filha, por favor.
Todos os meus bens, são seus agora. Saiba administrá-los e conte com Daniel para isso. Caso ele não possa ajudar, tenho certeza que instruiu pessoas sábias e confiáveis o suficiente para isso.
Quanto o seu pai biológico, infelizmente filha nunca mais o vi na vida. Desconfio que Eduardo o tenha matado, para poder ficar comigo e usufruir de minha fortuna, mas nunca consegui provar ou reunir provas que comprovassem minhas suspeitas.
Saiba que eu te amo de todo coração, e que torço para que você já tenha encontrado o amor da sua vida, que irá te fazer muito feliz. E se ainda não encontrou, corra atrás com todas as suas forças, pois pode parecer clichê, mas o amor é a maior força e poder que uma pessoa pode possuir em seu coração. Ame muito minha filha, e saiba escolher certo. Não se deixe enganar, e nem engane. Seja justa, sincera, fiel, e sobretudo leal a pessoa amada.
Eu sempre estarei vibrando pelas suas conquistas, e sorrindo para os seus sucessos. Um grande beijo da sua mãe que te ama muito,
Alexandra”
Todos que assistiam o vídeo, estavam emocionados. Até Silveira estava chorando. Juliana, não sabia que emoções sentir. Tocou a tela na esperança de poder enxugar as lágrimas que escorriam do rosto de Alexia, que leu toda a carta muito emocionada, mas sem embargar a voz nenhuma vez. E o vídeo seguia:
– Nossa Srtª Alexia, é uma história e tanto…
– Vocês não tem ideia do que esse monstro me fez passar, mas acredito que vou revelar, depois de um bom tempo, a pior delas.
– Conte-nos, por favor…
– Me descobri lésbica durante meu tempo de faculdade em Portugal…
Juliana deu um pulo da cadeira, e Isabela a acalmou:
– Preste muito atenção nisso Juliana.
O vídeo continuava:
– … quando conheci uma linda bolsista, carioca loirinha de olhos verdes que encantou meu coração. O tempo foi passando, eu fui me apaixonando e fiz por elas, coisas que eu jamais imaginei fazer. Eu era uma pessoa complicada, e ela me fez ser diferente, ser leve, feliz..até o dia que eu a pedi em casamento….
Alexia pausou para respirar profundamente, e Isabela perguntou:
– E o que aconteceu?
– Eu fiz uma burrice. Tentei pagar uns períodos de faculdade a ela, pois eu já sabia que a bolsa dela não seria renovada devido uns problemas que ela teve na faculdade, que não foram nem de longe culpa dela, e fiz um esquema para pagar a faculdade dela, sem que ela soubesse. Meu erro foi esconder isso dela. Meu pai descobriu, e apareceu no dia seguindo ao nosso noivado. A humilhou e me proibiu de vê-la ou tentar saber notícias dela, dizendo que a mataria, que a faria sofrer. Me manteve praticamente em cárcere durante o tempo que demorei para terminar a faculdade, pois eu acabei repetindo algumas matérias. Eu não pude ir atrás dela, pois ela estaria correndo risco de vida. Me afastei de minhas amigas na faculdade, para não levantar suspeitas. Fiquei sendo odiada por todos, enquanto o que eu mais queria era gritar para o mundo o que tava acontecendo. Mas eu não podia. Agora estou aqui, de frente pra vocês, abrindo meu coração, porque eu imagino que vocês saibam de quem eu to falando, e eu imagino que essa pessoa que eu tanto amo vá ver essa gravação e vai perceber que mesmo depois de tanto tempo, meu coração não foi, nem por um segundo sequer, pertencente a outra pessoa. E gostaria que se ela estiver vendo isso, ela soubesse: não a quis trair, eu quis ajudar, mas fui intrometida demais.
– Srtª Alexia, nós sentimos muito por tudo que passou. E ficaremos felizes se você conseguir resolver esta pendência amorosa na sua vida.
– Eu também espero. E só quero que saiba – virou-se pra câmera – que vou esperar seu tempo, e vou esperar você vir a mim quando quiser, para que possamos conversar. Espero que seu coração ainda bata pelo meu.
– Olha, Srtª Alexia, você poderia nos responder umas últimas perguntas?
– Claro, pode falar…
– Você acha que seu pai foi assassinado ou cometeu suicídio?
– Eu acho que ele teve o que merecia…
– A senhorita tá ciente que essa sua declaração pode lhe por como suspeita?
– Não me importo. Eu sei que não o matei, mas se o tivesse feito, não seria motivo de vergonha.
– Bom, podemos encerrar por aqui, ou a senhora tem mais alguma declaração para fazer?
– Já acabei, e por mim já chega. Estou exausta.
O vídeo congela, indicando o seu fim. Juliana está chocada, olhando para a tela do computador.
– O que você vai fazer Ju? – Isabela perguntou
– Como assim, o que a Teles vai fazer? – Silveira estava confuso
– Eu não sei… – Juliana balbuciava
– Não sabe o que? – Silveira insistia
– O que ela vai fazer, oras! – respondeu Hugo
– Mas porque ela deveria fazer algo?? – Silveira já estava perdido e Hugo lembrou que ele não sabia da história
– Silveira, vem comigo, deixa eu te contar uma história… – Se afastou com Silveira e tratou de resumir a história.
– Ju? Fala comigo. – Isa abraçou a amiga
– Eu preciso de tempo, de um bom tempo pra pensar… – Juliana constatou e se levantou – vocês podem editar a matéria para mim por favor? Não tenho cabeça e …
– Claro! Faremos isso. Você já fez muito por nós, só terá o trabalho de assinar a reportagem junto com a gente. Vá pra casa de descanse. Depois conversamos…
– Ok. Vou lá então…
Juliana saiu da redação, entrou em seu carro recém-comprado e se dirigiu para casa. Nesse momento ela desejou muito morar sozinha, pois sabia que seria coberta de perguntas. Deu meia volta com o carro e resolveu pernoitar em um Hotel no centro da cidade. Precisava esfriar a cabeça, e dormir: estava exausta.