No final daquela mesma semana reunimos as nossas famílias para contarmos sobre o namoro, quer dizer, noivado, tudo estava correndo apressadamente para que pudéssemos nos casar no civil antes do término da minha gravidez, e o casamento seria realizado nos Estados Unidos, não no Brasil. Tanto a minha família quanto a da Pietra tinham condições financeiras muito boas, todos, até mesmo o Renan, iriam para Nova York participar do nosso casamento e posteriormente voltariam para o Brasil. Não queria sair do Rio, mas foi a maneira que encontrei para me livrar de tantas memórias desgraçadas, nada melhor do que recomeçar a vida longe de tudo.
Não fazia nem dois meses que o Tiago havia sido preso e soubemos através da Bianca que o canalha foi assassinado no presídio depois de arrumar confusão com um dos traficantes mais perigosos do Rio. Se eu disser que senti piedade ou algo do gênero estaria mentindo, muito pelo contrário, estava aliviada por saber que não havia a possibilidade dele sair do presídio e infernizar novamente a minha vida.
As dúvidas para saber que nome dar para a minha filha eram muito grandes. Havia diversos nomes lindos, o que só nos deixava mais indecisas sobre que nome escolher, mas quando minha mãe falou no nome Kathleen e estava ligado a pureza, inocência e candura, sabíamos que esse nome caiu como uma luva para a menininha que estava perto de vim alegrar nossas vidas.
Todos estranharam nossa reconciliação rápida é claro, mas mostraram seu apoio, menos minha mãe que achou a decisão bastante precipitada.
–Filha, tem certeza de que é isso que você quer? Saiba que não é só sua felicidade que tá em jogo. Pense se essa será a melhor escolha para a Pietra e para a Kathleen. Ainda dá tempo de mudar de ideia. –minha mãe questionava após eu ter entrado no sétimo mês gestacional.
–A Pietra está completamente ciente de que não a amo, mas preferiu correr os riscos. Não tenho dúvidas de que essa é a melhor decisão para a minha filha e para mim. Nos Estados Unidos estaremos longe da memória desgraçada do Tiago, da Ágatha e todos os sofrimentos que passei neste país. –disse empolgada com a esperança de poder ter uma nova chance para ser feliz.
–Também estará longe dos seus pais que te amam tanto, do seu irmão, da Rafinha que crescerá longe da prima. Ainda dá tempo de consertar as coisas e desistir desse casamento de fachada. E se a Ágatha cair em si e quiser reconquistar o seu amor. Quando vocês terminaram percebi o quanto ela deixou essa casa arrasada…
–Mãe, para de falar na Ágatha! Em nenhum momento ela se importou comigo e com a minha filha, quero mais é que ela vá para o quinto dos infernos. –falei aborrecida. –Vou me casar com a Pietra e isso já está mais do que decidido.
–Casar com uma mulher e amando outra pessoa. Saiba que para mim isso não fará o menor sentido. Não concordo com a sua decisão, mas respeito.
Quando ia falar algo a mais, fomos interrompidas pela voz da minha noiva.
–Sogrinha, será que posso roubar a Giovanna pra mim um pouquinho? –como essa morena era linda. Estava noiva de uma gata desejada por várias mulheres desse país. Por que não ficava feliz com isso?
–Claro que sim. Vou deixá-las a vontade. Cuida bem da minha filha. –minha mãe falou e em seguida se retirou.
Fiquei na varanda curtindo os carinhos da Pietra no meu cabelo e torcendo para que não me arrependesse da decisão definitiva que estava tomando.
Minha viagem se aproximava. Antes de partir para uma nova vida, para um novo país, precisava ir à casa dos meus ex-sogros, os pais da Ágatha. Deixem eu me explicar direito… Não ia até lá colocar chifres na Pietra, mas precisava visitar uma pessoinha muito importante para mim. Mesmo com um barrigão fui até lá, dessa vez fui com o motorista do meu pai, visto que dirigir se tornava uma missão impossível.
–Giovanna, há quanto tempo não nos víamos. –fui recebida por uma Alana surpresa. Era uma sexta-feira a tarde e por sorte meus ex-sogros e nem Ágatha estavam na casa.
–É um prazer lhe rever. Parabéns pela gravidez. –o marido de Alana disse simpaticamente.
