Já caminhávamos há mais de uma hora e estávamos próximas a saída. Olhei Arítes e seu semblante estava pesado. Parecia que estava com raiva. Não conversava conosco e, apesar de saber que minha namorada era comumente calada, nunca vi seu semblante tão alterado.
— O que foi, Arítes? Parece contrariada com algo?
— Não é nada.
Falou seca e não olhou para mim. Adiantou o passo e se distanciou de nós. Tuli me tocou o ombro e olhei para ela.
— Vá atrás dela e faça-a olhar para você. Seja carinhosa. A espada emana muita energia, Tália, e ela ficará em um turbilhão de emoções. Ela tem que aprender a perceber e a se controlar.
— A espada faz ela ter sentimentos ruins?
— Não, não é isso. A energia que a espada emana faz com que o nosso equilíbrio energético altere. Ora ela estará eufórica, ora estará feliz, ora com raiva. Arítes é uma mulher de fibra e uma boa mulher, mas às vezes as emoções que suprimimos para não extrapolar, são as que vem à tona. Ela deve estar contrariada com toda a situação e por isso essa reação dela.
Assenti com a cabeça e me apressei em alcança-la.
— Arítes… Arítes, espera!
— O que você quer, Tália?
Parei, momentaneamente, chocada com a sua reação. Ela me olhou e viu que a tristeza em meu rosto ficou aparente para ela, pois retornou e segurou meus ombros.
— Desculpa, amor. Desculpa. Não queria ser grossa com você.
— Não tem importância, me abraça.
Circundei sua cintura e a trouxe para junto de meu corpo. Ela se aninhou em meu pescoço e começou a chorar.
— Desculpa…
— Shhhh. Não fiquei chateada. Olha para mim.
Desalojei-a da sua proteção e fitei seus olhos verdes, cobertos de lágrimas.
— Você não percebeu que está tendo muitas emoções ao mesmo tempo? É a espada, Arítes. Tenta focar no que temos que fazer, mas tenta ser objetiva e quando sentir que não está conseguindo, você vem para mim. Vamos fazer isso juntas, tudo bem?
Eu falava baixo, com minha testa colada na dela. Arítes inspirou forte. Meneou a cabeça, tentando controlar as lágrimas. Eu continuava abraçando sua cintura e corri minhas mãos pela lateral de seu corpo até chegar a sua face. Depositei um beijo suave em seus lábios e ela me abraçou mais forte, assaltando minha boca com intensidade. Era um beijo desesperado que cresceu se tornando voraz. Soube naquele momento que ela ainda não conseguia refrear as emoções que passavam por seu corpo. Desprendi meus lábios a muito custo e respirei forte, para não me entregar a esse turbilhão de emoções.
— Olha para mim. O que sente?
— Não sei… Sei que é muito forte o que sinto…
Estava com minha testa colada a dela novamente e a olhei com ternura.
— Ela não te controla, Arítes. Pensa no que somos, no que temos e no que, para nós, é mais caro. Eu não quero te perder, e sei que nem você a mim. Não quero que se perca, Arítes. Se for preciso, desisto de tudo por você…
Ela balançou a cabeça violentamente, como que espantando seus demônios.
— Não. Eu consigo. O que somos, é em parte pelo que estamos lutando.
Sorri para ela. Essa era a “minha Arítes”. Aquela, pela qual me apaixonei, ao longo de tantos anos. Ela, mais uma vez, inspirou fundo.
— Eu consigo! — Falou resoluta. – Vamos continuar.
Abraçou-me e caminhamos lado-a-lado, mais calmas, sem tanta ansiedade.
Pegamos os cavalos alados, e eles pareciam conhecer o nosso verdadeiro destino, pois voaram garantidos do nosso trajeto. Descemos em uma clareira na mata, pouco antes do rancho de Arítes. A madrugada já se avizinhava e precisávamos descansar. Sabíamos que Natust, ainda não havia conseguido chegar até as cercanias de Eras. Marchavam em direção a nós, porém o grande exército demoraria para se locomover. Não tínhamos mais Melorne como vidente de oráculo para nos orientar com precisão, mas, eventualmente, Tuli se isolava para entrar em transe e fazia um contato sensitivo.
