Sentada estrategicamente num lugar onde a visão do restaurante era ampla, Vanessa olhava o advogado e a ruiva por cima dos ombros retesados da CEO, que ainda não havia percebido a chegada deles. Vanessa era discreta e ia dançando conforme a música. Nada a abalava, mas sabia que Victoria teria alguma reação quando visse os dois juntos.>
― O que você está a fim de comer hoje, Vic? Ouvi falar que aqui fazem um fricassé divino.>
― Você já veio aqui?>
― Sim.>
― Huuuum, com quem? Posso saber?>
Victoria sentia que era necessário flertar o máximo possível com sua assistente, o máximo que conseguisse fazer fora do ambiente de trabalho. Tinha de saber em que pé estava a vida de Vanessa em se tratando de relacionamentos. Tinha de esquecer Martina, a qualquer custo, nem que usasse a morena para tal.>
― Com Osmund… Você conheceu ele no jantar do meu último aniversário, lembra?>
― Como ele está?>
― Acho que bem, até onde sei. Ele se mudou para perto do Instituto Circense, mas parece que está a cortar gastos e voltará a morar comigo… Bom termos entrado nesse assunto. Fiquei de ligar pra ele hoje e já ia me esquecendo.>
Victoria constatou que Vanessa era a irmã mais velha que todo irmão gostaria de ter. Como os dois perderam os pais muito cedo, ela havia se tornado a figura materna dele. Era o elo que ele tinha com o passado, o que sobrou da lembrança que ele não tinha, a própria personificação dos pais. Por ocasião da mudança do menino para perto de onde estudaria, a irmã deixou claro que o apartamento dela sempre estaria aberto para ele, não importava quais circunstâncias acometessem a vida de ambos.>
O pensamento foi interrompido por altas risadas provenientes de trás. A CEO não sabia o que de tão engraçado aquelas pessoas estavam rindo e chamando tanta atenção. Quando tentou virar para olhar, a assistente interrompeu seu movimento.>
― Vou pedir um fricassé. E você?>
― Pode ser o mesmo, Vanessa.>
As gargalhadas continuavam. Mark estava a fazer o que sabia de melhor, descontrair a nova amizade que cultivara e Martina surpreendia-se com o humor ácido dele.>
Victoria olhou para trás, depositando uma feição séria em Mark, que ao perceber a chefe se pôs de pé vindo ao encontro dela.>
― O que tem de tão engraçado em uma conversa sobre assuntos jurídicos? ― perguntou a CEO para Vanessa antes de Mark chegar à mesa.>
Isso a deixou extremamente irritada. Sentiu que era ela quem deveria estar fazendo Martina rir, como nos velhos tempos. E que risada gostosa era aquela! A risada da ruiva despertou em Victoria lembranças adormecidas, que ela lutava para esquecer.>
Ah, se tudo tivesse sido diferente… >
Como Martina agira tarde em se declarar! Se ao menos tivesse se adiantado um mês a sua declaração de amor, quem sabe o sofrimento fosse menor. Victoria não teria se envolvido com William, talvez. Ou teria? Ela não teria engravidado.>
Estava quase certa de que corresponderia aos sentimentos da amiga. O que ocorreu ali fora trágico, ela estava simplesmente fora de si com a gravidez e no outro dia com o falecimento do pai. Então a raiva a acometeu.>
Perda. >
A impotência de tomar as rédeas de seu próprio destino. Se pudesse voltar no passado sabia que seria a mesma mulher, porém teria o amor da ruiva e sua companhia que agora desesperadamente ansiava, incompreensivelmente.>
Seus pensamentos estavam ali a dar nós complexos na sua mente, pois também não imaginava sua vida sem sua filha. Aceitar a alternativa de não ter se envolvido com William apagava completamente a existência de Lucy.>
― Senhoritas! Gostariam de se juntar a nós?>
― Obrigada, Mark. Eu e Vanessa estamos passando a agenda da semana, então…>
― Ok. Aproveite e agende uma reunião comigo e Martina, pois precisamos do seu aval para algumas coisas que estamos planejando fazer.>
Vanessa os olhava atentamente, degustando suas expressões faciais e daria de tudo, qualquer valor em troca e se tornar ouvinte das sinapses do cérebro de Victoria que o devorava com os olhos.>
― Pode deixar, Mark. Iremos marcar.>
― Bom apetite! >
Ele se retirou normalmente, de forma bastante educada até.>
Logo que o advogado juntou-se a Martina, Vanessa percebe a ruiva movimentando-se para ir ao toalete e torce internamente para Victoia não perceber.>
Os toaletes ficavam perto da entrada do restaurante e Victoria não perceberia a movimentação da ruiva, ao menos que olhasse para trás.>
― Vou ao toalete, Vanessa.>
Enorme ironia do destino. >
As duas partem sincronizadamente para o toalete e praticamente não conseguem esconder a cara de eto ao baterem de frente uma com a outra na entrada.>
Vanessa percebe as duas chocarem e entrarem em silêncio. O toalete era amplo, todo em mármore branco e um castiçal oponente e luxuoso pendia desde o teto, que era trabalhado em uma espécie do que parecia ser Romero Brito. No centro do recinto havia um sofá scarlett redondo de couro.>
Como quem não se engana do próprio endereço, Victoria poderia apostar que Martina iria primeiro lavar as mãos antes de entrar numa das cabines. Um antigo costume da ruiva.>
― Certos hábitos não mudam mesmo com o tempo, não é? ― Victoria verbalizou ao vê-la se dirigir a pia.>
Os olhos verdes de Martina e sua expressão de pura ternura pela observação da “amiga” recobraram nela um sentimento antigo: a atenção que um dia dela teve!>
― Você se lembra?>
As duas estavam ali, uma ao lado da outra de frente para o espelho, olhando os respectivos reflexos. Victoria com a mãos espalmadas na pia, totalmente desmantelava pela ruiva, que não fazia ideia da influência que tinha na chefe. >
Martina havia se tornado uma mulher e tanto. Para Victoria era espetacular a olhar, mesmo que pelo reflexo do espelho. O quão longe o verde dos seus olhos poderiam a levar a fazia viajar no infinito.>
Por que sentia aquilo? Por que era extremamente difícil lutar por aquele sentimento?>
Sentia-se tonta. As pernas bambas não respondiam mais.>
Ali ela foi caindo nos braços da ruiva, desmaiada.>
Bom dia!!
Muito bom!!