–Obrigada Geraldo.
–Então… A que devemos a honra da sua visita? –Alana foi curta e grossa.
–Na próxima semana me mudarei para os Estados Unidos e não pretendo voltar. Só que antes de partir gostaria de saber se vocês permitem que o Enzo passe o final de semana comigo como uma despedida. Ele é uma criança muito fofa e especial. Prometo que cuidarei bem dele. No domingo a noite posso deixá-lo aqui. –percebi os dois se entreolharem e torcia para que minha ida até aquela casa não tivesse sido em vão.
–O Enzo ainda é muito pequeno para dormir fora de casa, definitivamente não é uma boa ideia. –sabia que Alana estava agindo desse jeito só porque não era mais namorada ou noiva da Ágatha.
–Qual é, Alana?! Você está sendo muito careta. A Giovanna é uma pessoa de confiança, nosso filho já está prestes a completar dez anos. Vamos deixar que ele decida. –Geraldo disse saindo ao meu favor.
Antes que minha ex-cunhada pudesse falar algo, uma voz alegre se fez presente enquanto sentia braços envolverem minhas costas.
–Tia Gi, tia Gi, estava morrendo de saudades suas! Então é mesmo verdade que você está grávida. Que barriga linda! –Enzo disse me abraçando apertadamente e fazendo carinho na minha barriga.
–Enzo, a Giovanna veio lhe fazer um convite. Ela quer saber se você aceita passar o fim de semana com ela. –o pai do garotinho comentou.
–Claro que quero. Tia Gi, vou pegar minha bola e já desço. Vai me levar pra conhecer seus pais e a Rafinha? Só ouço falar neles, mas ainda não conheço… –o menino tagarelava sem parar até ser interrompido por Alana.
–Enzo, nem faça planos porque não sei se vou deixar você sair. Você é muito pequeno para ficar fora de casa, vou ficar preocupada. –Alana comentou seriamente.
–Não seja chata, mãe. Com a tia Gi vou poder me divertir, trancafiado nessa casa não vou ter nada pra fazer. Desde que os filhos do tio Arthur nasceram ninguém me dar atenção. A Sra. só não quer me deixar ir porque a tia Gi e a tia Ágatha estão separadas. Seja madura e saiba separar as coisas… Pai, fala alguma coisa! –mesmo sabendo o quanto Enzo era uma criança madura, essa fala dele me surpreendeu.
–O Enzo está certo. Giovanna, pode levar o meu filho. Deixa que me acerto com a Alana. –Gustavo assentiu e apenas pude lhe agradecer.
–Obrigado papai! Você é o melhor pai do mundo. –Enzo disse abraçando o pai. –Vamos tia Gi.
–Espera rapazinho! Você precisa levar roupas e outras coisas que vá precisar.
–Não se preocupe, Gustavo. Já tenho tudo sob controle. Cuidarei muito bem do Enzo, não terá queixas. –disse recebendo mais um abraço apertado do menino.
O final de semana com o Enzo foi perfeito. Meus pais adoraram o menino que se deu bem de cara com a Rafinha que havia acabado de completar um ano e com o Mateus, os dois logo se entrosaram e começaram a falar sobre futebol, pareciam melhores amigos de longa data, o Enzo estava perto de completar dez anos, já o Mateus ia fazer oito anos, pouquíssima diferença de idade. A única criança que não gostou do Enzo, foi a Natalie, minha afilhada, irmã do Mateus, mas nem liguei muito para a opinião da menina. Desde muito pequena ela sempre teve uma personalidade forte, e agora com três anos estava no auge do egocentrismo. Sei que ninguém é igual a ninguém, cada um nasce com sua individualidade, mas torcia para que minha filha pudesse ser uma criança doce e meiga como o Enzo, não uma criança mimada e difícil de lidar.
Como tudo o que é bom, dura pouco, o final de semana estava chegando ao fim e teria que “devolver” o Enzo. Antes de leva-lo para casa, precisava ter uma conversa que me faltava coragem.
–Meu lindo, você sabe por que te trouxe para passar o final de semana comigo? –perguntei no banco do jardim da minha casa enquanto estávamos sozinhos.
–Porque você gosta muito de mim e porque sou uma criança fofa e adorável que não dou problemas?! Só a Natalie não gostou de mim. –foi inevitável não rir da fala do Enzo.