Largamos todas as nossas coisas no canto da sala, extenuadas com a intensa atividade que imprimimos do dia anterior. Queríamos comer, tomar um banho e dormir e tínhamos pouco tempo para isso. Arítes preparou mantas na sala para que Tuli e Miray pudessem dormir, enquanto eu fazia um guisado com tubérculos para comermos. Miray esquentava a água do nosso banho e Tuli tentava algum contato com Tir. Nos banhamos, comemos e Tuli disse que pouco conseguiu captar da mensagem vinda de Tir.
— Vi que Bonan não queria usar de magia para abrir o portal para nossa comunicação. Quase foi telepática nossa conversa, mas posso dizer que ela não está abrindo a fonte energética, pois disse que há uma grande força mágica atuando sobre Eras.
— E isso quer dizer?… – Questionei.
— Quer dizer que Serbes está próximo.
Inspirei fundo e exalei.
— Não estou gostando da “Espada Macha” estar conosco. Se ela tem esse grande poder, está mais próxima da mão de Serbes do que antes. – Falei.
— Não acho, Tália. Os homens dele chegaram a antessala da “Espada” junto conosco. Imagina se não tivéssemos lá? Ele já estaria de posse da espada à essa altura.
— Arítes está certa. E o pior, não temos como escondê-la corretamente. O tempo está contra nós. – Pontuou, Miray.
— Bom, o fato é que Bonan contou que Kamar está realmente marchando para nós, pelo leste. Como Natust vem pelo norte, talvez os batedores deles já saibam.
— Ou talvez não, Tuli. Para Natust, Terbs está acampado na fronteira sudoeste para nos atacar. Estão imaginando que nossa atenção está voltada para Terbs e, provavelmente, não enviariam batedores tão distantes ao leste. Não esqueça que a comandante Elia está se articulando para que as informações só saiam para o nosso exército, quando sentir que é a hora certa. Mesmo que Serbes já esteja entre nós, ele também será pego de surpresa.
— Isso se ele não esteve sempre entre nós… E não acho que seria tanta surpresa para ele assim, afinal, usa de magia.
— Ele pode ter a magia, mas teria que ter um oráculo também, ou um portal. Não captamos essa atividade aqui em Tejor, sem que fossem nossos próprios portais e com os nossos oráculos. – Miray explicou.
— Como assim, Tália?O que você quis dizer com “se ele não esteve sempre entre nós”?
Acredito que a pergunta de Arítes, naquela hora, era o que todas questionavam diante de meu pensamento expressado em voz alta. Apressei-me em explicar minhas próprias interrogações.
— Ele é um rosto desconhecido de todos, Arítes. Pode ser qualquer um. Está entendendo o que digo?
— Sim, mas ele é humano. Não teria tempo de articular tudo isso em Natust e ao mesmo tempo estar conosco. É um reino muito distante de nós.
Suspirei.
— Enfim, de qualquer forma, amanhã teremos que entrar muito cedo em Eras e de forma sigilosa, como minha mãe orientou.
— Bonan pediu para reforçar a ideia de vocês se manterem sempre juntas. Arítes ainda tem que controlar a “Espada”. Disse que Veras não chegou nada bem em Tir e está tentando curar seu ferimento, ainda. Ela também falou que as sombras estão chegando a Tir. Estão se alastrando rápido. Ervas daninhas que nunca cresceram lá, estão invadindo as florestas. O desequilíbrio energético já começou e ela está tendo dificuldades em fechar o ferimento de Veras. Serbes aprendeu muito sobre magia, e ele estando aqui em Tejor, utilizando-a, acelera esse desequilíbrio. Tir está entrando em trevas e se não conseguirmos, em breve Tejor também entrará.
Sentimos a dor de nossa impotência, diante do que ocorreu com Veras e diante dessa notícia.
— Bom, melhor a gente dormir. – Falou Arítes.
Todas levantamos e enquanto as duas se ajeitavam sobre as peles, fomos para o quarto de Arítes.
