Um Novo Jeito de Ser

4- Novos conceitos

Os dias passam e a amizade entre Paula e Clara só solidifica, ambas já se sentem à vontade para desabafar mágoas passadas, compartilhar alguns segredos. Sempre dão um jeito de se verem no almoço ou à noite no bistrô. Nos dias de folga da Clara, Paula acha alguns passeios para fazerem. Numa das folgas ela dá a ideia de irem para BH.

– Pela primeira vez terei uma guia?

– Sim, vou te mostrar alguns lugares que gosto e tentar ao menos te levar em um dos meus restaurantes preferidos.

Numa segunda que Paula não teve aula pela manhã, decidem ir para capital no seu carro. Partem logo cedo para terem tempo de passearem bastante. Vão direto ao Mercado Central, depois vão para a Praça da Liberdade e Paula sugere:

– Que tal almoçarmos?

– Ótima ideia.

– Vou te levar ao Recanto Mineiro, comida tradicional!

Clara se encanta pelo lugar e principalmente pela comida. A conversa está animada, de repente Paula se cala e faz um sinal para Clara.

– Vê aquela mulher que acabou de entrar?

– Sim, a de vestido azul?

– Sim, ela é esposa de um amigo do meu ex-marido.

-O que está com ela?

– Não. Estranho, não conheço esse homem.

As duas ficam observando o casal. A mulher nota Paula e vai até a mesa delas.

– Quanto tempo Paula!

Paula se levanta e se abraçam. Paula apresenta Clara e todas ficam conversando em pé.

-Quer sentar Marcia?

– Ah não, só vim mesmo te dar um oi. Estou com meu namorado.

O clima fica tenso e Marcia explica:

– Acho que você não sabe, mas eu e o Claudio nos separamos tem um ano.

– Não sabia…

– Ele é Renato, meu namorado há uns 4 meses. – diz sem disfarçar a cara de felicidade.

Conversam mais um pouco e Marcia volta para sua mesa.

– O que foi Paula? Parece estranha.

– Sei lá, ele é tão mais novo que ela….

– E qual o problema?

– Ah estranho, geralmente os homens procuram mulheres mais novas. – diz com expressão confusa.

– Você está generalizando, não é nada bom. Eles me parecem apaixonados.

– Ela tem muito dinheiro, será que…

Clara olha com cara séria e diz num tom um pouco mais seco:

– Você está sendo preconceituosa sabia?

Paula olha confusa e diz:

– Eu, jamais!

– Claro que está! Acabou de dar a entender que o namorado está atrás do dinheiro dela. Parou para pensar que ele de fato pode estar apaixonado por ela? Que ele pode preferir as mulheres maduras que sabem o que querem, ao invés das meninas mais novas? Que sua amiga tem sim atrativos?

– É não pensei nisso, na verdade me deixei levar pelo preconceito sim…

– Cuidado ao falar, julgar. Não sabemos a história deles.

O almoço segue um tanto tenso, mas quando entram no carro, Clara fala:

– Me desculpa, não quis ser rude com você.

– Não, tudo bem. Acho que você está certa Clara. Eu tenho alguns preconceitos e acabo reproduzindo sem nem pensar direito.

– Também era assim e por isso que te falei daquele jeito. A gente precisa repensar nossos conceitos, se abrir para o novo, rever regras sabe?

– Sei sim. Engraçado que eu mudei tanta coisa na minha vida, e me peguei sendo boba com a Marcia.

– O importante é perceber e tentar mudar. A gente sempre vai errar, temos é que ter empatia pelas pessoas. Acredito que é o primeiro passo para mudarmos de verdade.

Durante a viagem, ambas conversam bastante sobre seus relacionamentos amorosos, sobre a família e o que desejam do futuro.

– Nossa Clara, já reparou como pensamos e queremos coisas muito parecidas?

– De fato, parece que temos muita afinidade.

– Eu preciso abrir um pouco mais minha mente. Sabe fui casada por muito tempo, sempre cuidando dos filhos, marido, casa.

– Seu marido não era muito participativo?

– Trabalhava muito, não tinha tempo, às vezes ajudava em casa e com as crianças.

– Paula ele não ajudava você, ele fazia a parte que cabia a ele!! Esse é o problema!

– Como assim?

– Os homens não “ajudam” em casa ou com os filhos, apenas cumprem suas responsabilidades. Muitas mulheres acabam sendo tão ou até mais machistas que muitos homens.

Paula ficou pensativa e relembrando seu antigo relacionamento, de todas as vezes que o marido arranjava uma desculpa, geralmente o trabalho, para não participar da vida familiar e das coisas da casa. Sempre pensou que eram seus deveres e, mesmo também trabalhando fora, poupava seu marido das reuniões de escola, ir ao mercado, consertar a porta do armário e até passar tempo de qualidade com os filhos. Começou a se questionar o quanto tinha de culpa por ter sido tão submissa.

– É mesmo. Sabe, eu sempre achei que era minha obrigação, que meu marido deveria ser poupado e acabei assumindo muitas funções que na verdade, ele deveria dividir comigo.

– Infelizmente isso é extremamente comum, ainda vivemos numa sociedade machista. Muito hipócrita, pois se proclama igualitária, mas muito machista.

Paula para o carro na frente da casa de Clara e pergunta:

– Você não sente falta de ter alguém que te complete Clara?

– Por um bom tempo pensei nesse fato de completar, mas hoje não quero mais.

– E por que não?

– Porque quero alguém que me transborde!

– Como assim??

– Completar parece que tá me faltando algo, e não está. O transbordar quer dizer que sou inteira e, alguém virá apenas pra transbordar em mim o que já é muito bom.

– Nunca tinha pensando dessa forma. Você tem razão.

Se despedem e cada uma segue para sua casa, porém ambas pensativas. Paula em todos os conceitos novos que descobriu, e Clara no quanto estava interessada na nova amiga, mais do que deveria talvez.



Notas:



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