–Não liga pra Natalie, ela não sabe o que perdeu… Gosto muito de você, mas teve outro motivo para você passar esses dias comigo. Enzo, nessa semana estarei me mudando definitivamente com a Pietra para os Estados Unidos. Eu vim me despedir de você. –percebi algumas lágrimas nos olhinhos do menino.
–Mas por que tia…? Então você não vai no meu aniversário? Você ainda vai voltar de lá? A gente vai se ver ainda algum dia?. Vou morrer de saudades de você e até da Pietra, acho ela muito legal. E nunca vou conhecer a Kathleen? –foi inevitável não chorar ao imaginar as saudades que sentiria dessa criança e da tia dele.
–Algumas coisas não tem explicação, Enzo. Talvez quando você crescer seja capaz de entender determinados assuntos, mas mudar de país é a melhor solução para alguns problemas que tô enfrentando. A vida dá muitas voltas, prometo que ainda vamos nos rever e fazer muitos passeios juntos. Você também vai conhecer a Kathleen… Teremos muitos momentos felizes juntos ainda, mas não sei te dizer quando, daqui a alguns anos quem sabe! –era de partir o coração ver o Enzo chorando e dizer o quanto ficaria com saudades e implorando para que eu não me esquecesse dele.
–Só não consigo entender porque você e a Pietra vão se casar se é a tia Ágatha que você ama e a minha tia também te ama muito. Depois de um tempo você vai se separar da Pietra pra ficar com a minha tia? –e agora o que responderia?
–Enzo, sempre vou te amar muito, mas você precisa entender que a história entre a sua tia e eu terminou, infelizmente nossa relação não deu certo. Vou me casar com a Pietra, e a Ágatha também seguirá com a vida dela ao lado de outra pessoa, é o ciclo da vida. –disse me esforçando para não chorar.
–A história de vocês não terminou, apenas deu uma pausa. O tio Alex disse que podemos fugir de todo mundo, mas não podemos fugir de nós mesmos. Ele disse que a tia Ágatha e você podem se afastar no corpo, mas uma sempre estará pensando na outra, o coração de vocês estarão juntos. –tentei me esforçar, mas algumas lágrimas já jorravam pelo meu rosto.
–Apenas sei que seu tio anda assistindo muito filme de romance e você não parece que tem apenas nove aninhos. Vamos indo! Prometi para o seu pai que te levaria em segurança.
Apesar da minha barriga está cada vez maior, optei por ir dirigindo no meu próprio carro. Deixaria o Enzo na casa dele e de lá ainda teria outras duas paradas para fazer, mas ninguém precisava saber, muito menos o motorista do meu pai…
–Mãe, pai, vocês não imaginam o quanto a tia Gi e eu nos divertimos. –Enzo comentou todo eufórico quando chegamos na sua casa. –O Mateus é muito legal.
–Ele deu muito trabalho, Giovanna? –Gustavo perguntou percebendo a alegria do filho.
–Óbvio que não, o Enzo é um menino de ouro. Agora preciso ir.
–Já vai tia Gi? Fica mais um pouco. –percebi o semblante triste do menino.
–Enzo, não seja inconveniente. A Giovanna não pode ficar o tempo todo a sua disposição. –Alana falou sem paciência.
–Meu lindo, infelizmente tenho que ir, mas antes preciso te dizer uma coisa… Você é uma criança meiga, maravilhosa, de uma docilidade indescritível. Continue sendo um menino de bem e saiba que jamais esquecerei de você. Te amo, Enzo! –disse abraçando o garotinho e sentindo suas lágrimas molharem minha blusa. –Esse presente quero que abra quando já não estiver mais aqui! E quando usa-lo, sempre lembre de mim. –disse lhe entregando o embrulho.
–Também te amo tia Gi! Sempre vou sentir saudades. Espero que a Pietra te faça feliz e que a Kathleen seja uma criança tão linda quanto você. Tomara que volte logo ao Brasil. –Enzo disse ainda chorando e pegando o presente.
Sabia que o Enzo era apaixonado pelo Corinthians, e a irmã da Dani era a nutricionista do clube. Não foi muito difícil conseguir uma camisa do time com o autógrafo de todos os jogadores, sabia que o garotinho jamais se esqueceria desse presente.