As expressões de Arítes estavam sérias e eu cheguei, abraçando-a por trás, enquanto ela desprendia a bainha da espada para pendurá-la. Apoiei meu queixo em seu ombro, esperando que ela falasse algo. Estava taciturna e sua postura me preocupava. Ela inspirou fundo, cerrando os olhos fortemente para depois abri-los, voltando seu rosto de encontro ao meu. Ainda se mantinha de frente para a parede, como que decidindo se deixaria a “Espada Macha” ali, pendurada, longe de sua mão. Beijou meus lábios, brevemente, e fitou meus olhos com expressão de cansaço.
— Está difícil decidir se vai deixa-la aí ou não? – Perguntei num tom baixo.
— Sei que não vou deixa-la aí. – Suspirou novamente.
— Mas queria.
Afirmei, mantendo-me ainda colada a ela por trás, apoiada sobre seu ombro. Ela não se movera do lugar, a não ser, pelas mãos que voltaram a prender a fivela da bainha.
— Sim. Estou tão confusa, Tália. Eu sempre me orgulhei de conseguir me controlar, controlar o que sinto. Não sei se vou alcançar esse equilíbrio com a “Espada”…
— Shhhh. Vai sim. O nosso maior problema é o tempo, pois amanhã vamos estar dentro do olho do furacão, mas eu não conheço ninguém que tenha mais força de vontade e mais determinação que você. A “Espada Macha” não poderia estar com uma pessoa melhor.
Dei a volta em seu corpo para ficar de frente para ela, sem deixar de segurar seu corpo e ela pousou seus braços sobre meu ombro, afagando minha nuca. Depositei outro beijo em seus lábios. Um toque suave e acalentador. Não era sensual, mas algo próximo da ternura, para transmitir-lhe segurança. Eu queria dizer que estava ali, junto a ela e não a deixaria só. Nos afastamos e ela esboçou um sorriso tímido.
— Me fala o que sente quando está com “ela”.
Ela balançou a cabeça, levemente, em negativa.
— O que eu sinto? Creio que não conseguiria descrever, Tália. É como se ela me tomasse por inteira. Eu sinto uma força e meus pensamentos se desarrumam. Ora eu tenho certeza do que devo fazer, ora tudo fica muito difuso. Não consigo distinguir o que é meu, ou melhor, se o que sinto é real ou não.
— Mas não pode deixa-la longe de você, também. Amanhã não saberemos o que nos espera, mas eu sei que o que vier, teremos que nos preparar e se você não se acostumar, pelo menos um pouco que seja, na hora que necessitar, não conseguirá.
— Eu sei…
Ela suspirou desanimada. Eu estreitei mais meus braços em torno dela, escondendo meu rosto em seu pescoço e aspirando o aroma de sua pele. Ela resmungou num gemido e prendeu a respiração por segundos. Me segurou pelo quadril, puxando para que subisse e abarcasse com minhas pernas seu corpo. Ela riu relaxada, pela primeira vez, desde que chegamos.
— Eu amo te pegar no colo. Adoro quando você fica, assim, pendurada em mim como um bichinho.
Achei graça do que ela acabara de falar. Nunca imaginei que ela gostasse de me carregar assim.
— É? E por quê?
Perguntei rindo, dando pequenos beijos em sua boca, mas fugindo para que ela não aprofundasse o beijo. Ela sorria tentando capturar meus lábios e desistiu resvalando para meu pescoço, me provocando com seus lábios, que passeavam sobre minha pele. Começou a andar comigo em direção a cama e eu já previa que ia perder a disputa na brincadeira.
— Não me joga na cama. Isso é desleal.
Eu falava entre os risos, pois agora ela mordiscava de leve a minha pele, onde alcançava.
— Desleal por quê? Só porque eu caio sobre você, lhe prendendo, e você não vai conseguir fugir?
As palavras eram pronunciadas, na medida que ela se aproximava da cama. Eu comecei a me desprender de seu corpo, tentando sair da sua cilada, mas ela não deu tempo. Me jogou e caiu por cima de mim, rindo. Segurou minha cintura, pressionando a pelve sobre a minha.
— Não vai prender meus punhos para que eu não fuja?
Falei em seu ouvido, capturando o lóbulo de sua orelha entre os dentes.
— Não.
— Não?
— Não. Você não vai conseguir sair. – Riu de minha cara enfezada.
— Acha que não?
Empurrei-a pelo ombro e ela colocou suas pernas entre as minhas, enlaçando-as, forçando seu peso para baixo. Envolveu minhas costas num abraço e seu rosto, meteu-o enfurnado no travesseiro, ao lado do meu. Tentei empurrá-la novamente, mas não conseguia me mover.
— Ei! Não é justo!
— E por que não?
O som de sua voz saia abafado, pois ela permanecia com o rosto colado no travesseiro e eu comecei a gargalhar.
— Porque não vou conseguir fugir, mas você também não fará mais nada, a não ser que saia dessa posição.
Ela elevou o rosto, vendo que eu não resistia mais e ficou me encarando.
— Então, eu ganhei?
— Logico que não. Foi um empate.
— Eu ganhei, sim. Você desistiu de resistir.
— Não desisti, não. Estamos num impasse. Mas se você quiser ficar a noite toda com o rosto enfurnado, aí, é com você.
— Hum, sem graça.
Ela elevou o tronco sobre mim, afrouxando a pegada. Nesse momento, eu rolei para o lado para fugir e não conseguia parar de rir, com a minha travessura. Arítes segurou o cós da minha calça, no reflexo. Desequilibrei e caí sobre a cama, novamente, porém de bruços. Ela se jogou sobre minhas costas. Me dei mal. Não conseguiria mais me virar, com ela sobre mim. Voltei a rir, pois ela gargalhou mexendo comigo.
— Agora você é minha!
Falou, passando suas mãos por baixo de meu dorso, alojando-as em meus seios, apertando-os. Ela ria, pois fazia isso para me atormentar, porém meu riso começou a diminuir, quando tive a percepção de seus movimentos sobre mim. Virei meu rosto de lado para respirar. Começava a apreciar, muito, a investida dela e acredito que já estampava em meu rosto, pois ela foi diminuindo o riso. Debruçou toda sobre meu corpo, movendo-se intensamente. Seu sexo estava em contato com meus glúteos e ela começou a movimentar agressivamente, arrancando gemidos altos de minha garganta.
Suas mãos principiaram a abrir minha roupa, com dificuldade, pois estavam entre meu corpo e o colchão. Tentei levantar para ajudá-la, mas ela me empurrou de volta.
— Não. Eu quero assim.
Permitiu que eu elevasse o suficiente, apenas para que ela puxasse pela minha gola e arrebentasse os finos cadarços de couro que enlaçavam meu corpete, deixando meu tronco livre para que ela tateasse minha pele, com mãos atrevidas.
— Arítes, deixa eu tirar…
— Não.
Ela não falava mais que algumas palavras, mas eu escutava sua respiração arfante e pesada, os gemidos fortes e sentia seu corpo capturar o prazer através de meu corpo. Ela enfiou a mão por baixo de minha pelve, puxando os cadarços que prendiam minha calça, sem paciência, enquanto a outra mão, apertava forte meu seio. Empurrou sua mão para dentro, tocando meu sexo sem sutileza. Essa ação fez com que me assustasse, mas minha libido me traía. Molhei seus dedos fartamente, extraindo dos lábios de Arítes um urro de prazer. Sabia que algo estava errado, pois ela nem retirar suas roupas se permitiu, no entanto, me envolvi nessa bruma excitante de dominação que ela me proporcionava. Joguei minha pelve para cima, colando mais meu traseiro ao sexo dela e movi com força. Outro gemido alto soou entre as paredes do quarto. Antes que ela tivesse outra ação, lancei meu braço para trás, entre nossos corpos, e desafivelei a bainha da espada, que ainda estava presa a seu corpo. Ela desprendeu e caiu sobre a cama. Arítes parou momentaneamente. Virei meu rosto para trás, para olhá-la e ela estava estática, olhando a espada, pousada ao nosso lado. Voltou seu olhar para mim e ensaiava falar algo. Parecia assustada.
— Arítes, se você parar, ou mudar qualquer coisa no jeito que está fazendo, eu juro que não faço amor com você por um mês!
Falei rápido e aflita. Meu corpo pegava fogo e nada que essa espada pudesse influenciar, ou não, justificaria ela parar de me pegar daquele jeito.
Ela saiu de sua momentânea apatia. Puxou minha calça com força, escorregando por minhas pernas. Retirou a sua também com rapidez, voltou a me enlaçar por trás entrando em mim com vontade, movendo seus dedos com força. Agarrou meus cabelos com a outra mão, fazendo com que eu arqueasse e mordeu minha nuca, deslizando sua língua, logo em seguida, sobre a pequena marca que seus dentes deixaram. A agonia dela era a minha agonia para o gozo. Mexeu cada vez mais rápido, fazendo meu corpo todo contrair e desfaleci, vencida. Ainda senti Arítes movendo sobre mim e escutei ao longe seus gemidos. Logo após, ela se deixou cair ao meu lado.
Estendi minha mão, para tocar seu rosto suado. Cerrei meus olhos, sentindo a sua pele sob meus dedos. Ela segurou minha mão, fazendo-me olhar através de sua íris verde-translúcida. Transbordávamos amor. Buli seus lábios, arteira. O som da risada frouxa, ganhou o ar divertida. Aproximou a boca, depositando um beijo plácido em minha face. Seu espírito ganhara serenidade, eu sabia.
Rolei sobre seu corpo, segura de que ela não reagiria. Meu olhar era predatório e burlão, insinuando roubar a atenção para meus atos. A pele dela eriçou no contato sutil de meus lábios sobre seu colo amorenado pelo sol. O cheiro amadeirado do perfume dela rescendia, aguçando os sentidos que se encontravam na superfície. Sentidos latentes, meus e dela. Os beijos miúdos acalentavam o véu da pele, trazendo à tona a percepção de bem-estar que era a morada daquele corpo. Tudo me pareceu tão suave, beirando o etéreo. Algo acima de nossas vontades e contendo todas elas, como a brisa leve na beira de um penhasco, onde lá embaixo, se desvenda um vale verde e cheio de vida.
Em seu vale, um rio caudaloso verteu seu querer entre meus dígitos. Eu me consumia na paixão de vê-la entregue aos meus carinhos. Os gemidos aumentavam na proporção em que eu tocava o âmago daquela que fez minha vida doce e intensa.
Eu estava saciada e, ao mesmo tempo, sequiosa. Sempre com sede do amor dela.
Um tempo depois, Arítes se aproximou para me abraçar. Recostei minha cabeça em seu ombro, permanecendo de olhos fechados. Abri um sorriso tão grande que mal cabia em meu rosto.
— Será que as meninas escutaram?
— Se escutaram, vão ter que se virar sozinhas. – Ela riu.
— Ou juntas. Sabe-se lá?
Gargalhamos novamente. Me acomodei melhor em seu corpo. Meus olhos pesavam.
— Tália, eu estava descontrolada.
Ela falou preocupada por sua ação intempestiva. Sabia que estava se referindo as emoções causadas pela força da espada.
— Que ótimo. – Falei sonolenta. – Gozamos gostoso e rápido. Quanto tempo temos para dormir? – Perguntei sonolenta e bocejando.
— Menos de cinco horas.
— Viu? Foi prático. Precisávamos relaxar para dormir.
Eu resvalava para o sono, mas ainda escutei ela rindo e retrucando.
— Você é uma coisinha preciosa.
****
Pegamos algumas armas no pequeno arsenal que Arítes mantinha pendurado na parede e nos adiantamos para pegar os cavalos. Tuli passou a mão por sua nuca tentando desfazer a tensão. Todas estávamos apreensivas e parecia que fazíamos as arrumações automaticamente. O cansaço nos rondava. Dormimos pouco e diante de toda a situação, o nervosismo nos tomava.
— Vamos. Não gostaria de entrar no castelo com o dia claro. – Pontuou Arítes.
Montamos nos cavalos e dessa vez, não alçaríamos voo. Chegaríamos como se fossem montarias comuns. Estavam sob o véu da magia para que ninguém visse suas asas e o mais estranho, era que nós também não víamos. Apenas temíamos que Serbes percebesse quando chegássemos próximo, mas Tuli falou que era um encantamento simples. Que não desprendia muita energia. Galopamos rápido. Barulhos de tumultos começaram a chegar a nós e paramos os cavalos de súbito. Miray apeou falando que ia verificar o que era.
— Miray, não! Parece sons de luta. – Arítes novamente tomava a frente. – Temos que ter muito cuidado. Não parece uma disputa qualquer. O barulho está muito intenso.
— Miray é batedora, Arítes. Deixe que ela vá. Não podemos avançar se não sabemos o que está à nossa frente. – Retrucou Tuli.
Eu olhei para Arítes e sua expressão era de dúvida e apreensão.
— Arítes.
Chamei sua atenção e ela se voltou para mim. Seus olhos mostravam medo e confusão.
— Temos que chegar ao castelo e já está amanhecendo. A floresta não vai nos esconder até a entrada que minha mãe ensinou para a gente. Se Miray é batedora, ela nos dará uma posição.
Arítes olhou a todas e voltou-se para mim novamente. Meneou a cabeça afirmativamente. Miray saiu na sua exploração e vi, mais uma vez, Arítes travando uma luta interna com as suas emoções. Emparelhei meu cavalo com o dela.
— Isso não vai dar certo, Tália. Minha apreensão se transformou em medo. Não posso ir para uma guerra nesse turbilhão. – Segurei sua mão. – A “Espada” ainda me pega de surpresa nas minhas emoções.
— Vai passar, você já consegue distinguir.
Confortei-a, vendo a luta que amargava para harmonizar-se por dentro.
— Já percebeu a influência e não se deixou levar. Não percebeu, isso?
Ela se aprumou na montaria e olhou a bainha da espada.
— Ela queima junto a meu corpo, ainda me assusta.
— Ela queima, mas não lhe faz mal. É sua aliada e não sua forca.
Ela olhou novamente a espada, segura em sua bainha e estreitou os olhos. Meneou levemente a cabeça e depois, voltou-se para mim. Estendeu a mão, acariciando de leve meu rosto.
— Acho que meu maior medo é te perder ou te machucar.
— Eu tenho certeza, pela Divina Graça”, e pelo que acreditamos que ela, — apontei a espada — não faria isso.
Mais uma vez, ela voltou seu olhar para a bainha e se perdeu em seus pensamentos, momentaneamente. Espremeu seus olhos quando colocou a mão sobre o punho. Os cavalos agitaram. Fiz esforço para manter o meu cavalo parado. Seu corpo tremia e me preocupei. Coloquei minha mão sobre o seu ombro e fui atingida por uma avalanche de sentimentos conturbados. A sensação era forte demais. Apertei com força, como num espasmo de meus próprios sentidos e soltei-a, como se eu queimasse com a intensidade de meus medos.
Novamente os cavalos se agitavam enérgicos, dificultando Tuli e eu, na tarefa de acalma-los. A montaria de Arítes estava parada, assim como ela, num transe compartilhado. Apavorei-me, pois não conseguia chegar até Arítes, novamente, por conta da agitação de meu cavalo e ao mesmo tempo, ela não saía do lugar. Permanecia parada e fixava o olhar em sua mão, pousada no punho da espada. Miray chegou de sua exploração e ficou momentaneamente estática, ao olhar a cena a sua frente. Quando ensejou chegar até nós, nossos cavalos começaram a acalmar e vi Arítes se movimentar de novo.
— O que foi isso? – Perguntou Miray.
Eu estava um pouco atordoada e ouvi as palavras de Arítes, quase como um sussurro.
— Eu estava em uma conversa com a minha amiguinha, aqui.
Ela sorriu levemente, enquanto voltava a segurar a espada. Preparei-me para um novo embate com meu cavalo, mas ele não veio. As montarias, e Arítes, estavam espantosamente serenos. Não sei o que aconteceu, mas gostei do que vi. O rosto dela estava tranquilo, como há muito tempo não via.